O padrinho também vai? |
TOCAIA
GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº
301
10
Mais tarde, na cama com Bernarda, o Capitão lhe disse:
- Um bocado de gente tá indo embora. Tu devia
fazer o mesmo. Aqui , o risco é
grande.
Olhava para o teto de madeira, a voz
neutra, sossegada: não ditava uma ordem, dava um conselho.
- Ir embora? Para onde?
- Tem um lugar em Taquaras onde tu pode
ficar.
- O padrinho também vai?
- Eu não posso sair daqui .
- E a Madrinha?
- Fica aqui ,
comigo. Ela e os meninos.
- Nem vosmicê, nem a madrinha, nem os
meninos. Por
que eu houvera de ir? Por que vosmicê quer
me ver longe?
Por que me manda embora? Não fiz por
merecer regalia nem desprezo.
Aqui ,
se tiver de morrer, tou perto de vosmicê e de Nadinho.
Descansou a cabeça no peito do padrinho
como o fazia desde criancinha, mas com os braços e pernas o prendeu contra o corpo
nu:
- Se cansou de mim?
- Não disse que tu fosse, só lembrei.
Cumpria sua parte, igual a Zilda na mesa
do almoço. O capitão Natário da Fonseca tocou com os dedos a face da afilhada, xodó
de tantos anos. Ao falar, já sabia da resposta.
11
Morte sentida foi a de Merência. Se
houvesse sido vitimada
por qualquer outra doença ou por picada de
cobra, também ela teria merecido velório de arromba, com mais razão do que a
lesa e o comprador de cacau. Tantos acontecidos a recordar, passagens
divertidas, momentos de exaltação.
Mulher casada, guardava distância das
raparigas mas nem por isso deixou de defendê-las quando os boiadeiros tentaram
impor a lei da prepotência. Com as calosas mãos de oleira, concorreu infatigável
para levantar paredes e colocar telhados na desolação de Tocaia Grande após a
enchente.
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