sábado, agosto 01, 2015

O padrinho também vai?
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 301



10

















Mais tarde, na cama com Bernarda, o Capitão lhe disse:

- Um bocado de gente tá indo embora. Tu devia fazer o mesmo. Aqui, o risco é grande.

Olhava para o teto de madeira, a voz neutra, sossegada: não ditava uma ordem, dava um conselho.

- Ir embora? Para onde?

- Tem um lugar em Taquaras onde tu pode ficar.

- O padrinho também vai?

- Eu não posso sair daqui.

- E a Madrinha?

- Fica aqui, comigo. Ela e os meninos.

- Nem vosmicê, nem a madrinha, nem os meninos. Por
que eu houvera de ir? Por que vosmicê quer me ver longe?

Por que me manda embora? Não fiz por merecer regalia nem desprezo.

Aqui, se tiver de morrer, tou perto de vosmicê e de Nadinho.

Descansou a cabeça no peito do padrinho como o fazia desde criancinha, mas com os braços e pernas o prendeu contra o corpo nu:

- Se cansou de mim?

- Não disse que tu fosse, só lembrei.

Cumpria sua parte, igual a Zilda na mesa do almoço. O capitão Natário da Fonseca tocou com os dedos a face da afilhada, xodó de tantos anos. Ao falar, já sabia da resposta.


11

Morte sentida foi a de Merência. Se houvesse sido vitimada
por qualquer outra doença ou por picada de cobra, também ela teria merecido velório de arromba, com mais razão do que a lesa e o comprador de cacau. Tantos acontecidos a recordar, passagens divertidas, momentos de exaltação.

Mulher casada, guardava distância das raparigas mas nem por isso deixou de defendê-las quando os boiadeiros tentaram impor a lei da prepotência. Com as calosas mãos de oleira, concorreu infatigável para levantar paredes e colocar telhados na desolação de Tocaia Grande após a enchente.

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