domingo, outubro 29, 2006

Eu cá não voto... mas se votasse...


EU CÁ NÃO VOTO…mas se votasse…

Desculpe-me, Maria Elisa, mas não obstante a satisfação em vê-la de volta aos ecrãs da Televisão pela qualidade e segurança das suas intervenções, não vou votar para a eleição do português mais importante.

Não é por considerar essa eleição uma fantochada como o deputado historiador do Bloco de Esquerda, Fernando Rosas ou por uma questão de rigor histórico como alegou e com alguma razão, o professor de História da Universidade de Coimbra, é apenas por simples e elementar justiça.

Votar é escolher e escolher é preterir, deixar de fora e isso não me é possível fazer porque é injusto, mesmo num simples jogo, num entretenimento, num passatempo.

Repare:

Como escolher entre D. Afonso Henriques, primeiro grande responsável pela nossa existência como Nação de mais de 8 séculos, e D. João II que envolveu os portugueses da sua geração e seguintes nos Descobrimentos que constituiu o maior trabalho colectivo levado a cabo com sucesso pelo país, qualquer coisa de grandioso com repercussões em todo o mundo?

E como escolher, por exemplo, entre Luís de Camões, Agostinho da Silva ou Fernando Pessoa?

Quem deixaria de fora se os admiro a todos igualmente?

- Luís Vaz de Camões, génio lírico, aventureiro, romântico, apaixonado e sentimental, autor, entre muitos outros, daquele verso escrito à sua em amada e que há mais de 50 anos vive na minha memória e de tantos outros milhares de portugueses:

“ Alma minha, gentil, que te partiste…”

e depois conta a história dos heróis do seu país mas também das suas graças e desgraças num estilo épico cuja obra, os Lusíadas, mesmo hoje, passados séculos, continua a ser a obra de referencia da nossa literatura ?

-Agostinho da Silva, génio do pensamento, da acção, da coerência e da honestidade intelectual que escrevendo aos seus amigos dizia:

“ Parece que toda a gente está de acordo que o mundo se encontra em crise. Como isto me parece demasiado vasto para eu poder ser útil decidi que sou eu quem está em crise e talvez consiga sair dela com três princípios:

- O de me ver livre do supérfluo;

- Não confundir o verbo amar com o verbo ter;

- O de prestar voto de obediência ao que for servir, não mandar.”

- Fernando Pessoa, que escreveu coisas tão simples, belas e humanas como:

-"Todas as cartas de amor são ridículas"

-"
Tudo vale a pena se a alma não é pequena"
-" Minha pátria é a Língua Portuguesa"

- "Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal."

E, num outro registo, Vasco da Gama, Bartolomeu Dias, Gil Eanes, Pedro Álvares Cabral que ligaram o mundo através de rotas marítimas que eles próprios desenharam no mar só possível com heroísmo e competência ímpares.

E, já agora, porque escrevo de Santarém, referir, por último, dois homens que em momentos diferentes lutaram por essa coisa que me é tão cara e que é a liberdade:

-Marquês Sá da Bandeira, de seu nome Bernardo de Sá Nogueira de Figueiredo, cuja estátua se encontra na praça mais nobre da cidade e que foi exemplo de um homem não só de grande carácter, coragem e destemor como também uma pessoa de causas, as mais importantes, liberdade e luta contra a escravatura, cujo percurso militar e político, na qualidade de Liberal contra a via absolutista de D. Miguel, bem merecia que fosse contada em pormenor a toda a nossa juventude para que dele se orgulhasse e orgulhando-se dele se orgulhasse de si própria.

Mas… se eu votasse, escolheria uma personagem mais perto de mim, da minha geração e que também tem a sua estátua em lugar de destaque, à entrada da cidade: o Major Salgueiro Maia.

Como a história não acontece duas vezes ficaremos sempre por saber se a Revolução dos Cravos teria sido mesmo de cravos se tivesse sido outra pessoa a desempenhar o papel que lhe foi entregue.

Saiu de Santarém por causa do “ estado a que isto chegou” era ainda de noite, com os soldados estremunhados.

Ocupou o Terreiro do Paço que é assim como que ocupar Lisboa inteira e ofereceu-se, de peito aberto, olhos nos olhos, às balas de uma metralhadora montada num blindado de uma força comandada por um Brigadeiro histérico.

Ganhou a “sua guerra” mas foi de forma respeitosa e não como um vencedor que acompanhou Marcelo Caetano ao avião na sua viagem para o exílio, no Brasil, onde iria remoer os seus ódios por todos quantos tiveram a coragem que a ele lhe faltou.

De seguida, terminada a sua missão, regressou discretamente ao seu quartel e continuou a ser apenas um militar só que, a partir de então, um militar de Abril, o mais puro de todos eles.

Morreu prematuramente porque às vezes, a morte tem destas coisas: leva os melhores à frente para que todos os outros que cá ficam os possam aplaudir como fazem agora os treinadores de futebol quando retiram do campo a estrela da sua equipa minutos antes do jogo acabar para receber a grande ovação.

Salgueiro Maia mereceu inteiramente a ovação, de pé, como se faz com as grandes estrelas.


E se amanhã, quando o desfecho da eleição do português mais importante for conhecido e o resultado for qualquer coisa de semelhante ao que aconteceu em Inglaterra, em que a Lady Di ficou 4 lugares acima de Shakespeare, eu quero estar fora, não tive nada a ver com isto.

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