sábado, dezembro 05, 2009

VÍDEO

Por que não, todos os dias de manhã, uns pequenos exercícios?...

LIONEL RITCHIE - EASY


EVIAN ROLLER BABIES (VERSÂO TURCA)


DANIELA MERCURY & ROBERTO CARLOS - COMO È GRANDE O MEU AMOR POR VOCÊ


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TIETA DO
AGRESTE


EPISÓDIO Nº 297


DA ALPARCATA DO CÂO, LÍNGUA E OLHO DA CIDADE



Na barra da manhã, Bafo de Bode abre os olhos na sarjeta onde a cachaça o derrubara na noite anterior. Sarjeta é força de expressão folhetinesca – adormecera na porta do Cine Tupy, abrigado contra o vento e a chuva. Levantando-se toma o caminho do Buraco Fundo. Ao atravessar a Praça da Matriz, percebe movimento na porta de Terto. Detém-se para identificar o apressado a partir tão cedo quando pode demorar-se, tranquilo – Terto, o dedicado marido, adora dormir até bem tarde, na rede pendurada no alpendre, o sono pesado e plácido dos bons cabrões, satisfeitos de seu estado (aqueles que assumem, como escreveria um jovem autor moderno).

Ao encontrá-lo andejo em ronda pelas ruas e becos da cidade, em horas tardas, tudo vendo e comentando, Amélia Dantas (actualmente Regis) de apelido Mel, ex-primeira Dama do Município, classificara o mendigo de alpargata do cão. Segundo Barbozinha, Bafo de Bode é o olho da cidade. O olho do cu acrescenta Aminthas. Tanta coisa viu, nada mais o espanta. Não pode, porém, esconder o pasmo ao reconhecer no cidadão metido num velho par de calças de Terto o seminarista Ricardo. Em camisola, pendurada ao pescoço do rapaz. Em camisola, pendurada ao pescoço do rapaz dona Edna se despede num chupão daqueles. As calças de Terto, apertadíssimas, vão-lhe mal, por que o padreca as usa? Trajava batina quando Bafo de Bode o surpreendera acompanhado da meninota, inquilina da Zuleika, para os barrancos do rio. Vestia calção e camisa-esporte ao atravessar a proibida porta de Carol, não se haviam passado quatro dias. De batina o avistara ainda na véspera galgando os degraus da torre para consolar a indócil vitalina. Sem falar…Cala-te boca.

Retomando a marcha, corifeu da cidade, Bafo de Bode revela e aconselha:

- Gentes, vamos pôr o cu no seguro que a Pomba do Divino está solta em Agreste!



DA PASTORA E DO BODE NOVO



Ricardo cruza o jardim da Praça, as calças justas não lhe permitem correr. Bate na porta do fundo, Araci abre, espoca em riso: seu Cardo está tão engraçado, ai que moço mais bonito! Um dia há-de reparar nela, se Deus quiser.

Entra, veste a batina, está terminando de arrumar a mala quando sente que alguém o observa, levanta a vista. Nos trajes negros, o terço na mão, Perpétua, preparada para ir à igreja. Ameaçadora, pronta para a acusação e o castigo, no rosto a indignação e a repulsa, os olhos fuzilando, a voz terrível – mas contida para não acordar as duas amaldiçoadas:

- O que está fazendo, excomungado?

- Vou tomar a marinete para Esplanada daqui a pouco.

- Tomar a marinete? Com ordem de quem?

- De ninguém, Mãe. Em Esplanada tomo o ônibus para Aracaju, salto na estrada para São Cristóvão.

- O que é que tu está pensando? Não tem mais mãe a quem obedecer? Ficou maior de idade? Trate de guardar suas coisas e ir se deitar. Mais tarde, vai me prestar contas, se prepare.

- Vou passar uns dias com Frei Timóteo, no convento. Ele me convidou. Depois que Tieta… que a tia viajar, eu volto.

- Não vai para lugar nenhum. Faça o que eu lhe disse.

Sabe que não vai ser obedecida, que nunca mais mandará nele. Irmã mais velha, jamais mandou em Tieta, jamais foi por ela obedecida.

- Já disse, Mãe, que vou para São Cristóvão. Não fiquei maior de idade, fiquei homem, não vê? Não tente me impedir, não quero sair fugindo. Eu volto, fique descansada.

- Tu nem parece mais meu filho. Tu estás igual a ela. Era a nossa vergonha: de dia com as cabras, de noite no pecado. Tu quer tomar o lugar dela. Tu não tem medo do castigo de Deus?

Desde a morte do major, sente, pela primeira vez vontade de chorar.

- Meu Deus mudou também, Mãe, não é mais semelhante ao seu. Meu Deus perdoa, não castiga.

- Mas tu não pode ir embora assim, antes de se acertar tudo. Ela te desviou do bom caminho, te perverteu, pôs minha promessa a perder. Tem de compensar o mal que praticou. Trouxe o pecado para esta casa, te desgraçou, a maldita.

- Não, Mãe. Eu era cego, ela me ajudou a enxergar. Não sei se vou ser padre ou não, ainda é cedo para saber. Mas fique certa de que se eu não me ordenar é porque Deus não quis. Quando eu souber, lhe digo. Mas vou continuar a estudar, não tenha medo.

- Tu jura que é mesmo para o convento que tu vai?

- Já lhe disse. Agora, ouça, Mãe: a tia foi boa demais para comigo. Nunca poderei pagar o que devo a ela.

Toma da mala, sorri para a mãe, sereno e terno:

- A bênção, Mãe.

- Ai, meu Deus! – a mártir eleva os olhos para o céu.

Ao voltar-se em direcção à saída, Ricardo vê Tieta na porta da alcova, o corpo bem-amado vestido com uma réstia de luz da manhã recente.

Adeus, tia…Tieta!

- Adeus, Cardo. Pode me chamar de tia. Diga ao Frade que estou em Agreste, que vai ser uma briga de foice.

A porta da rua se fecha sobre Ricardo. Sem sequer olhar para a irmã, Tieta reentra no quarto. Pastora de cabras, sente orgulho no sobrinho. Igual a ela, sem tirar nem pôr, Perpétua tem razão. Bode novo, sem peias, livre nos outeiros, de cabeça erguida, herdeiro de sua rebeldia. O que passou, passou, capricho louco, fica a saudade, tanta!

sexta-feira, dezembro 04, 2009

TUBARÕES ... Não há animais maus por pior que seja a fama.




O Dilema do
Pavão


Esclareço que não estou a referir-me aos pavões que podemos ver no Jardim Zoológico ou àqueles que se passeiam vaidosos nos jardins dos palácios como elementos vivos de decoração e exotismo.

Não, esses não se defrontam com nenhum dilema, talvez tédio mas não dilema.

Apesar do seu mau feitio foi-lhes roubada a liberdade e escolhidos para alindarem jardins. A troco, garantiram-lhes a paz e a segurança das suas vidas sem lhes perguntarem se era isso que eles queriam.

Claro que o homem não costuma questionar-se quando interfere na natureza. Simplesmente serve-se a seu belo prazer, põe e dispõe e só agora, tarde demais para muitas espécies para sempre desaparecidas, tomou consciência das consequências dos seus actos para a sua própria sobrevivência no longo prazo.

Era, pois, muito difícil, que aquela ave com uma cauda que chega a atingir os dois metros e meio de comprimento, ornamentada com desenhos e cores lindíssimas, pudesse passar despercebida e deixada em paz no seu ambiente natural, lá pelas florestas da Índia, atordoando os ares com os seus gritos estridentes avisadores de intrusos indesejados.

Quando os estudiosos dos fenómenos do Evolucionismo reflectiram sobre aquela cauda que “conduz” os pavões direitinhos para a boca dos tigres, seu principal predador, perguntaram-se como tinha sido possível a uma espécie evoluir desenvolvendo um atributo - a sua longa cauda - que era precisamente a razão da sua morte precoce.

Aquelas penas compridíssimas e pesadas constituem um enorme empecilho quando pretende levantar voo, fazendo lembrar um B52 com os porões carregados a devorar a pista até ao fim para conseguir pôr-se no ar com a diferença que não leva um tigre a correr atrás de si.

Mas os problemas não acabam mesmo que consiga elevar-se porque depois vai pousar num ramo e como é pesado não pode ser um raminho qualquer e, das duas uma, ou fica a uma altura considerável do chão ou o tigre vai buscá-lo armando um salto, eles que são gatos enormes dotados de uma incrível agilidade, puxando-o exactamente pelas penas do rabo.

- Mas então, porquê?


- Não é a vida, seja ela de quem for, o principal valor a preservar na natureza?


- Então como é que essa mesma natureza desenvolve na vítima as características que se transformam em vantagens acrescidas para o predador?

Se pudéssemos voltar ao tempo de La Fontene, quando os animais falavam, e ter com o pavão uma “conversinha” em particular o que ele nos contaria, certamente, seria o terrível dilema em que a sua vida, progressivamente, se transformou e explica o seu permanente mau feitio:

- Viver um romance de amor com a sua amada e poder vir a ser o pai de futuros e lindos pavõesinhos ou acabar estralhaçado na boca voraz de um tigre porque ela, a amada, lhe deu a perceber, sem margens para dúvidas, que escolheria sempre para pai dos seus filhos os machos mais lindos... os que tivessem uma cauda maior.


Entre o tigre e a amada ele, o pavão, escolheu o amor...

DEMIS ROUSSOS - VELVET MORNINGS


ADRIANO CELENTANO - DON'T PLAY THAT SONG


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TIETA DO


AGRESTE

EPISÓDIO Nº 296



- Compensar teu filho? De quê? Era um donzelão, capaz de terminar veado, dando por aí, fiz dele um homem. Como se você acreditasse que padre tem de ser virgem.

- Era um menino imaculado, bem ouvido, respeitoso, só pensava em seus deveres. Agora nem parece o mesmo, tomou a rédea nos dentes. Tu fez dele teu igual. Está igual ao que tu era, maldita! Tem coragem de negar?

- O que você quer é que eu pague o cabaço do seu filho, não é?

Levanta-se, desce da cama, o corpo lascivo e afrontoso. Rebolante, dirige-se para o armário, toma da maleta onde guarda o dinheiro, destranca-a e suspende a tranca, separa um maço de notas e as atira em direcção à irmã. Espalham-se no chão:

- Toma, eu pago o cabaço que comi. Foi bom, valeu a pena, me fartei. Vai, recolhe a paga, caftina de merda. Tu me dá nojo.

Perpétua pousa o candeeiro, penetra no quarto, agacha-se, cata as cédulas. A voz se eleva do chão, fanhosa mas abrandada, conciliadora.

- O que tu deve fazer é adoptar os dois meninos…

- Adoptar? Como meus filhos? – de novo em cima da cama, Tieta observa Perpétua de quatro, juntando e recolhendo as notas – É isso que você deseja… Para serem meus únicos herdeiros, não é? Não faz mal que eu passe a ser mãe do meu macho? Tu é demais.

Ao vê-la andando de gatas, o braço estendido sob a cama, em busca de alguma cédula extraviada, os peitos murchos balouçando sob o camisolão, o coque desfeito, os cabelos tombando sobre o rosto azedo de beata, a feiura de bruxa e o olho aceso, apossa-se de Tieta um sentimento misto de admiração e pena, a juntar-se à raiva – que diabo de mulher capaz de tudo pelos filhos.

- E dizer que teve um homem que te quis, te desejou, dormiu contigo e te fez filhos. Contando, não se acredita.

Relembra então uma ideia louca, grotesca imagem que certa ocasião lhe atravessara o pensamento: imaginara Perpétua em cima daquela cama, sobre o fofo colchão de lã de barriguda, embolada com o marido na hora da folgança, espantosa visão! De súbito a raiva desaparece, Tieta começa a rir:

- Se você disser uma coisa, contar a verdade, eu prometo te botar no meu testamento.

Perpétua eleva o rosto, suspeitosa e interessada, cúpida.

- Na hora agá, me diga, tu e o major ficavam no papai e mamãe ou faziam sacanagem? Ele gostava de uma boquilha?

Ao pensar na irmã tentando o ipicilone com o marido, Tieta é sacudida por um ataque de riso incontrolável. Quer parar e não consegue, o riso desdobra em gargalhada monumental: enxerga Perpétua agarrada ao badalo do Major – bem servido a julgar pelo filho. Na risada foram-se os cornos, todos eles, os cravados na beira do rio por Maria Imaculada e os outros, dos quais nunca teve conhecimento.

- Respeite os mortos, desgraçada! – Perpétua se levanta feito doida, as mãos gadanhando as cédulas, os olhos esbugalhados fitando o leito, sentindo os cheiros, revendo os gestos.

Ruído de chave na porta, passos leves no corredor. Perpétua trata de compor-se, enfia o dinheiro nos bolsos da saia para que a outra desavergonhada, de volta do pecado – cada noite chega mais tarde – não fique a par do acontecido. Ao aperceber movimento, luz e riso na alcova, Leonora se aproxima:

- Boa noite, dona Perpétua. De que ri tanto, mãezinha?

Mãezinha não consegue deter o frouxo do riso, visão mais cómica! Tendo conseguido apagar dos olhos a figura do Major, viril e apaixonado, a despir o pijama de listas amarelas, Perpétua explica:

- A gente estava conversando, as duas. Tieta achou graça numa bobagem que eu disse… - levanta o candeeiro – Amanhã a gente continua, mana.

Se Tieta pensa ter colocado ponto final no assunto com aqueles contos de réis, ah!, se engana, não conhece a irmã mais velha. Perpétua quer e há-de obter papel passado no cartório, firma reconhecida, não faz por menos. Vai saindo mas retorna, rápida, para recolher uma cédula junto ao armário. Deve haver outras. Voltará amanhã, antes de Aracy varrer o quarto.

Tieta ainda ri quando Leonora começa, a voz desconsolada:

- Mãezinha, ai, Mãezinha! Coitado de Ascânio. O pobre está desesperado…

quinta-feira, dezembro 03, 2009

Este anúncio foi feito na Tailândia para a marca Pantene. É a história de uma menina surda-muda que aprende a tocar violino apesar das dificuldades criadas, principalmente, por uma colega pianista.
Há uma altura em que a menina pergunta " por que tenho de ser diferente dos outros?" e o violinista da rua responde:" e por que você teria de ser igual aos outros?
Há anúncios e anúncios... este "é dos outros".

DEMIS ROUSSOS - SOMEDAY SOMEWHERE


LINDOMAR CASTILHO - CORAÇÃO VAGABUNDO



TIETA DO


AGRESTE

EPISÓDIO Nº 295





DO DIÁLOGO DAS DUAS IRMÃS SOBRE ASSUNTOS DE FAMÍLIA, CAPÍTULO UM TANTO SÓRDIDO ONDE É LAVADA A ROUPA SUJA E SE PÔE MERDA NO VENTALIDOR



Desnuda, florescida em galhas, recoberta de chifres e isso que ela não sabe da missa a metade, Tieta enfrenta a irmã. Despira-se à espera do pulha, para degustar todos os condimentos da traição, percorrer a escala da vileza até ao fim, sentir o desespero transformar-se em ódio quando ele estendesse a mão ainda quente do calor da outra e lhe tocasse o corpo. Assim acontecera.

Nudez agressiva, bela e opulenta, na pujança dos seios arrogantes, das longas coxas, da altaneira bunda do saracoteio, da negra e profusa mata de pelos – além da cornadura, apenas o bordão. Ao vê-la de tal sorte impúdica e colérica, Perpétua decidira adiar a inevitável explicação, o difícil confronto. Para conversação de subtilezas e meias palavras, de subentendidos, exige-se tranquilidade, ânimo sereno. Desaconselhável em hora de cabeça quente e orgulho ferido. No ajuste de prestações de contas, Tieta pode resolver cobrar aleives do passado.

Perpétua tenta cerrar a porta do quarto, recolher-se, borrar dos olhos o que vira. Mas não chega a completar a manobra de recuo. Tieta percebe o bruxuleio da chama do candeeiro, advinha a irmã à espreita, a raiva culmina:

- Que faz aí, escondida, espiando?

Descoberta, Perpétua mostra-se, avança um passo:

- O que aconteceu? O que é que isso significa?

A voz sibilante não reflecte escândalo e furor, apenas espanto. Ainda há tempo para salvar a moralidade, manter a decência. Disposta a colaborar, Perpétua deixa margem para qualquer versão satisfatória: Ricardo vem-se revelando voluntarioso e desobediente, não cumpre horários, merece repreensão e castigo. Quanto à nudez das personagens, explica-se pelo calor de verão ou não se fala nisso, detalhe secundário. Salvas as aparências, as negociações tornar-se-ão mais fáceis. Mas Tieta descontrolada, despreza a oportunidade, põe a merda no ventilador:

- Significa que o cachorro do seu filho se atreveu a me botar os cornos com uma putinha descarada, coisa que nenhum homem me fez.

Perpétua abafa um grito com a mão. Avança mais um passo, encosta-se à parede do gabinete:

- Quer dizer que tu e Cardo…Que horror, meu Deus! – Pasmo e repulsa estampam-se na face mas novamente a mão impede o lamento. Em Agreste, o sono da vizinhança é leve; despertados pelo estardalhaço de Tieta, quantos não estarão á escuta?

Arrastando o pesado fardo da traição, a abundante colheita de chifres, Tieta caminha para o quarto, senta-se na cama, as pernas dobradas, indecente postura. A indignação e a raiva prosseguem implacáveis, agora voltadas contra a irmã:

- Não venha bancar a inocente, fazendo que não sabia quando estava farta de saber.

- O que é que tu quer dizer com isso? Tu está louca? Eu te recebi em minha casa, de braços abertos, pensando que tu tinha mudado. Tu não mudou nada, é a mesma depravada de antes. Desencaminhou um menino inocente, temente a Deus, desgraçou a vida dele. Ia ser padre, agora está excomungado… - abafa um soluço, mãe em pânico, estarrecida – E ainda tem coragem de dizer que eu sabia. Vade retro – Não cabendo mais remendo, resta-lhe enfrentar a situação, tomar a ofensiva.

- Não sabia! Cínica! – o desejo de Tieta é esbofetear a hipócrita, baixar-lhe o bastão nas costas como fez com o nojento – Quem foi que mandou o filho de noite para Mangue Seco quando viu que eu estava tarada por ele? Com olho no meu dinheiro, pensa que não me dei conta? Mas você se esqueceu de explicar a ele que não nasci para carregar chifres. Não sei onde estou que não lhe meto o braço.

O candeeiro na mão, no corredor, diante da porta do quarto, acuada contra a parede, suor frio na testa, Perpétua reage:

Tu está inventando calúnias para fugir à responsabilidade – A voz agressiva, o dedo num gesto acusador – Tu não pode desviar um menino inocente do sagrado caminho do sacerdócio, cortar sua carreira, sem…

- Sem pagar, não é? Você só pensa em dinheiro. Antigamente, só pensava em arranjar um homem disposto a te comer, não era?

- Nunca tive esses pensamentos, não sou tua igual.

- Então por que prometeu um filho a Deus? Não foi para arranjar um homem com quem trepar? Você não é igual a mim porque é pior. Astuciou tudo isso para me tomar dinheiro. Quando me cedeu a alcova e botou ele para dormir ali defronte, já foi um plano. Eu devia ter desconfiado.

- Mentira, nem me passava pela cabeça…

- Depois, quando me viu de olho nele, armou o bote, não foi?

- Não adianta tu continuar inventando embustes. Eu quero saber o que é que tu vai fazer para compensar meu filho. E quero saber agora mesmo.

MAMÃ:

- O QUE È SER VIRGEM?

quarta-feira, dezembro 02, 2009

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VÍDEO

SURPRESA


Quando Me
Tornei Invisível”


Esta história que nos é contada por Hamilton Slide pretende ser um grito de revolta, surdo, profundo, mas resignado contra o desprezo a que os velhos, hoje, são votados pelas novas gerações.

Não tem que ser assim: “Quem se tornou invisível” em velho, provavelmente, foi invisível toda a vida… sempre haverá alguém a querer disputar o espaço que é nosso, velhos ou novos. Afirmar e defender o nosso espaço é um dever que nos cabe independentemente da idade.

Vamos à história que é triste mas bonita:




Quando me Tornei Invisível


Já não sei em que data estamos, lá em casa não há calendários e na minha memória as datas estão todas misturadas.

Recordo-me daquelas folhinhas grandes, um primor, ilustradas com imagens dos Santos que colocávamos ao lado do penteador.

Já não há nada disso. Todas as coisas antigas foram desaparecendo e, sem que dessem conta, eu fui-me apagando também.

Primeiro, trocaram-me de quarto pois a família cresceu, depois passaram-me para outro, ainda na companhia das minhas bisnetas e agora ocupo um pequeno espaço numa despensa que está no pátio atrás da casa.

Prometeram-me trocar o vidro quebrado da janela, mas esqueceram-se, e de noite corre por ali um ar frio que aumenta as minhas dores reumáticas.

Mas, tudo bem…

Desde há muito tempo que tinha intenção de escrever porém, passei semanas a procurando um lápis e quando o encontrava de novo me esquecia onde o tinha posto… na minha idade as coisas perdem-se facilmente.

Claro que não é uma enfermidade delas, das coisas, porque julgo estar segura de tê-las, mas sempre desaparecem.

Há dias dei-me conta que a minha voz também tinha desaparecido porque quando falo com os meus netos ou os meus filhos não me respondem.

Todos falam sem me olharem, como se não estivesse com eles, escutando atenta tudo o que me dizem.

Ás vezes intervenho na conversação, segura de que o que tenho para lhes dizer não ocorreu a nenhum deles e que lhes vai ser de grande utilidade.

Porém, não me ouvem, não me olham, não me respondem e então, cheia de tristeza, retiro-me para o meu quarto e vou beber a minha chávena de café.

E faço assim de propósito, para que compreendam que estou aborrecida, para que se dêem conta que me entristecem, me venham buscar e me peçam perdão…mas ninguém vem.

Quando o meu genro ficou doente, pensei que teria oportunidade de lhe ser útil e levei-lhe um chá especial que eu mesma preparei.

Coloquei-o na mesinha de cabeceira e sentei-me esperando que o tomasse, só que ele estava a ver televisão e nem um só movimento me indicou que se dera conta da minha presença.

O chá, pouco a pouco, foi esfriando e com ele o meu coração.

Então, no outro dia, disse-lhes que quando eu morresse todos se iriam arrepender e o meu neto mais pequeno respondeu: “Ainda estás viva avó” e acharam tanta graça que não pararam de se rir.

Estive três dias a chorar no meu quarto, até que numa manhã entrou um dos rapazes para tirar umas rodas e nem o bom dia me deu.

Foi então quando me convenci de que sou invisível…

Parei no meio da sala para ver se tornando-me num estorvo me olhavam, porém a minha filha continuou a varrer sem me tocar e os meninos correram à minha volta, de um lado para o outro, sem tropeçarem em mim.

Um dia, os meninos agitaram-se e vieram dizer-me dizer que no fim-de-semana iríamos todos passar um dia ao campo.

No sábado fui a primeira a levantar-me. Quis arrumar as coisas com calma porque nós, os velhos, levamos muito tempo a fazer as coisas e assim adiantei o meu tempo para não os atrasar.

Rápidos, entravam e saíam da casa a correr levando os sacos e brinquedos para o carro.

Eu já estava pronta e muito alegre e permaneci no meu quarto à espera que me chamassem mas, quando dei conta, já tinham partido e o carro desapareceu envolto em algazarra.

Compreendi que não estava convidada, talvez porque não coubesse no carro, ou porque os meus passos, de tão lentos, impediriam que caminhassem a seu gosto pelo bosque.

Senti, claro, como o meu coração se encolheu e a minha face ficou tremendo como quando a gente tem que engolir a vontade de chorar.

Eu entendo-os, eles vivem no mundo deles, riem, gritam, sonham, choram, abraçam-se, beijam-se…eu nem sinto mais o gosto de um beijo.

Antes beijava os pequeninos, era um prazer enorme tê-los nos meus braços como se fossem meus.

Sentia a sua pele tenrinha e a sua respiração doce bem perto de mim.

A vida nova produzia-me alento e até me dava vontade de cantar canções que já não acreditava lembrar-me delas.

Mas um dia, a minha neta Laura, que acabava de ter um bebé disse-me que não era bom que os velhos beijassem os bebés, por questões de saúde…

Desde então já não me aproximo deles, não quero passar-lhes algum mal por imprudência minha.

Tenho tanto medo de contagiá-los!

Eu os bendigo a todos e lhes perdoo porque:


“ Que culpa eu de me ter tornado invisível?”


(Hamilton Slide)

CANÇÔES ROÂNTICAS BRASILEIRAS
JERRY ADRIANI - QUERIDA


CANÇÃO TRADICIONAL BRASILEIRA

LEANDRO & LEONARDO -SE ESTA RUA FOSSE MINHA



TIETA DO
AGRESTE


EPIDÓDIO Nº 294


DE TIETA TODA ORNADA DE CHIFRES



Os gritos de Tieta despertaram Perpétua. Enfia a saia negra sobre o camisolão, toma o candeeiro, abre a porta a tempo de enxergar Ricardo fugindo pelo corredor, apanhando sem soltar um pio, nu em pelo, ai Senhor meu Deus!

Desatinada, mandando ao diabo contenção, decoro, conveniências, desprezando qualquer espécie de cautela, a tia o persegue até à porta da rua; o bordão ronca nas costas do sobrinho. O bordão do velho Zé Esteves, o mesmo que exemplou Tieta quando o pai soube, por intermédio de Perpétua, do caixeiro-viajante.

Ricardo ainda tenta voltar em busca de um calção mas a fúria, de cajado em riste, no auge da dor de corno, o atinge na face, na face angelical e pérfida como a atingira Zé Esteves em outra distante madrugada – também ela tinha a face angelical. Fecha o corredor, vibra o cajado, ameaça os celestiais e traiçoeiros quimbas do aleivoso, a divina e perjura estrovenga. Num salto, Ricardo ganha a rua, salva os preciosos bens. Não refeito ainda da surpresa, desarvorado, vê-se na Praça, trajando lanhos, vergonha e o anel de jade, a porta fechada com violência sobre a voz colérica a expulsá-lo: - Suma da minha frente!

Tieta toda ornada de chifres. Ela os fora recolher na beira do rio. Quando a luz do motor marcou a hora combinada, estava a postos: assistiu ao encontro atrás da mangueira, acompanhou o traste e a moleca até à escuridão da Bacia de Catarina. Sujeitando o orgulho à dura prova, postou-se à escuta para cumular-se de indignação, suar o ciúme inteiro, gota a gota. Aberta em chagas, aviltada, coberta de lama, abjecta, ridícula, corneada. Escutou os risos, perdeu a conta dos suspiros, mediu o silêncio dos beijos, aprendeu as nuanças da palavra bem, repetido refrão: me beija de novo, bem, me morde, mete em mim, bem; não vá embora, bem, demore mais; ai, bem.

Logo ao regressar de Mangue Seco começara a suspeitar da existência de outro rival além de Deus: humano e fêmea. Pôs-se à escuta, recolheu informações mas quis ter a certeza, tirar pessoalmente a limpo, tão impossível lhe parecera. Viu, ouviu, quase participou. Era verdade. Deixara-se enganar, ela, Tieta, vaidosa e segura de si, como se fosse a mais tola e confiante das raparigas.

Conforme fazia todas as noites, no quarto se despiu e perfumou. Assim o esperara para que as últimas centelhas de paixão se extinguissem quando ele a tocasse com as mãos ainda quentes do corpo da menina e sobrassem tão-somente humilhação e raiva.

Jamais lhe acontecera. Lucas fugira temendo se prender, não por causa de outra. Fora necessário retornar a Agreste para um homem ousar. Um homem? Cabrito apenas desmamado, vestido de batina, de inocência e medo, um menino donzelo, cabaço cuja flor ela colhera na noite das dunas, ao luar.

terça-feira, dezembro 01, 2009

VÍDEO

Festa do 82º Aniversário da avózinha...

RUI VELOSO - A PAIXÃO


CANÇÕES ROMÂNTICAS BRASILEIRAS

MARIA BETÂNIA - ONDE ESTARÁ O MEU AMOR



TIETA DO
AGRESTE

EPISÓDIO Nº 293



Diante dos sacos de farinha de Gumercindo Sare, Peto entregou um prospecto ao vendedor, outro à compradora, dona Jacinta Freire, beata das mais xeretas. Gumercindo, julgando tratar-se de anúncio de cinema, deixou o papel cair no chão. Dona Jacinta, porém, interrompendo a compra, dedicou-se à leitura, em voz alta; outro jeito não teve o feirante senão escutar. Ao ouvir o nome de Ascânio, interessou-se, pediu explicações. Dona Jacinta satisfez-lhe a curiosidade com prazer. Indicou a tabuleta no centro da Praça, apontou a faixa, releu os insultos com gorjeios de voz, adorando. Incrédulo, Gumercindo perguntou:

- Querem tirar doutor Ascânio da Prefeitura?

- Para botar o Comandante Dário. Diz que Ascânio…

Homem de acção, Saruê procura com os olhos o menino que distribui aquele papel imundo e o enxerga mais adiante, descansando da árdua empreitada, enquanto chupa um picolé. Gumercindo parte para Peto, estende as mãos para tomar o maço de volantes, consegue tirar alguns que rasga com raiva, quer o resto:

- Me entregue essas porqueiras, seu moleque.

Ora, como de sobejo se sabe, Peto é parada. Unindo a acção à parada, vibra um pontapé na canela de Gumercindo e xinga-lhe a mãe.

- O que é isso, compadre? – intervém Nhô Batista, outro lavrador de Rocinha, ao observar o amigo, cego de ódio, buscando agarrar o menino.

Estão querendo tirar doutor Ascânio da Prefeitura!

A notícia se espalha, corre como um rastilho de pólvora, ou seja rápida e peçonhenta, comovendo a feira. A maioria dos vendedores, procedentes quase todos de Rocinha, tinha Ascânio em grande estima. Os habitantes da beira do rio e da orla do mar, fornecedores de peixe, mariscos, caranguejos e guaiamuns, juravam pelo Comandante – numericamente em minoria, eram temidos, alguns possuíam fama de contrabandistas e tradição de luta contra a polícia.

A caça a Peto através da feira, com lances espectaculares e muita mercadoria derrubada, deu início à desordem. Safa-se Peto, desatando uma vara de porcos nos pés de Saruê e seus asseclas. Parte para o bar em busca de reforços; a última coisa que viu na confusão foi Ricardo sendo agarrado por um grupo, os volantes espalhando-se ao vento. O bar cheio, vieram todos.

Feira assim animada, não houve jamais. Desbancou a 4 de Junho de 1938, na qual o façanhudo cabo Euclides tentou capar, na vista do povo, o violeiro Ubaldo Capadócio escapou por milagre. Não escaparam a faixa e as tabuletas – as duas, pois o placar do cinema, anunciando profeticamente porrada à Beça, foi igualmente destruído. Acontece que os pescadores, de início ignorantes da causa do conflito, demoraram a participar na festa. Mas, quando se deram conta do desafio ao Comandante, pau comeu.

O pau comeu de todos os lados, muitos nem souberam dos motivos da briga, todos se envolveram. Prejuízo vultoso e geral: sacos e sacos de farinha, de feijão, de arroz, de milho, derramados, frutas e legumes pisados, esmagados, mantas de charque pelo chão, peixes servindo de arma de combate e caranguejos soltos entre os campeões. O profeta Possidónio, tendo proclamado mais uma vez o fim do mundo, baixou o cajado sobre uns e outros, indiferente às posições políticas, eram todos condenados pecadores.

Nem Ascânio, vindo da Prefeitura às pressas, conseguiu acabar com a briga. Tampouco o Comandante, roubado à redacção do seu discurso. Nem mesmo padre Mariano, cuja intervenção apenas impediu que o Comandante e Ascânio se atracassem.

Mas quando Tieta, alertada por Sabino, apareceu na Praça, empunhando o bordão do velho Zé Esteves, semelhando a Senhora Sant’Ana, e entrou no meio do povo gritando: parem com isso!, todos abriram passagem para ela e tudo serenou. Tarde de mais para salvar a faixa e a tabuleta, mas a tempo de recolher os escombros de Ricardo. Na hora exacta; nem bem levantara e conduzira o sobrinho glorioso (equimoses no rosto e nas pernas) surgiram na Praça em pé de guerra, vindas de horizontes diferentes, a pequena Maria Imaculada, a devota Cinira, a pretendente Edna e a liberta Carol. Também Ricardo possui
eleitorado. Reduzido mas de qualidade.

segunda-feira, novembro 30, 2009

VÍDEO

AS TUAS MÃOS SERVEM PARA PROTEGER


Pensar é
melhor
que Rezar



Este, o título do Manifesto Ateísta de Sam Harris, escritor e filósofo americano, que adverte os possíveis interessados na sua leitura que ele é um espaço para ateus, agnósticos e simpatizantes e todos aqueles que não sendo nada disto se arriscam, ao lê-lo, a plantarem dentro de si “a semente da dúvida”.

Sam Harris discute contra a fé irracional e os seus partidários:

“Em um qualquer lugar do mundo um homem sequestra uma menina, a estupra, tortura e mata. Se uma atrocidade deste género não estiver a acontecer neste momento ela irá acontecer dentro de horas ou dias no máximo.

Esta afirmação resulta da confiança que temos nas leis estatísticas que governam as vidas de mais de 6 biliões de seres humanos, as mesmas estatísticas que também sugerem que os pais desta menina acreditam que, neste momento, um Deus Todo-Poderoso e Todo -Amoroso está assistindo a eles e à sua família.

Terão eles razão em acreditar nisto? Será bom acreditarem nisto?

Não.

A totalidade do ateísmo está contida nesta resposta porque ele não é uma filosofia, nem mesmo uma visão do mundo, tão-somente uma recusa, negar o óbvio e isso é um trabalho ingrato, um trabalho que o ateu não quer.

Vale a pena notar que ninguém precisa de se identificar como um não-astrólogo ou um não-alquimista e por isso nós não temos nomes para designar as pessoas que negam a evidência destas pseudo disciplinas e por esta razão o ateísmo é uma palavra que nem devia existir.

O ateísmo não passa de “barulhos” que as pessoas razoáveis fazem quando na presença de dogmas religiosos.

O ateu é apenas uma pessoa que acredita que os 260 milhões de americanos (87% da população) que reivindicam nunca duvidar da existência de Deus deviam ser obrigados a apresentar evidências não só da sua existência como igualmente da sua benevolência perante a inexorável destruição de seres humanos inocentes que, no dia a dia, testemunhamos por todo o mundo.

No entanto, parece que só ateu é que se apercebe desta situação:

-A maioria de nós acredita num Deus que é tão poderoso quanto os deuses do Monte Olimpo;

-Nenhuma pessoa, sejam quais forem as suas qualificações, pode assumir a um cargo público nos EUA sem fingir que tem a certeza que tal Deus existe;

-Muito do que passa para a vida política daquele país está conforme com tabus religiosos e superstições, como uma teocracia medieval.

Nós vivemos num mundo onde todas as coisas, as boas e as más, são destruídas pela mudança: os filhos perdem os pais, estes os filhos, os maridos separam-se das esposas para nunca mais as encontrarem. Os amigos separam-se sem saberem que é a última vez que se vêem.


Esta vida, quando inspeccionada com um olhar amplo, apresenta pouco mais que um espectáculo de perda e, no entanto, a maioria de nós pensa que há um remédio para isto.

Se não vivermos de acordo com a ética mas dentro de um edifício de convicções religiosas, antigas e estereotipadas, poderemos adquirir o que quisermos depois de morrermos.

Quando, finalmente, os nossos corpos fracassam, derramamos o nosso lastro corpóreo e viajamos para uma terra onde estaremos reunidos com tudo aquilo que amámos enquanto vivos com a vantagem de que, nesse mundo, as pessoas racionais e as “populaças” serão mantidos fora desse lugar feliz e aqueles que acreditaram nisso enquanto vivos, desfrutarão dele por toda a eternidade.

Consideremos a destruição provocada pelo furacão Katrina em Nova Orleans. Mais de mil pessoas morreram, dezenas de milhar ficaram sem as suas casas e os seus bens e quase um milhão de pessoas foram deslocadas.

É seguro dizer que quase todas as pessoas que moravam em Nova Orleans, no momento em que o Katrina passou acreditavam num Deus omnipotente, omnisciente e compassivo.

Mas o que estava Ele fazendo quando o furacão destruiu a cidade deles? Seguramente, Ele ouviu as orações dos homens e mulheres anciãos que fugiram para os sótãos enquanto as águas subiam para depois, aí, muitos deles serem submersos.

Essas, eram pessoas de fé, homens e mulheres que tinham rezado ao longo de todas as suas vidas.

No entanto, só o ateu tem coragem para admitir o óbvio: “essas pessoas pobres morreram enquanto falavam com um amigo imaginário”.


Claro que tinha havido uma ampla advertência efectuada pelos Serviços Meteorológicos com a ajuda das imagens de satélite, foram eles que arrancaram essa informação à natureza porque Deus, mais uma vez, não contou a ninguém acerca dos seus planos e se os residentes tivessem contado, exclusivamente, com a benevolência de Deus, jamais saberiam que um furacão assassino os estava abordando até receberem na cara as primeiras rajadas.

No entanto, num inquérito levado a efeito pelo Washington Post, 80% dos entrevistados, sobreviventes do Katrina, declararam que aquele desastre apenas lhes tinha reforçado a fé em Deus…

Enquanto isto acontecia em Nova Orleans quase mil peregrinos Xiitas morriam espezinhados numa ponte no Iraque.

Não há qualquer dúvida que todos estes peregrinos acreditam poderosamente no Deus do Alcorão: as suas vidas são organizadas à volta da sua existência, as suas mulheres caminhavam cobertas e os seus homens assassinam-se uns aos outros regularmente por causa de interpretações diferentes da palavra desse Deus.

Seria notável se um único sobrevivente desta catástrofe perdesse a fé nele. O mais provável é que os sobreviventes acreditem que foram poupados graças a Deus.

Só o ateu reconhece o narcisismo ilimitado.

Só a ateu percebe como é moralmente censurável para os sobreviventes de uma catástrofe, considerarem-se poupados por um Deus amoroso enquanto, esse mesmo Deus, submergiu crianças nos berços.

Porque recusa encarar a realidade do mundo, sofre, farto da fantasia da vida eterna, o ateu sente nos ossos como a vida é preciosa e, realmente, como é triste que milhões de seres humanos sofram as abreviações mais horríveis da felicidade por nenhuma razão.

Uma pessoa pode pensar que uma catástrofe teria que fazer tremer a fé no mundo. O holocausto não fez isso, o genocídio no Ruanda também não, a morte, no século XX, de 20 milhões de pessoas por varíola, também não.

Realmente, os desígnios de Deus são ininterpretáveis e, qualquer facto, não importa quão infeliz, é compatível com a fé religiosa.

Claro que, as pessoas de fé, asseguram, regularmente, umas às outras, que Deus não é responsável pelo sofrimento humano mas, sendo assim, como podemos nós entender a reivindicação de que Deus é omnipotente e omnisciente?

Não há nenhum modo de entender esta incompatibilidade e está na hora de isso ser confessado.

Se Deus existe, ou ele não pode fazer nada para parar as calamidades ou então pode mas não se preocupa e, sendo assim, ou é impotente ou é mau.

Neste ponto, as pessoas piedosas dirão, simplesmente, que Deus não pode ser julgado por padrões meramente humanos de moralidade mas são exactamente esses padrões que servem para estabelecer a bondade de Deus em primeiro lugar.

E um Deus que se interessa por algo tão trivial como matrimónios ou o nome pelo qual é chamado em oração, não só é inescrutável como igualmente, se o Deus de Abraão existe, é desmerecedor da criação do mundo e do próprio homem.

Há outra possibilidade que é mais razoável e menos odiosa: O Deus bíblico é uma ficção.

Como observou Richard Dawkins nós somos todos ateus no que respeita a Zeus ou a Thor e só o ateu percebeu que o Deus bíblico não é em nada diferente daqueles.

Por conseguinte, só o ateu é suficientemente compadecido para ver a profundidade do sofrimento do mundo.

É terrível que percamos aquilo que amamos; é duplamente terrível que tantos seres humanos sofram desnecessariamente enquanto vivos.

O facto de tanto deste sofrimento poder ser atribuído directamente à religião – guerras religiosas, ódios religiosos, ilusões religiosas – é o que faz do ateísmo uma necessidade moral e intelectual.

Porém, mesmo apesar de ser uma necessidade, o ateu é colocado às margens da sociedade.

O ateu, só por estar em contacto com a realidade, parece vergonhosamente fora de sintonia da vida de fantasia dos seus semelhantes.
(Por favor, não tenhamos medo de raciocinar)

CANÇÕES ROMÂNTICAS BRASILEIRAS

LINDOMAR CASTILHO - TROCO


GIANE - DOMINIQUE


TIETA DO


AGRESTE


EPISÓDIO Nº 292





DA VOLTA DA ANIMAÇÃO OU DE COMO O PAU COMEU


Com a fábrica vai voltar a animação, prometera Ascânio Trindade ao coronel Artur de Figueiredo. Decorridos poucos dias os acontecimentos deram-lhe razão; não se fez sequer necessário o estabelecimento da indústria para a feira de Agreste reaver movimento e entusiasmo dignos dos falados tempos de antanho. Alvoroço de tal magnitude a ponto do beato Possidónio, convencido de que chegara o dia do juízo final, abandonar a cuia de esmolas, entregando-se por inteiro à salvação dos pecadores, brandindo o cajado redentor.

No sábado, arribando de manhãzinha à Praça do Mercado os feirantes depararam com algumas novidades, entre as quais uma faixa, esticada entre duas varas fincadas no chão, propondo a candidatura do Comandante e uma tabuleta, convocando para o comício. Esta última, fazendo parelha, num poste bem no centro da Praça, com o placar do cinema que anuncia sensacional bang-bang no fim-de-semana: Porrada à Beça! Promete.

A princípio, faixa e tabuleta despertaram pouco interesse. A curiosidade dos matutos voltava-se para curiosidades maiores e mais vistosas; os novos postes de luz, da Hidrelétrica de São Francisco, gigantescos, belos, impressionantes. Dois deles já colocados de pé; os feirantes esticavam os pescoços buscando divisar as lâmpadas. Um terceiro, ainda estendido no chão, reuniu curiosos a admirá-lo, em exclamações de pasmo.

Alguns mais letrados soletraram as palavras da faixa, raros se interessaram pela tabuleta, a maioria não sabia ler. Assim a feira começou normalmente, vindo a ganhar influência somente quando Ricardo e Peto começaram a distribuir os volantes. Aí foi aquele deus-nos-acuda.

Gumercindo Saruê, pequeno produtor de farinha de mandioca, contemplara os postes boquiaberto; mal reparara na faixa, nem se dera conta da tabuleta. Um homenzarrão com fama de valente, dado a brigas. Chegou a ser preso num Domingo de cachaça. Armado de foice pusera a correr os dois filhos de siá Jesuina, viúva de cabelo na venta. A viúva não se acomodou enquanto não viu Saruê no xadrez – A cadeia de Agreste, quase permanentemente vazia, ocupa uma das salas dos fundos da Prefeitura, com grades na janela. Ascânio ao tomar conhecimento do acidente, abandonando o bilhar, acalmou a mãe irada, abriu a porta da prisão e mandou Gumercindo em paz. O gigante, agradecido, jurou:

- Conte comigo, seu doutor, para a vida ou para a morte.

Não eram palavras vãs como se verá agora mesmo, pois Ricardo e Peto haviam surgido na feira e começaram a distribuição dos prospectos redigidos pela indignada dona Carmosina em colaboração com o sardónico Aminthas.

Enquanto faixas e tabuletas limitavam-se a anunciar a candidatura do Comandante, com breve referência à poluição, o volante estendia-se sobre as razões da campanha, destinada a salvar Agreste, paraíso ameaçado de podridão.

Citava trechos da crónica de Giovanni Guimarães, baixava o pau na Brastânio, “empresa multinacional destinada a encher o bandulho de estrangeiros à custa da miséria do povo”. Descia igualmente ripa em Ascânio: “aproveitando-se do posto que ocupa, presta-se ao jogo sujo desses criminosos que querem transformar Agreste numa lata de lixo.” Impedir a eleição desse playbói matuto, agente a soldo dos empresários da morte” era obrigação de todos os cidadãos do município.

Ricardo cumpria dever ditado pelo mais puro idealismo; Peto trabalhava contra pagamento prometido por Osnar, um dos financiadores da candidatura do Comandante, mas os dois irmãos, o abnegado e o mercenário, cumpriam conscientemente a tarefa recebida, indo de pessoa em pessoa, feirantes e fregueses, distribuindo os volantes de mão em mão. Sabino, preso ao balcão da loja, não teve participação no início da folgança.



domingo, novembro 29, 2009

VÍDEO

E se a moça sofresse do coração?...


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