(Domingos Amaral)
Episódio Nº 41
Como conhecia as ruínas por
ter passado lá perto várias vezes nas suas viagens comerciais, Mem podia
juntar-se ao cordovês na velha povoação, à procura da relíqui a do conde Henrique.
- Para quê perder tempo? –
ripostara Zaida – Se Sohba onde está o tesouro é mais fácil descobri-la em
Lisboa e levá-la a Sellium.
E estaria Sohba em Lisboa?
Ao falar dela Mem sentiu saudades. Nutria um verdadeiro sentimento de gratidão
para com aquela misteriosa e idosa senhora de negro.
Depois do que haviam passado
juntos, mantivera-se vivo um elo de forte cumplicidade entre eles. Mem era o
único que não lhe chamava bruxa nem a temia.
- Sohba gosta de vós –
reconhecera Zaida com um sorriso meigo e já prometedor, acrescentando – como
todas as mulheres...
Porém, o almocreve temia os
riscos da aventura. Equi librar-se
naqueles tempos duvidosos era uma arte difícil.
- Há guerras na Andaluzia.
Afonso VII combate os mouros e estes lutam entre si. Irem para Córdova agora é
arriscado – recordara.
Sem qualquer sinal de
desânimo, Zaida contrapusera o argumento de que Zakharia era um grande
combatente, seria capaz de as levar até lá sãs e salvas.
Além disso, o governador de
Córdova, chamado Ismar, um árabe andaluz que odiava os berberes e o califa Ali
Yusuf, certamente as iria receber de braços abertos no Azzahrat.
Tudo é frágil nestes tempos
– murmura Mem, preocupado.
Sentindo-o hesitante, Zaida
encostara-se a ele, o seu peito tocando-lhe no antebraço. Mem escutara o
coração a acelerar. Recordava os seios cheios dela, pressionados contra as
costas dele e relembrara-se da primeira vez que os tinha beijado.
Fora ali mesmo, naqueles
banhos públicos à porta dos quais estavam agora.
Memória quente anima a gente.
Como fazia muito calor, Mem
sugerira que entrassem no local que em breve seria destruído devido à
construção do mosteiro de santa Cruz.
Porém, ao verem várias
pessoas lá dentro, Zaida deduzira que os cristãos não iriam aceitar tais
liberdades em público.
- É melhor voltarmos à noite
– dissera ela.
Mem prometera então
descobrir quem roubara o punhal de casa das irmãs e dirigira-se às portas da
cidade, à Sé e à alcáçova fazendo aqui
e ali discretas perguntas, ficando a saber que no dia do assalto á casa das
mouras, Ramiro havia chegado de manhã a Coimbra, trazendo à pendura o Velho,
que, no entanto, já não acompanhara o jovem templário de regresso a Soure.
Ao princípio da noite, Zaida
regressara e depois de Mem revelar que o autor devia ter sido o Velho, os dois
dirigiram-se de novo aos banhos públicos e haviam, entrado, avançando até
próximo da piscina onde, anos antes, ambos se tinham banhado com Zulmira.
Nesse momento, a nostalgia invadira
Mem, que suspirara.
- Que foi? – perguntou Zaida.
O almocreve murmurara:
- Todos os dias me lembro de vossa mãe.
Zaida comovera-se e chorara
durante algum tempo, encostada ao ombro dele.
Por fim, limpara as lágrimas
ao lenço e desabafara:
- Não aguento mais esta cidade.
A sua vontade de regressar a
Córdova, uma de onde tinha saído em criança, era suplantada pelo irresistível
desejo de fuga de Coimbra, onde as recordações da mãe lhe eram insuportáveis.
- Tirai-me daqui , Mem, por favor! - pedira
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