segunda-feira, agosto 08, 2016



O Alexandre e o Mar






O meu colega e amigo Alexandre, vivendo, enquanto estudantes, numa mesma casa ali ao Príncipe Real, em Lisboa, foi vítima precoce de um cancro feroz, desengalgado, que o tomou de gancho e decidiu perder pouco tempo, não matando-o mas destruindo-o porque, vá lá saber-se, não simpatizou com ele, ou talvez, apenas por ter muito que fazer e, desapiedado, levou-o dolorosa e rapidamente.

Sem paciência, com pouco tempo de vida e menos ainda disposição porque as dores eram muitas - o cancro estava a comê-lo - o Alexandre, nos seus últimos dias, pedia à Bela, sua mulher de sempre, que o metesse no carro e o levasse a ver o mar.

Estendendo a vista pelo horizonte sem fim das esverdeadas águas do Oceano Atlântico, ele encontrava como que a continuação da vida que lhe fugia, a sensação que desejava e as paredes do seu quarto não lhe permitiam.

Agradeço-te, Alexandre, não me teres chamado para ao pé de ti, como quando fazias para te ler, no banco do Jardim do Príncipe Real, os livros do pitigrilli.         

Então, chorávamos a rir e era um belíssimo tempo, porque éramos novos e tu tinhas saúde. 

Poupaste-me as lágrimas que em nada te teriam ajudado. Ficaram, no entanto, sem eu o saber, para serem derramadas sobre a carta em que a Bela me deu a noticia, anos depois, do que foram os teus últimos momentos.

Agora, gosto de pensar que ficaste à beira-mar e neste momento, neste preciso momento, lá continuas, sentado em uma qualquer rocha, num local à tua escolha, olhando o horizonte sem que nada se possa intrometer entre ti e o infinito.

Tomei a liberdade de escolher estas águas, de vários tons, entre eles o verde, o nosso verde... com o branco da espuma, como o nosso Sporting.

Repara, que o horizonte está livre, desocupado, nada impede a tua vista de o percorrer sem limites... Vê, como ele está pacífico, submisso, doce, parece convidar-te a ires com ele, a ti, que o procuraste nos últimos dias da tua vida para mitigares o teu sofrimento.

Obrigado, Alexandre, o emprego que me arranjaste, em Santarém, logo que acabei o curso. Nunca te cheguei a agradecer.

Não era tão dotado com tu, especialmente para a Matemática e a Economia, em que eras muito bom. 

Não cheguei a Secretário de Estado, não era competitivo, não me alistei em partidos políticos, não acertei com a mulher com quem casei, como foi o teu caso com a Bela, éramos diferentes e tivemos fins muito desiguais com prejuízo teu.

Aos 77 anos estou convencido que irei mesmo morrer de velho, uma velhice em paz com uma mulher que não só é o meu apoio, como me deu duas netas do coração. De qualquer maneira, morrer como tu, ninguém merecia morrer...

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