sábado, dezembro 27, 2008




JORGE AMADO









Nascido a 10 de Agosto de 1912, no sul do Estado da Bahia, Jorge Amado, nasceu, como dizia sua mãe, “com estrela”; um homem afortunado. Seu pai queria que o filho fosse doutor, e ser doutor naqueles tempos era formar-se em Medicina, Engenharia ou Direito.

Jorge Amado, que desde os catorze anos participava em movimentos culturais e políticos, optou por Direito. Fez a vontade ao pai, mas não foi buscar o diploma e nunca exerceu advocacia. Em compensação, no ano da sua licenciatura, em 1935, já era um escritor conhecido, autor de quatro livros que fizeram sucesso entre o público e a crítica: “O País do Carnaval” com que se estreou aos dezoito anos, “Cacau”, “Suor e Jubiabá”. Em 1937, devido ao seu intenso envolvimento político, viu toda a edição do seu livro “Capitães da Areia” ser queimada em praça pública, o que o levou, em 1941, ao exílio na Argentina e no Uruguai.

Em 1945, Jorge Amado uniu-se a Zélia Gattai, companheira de toda a sua vida. Deputado Federal pelo Estado de São Paulo, fez parte da Assembleia Constituinte votando leis importantes, como a que ainda hoje garante a liberdade religiosa no país. Em 1947, o Partido Comunista foi ilegalizado e Jorge Amado perdeu os seus direitos políticos.

Voltou para o exílio, desta vez em França e na Checoslováquia, continuando a escrever e a trabalhar pela paz, agora na companhia de Pablo Neruda, seu velho amigo, de Pablo Picasso, de Luís Aragon, de Nicolas Guillen, só regressando ao Brasil em 1952. Em 1961 foi eleito para Academia Brasileira de Letras, vindo também a pertencer à Academia de Letras da Baía, à Academia de Ciências e Letras da República Democrática Alemã e à Academia de Ciências de Lisboa sendo membro correspondente destas duas últimas.

O seu livro Gabriela , Cravo e Canela, publicado em 1958, teve grande sucesso e os seus direitos cinematográficos foram vendidos para a Metro, o que possibilitou ao escritor a compra de uma casa em Salvador realizando, assim, o sonho de voltar a viver na sua terra.

Em 1963 muda-se com a sua família para a rua de Alagoinhas, onde continuou a escrever os seus livros.

Foi publicado em 95 idiomas, faleceu a 6 de Agosto de 2001.

Jorge Amado acumulou um sem número de Prémios Literários e foi-lhe atribuído o título de Doutor Honoris Causa pelas principais Universidades de países como: França, Itália e Israel.


Para mim, simplesmente, ele foi o melhor escritor de histórias impregnadas de um humanismo autêntico, inserido numa realidade social que ele tão bem conhecia, e eu sinto-me orgulhoso que elas tenham sido escritas por um compatriota porque, como dizia Fernando Pessoa, a minha língua é o meu país.

Em homenagem a Jorge Amado e como agradecimento pelos momentos de prazer que os seus livros me proporcionaram, reproduzirei neste blog, diariamente, a história da Tieta do Agreste.


ROMANCE


EPISÓDIO nº 1

Tieta do Agreste (I)

Pastora de Cabras - Ou A Volta da Filha Pródiga, Melodramático Folhetim em cinco sensacionais episódios e comovente epílogo: Emoção e Suspense!


Silêncio e solidão, o rio penetra mar adentro no oceano sem limites sob o céu despejado, o fim e o começo. Dunas imensas, límpidas montanhas de areia, a menina correndo igual a uma cabrita para o alto, no rosto a claridade do sol e o zunido do vento, os pés leves e descalços pondo distância entre ela e o homem forte, na pujança dos quarenta anos, a persegui-la.

Arfando, o homem sobe, o chapéu na mão para que não voe e se perca. Os sapatos enterram-se na areia; o reflexo do sol cega-lhe os olhos; agudo fio de navalha, o vento corta-lhe a pele; o suor escorre pelo corpo inteiro; o desejo e a raiva – quando te pegar, peste! Te arrombo e mato.

A menina volta-se e olha, mede a distância a separá-la do mascate, o medo e o desejo: se ele me pegar vai meter em mim, estremece apavorada; mas, se eu não esperar, ele desiste, ah!, isso não, não pode permitir mesmo que queira pois o tempo é chegado.

O homem também parou e fala, grita palavras que não alcançam a menina, perdidas na areia, levadas pelo vento. Ela não houve mas advinha e responde:

- Bééé! – Assim cantam as cabras que ela pastoreia.

O desafio bate na face, penetra nos ovos do mascate, ergue-lhe as forças, ele avança. Atenta, a menina espera.

Lá atrás o rio, na frente o oceano, os olhos adolescentes percorrem e dominam a paisagem desmedida. Naquele momento de espera, de ânsia e de angústia, a menina fixou na memória a deslumbrante da cama de noiva que lhe coube. Do outro lado da barra, a beleza da praia larga e rasa do Saco, em mar de águas mansas, no Estado de Sergipe, a ampla aldeia de pescadores, com armazém, capela e escola, um vilarejo.

O oposto dos cômoros monumentais onde ela se encontra, a invadirem as águas, o espaço do mar, contidos pelos vagalhões na fúria da guerra. Aqui o vento deposita diária colheita de areia, a mais alva, amais fina, escolhida a propósito para formar a praia singular de Mangue Seco, sem comparação com nenhuma outra, aqui onde a Baía nasce na convulsa conjunção do rio Real com o oceano.

Dúzia, dúzia e meia de casebres provisórios, mudando-se ao sabor do vento e da areia a invadi-los e soterrá-los, morada dos poucos pescadores a habitar desse lado da barra. Durante o dia, as mulheres pescam no mangue de caranguejos, os homens lançam as redes ao mar. Por vezes partem em pesca milagrosa, audazes a cruzar os vagalhões altos como as dunas nos únicos barcos capazes de enfrentá-los e prosseguir mar afora, ao encontro marcado com navios e escunas, em noites de breu, para o desembarque do contrabando.

O falso mascate vem na lancha a motor recolher as caixas de bebidas, de perfumes, os fardos de seda italiana de casimira e linho ingleses, outras especiarias, e fazer o módico pagamento – dinheiro para a farinha, o café, o açúcar, a cachaça, o fumo de rolo. De quando em quando, trás uma vadia na lancha e enquanto caixas e fardos são transportados dos casebres, vai despachá-la nas dunas, sobre as palhas dos coqueiros para aproveitar o tempo. Um garanhão, o mascate; os pescadores o apreciam. Em mais de uma ocasião ele não os acompanhou nos barcos, indiferente às vagas até o alto mar de navios e tubarões?

A menina deixa que o homem chegue perto – só então dispara areia acima e do alto novamente canta o exigente e assustado chamado das cabras, Bééé! De amor não conhece outra expressão, outra palavra, outro som.

Ainda naquele dia o ouvira da cabrita no primeiro cio quando o bode Inácio, pai do rebanho, se encaminhou para ela, balançando o cavanhaque e as trouxas. Depois o mascate apareceu e a menina aceitou o convite para o passeio de lancha, vinte minutos de rio, cinco de mar agitado e o esplendor de Mangue Seco. Como resistir, dizer obrigado mas não vou? Mentira: não a seduzira a corrida do rio, a travessia do pedaço de mar, nem sequer as dunas bem amadas desde a infância. A menina não tenta inocentar-se. Recusara convites anteriores, o mascate a tinha de olho há tempos. Desta vez agora ela disse vamos, sabendo ao que ia.

Quando, porém, sente a mão pesada segurar-lhe o braço o medo a invade inteira, da cabeça aos pés. Contem-se, no entanto não busca fugir.

O homem a derruba sobre as folhas dos coqueiros, suspende-lhe a saia, arranca-lhe a calçola, trapo sujo. De joelhos sobre ela, enterra o chapéu na areia para que não voe e se perca, abre a braguilha. A menina o deixa fazer e quer que ele o faça. Para ela soara o tempo, como para as cabritas a hora temida e desejada, a hora implacável do bode Inácio, o saco quase a arrastar por terra de tão grande. Sua hora chegara, já não lhe corria sangue entre as coxas todos os meses?

Nas dunas de Mangue Seco, Tieta, pastora de cabras, conheceu o gosto do homem, mistura de mar e suor, de areia e vento. Quando o mascate a arrombou, igual à cabrita horas atrás, ela berrou. De dor e de contentamento. (continua)
Praia de Mangue Seco

sexta-feira, dezembro 26, 2008


A história do Menino Jesus:



Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava, Ele é o humano que é natural, Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é porque ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre, E que o meu mínimo olhar Me enche de sensação, E o mais pequeno som, seja do que for, Parece falar comigo.
A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E a outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver, Saltando e cantando e rindo E gozando o nosso segredo comum Que é o de saber por toda a parte Que não há mistério no mundo E que tudo vale a pena.

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.

Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas No degrau da porta de casa, Graves como convém a um deus e a um poeta, E como se cada pedra Fosse todo o universo E fosse por isso um grande perigo para ela Deixá-la cair no chão.

Depois eu conto-lhe histórias das cousas só dos homens E ele sorri, porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos-mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade Que uma flor tem ao florescer E que anda com a luz do sol A variar os montes e os vales E a fazer doer aos olhos os muros caiados.

Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.

Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos
Vira uns em cima dos outros
E bate as palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.


Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.

Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam?

Alberto Caeiro

O Amor É Louco - Carlos Ramos



Lado a Lado - Toni de Matos



Música Portuguesa

Donna Maria - Quase Perfeito



Amália Rodrigues, Zanguei-me com o meu Amor (link)

Estranha Forma de Vida - Amália



Fado da Despedida - Carlos Ramos



Que Deus Me Perdôe - Amália


Só Nós Dois - Toni De Matos


Gente da Minha Terra - Mariza

quarta-feira, dezembro 24, 2008



A BALEIA AZUL







Há uma natural curiosidade por tudo quanto é muito pequenino e pelo seu contrário, o muito grande.

O muito pequenino não está ao alcance da nossa vista e por isso a curiosidade relativamente a ele é assunto para cientista, quanto ao muito grande, aqueles animais que nos impressionam pelo seu tamanho, os maiores de todos, temos os elefantes em terra e a baleia azul nos mares.

Nas savanas africanas os grandes elefantes machos chegam às 7 toneladas e as baleias azuis atingem mais de 30 metros para um peso médio, com esse comprimento, de 200 toneladas e mais.

Para qualquer deles a vida, um pouco por causa do seu tamanho mas muito mais por causa do homem, não tem sido fácil.

A baleia azul, o maior animal que desde sempre existiu na Terra, com toda aquela massa de carne, gordura e óleo atraiu a cobiça dos homens que quase a levaram à extinção, tendo sido mortas 360.000 em todo o século XIX até aos anos 60 do século XX, restando hoje entre 3 a 4.000. A sua caça está proibida em quase todos os países do mundo.

Este animal é impressionante em tudo:

- A abertura por onde respira emite jactos de água até 9 metros de altura;

- O seu pulmão pode alojar 5.000 litros de ar;

- Emite sons de baixa frequência que atingem os 188 decibéis – mais fortes do que um avião a jacto - que podem ser ouvidos a 800 km de distância.

- Um bebé humano poderia gatinhar pelas suas artérias e um adulto arrastar-se pela aorta;

- Uma baleia azul à nascença pesa mais de 2 toneladas e tem quase 8 metros de comprimento;

- O pénis chega a atingir os 3 metros;

- Os recém nascidos até aos 7 meses de idade tomam 380 litros de leite por dia ganhando 91 quilos de peso a cada 24 horas;

- Os filhotes das baleias azuis não mamam por tetas porque o leite é solto na água na qual não se mistura por ser muito gordo, e é sugado pela cria;

- A base da sua alimentação é o kill, uma espécie de camarão com poucos centímetros de comprimento, e do qual a baleia azul ingere cerca de 3 toneladas por dia.

Dada a sua velocidade e poder, a baleia azul não constituía inicialmente o primeiro objectivo dos pescadores que procuravam mais os cachalotes mas à medida que estes foram escasseando começaram a cobiçar estas baleias e em 1864, um vapor norueguês, equipou-se com arpões especialmente concebidos para capturar as grandes baleias e quando, finalmente, a sua caça foi proibida mais de 360.000 tinham sido mortas.

Pode viver quase até aos 100 anos.

Das 3 a 4.000 que hoje sobrevivem, 2.000 estão concentradas na costa californiana e constituem a maior esperança para o longo e gradual processo de aumento populacional desta espécie.

Mas é interessante saber que dois episódios na história da Terra estiveram ligados à dimensão dos animais e, consequentemente, da “nossa” Baleia Azul.

Como se explica então que coabitem no Planeta microorganismos unicelulares invisíveis e a grande Baleia Azul porque, de facto, existe no mundo animal tamanhos para todos os gostos.

Como chegámos a esta biodiversidade?

Cientistas dos EUA fizeram esta pergunta e descobriram dois momentos na evolução da Terra que foram decisivos para a diversificação do tamanho dos seres vivos.

Olhando para os registos fósseis ao longo das eras e comparando-os com a história geológica do planeta, a equipa coordenada por Michal Kowalewski, do Virgínia Tech, verificou que houve duas épocas chave para a complexificação da vida na Terra e para o surgimento de seres vivos do tamanho XXL.

Esses dois episódios têm a ver com o aumento do oxigénio na atmosfera terrestre e esta descoberta foi publicada na “Proceedings of the National Academy of Siences”.

“Ficámos surpreendidos ao observar que o aumento da dimensão dos seres vivos ocorreu quase todo em dois intervalos de tempo distintos”, disse o coordenador da equipa, explicando que aquele padrão básico “se tornou imediatamente visível na comparação dos registos fósseis com os dados geológicos”.

Tendo a vida surgido na Terra há 3,5 mil milhões de anos nos oceanos, a vida foi durante os primeiros 1,5 mil milhões, feita apenas de organismos unicelulares, de tamanhos diminutos.

Dessa época só existem, de resto, registos fósseis de bactérias e foi por essa altura, há 2.000 milhões de anos, que surgiram os primeiros organismos complexos e porquê neste preciso momento?

- Porque a própria vida tinha preparado as condições para isso, fabricando oxigénio através do seu metabolismo, e as pequenas células que eram então os seres vivos também tinham incorporado no seu interior estruturas funcionais, incluindo um núcleo com o seu material genético.

Nos 200 milhões de anos que se seguiram, os seres vivos começaram a incluir mais do que uma célula e foram tornando-se cada vez mais complexos.

Há 540 milhões de anos, quando o oxigénio na atmosfera terrestre aumentou de novo de forma abrupta (para 10% do que é hoje), os organismos sofreram nova complexificação e puderam atingir grandes dimensões.

Hoje, de todos, o maior é a Baleia Azul que o homem, na sua insensatez, ignorância e completo desrespeito pela natureza e a vida dos animais selvagens, ia pondo termo no século passado.

terça-feira, dezembro 23, 2008

Foi Deus - Amália



Aí Mouraria - Amália


Povo Que Lavas no Rio - Amália



Amália - Prece/ Chora, Mariquinhas, Chora



De Quem Eu Gosto - Amália




Não há Pachorra…




Creio que os comentadores e analistas da nossa política partidária devem delirar com as manigâncias, reviravoltas e acrobacias das principais personalidades do PSD.

E ponhamos nomes nos “bois”, salvo seja, claro: Ferreira Leite, Marcelo Rebelo de Sousa, Santana Lopes, Pacheco Pereira Luís Filipe Menezes e outras figuras de menor mediatismo no momento, surpreendem pela novidade das suas posições.

Mas de todos estes é Ferreira Leite a que mais estranheza provocou porque a imagem de marca que, de certa forma, vendeu ao eleitorado do PSD e aos portugueses de uma forma geral, como potencial futura 1ª Ministra era de seriedade, rigor, coerência e credibilidade política, qualidades que os cidadãos muito apreciam cansados da leviandade de certos políticos.

A sua aprovação à candidatura de Santana Lopes à Câmara de Lisboa estragou completamente essa imagem como o demonstra os resultados, cada vez piores das sondagens de opinião.

Há pouco mais de 6 meses foi eleita para presidir aos destinos do Partido depois de uma campanha cerrada com os seus oponentes a quem ganhou mais ou menos à tangente com 37,6% dos votos contra 31 de Passos Coelho e 29,5 de Santana Lopes.

Foi Manuela Ferreira Leite e o seu núcleo central de apoiantes que mais diabolizaram Santana Lopes nomeadamente, condenando a sua subida à liderança em 2005 tendo feito tudo para que ele fosse derrotado por José Sócrates e não esquecendo, igualmente, as suas próprias afirmações ao referir que só tinha votado no PSD nas últimas legislativas porque no Boletim aparecia a sigla do partido e não o nome do candidato.

Ora bem, estas posições que são legítimas e compreensíveis em personalidades tão diferentes, não encaixam de forma alguma na sua decisão de o apoiar como candidato do PSD para a Câmara da capital do país.

Não existe nenhuma coerência de Manuela F. Leite nesta sua atitude e a coerência era um dos seus capitais políticos, perdido este de uma forma tão flagrante, os outros: rigor, seriedade, credibilidade, vão por água a baixo levando Filipe Menezes a dizer em tom irónico:

- “Santana Lopes vai ter que ganhar as eleições sem o voto da Presidente Social Democrata”.

Por tudo isto foi uma autêntica vergonha para o partido que o anúncio da candidatura de Santana Lopes à Câmara de Lisboa tenha sido apresentado oficialmente na televisão em 2º lugar, depois da candidatura de Braga, por aquela figura inenarrável que é Castro Almeida.

Como é que todas estas coisas “se cozinham” na cabeça dos eleitores nas próximas legislativas vivendo nós uma situação de crise a nível mundial de uma gravidade e duração que ninguém parece saber, é uma das incógnitas do nosso futuro político e nestas condições a segurança começa a ser a primeira preocupação.

Claro que em democracia seria preferível uma alternativa credível, sobre isso não tenho dúvidas nenhumas mas neste cenário, com estes actores, seriamente, não me parece que essa alternativa para o país exista.

Estamos a entrar num período no qual, pelas dificuldades esperadas, sem um rumo certo, uma forte determinação, um espírito positivo e ganhador, corremos sérios riscos.

Por isso, “partidarites” à parte, há dois homens, gostemos ou não deles que, por questões de carácter, me parecem incontornáveis nos tempos mais próximos e nas funções que desempenham:

- José Sócrates no governo do país;

- António Costa ao leme dos destinos da capital;

Com estilos um pouco diferentes, ambos são pessoas sérias, determinadas, fiáveis, com objectivos que procuram cumprir não iludindo as dificuldades dos problemas.

É mesmo possível ouvir da parte de sectores da oposição menos facciosa, elogios às principais medidas tomadas por José Sócrates, sem tibiezas e em tempo útil, o que nestas situações é muito importante.

- Nunca como agora a acção do estado foi e vai ser tão importante, todos olhamos para ele, todos esperamos dele qualquer coisa sabendo, no fundo, que não vai ser possível chegar a todos e nós ouvimos de quadrantes vários receitas contraditórias de quem, felizmente, não tem neste momento a responsabilidade de tomar decisões.

Veremos o que nos espera mas não me parece que qualquer deles perca as eleições em que vai estar envolvido, apenas a dúvida sobre que maioria o PS vai obter e isso deixa-me apreensivo porque se a crise vier a ser o que dizem não sei como e com quem Sócrates vai negociar e especialmente com que consequências para o país.

Recordo o “pântano político” de que Guterres fugiu numa altura em que ser substituído no governo não era nenhum drama porque sem maioria no parlamento não conseguiu prosseguir a sua acção.

Não é fácil negociar com as oposições em Portugal e dessas dificuldades foi testemunha António Guterres, e antes dele Mário Soares.

Hoje, um largo sector da esquerda é demagógica, oportunista ou fala como se vivêssemos na história de Alice no País das Maravilhas e outros, são radicais, ortodoxos dogmáticos e relativamente a todos eles percebemos que não é fácil haver entendimentos.

Ao centro, onde seria natural fazerem-se coligações e entendimentos políticos dada a afinidade das ideologias, não é possível por causa de rivalidades pessoais num partido de personalidades vaidosas e rivais e esta é uma das especificidades da política à portuguesa.

Veremos se o país não virá a ser vítima desta especificidade da nossa vida política num momento em que grandes dificuldades poderão exigir ou um governo de maioria absoluta ou um governo com uma base de entendimento alargado e responsável.

De qualquer maneira ainda falta muito até lá chegarmos e ainda pode até haver novas definições ao nível do PSD se Manuela F. Leite continuar a baixar nas simpatias do eleitorado…

Barco Negro - Amália



Tempo Volta Para Trás - Toni de Matos



Tudo Isto é Fado - Amália



segunda-feira, dezembro 22, 2008

Olhos Castanhos - Francisco José



Não Venhas Tarde - Carlos Ramos



Guitarra Toca Baixicho



domingo, dezembro 21, 2008

A casa onde nasci...




A Casa Onde Nasci










Sabes, Rui, eu penso que gostamos mais das terras onde nascemos quando, pelas circunstâncias da vida, as temos que deixar.

Então, se for uma grande cidade, com aquela dinâmica própria das grandes cidades, esse sentimento pela ausência ainda mais se acentua.

Furtamo-nos à poluição, ao trânsito, ao receio por uma maior insegurança e o que permanece é a imagem colorida feita saudade, um misto de sentimentos que mete ruas, praças, jardins, prédios… a nossa vida feita aos retalhos, um pedacinho neste lugar, outro além, naquele outro.

Memórias que nos aconchegam a alma e nos devolvem, de regresso, ao nosso banco do jardim à sombra daquela árvore, ao passeio da frente com a paragem do eléctrico e de repente, o polícia de turno que passa no seu andar calmo, mãos atrás das costas, seguro, tão seguro e confiante de si próprio que nos faz sentir aliados da autoridade.

Quase setenta anos de vida que não se somam em parcelas iguais, longe disso, a maior parte passaram incógnitas, não me lembro delas, não interessam, foram ram-ram, folhas de uma agenda que se rasgaram e perderam… procuro-as na minha memória e não as encontro.

À primeira vista parece um enorme desperdício, pensando melhor, foi mesmo um grande desperdício, o mesmo que enche a vida de tantas pessoas que, como eu, não deram conta de que o relógio estava a contar, minuto a minuto, hora a hora, todas exactamente com a mesma duração, todas sem retorno.

Mas a minha cidade, essa, está lá toda, não a tua, grande parte dela nem a conheço, não tem nada a ver comigo.

Lembras-te da inauguração da Expo / 98, das bichas intermináveis para os bilhetes de acesso, da euforia criada pelas expectativas de algo verdadeiramente novo, moderno, arejado?

Nunca me senti tão orgulhoso da minha cidade, comovi-me quando pela primeira vez entrei naquele espaço e me apeteceu correr ao encontro dos responsáveis de tudo aquilo que via ao meu redor no enquadramento mágico do estuário do Tejo, abraça-los e dizer-lhes obrigado.

Apeteceu-me recuar 50 anos e partir à desfilada por toda a Lisboa a gritar:

-“Venham cá agora, venham ver o meu bairro de operários, dos Armazéns de Vinho do Abel Pereira da Fonseca, da Fábrica do Material de Guerra, do Sabão, dos bilhetes de eléctrico a dois tostões destinados aos operários, venham cá agora, seus vaidosos, convencidos, do Bairro de Alvalade, da Baixa, do Chiado…venham cá agora!

Ah… se fosse possível misturar os tempos!

Eu tinha razões especiais:

- Quase sessenta anos antes, em 39, eu tinha nascido muito perto dali, na R. José do Patrocínio, ao Poço do Bispo, ao fim da linha dos eléctricos, próximo daquele que viria a ser desde cedo, o maior depósito de lixos tóxicos da cidade, algo a que à data apenas se chamava, prosaicamente, de porcaria e onde, 49 anos mais tarde viria a nascer, quase como por artes mágicas, a Expo/98, o maior, mais belo e surpreendente projecto de recuperação urbanística de Lisboa.

O Bairro de Marvila, na década de 40, era o local, por excelência, das tabernas e carvoarias, das fábricas, dos operários e dos copos de três, no tempo em que beber vinho era dar de comer a um milhão de portugueses.

O meu pai era proprietário de duas dessas tabernas e carvoarias, uma em Vale Formoso de Baixo e outra na Rua Direita de Marvila e ao Domingo, quando ganhava o C.O.L (Clube Oriental de Lisboa), aumentava a euforia e o negócio do vinho a copo.

Ainda se faziam sentir os efeitos da guerra terminada em 45, das senhas de racionamento, das dificuldades, não para mim que era filho de pai, então rico, usava calções, meias de soquete e chamava de mamã à minha mãe.

Em 1937/38, o meu pai alugou uma moradia quase no fim da Rua José do Patrocínio onde então desaguava, vindo de cima, por uma ruazinha estreita, o bairro chinês, o mais antigo bairro de lata da cidade de Lisboa.

A moradia, sobre elevada relativamente à rua, tinha um amplo terraço em toda a sua frente com uma dupla escadaria, a primeira até um portão de ferro pintado de verde que se abria para a outra até à rua.

O edifício era de dois pisos separados por uma escadaria interior muito bonita, em madeira exótica que se abria em leque ao chegar ao hall de entrada. A parede da frente era toda em azulejos verdes com uma varanda ao meio a toda a largura e com figuras de pedra a encimá-lo.

Que fazia ali aquela moradia tão bonita? Quem era o seu dono? Por que razão a construíra ali, numa zona pobre e marginal, às portas do bairro chinês, encostada a uma ponte por onde o comboio ao passar fazia estremecer toda a casa?

Ah… não sei como vocês podem viver aqui!

Porquê? Eu não dei por nada... nasci com o barulho do comboio, já o ouvia quando estava na barriga da minha mãe.

Depois, via-os passar do meu terraço, eram todos pretos, à excepção de um que era branco, o “comboio de prata”, era o rápido que ia para o Norte, levava pressa, de tão junto que passava da minha casa até parecia que me ia atropelar.

Ainda hoje os ouço no seu matraquear característico, especialmente quando iniciavam a marcha na estação de Braço de Prata, ali próxima.

Pou-ca-te-rra…Pou-ca-te-rra…Pou-ca-te-rra…Pou-ca-te-rra….ÚÙÙÙ…ÙÙÙÙ... e lá vinha ele resfolgando como que a tomar balanço para a próxima corrida até à nova estação.

O pior eram aqueles que não paravam na estação de Braço de Prata e passavam já embalados…era coisa de doidos, abanava tudo, os copos à mesa estremeciam, os talheres tilintavam e o meu pai, depois do comboio passar e ficar audível dizia para a minha mãe:

- Mimi, passa-me o pão por favor.

Um dia, um homem resolveu caminhar a pé pelo meio da via e prendeu-se-lhe a bota… sei que era uma bota porque veio parar ao meu terraço com o pé lá dentro.

Não me lembro de quantas noites não consegui dormir…foi a única vez em que me zanguei com os comboios.

O meu vizinho que morava do outro lado da ponte, o Mário Martins, o da Valentim de Carvalho, que descobriu tudo o que era cantor em Lisboa e arredores, a começar pelo Marco Paulo, uns anitos mais velho que eu, dizia-me, apurando o ouvido para o comboio que lá vinha:

- Aposto que o número do comboio que lá vem é o… ainda hoje estou para saber como é que ele acertava sempre, seria um truque ou já a manifestação da sua extraordinária sensibilidade musical?

Lembro-me, que ele vivia no desejo nostálgico de ter um instrumento de musica, não posso precisar qual, mas o negócio da pequena mercaria do pai, nesse tempo, era de patacos e a fiado, como já vai sendo hoje nas mercearias de bairro, e além disso, oriundo lá do norte, não era sensível à vocação musical do filho.

Por isso, o meu amigo Mário, olhava para o piano que a minha mãe tinha em casa um pouco à maneira de quem olha, mesmo de perto, aquilo que lhe estava tão distante.

Recordo que o meu pai alugou esta casa por 400 mil réis, o dobro do que a minha mãe pagava à cozinheira, e um quarto do que pagava à “criada de fora”, comidos e dormidos, já se vê, que sendo já dinheiro para a época, devia ter alguma coisa a ver com a frustração do senhorio que nunca se deve ter entendido com o barulho do comboio.

Devia de andar pelos meus 50 anos quando regressei de novo àquele local e àquela casa.

Bati à porta e disse à senhora que me atendeu:

- Nasci nesta casa há 50 anos, vivi nela os meus primeiros 10, nunca mais cá voltei, importa-se que dê uma vista de olhos?

- Faça favor, isto agora é um infantário, esteja à sua vontade.

Dei meia dúzia de passos, olhei ao meu redor, não reconheci nada, agradeci e vim embora…tinha-me esquecido de levar os meus olhos de criança!

Recentemente, vi-a de soslaio da janela do comboio, um pouco antes de chegar a Santa Apolónia, pareceu-me estar já em perfeita degradação. Podem destruí-la por completo porque sem os meus olhos de menino não me serve para nada.

De resto, para a revisitar não tenho necessidade de lá voltar, nem sequer preciso dela, todos os seus mais pequeninos recantos e pormenores continuam indeléveis na minha memória.


Nota:

Dedico este texto ao meu sobrinho Rui.

Site Meter