segunda-feira, junho 20, 2016

Tieta do Agreste
(Jorge Amado)




EPISÓDIO Nº 169

























Ora, o carácter nacional e patriótico da Brastânio tem sido repetidas vezes afiançado e eu não pretendo discutir tal afirmação. Nem rectificá-la, nem ratificá-la. Mantendo-me à margem, apenas esclareço, cumprindo obrigação de autor imparcial, ser o Bayer da entrevista um Karl qualquer, técnico de renome e nada mais: não possui acções na companhia.


Se outros Bayer, donos de meio mundo, têm dinheiro e mandam na empresa, não sei nem desejo saber. Meta a mão em cumbuca quem quiser, não eu, macaco velho.

Evitando assim qualquer confusão no espírito do leitor, antes de retornar ao folhetim propriamente dito, gostaria de acrescentar uma palavra sobre a actuação desses capacíssimos técnicos, pagos a peso de ouro.

Palavra de pouca valia por se de leigo em matéria científica – mais leigo ainda que o cronista Giovanni Guimarães, cujas boas intenções estão dando nesse bode todo – não obstante capaz, quem sabe, de revelar curiosa circunstância na aplicação dos incomensuráveis conhecimentos desses senhores cuja opinião, como se disse atrás e em seguida se provará, dita leis e orienta governantes.

O Herr Professor Karl Bayer foi categórico. 

Nenhum perigo de poluição. Com isto liquidou os últimos escrúpulos de certos homens de governo aparentemente receosos da propalada capacidade poluidora da Brastânio.

A segurança expressa pelo competente técnico não significa no entanto inflexibilidade; tudo no mundo depende de hora e lugar e de quantia em jogo. 

Amanhã Herr Bayer pode mudar de opinião, afirmar exactamente o contrário e nisso reside a grandeza (e a fortuna) dos técnicos fora de série.

Sou levado a essa conclusão lendo nos jornais notícia da chegada ao Brasil de outro técnico ilustre e infalível.

Vem por conta de multinacional com matriz nos Estados Unidos negociar contracto de risco para prospecção de novos campos petrolíferos garantindo, no maior entusiasmo, possuir nosso subsolo incomensuráveis reservas do cobiçado ouro negro.

Trata-se do mesmo competente especialista outrora contratado por governantes nacionais para tirar a limpo de uma vez por todas a existência ou não de petróleo no Brasil.

Foi ele ainda mais categórico, explícito e peremptório em sua resposta negativa do que, na polémica sobre a Brastânio, o conclusivo Bayer. 

Após meses de estudo, pesquisas, prospecções, banquetes, garantiu, sobre palavra de honra, a total, absoluta ausência de petróleo no subsolo brasileiro: nem uma gota para remédio, na terra e no mar.

Não passando toda e qualquer afirmação em contrário de agitação subversiva, a serviço de Moscovo merecedora de severa repressão. 

Embolsou régio pagamento e, se não me engano, recebeu de lambugem magna condecoração pelos serviços prestados ao Brasil.

Sua opinião fez lei e vários indivíduos foram trancafiados no xadrez, entre os quais um certo Monteiro Lobato, escritor de profissão, teimoso brasileiro irresponsável a ver petróleo onde petróleo não havia; inexistência provada e comprovada pelo relatório de Mister… como é mesmo o nome do porreta?

O nome o leitor pode vê-lo nos jornais, onde brilha de novo, agora afirmando exactamente o contrário sobre a existência de petróleo no subsolo brasileiro, na terra e no mar, pago desta vez por seus patrícios. No caso, nascimento e dinheiro coincidem para lhe dar a nacionalidade norte-americana, uma das melhores entre as actuais.

Quem sabe, com o passar do tempo, o nosso Herr Professor Bayer mudará também de opinião. Quanto aos outros Bayer, os magnatas, a esses pouco importa se a indústria de dióxido de titânio polui ou não. Se polui o faz bem longe deles, em ignotas terras da Bahia.

A fumaça mortal, amarela ou negra, não os alcança, cabe-lhes apenas recolher os lucros do capital aplicado e das gorjetas pagas a sabichões e a excelências.

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