terça-feira, outubro 25, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)


Episódio Nº 103




















Sobre o que se passou na masmorra durante o nosso ataque a Tui ninguém pode ter absolutas certezas. Os seres humanos são entidades misteriosas e complexas, cujos sentimentos e interesses se alteram consoante as circunstâncias.

Nunca sabemos se é verdadeiro o que dizem pois verdades e mentiras são também necessidades do momento. Só Deus sabe e vê tudo e faz o seu juízo final.

É preciso relembrar que Gonçalo e Chamoa não eram muito próximos. Tinham-se conhecido em Viseu, oito anos antes, mas até àquele haviam-se visto poucas vezes, embora um círculo de afectos os unisse.

Gonçalo adorava Zaida, grande amiga de Chamoa, que amava Afonso Henriques, grande amigo de Gonçalo. No centro dessas conhecidas emoções, existiam as zonas cinzentas.

Gonçalo roía a um certo ressentimento, pois temia que Afonso Henriques o tivesse enviado para Celmes para o afastar da bela moura. E Chamoa, que receava todas as mulheres, receava também que Zaida lhe roubasse o príncipe de Portugal.

É pois, possível admitir um caldo de medos mútuo onde ferveu uma aproximação imposta pelas circunstâncias externas em que ambos se encontravam.

Tanto Gonçalo como Chamoa desejavam ardentemente a vitória de Afonso Henriques em Tui mas a perentória condenação do Trava colocou-os à beira de um terrível abismo: quanto mais perto estivessem da liberdade, mais perto estavam da morte.

Diz-se que as pessoas quando confrontadas com a possibilidade real de morrerem, têm uma certa tendência para o descontrolo. O seu coração enche-se de angústia e o seu espírito desespera admitindo o que pouco tempo antes era impensável.

Teria sido isso que se teria passado entre Chamoa e Gonçalo naquele frio buraco? – Ninguém poderá nunca ter a certeza, pois as versões de ambos divergem.

Tempos depois, Chamoa garantiu que se limitaram a escutar os rumores da batalha. A meio da tarde perceberam que portucalenses já retiravam, o que os deixou desiludidos por não serem libertados, mas ao mesmo tempo aliviados, pois não iam morrer.

Quanto a Gonçalo, certo dia gabou-se a Zaida, jurando que Chamoa se montara nele. Pelos vistos, a princesa moura acreditou. Lembro-me de que quando falamos sobre esse assunto, Zaida me perguntou:

 - Lourenço Viegas, se os dois estivéssemos numa masmorra, condenados à morte e depois de virar um jarro de vinho tinto da Galiza, não me teríeis possuído?


Tremi de excitação só de pensar na possibilidade... Seja como for o mais importante passou-se a seguir.

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