(Domingos Amaral)
Episódio Nº 43
Compostela, dezembro de 1132
Uma bela rapariga rezava, compenetrada e solitária, num canto da grande catedral de Compostela e por várias vezes, Afonso VII, tentou cruzar o seu olhar com o da beldade, mas não foi bem sucedido porque, a absorta moça, nada ligava ao que se passava à sua volta.
O rei de Castela, Galiza e
Leão viera ali para pedir a ajuda divina nas muitas guerras que enfrentava. A
sul de Toledo tinha de suster os berberes do califa Ali Yusuf.
A leste mantinha-se intensa
a contenda com o antigo marido de sua mãe, Dona Urraca, o rei Afonso I de
Aragão, que lhe disputava a hegemonia peninsular.
Por fim, a oeste, havia o
sempre irrequi eto Afonso Henriques,
que persistia em recusar-lhe vassalagem e construíra um novo castelo em plena Galiza , na
povoação de Celmes.
Alem disso, também o perturbava
a divisão religiosa da Igreja de Roma, o cisma grave verificado quando Anacleto
recusou a eleição de Inocêncio II para Papa, disputando-lhe o trono de São
Pedro.
O monarca Leonês apoiara o
Antipapa, na esperança de que vencesse o conflito, mas as querelas
agudizavam-se e Anacleto exigia que ele proibisse os “monges apostólicas”, que
por toda a península se começavam a instalar.
Como se tudo isso não fosse
já suficiente, Berengária de Barcelos, sua esposa há quatro anos, mostrava-se
incapaz de engravidar.
Sem qualquer herdeiro para
exibir, Afonso VII começava a sentir a pressão da paternidade, matutando já
numa possível alternativa a tanta esterilidade e certamente por isso se
alvoraçava com a visão daquela magnífica rapariga.
Os cabelos loiros e os olhos
verdes da moça tinham feito trepidar as suas entranhas masculinas, o que era
coisa rara, pois Afonso VII sempre de mostrara contido e de reputação
intocável, para assim esbater a desvairada herança materna.
Dona Urraca coleccionara
inúmeros amantes e o seu inconstante útero multiplicara os problemas nos
territórios cristãos onde reinava.
Não querendo repetir tais
desgraças, Afonso VII impusera a si próprio o recato e evitava galantear as
senhoras.
Porém, pela primeira vez e
perante tal visão celestial, o monarca leonês sentiu-se tentado a meter
conversa. Mas foi tanta a hesitação que, quando finalmente já se tinha
decidido, viu que a beldade se levantava, sempre de olhos no chão e com um ar
tristíssimo, desaparecendo entre as gentes que rezavam na catedral.
Angustiado, Afonso VII
sentiu que alguém tinha apagado a luz que o ofuscara e uma breve angústia
assolou-o, como se tivesse perdido a oportunidade de uma vida.
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