sábado, julho 31, 2010


ENTREVISTAS


FICCIONADAS


COM JESUS CRISTO

Entrevista Nº 48


TEMA – AS APARIÇÔES DE MARIA (Fátima)


Raquel – Para levantar o ânimo dos nossos ouvintes, deprimidos, talvez, mas com fortes razões, depois da nossa última entrevista, a unidade móvel decidiu regressar a Nazaré (Nazeraf, em hebraico), uma cidade aprazível. E começar a entrevista de hoje contando a Jesus Cristo uma piada.

Jesus – Uma piada?

Raquel – Sim, sobre a sua mãe.

Jesus – Conta-me, Raquel.

Raquel – Pois aconteceu que um sacerdote chegou ao céu e viu uma criança a chorar. Quem és tu? Perguntou. O menino Jesus, dizem-lhe. E por que chora ele tanto? Explicam-lhe: porque sua mãe, Maria, baixa à terra tantas vezes que não tem tempo para cuidar dele.

Jesus – Devo estar ainda ensonado pois não percebi a graça…

Raquel – Ora veja, Jesus Cristo, a sua mãe desce do céu à terra continuamente. Nestes últimos anos multiplicaram-se as suas aparições por todo o mundo. É realmente uma avalanche: Lourdes, Fátima, Garabandal, Medjugorje, Cuapa, Ostina, Manduria, Arizona, La Rosa Mística… a lista é interminável.

Jesus – Deveras?

Raquel – Imagens de Maria que choram, outras que sangram, silhuetas nas árvores… até num pedaço de piza há pouco tempo a sua mãe apareceu.

Jesus – E o que faz a minha mãe quando aparece?

Raquel – Pede que construam uma Igreja e que rezem o Terço. Uma das aparições mais sonantes foi a de Fátima, Portugal.

Jesus – Conta-me porque eu não sei nada disso.

Raquel – A 13 de Maio de 1917, em Fátima, três pastorinhos viram uma senhora no céu. Alta, loura, vestida de branco…

Jesus – Então, não acho que fosse a minha mãe. Ela era morena, baixita, com uma túnica cor de terra… e em que língua falava?

Raquel – Em português.

Jesus – Em português?

Raquel – Poucos meses depois ocorreu o milagre do sol. Um prodígio que foi contemplado por 70.000 pessoas.

Jesus – E o que se passou, diz-me Raquel.

Raquel – Ao meio-dia, depois de horas e horas de espera, os três pastorinhos viram sua mãe Maria aparecer. Então o sol começou a girar, a girar, a pôr-se roxo e a desmoronar-se sobre as pessoas aos gritos…

Jesus – Que coisa tão terrível…

Raquel – Quando a bola de fogo ia a cair sobre a multidão o milagre terminou e o sol regressou ao seu lugar no céu.

Jesus – E por que chamas milagre a essa calamidade?

Raquel – Eu não. Os representantes do senhor no Vaticano consideram-no oficialmente um milagre portentoso. O senhor, Jesus Cristo, que é o filho dela e o representado por eles que opinião tem destes factos?

Jesus – Que Deus faz nascer o sol todos os dias sobre os bons e os maus, sobre os inteligentes e os tolos.

Raquel – Não o entendo.

Jesus – Só há um sol no céu, não é verdade, Raquel? O sol que essas pessoas viram nesse dia era o mesmo em todo o mundo. Se o sol se tivesse desviado do seu caminho, todos os filhos de Deus se teriam dado conta. O milagre não foi aquele que foi visto por uma minoria, o milagre foi a maioria não o ter visto.

Raquel – Mas, que se passou então em Fátima? Tanta gente não pode ficar alucinada ao mesmo tempo.

Jesus – Teriam comido alguma coisa? Não estariam desfalecidos depois de tantas horas de espera?

Raquel – O senhor não acredita no milagre de Fátima?

Jesus – Recorda-me as histórias que o meu avô Joaquim nos contava em criança para nos assustar…

Raquel – E as outras aparições de sua mãe Maria?

Jesus – A minha mãe não necessita de igrejas, nem de rosários. A minha mãe não joga às escondidas. Deixa isso, Raquel e conta-me histórias mais divertidas.

Raquel – Não sem antes encerrar o programa e despedir-me dos nossos ouvintes que estarão perguntando, me parece, até onde iremos chegar…

Da Nazaré, Raquel Perez, enviada especial.



NOTA


Uma Crença Oficial – Que Maria, mãe de Jesus, aparece às pessoas na terra é uma crença oficial que a igreja católica certifica e difunde activamente. A primeira destas aparições mais parece ter sido um caso de ubiquidade (conseguir estar em dois lados diferentes em simultâneo). Maria, ainda em vida, no ano 39, teria aparecido ao evangelista Santiago (também apóstolo e, na realidade, seu filho, irmão de Jesus) que nessa data estaria a pregar o Evangelho em Zaragoza, Espanha.

Desde então para cá as aparições contabilizadas pela Igreja católica em vinte séculos somam mais de quinhentas. Nas últimas décadas do século XX chegaram ao Vaticano informações de 1.500 aparições em mais de 30 países do mundo. Aprovadas oficialmente foram apenas umas 20, entre elas, Guadalupe, no México, Lourdes, em França e Fátima em Portugal.

Branca, Loira e Ocidental – É curioso que depois das “aparições” as imagens, pinturas e esculturas que aparecem é de Maria branca, loura,
com traços ocidentais, quase sempre vestida de branco e azul, cores que ela nunca vestiu na sua vida pois era uma pessoa pobre, camponesa que vestia cores pardas enquanto que o azul e o branco estavam apenas reservados para as mulheres ricas de Jerusalém que as podiam comprar.

Por outro lado, as intervenções desta Maria “aparecida” são sempre de apoio à doutrina e devoções oficiais da Igreja católica e nunca de apoio às mensagens inovadoras e ensinamentos de seu filho, como seria normal. Insistem sempre nos mesmos pontos: construam uma igreja, rezem o Terço, façam sacrifícios para a salvação do mundo e advertências sobre o inferno quando, Jesus Cristo, questionava as rezas repetidas, enfrentou os sacerdotes, não ia aos templos, recusou sacrifícios e nunca pregou sobre o inferno.

O Dia em que o Sol Brilhou – Na sexta “aparição” de Maria em Fátima, Outubro de 1917, ocorreu o milagre do sol anunciado três meses antes. Segundo as crónicas da época 70.000 pessoas na Cova da Iria e outros milhares 40 milhas em redor, numa manhã de chuva torrencial viram a chuva cessar e aparecer o sol que depois de dar três voltas sobre si mesmo desceu vertiginosamente sobre a terra para regressar depois à sua posição inicial. Este prodígio demorou uns dez minutos.

O Director do Laboratório Astronómico de Lisboa declarou aos jornalistas: “Se fosse um fenómeno cósmico os Observatórios Astronómicos tê-lo-iam detectado com exactidão” mas a Igreja reconheceu oficialmente este fenómeno como um milagre.

Praticamente, toda a história oficial do que aconteceu em Fátima nesse dia e desde que começaram as “aparições” foi extraída da memória de Lúcia já que os irmãos, Francisco e Jacinta, morreram muito jovens pouco tempo depois destas ocorrências. Lúcia, já adolescente, entrou para um convento onde aprendeu a ler e a escrever. Vinte anos depois destes acontecimentos em Fátima, Lúcia recebeu do Bispo de Leiria, José Alves Correia da Silva, ordem para contar tudo por escrito. Em finais de 1935 um texto com as primeiras memórias depois do qual escreveu mais cinco versões. Estes escritos são a única fonte para conhecer a história oficial de Fátima.

Uma Mensagem Nova: O Aborto – Em alguma das suas mais recentes “aparições”, Maria começou a falar sobre o aborto, um tema que é obsessivo para a hierarquia católica.

Os videntes de Oliveto, Itália (1985), a vidente Mike Siate, do Texas (1988), a vidente coreana Júlia Kim (1985), o vidente dos E.U. John Dorwns, todos eles manifestam grandes preocupações com o aborto a ponto de estar a surgir uma nova devoção nos EU. que está alastrando à América Latina: “O Terço dos Não Nascidos”em que cada conta do Rosário é uma lágrima com um feto inserido.


O Fenómeno das Aparições na Igreja Católica – O historiador mexicano Rodrigues Martinez Baracs afirma algo que não só se aplica às “aparições” de Nª. Sª. de Guadalupe como igualmente a todas as outras aparições:

- “A questão é a maneira como a Igreja Católica se relaciona com a verdade, com a ciência, com esse sentido do real e do verdadeiro que compartilhamos com todos os seres humanos para além dos nossos credos ou nacionalidades. Ao obstinar-se num “aparicionismo” estreito e mal provado, a Igreja Católica encerra-se em si mesma, procurando crescer e fortalecer-se, para se separar das outras religiões da maltratada comunidade humana”.

As “Aparições e os Interesses Financeiros - O “aparecionismo” católico reforça-se continuamente. Há interesses tanto ideológicos como financeiros atrás de cada uma das aparições. Durante o seu Pontificado o Papa João Paulo II apoiou activamente as fraudulentas “aparições” de Medjugorje, em terras croatas convertendo, dessa forma, esse lugar num centro nevrálgico financeiro de uma empresa multinacional, de acordo com as investigações do escritor britânico David Yallop no seu livro “O Poder e a Glória”.

Em 2007, o Vaticano fez-se sócio de uma Linha Aérea, Mistral Air, que se dedica a transportar peregrinos desde Roma para os santuários marianos de Lourdes (França), Fátima (Portugal), Guadalupe (México) e Czestochowa (Polónia). Os aviões vão pintados com as cores papais, branca e amarela e levam a bordo assistentes que durante as viagens animam os peregrinos com preces e cânticos.

George Carlin - O Aborto e os "cruzados morais"
a linguagem poderá não ser a mais bonita... o estilo o mais pousado... mas a verdade está lá... brutal e chocante.

CANÇÕES ANGLO - SAXÓNICAS

STUMBLIN' - SUZI QUATRO & CHRIS NORMAN



DONA
FLOR


E SEUS
DOIS

MARIDOS




Episódio Nº 186


Não lição de cosmografia, pedante e ingénua, não, galanteio ardente, sua maneira de coibir a timidez e lhe ofertar a magia da noite e seu amor. Dona Flor, toda de estrelas e ciência recoberta, a cabeça reclinada no peito no peito do doutor, já mais em sossego e no prazer de tais conhecimentos, quis saber:

- Vénus não é também a deusa do amor? Uma sem braços?...

Bem outra coisa desejava lhe dizer: “com sua luz ela fulge sobre nosso leito, é nossa boa estrela; não tenhas medo meu querido, não me ofenderás se tomares de mim com doido ardor, se arrancares num afã, num arrebatamento, esse vestido que Rosália me mandou do Rio, se me puseres nua coberta só de estrelas, e se em mim montares e partirmos, égua e garanhão por esse campo de mangueiras e cajus, põe esse mar de canoas e saveiros”.

Mas cadé coragem para lhe dizer?

Sorrindo, o doutor lhe apertou a mão num gesto ousado, sua mão tremia. “Sim, era a deusa do amor da mitologia grega, e a escultura célebre, criação do génio clássico…

Dona Flor de novo constatou como igualmente a ele faltava intrepidez para ser bruto e louco, para romper o muro a separá-los. Tamanho homem de saber tamanho e não sabia como tomá-la e possuí-la. Quanto a ela, ah!, Teodoro, por mais deseje, não lhe compete a mínima iniciativa. Já quase ultrapassara os limites do devido, pois de direito não pode a esposa oferecer-se à excitação de seu esposo sem passar por sem-vergonha, por concorrer com mulher da vida, por descarada. Compete ao marido, meu Teodoro.

Aos trancos e barrancos lá ia ele em seu esforço. Já lhe tendo dado um colar de astros por adorno, lhe ofertava agora a riqueza dos monopólios desse mundo e, de quebra, a luta dos povos contra os trustes:

- Dizem que por aqui há um lençol subterrâneo de petróleo, imenso, uma riqueza tal, bastante para tornar nosso povo poderoso…

Rios de petróleo, torres, perfurações e poços, tudo aos pés de dona Flor; que não lhe daria ele nessa noite de esponsais?

- Também já ouvi dizer… Foi tio Porto, ensinava por aqui…

Dona Flor descansou a cabeça no peito do marido. Lá fora, perfumada de jasmim, permanecia a noite, a mesma a acompanhá-los no táxi a caminho da casa-grande do doutor Pimenta e de dona Flor nas lonjuras de São Tomé de Paripe. Noite de lua num céu próximo e fulgurante onde estrelas nasciam umas das outras, anónimas, mas logo eram classificadas pela polimorfa erudição do farmacêutico (só dona Gisa para emparelhar com ele na sabedoria):

- …bem aqui em cima, sobre os jenipapos, as Três Marias…

A lua cheia rasgava a escura e densa água do mar, negrume de petróleo, mar de golfe em tranquila mansuetude. Lanternas saveiros, cometas errantes e vermelhos no rumo de plantações de cana verde e de tabaco, nas margens do rio Paraguaçu, onde agonizam vilas e cidades de antigamente.

Um mar interior, macio de bonança, morno e quieto, e a brisa suave entre a jaqueira e o pé de fruta-pão. Dona Flor considera a beleza do luar cobrindo as águas, as areias, as canoas, os saveiros. Mar de repouso e paz.

Não o mar oceano de barra fora, feroz e perigoso, de vagas e correntes submarinas, de enganosas marés; livre mar de solta ventania, de loucos temporais, mar de tempestades – desdobrando-se no caminho das pequenas casas ilegais de Itapoã, onde o amor irrompe em aleluia. Mar de violência desatada; não esse adocicado perfume de jasmim, mas o de
maresia, ardido cheiro de
sargaços, de algas e ostras, gosto de sal. Por que lembrar-se?

sexta-feira, julho 30, 2010

VÍDEO

é o sonho americano... e não só. As legendas estão em castelhano, são muito rápidas mas o essencial da mensagem dá para entender.

CANÇÕES ANGLO- SAXÓNICAS

DEAN MARTEN - BLUE MOON
Na segunda noite de núpcias de dona Flor em que Jorge Amado mostrou, masgistralmente, como os astros podem atrapalhar, nada mais a propósito de que o "Blue Monn" pela voz mais romântica da América, Dean Marten.


DONA FLOR
E SEUS DOIS
MARIDOS


Episódio Nº 185




Por que, meu querido, esse medo, esse temor? Por que não me tomas em teus braços, não me beijas a boca, não me levas para o leito? Não vês como espero impaciente, não enxergas a fome em minha face, não ouves meu coração descompassado, não advinhas minha ânsia? – dona Flor tinha também revelações de estrelas em seu céu nocturno, secreta astronomia.

A seu lado, na janela, tendo-a contra o peito, pensa doutor Teodoro em como agir para não magoá-la, não feri-la por indecente ou chulo. Cuidado, Teodoro, não te afobes nem te apresses, por imprudência és capaz de por tudo a perder; podes lhe dar, a esta criatura tão direita, um choque do qual ela jamais se refaça.

Não confundas, na cama, tua esposa com mulher da vida, com despudorada marafona; com meretriz paga para satisfação do homem, para o vício, de quem se abusa e com quem se pode agir sem levar em conta a compostura e o pundonor. Para a luxúria existem as raparigas e seu triste ofício. As esposas são reservadas para o amor. E o amor, tu o sabes, Teodoro, é feito de mil coisas diferentes e importantes. Inclusive de desejo, mas de um desejo tão do espírito como da matéria; cuidado em não torná-lo sórdido e obsceno. Esposa exige prudência, sobretudo no trato de coisas de tal delicadeza, e a noite de núpcias é sempre decisivo ponto de partida para uma vida feliz ou infeliz. Ainda mais quando a esposa teve a amarga experiência de um primeiro matrimónio desastroso.

Pelo que lhe contaram fora não apenas amarga mas dolorosa e cruel aquela primeira experiência, fora tão-somente sofrimento e humilhações. Deves ser, por isso mesmo, um marido tão dedicado e terno que consigas arrancar do coração sofrido da esposa até à última lembrança de uma vilania ou de uma falta de respeito. Sim, ele lhe dará quanto lhe faltou, e nunca motivo para sofrimento e humilhações.

Naquela hora de inibido anseio, de busca de compreensão e ternura, cada qual com seus enganos, numa rede de equívocos, tacteando às cegas um caminho, pelo céu partiram impávidos astronautas, e assim puderam reencontrar na órbita das estrelas a necessária calma e alguma intimidade.

Doutor Teodoro era familiar da carta do céu, do mapa do universo, conhecia nomes de constelações e cometas, número e grandeza dos astros nas galáxias - com o dedo a indicar nos recantos do infinito a mais pura estrela, e logo a recolhendo com seu saber e sua grande mão. Ali a punha, no rebordo da janela, sobre a pequena mão da esposa.

Naquela noite de núpcias ele lhe deu o que jamais amante algum a sua amante pôde oferecer: colar de astros com luz divina e com os volumes, os pesos e as medidas, sua posição no espaço, sua elipse e sua distância exacta. Com o dedo doutoral ele no céu os elegeu, dispondo-os numa ordem de grandeza: no colo de dona Flor os astros translúcidos refulgiam.

Aquela estrela grande em teus cabelos, aquela quase azul, colhida na fímbria do horizonte, a que mais brilha, a maior de todas, ah!, querida minha, é o planeta Vénus, impropriamente designado estrela da tarde ou vespertina quando acesa no crepúsculo e na noite, e estrela da manhã ou matutina, ou estrela d’alva, quando irrompe com a aurora sobre o mar.
Em latim, oh! bem-amada, se diz stella-maris, estrela a guiar os navegantes…

quinta-feira, julho 29, 2010


DONA FLOR
E SEUS DOIS
MARIDOS

Episódio Nº 184




Tendo comprovado mais uma vez a ordem absoluta e o irrepreensível asseio, dona Flor foi saindo devagar, em seu passo de obesa:

- Fiquem à vontade seus anjos… Não preciso desejar boa noite… - mesmo querendo ser maliciosa era apenas bonachona e maternal: conhecera doutor Teodoro ainda estudante, contemporâneo e companheiro de seu filho, o médico João Baptista. – Com vocês, sabem quantos casais passaram a lua-de-mel neste quarto, depois de estarmos aqui em São Tomé? Dezassete… Ou dezoito? Nem sei, só contando…

Um agrado no rosto de dona Flor, um piscar de olhos para o farmacêutico:

- Durmam de um sono só, sossegado… - a risada frouxa, balançando-lhe as bochechas, ressoou pela casa, trazendo do quarto da frente a voz do doutor Pimenta numa repreensão (lá está Filo a atazanar os hóspedes.)

- Vem dormir, mulher… Deixa os outros em paz…

_ Só estou vendo se falta alguma coisa… - um último olhar da porta: - Meus pombinhos…

Viram-se dona Flor e doutor Teodoro um diante do outro no quarto enorme: encabulados, inibidos. Inibição a acumular-se durante o dia com as piadas das comadres, com as facécias das alunas. Os chistes idiotas, as chalaças dos vizinhos. Tanto no acto civil como na Igreja cada um dos convidados revelou-se mais engraçadinho e persistente em sua malícia. O banqueiro Celestino dissera cada uma de arrepiar, era português de boca suja; o táxi partindo e ele ainda em deboche e arrelia. São sempre assim as bodas de viúva, no tempero da galhofa rude, com o sal dos ditos ordinários. Pois se até dona Flor, a pessoa melhor e mais acolhedora, se até ela saíra do sério para fazer troça, recomendando prudência ao boticário. Ali, no quarto, a inibição aumentara. Morrendo de sem jeito, permaneciam mudos, sem se olhar, como dois matutos.

Doutor Teodoro andou para os grandes janelões abertos sobre o jardim no visível intento de fechá-los. Por eles a noite penetrara inteira quarto adentro: o luar, as estrelas, o coaxar dos sapos, um rumor de caranguejos e aratus, brilho de peixes como lâmina de aço no escuro do mar, e a mariposa azul-marinho com manchas de ouro, obstinada em torno do lustre. A brisa vinha de entre os coqueiros e as mangueiras; num baque surdo, morcegos derrubavam sapotis em voo raso de sombras e fantasmas no charco de grilos e de rãs.

Dona Flor num ímpeto – era preciso transpor aquela barreira a separá-los, aquele impasse inicial e bobo – veio para junto do marido, debruçando-se no peitoril da janela. Doutor Teodoro vencendo a timidez, aconchegou-a em seu peito; com a mão livre apontou a noite de lua, no rumo da distância.

- Está vendo, querida? – dizia querida ainda a medo, num esforço – Ali, no alto? É o Cruzeiro do Sul…

Eis que ela sempre desejara vê-lo, desde menina.

- Onde? Me mostre, meu querido…

quarta-feira, julho 28, 2010

CANÇÕES PORTUGUESAS

ANA MOURA - NÃO FUI EU
O autor é o Jorge Fernando que respira fado por todos os lados e Ana Moura dá-lhe a voz que nos encanta.

CANÇÕES ITALIANAS

ADRIANO CALENTANO - Il TEMPO SE NE VA (1978)
Os seus fãs, os que assistiam aos seus concertos, consideravam-no o melhor cantor que conheciam... ele era vida! ... ouvindo a sua voz, a música e as letras das suas canções percebe-se, mesmo a esta distância, a razão dessa preferência, desse encantamento.


ENTREVISTAS


FICCIONADAS


COM JESUS CRISTO


Entrevista Nº 47



TEMA – A SANTA INQUISIÇÂO?



Raquel – Continuamos em Jerusalém e continuamos a receber reclamações e até ameaças. Alguns ouvintes fundamentalistas dizem que se Jesus Cristo continua a falar assim exercerão represálias contra a nossa Emissora.

Jesus – E por quê um coração tão duro como o destes ouvintes?

Raquel – O senhor sofreu na sua própria carne a intolerância. Intolerância, que sempre andou de mãos-dadas com a religião… como prova trago hoje um documento gravado. Gostaria que o escutasse para início do nosso programa.

Jesus – Sim, faz-me ouvi-lo.

Narradora – Atavam-lhe os pés e as mãos e estiravam-nos até lhes rebentarem os ossos. Sentavam-nos em selas com bicos, escaldavam-nos com água a ferver pela boca e ouvidos…

Inquisidor – Confessa, maldita, bruxa, confessa que tiveste relações carnais com o diabo!

Narradora – Trespassavam-lhe o corpo com pregos, cortavam-lhe a língua, os peitos, espetavam-lhe as mãos, violavam-nas perante seus maridos e filhos… e depois queimavam-nas na fogueira.

Jesus – Não prossigas. Por que me fazes escutar essas abominações?

Raquel – Porque os verdugos eram seus representantes.

Jesus – Meus? De que estás falando, Raquel?

Raquel – O que o senhor escutou passava-se nos Tribunais da Santa Inquisição.

Jesus – Como é que tu chamas Santa a algo assim?

Raquel – Era assim que lhe chamavam, Santa. Tenho os dados, queres conhecê-los?

Jesus – Conta-me.

Raquel – São muitos os que coincidem na afirmação de que a Inquisição terá sido a página mais vergonhosa da história da Igreja. Foi iniciada há uns mil anos pelo Papa Inocêncio III, para perseguir hereges… o mesmo que impôs o sacramento da confissão. Os Papas que vieram a seguir criaram os tribunais, aprovaram o extermínio maciço de mulheres em todos os países cristãos. Acusavam-nas de serem bruxas.

Jesus – E quem eram essas filhas de Deus às quais chamavam bruxas?

Raquel – A maioria eram camponesas, mulheres pobres, parteiras… mas também havia mulheres sábias que conheciam os segredos da natureza… diziam que estavam possuídas e torturavam-nas para lhes tirar o diabo do corpo.

Jesus – E os diabos eram eles…

Raquel – Se leres as crónicas nunca ficas a saber quem as acusava nem do que eram acusadas e se negassem as torturas seriam mais cruéis. Se por medo admitiam estar endemoniadas concediam-lhes a graça de as estrangularem antes de as deitarem à fogueira. Também torturavam e matavam homens, pessoas do campo, aldeões… as famílias tinham de entregar seus bens aos sacerdotes… e tudo isto em seu nome, Jesus Cristo.

Jesus – Não em meu nome…diz-me, Raquel, durante quanto tempo demorou essa abominação?

Raquel – Prolongou-se por séculos.

Jesus – E morreram muitos filhos de Deus às mãos desses demónios?

Raquel – Alguns falam de centenas de milhares, outros, mais ainda…

Jesus – Na verdade, te digo: foi a hora do poder das trevas.

Raquel – Bem, o Papa João Paulo II já pediu desculpas pelos erros que a Inquisição cometeu.

Jesus – Erros? Desculpas por milhares e milhares de mulheres torturadas e queimadas vivas? Esses crimes não se apagam com um pedido de desculpas.

Raquel – Quer dizer que o senhor não os perdoava?

Jesus – Tinham de arrancar o mal pela raiz.

Raquel – Arrancar o quê?

Jesus – A árvore na crença no diabo. Foi essa árvore que deu frutos tão podres como os que me contaste hoje. Eles têm de ser arrancados pela raiz… têm que dizer claramente que o diabo não existe nem nunca existiu… dizerem que o diabo foram eles. Só assim serão perdoados.

Raquel – De Jerusalém, Raquel Perez, Emissoras Latinas.


NOTA


O Princípio – Tudo começou quando o Imperador romano Constantino se “converteu” ao cristianismo que passou a ser a religião oficial do Estado. Todos aqueles que discordavam da doutrina oficial, que nesse século começou a ser a doutrina dos Papas de Roma, eram considerados traidores e inimigos do Estado, delinquentes políticos.


Os Cátaros ou Albigenses – Questionaram o poder Papal. Chamavam-lhe “O Anticristo” e à Igreja de Roma “A Puta da Babilónia”. Os cátaros eram contrários ao luxo e ao poder, comportavam-se como ascetas: não comiam carne, não contraíam matrimónio, negavam-se a usar armas e recusavam os altares, os santos, o culto das imagens e as relíquias.

O Papa Lúcio III decidiu acabar com eles militarmente e emitiu a bula “Ad Abolendan” que exigia aos Bispos que estripassem a heresia. Esta bula foi o gérmen da Santa Inquisição.


Os Autos de Fé: Um Espectáculo – Constituíram uma das mais importantes manifestações públicas do poder intimidatório da Inquisição. Desenrolavam-se nas Praças públicas e a eles assistiam multidões. Todos os pormenores, como num espectáculo teatral, eram cuidados para provocar nos espectadores medo, respeito pela autoridade, curiosidade mórbida, arrependimento, recusa e desprezo pelos hereges.



O Maior Horror: A Queima das Bruxas – Para acusar uma mulher de ser bruxa, ou seja, de ter um pacto com o demónio, bastava uma simples suspeita sendo válidas todas as confissões obtidas sob tortura. E quais eram as acusações?
- Renegar Deus, prestar homenagens ao demónio, oferecer-lhe filhos antes de eles nascerem, matar os filhos para com eles fazer poções mágicas, comer carne humana, profanar cadáveres, beber sangue e ter relações carnais com o diabo.


As Razões da Queima das Bruxas – É evidente, que, por detrás da queima das “bruxas”, estava uma ideologia misógina (ódio pela mulher, ódio ao feminino) que era sentida pelos funcionários da Igreja. A própria palavra latina “fémina” de onde deriva feminina, significa fé menor, de fé mais débil, por isso atacadas prioritariamente pelo diabo.


Até aos Dias de Hoje – A Congregação da Doutrina da Fé do Vaticano, nome moderno da Inquisição, tinha no actual Papa, ao tempo, Cardeal Ratzinger, o Perfeito, o Inquiridor Mor.

Claro que já não manda para a fogueira mas continua a condenar os teólogos de todo o mundo por julgar que as suas ideias contradizem a doutrina oficial. Com métodos idênticos aos medievais: processos secretos, informadores que denunciam anonimamente, julgamentos à porta fechada, juízes que são ao mesmo tempo os acusadores e sentenças sem possibilidades de apelação para qualquer tribunal independente.


A Intolerância Fanática da Inquisição – Nasceu de um excesso de poder e de arrogância. Em 1990, depois de João Paulo II ter proposto a revisão do caso Galileu, o mais escandaloso e mediático dos levados a cabo pela Inquisição de Roma, (que nunca chegou a reabilitar o grande cientista), o Cardeal Ratzinger, Perfeito da Congregação e hoje Papa, afirmou:

- “Na época de Galileu a Igreja foi muito mais fiel à razão que o próprio Galileu. O processo contra Galileu foi razoável e justo.”

Anos depois, num programa de televisão alemão, intitulado “Contraste”, pouco antes de ele ser eleito Papa, quando lhe chamaram “O Grande Inquisidor”, Ratzinger respondeu:

- “Esse título é uma classificação histórica mas, de certa forma, damos-lhe continuidade e, segundo a nossa consciência do direito, tentamos fazer hoje aquilo que se fez com os – em parte criticáveis – métodos de então”.

E justificou aquela etapa horrenda da história eclesiástica pelo avanço que ela significou pois, antes de condenar alguém, deve-se escutar esse alguém. Estas, as suas palavras:

- “No entanto, deve dizer-se, que a Inquisição constitui um progresso: ninguém pode ser julgado sem ser inquirido, ou seja, primeiro têm que fazer-se investigações”.


....AS FOGUEIRAS ACABARAM MAS A ARROGÂNCIA CONTINUA!

CANÇÕES ANGLO - SAXÒNICAS

HERBERT ALPERT - RISE 1979



DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS








IV PARTE





DA VIDA DE DONA FLOR, EM ORDEM E EM PAZ, SEM SOBRESSALTOS NEM DESGOSTOS, COM SEU SEGUNDO E BOM MARIDO, NO MUNDO DA FARMACOLOGIA E DA MÚSICA DE AMADORES, BRILHANDO NOS SALÕES, E O CORO DOS VIZINHOS A LHE RECORDAR SUA FELICIDADE (COM DOUTOR TEODORO NUM SOLO DE FAGOTE)


terça-feira, julho 27, 2010

VÍDEO

Com um amigo destes para que precisa ele de um irmão para brincar?...

CANÇÕES LATINO - AMERICANAS

LEONARDO FÁVIO - LLOVIA Y LLOVIA
Excelente canção de Leonardo Fávio, argentino, nascido em 1938. Produtor e Director cinematográfico, Guionista, Compositor e Cantor especializado em baladas românticas latino-americanas nas décadas de 60 e 70.

CANÇÕES ANGLO - SAXÓNICAS

ELVIS PRESLEY - GREEN, GREEN GRASS OF HOME
A sua maior virtude era a voz. O alcance vocal que atingia, segundo os especialistas, permitia-lhe notas musicais muito difíceis para um simples cantor popular. O timbre da sua voz destacava-o de todos os outros sendo, por isso, considerado por muitos o melhor cantor de século XX.


DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS


Episódio Nº 183


Acostumavam-se um ao outro e já sentia dona Flor ternura por aquele homem calmo e bom, seu tanto solene e sistemático, exigindo tudo em seu lugar e em hora certa, mas incapaz de uma indelicadeza, cheio de atenções e sem dúvida morto de amor por ela. Já agora, ao chegar e ao despedir-se (e vinha diariamente, acabara-se aquela bobagem, tão criticada por dona Gisa, de visitas só três vezes por semana), ele a beijava nos lábios, levemente. Com sua boca forte apenas tocava a boca da viúva. Ela sentia ganas de mordê-lo, num beijo de verdade.

Uma noite tinham ido ao cinema, mas como acontecia cada vez que saíam com seu Ruas, chegaram atrasados, a sessão tivera início e na sala cheia não conseguiram lugar para os quatro na mesma fila, ficando dona Flor e doutor Teodoro lá na frente, incómodos. Incómodos para ver o filme, a tela muito próxima, mas sozinhos na fila e de mãos dadas. Certo momento ele aflorou-lhe os lábios de manso, mas ela abriu os seus e o beijou deveras. Foi o primeiro beijo que trocaram, carícia de homem e de mulher, os outros tinham sido ósculos e não beijos. Faltava uma semana para de todo completarem, ante o juiz e o padre, os esponsais. Aquele beijo como que inaugurou a sua intimidade, destruindo o pejo e a vergonha a fazer daquele o mais cerimonioso dos noivados.

Com esse beijo de verdade sonhava dona Flor todas as noites, dando em sua insónia, razão a dona Gisa: se iam casar daí a dias por que diabo não matar de uma vez a fome e a sede a devorá-los? Não fizeram, é claro, nem jamais falaram nisso, nem uma insinuação sequer. Daquele beijo, porém, nasceram outros, e as mãos se apertaram, juntaram-se as cabeças no escuro do cinema. Naquela noite dona Flor dormiu tranquila e em repouso, depois de muitos meses.

Assim chegou dona Flor, honrada e mansa, ao dia do seu segundo matrimónio. A casa, uma beleza, parecendo nova com a pintura a óleo, um fascinante lustre de penduricalhos, a placa da escola a reluzir. Outra disposição dos antigos móveis, completando-se com os recém-adquiridos, como a escrivaninha e sua cadeira giratória: no leito de ferro (agora azul) o colchão de molas, suco dos sucos, um xispeteó.

Da parede da sala tinham sido retirados os retratos coloridos de dona Flor e do primeiro esposo. Em seu lugar, na véspera do casório, foi posto o quadro de formatura do farmacêutico, onde, em meio aos colegas, ele sorria de beca negra, em trajes de doutor.

Não ficava bem manter o falecido a presidir a casa, segredou dona Norma a dona Flor. Tinha razão, mas dona Flor não quis na parede apenas seu retrato: um retrato de mocinha, da mocinha que ela fora, sem juízo, tola menina aflita, na idade de sofrer, a mulher do jogador; não a dona Flor de agora, mais gorda um pouco e mais pousada, a esposa do doutor, madura para a conquista da felicidade.

Todos o diziam, sem excepção, aquele mundo de convidados a lotar a igreja, inclusivé o banqueiro Celestino, ocupadíssimo, chegando com atraso, como já sucedera com o primeiro casamento, no último instante na Igreja de São bento. No começo da noite enluarada, quando já os noivos iam a entrar no táxi que os conduziria para fora da cidade, para as núpcias na quietude de São Tomé de Paripe, no golfo verde-azul da Bahia de Todos os Santos, com estrelas inúmeras e coral de sapos – todos diziam, até dona Rozilda:

- Desta vez, sim, ela acertou; vai ser feliz.

Desta vez sim, todos diziam sem excepção.

segunda-feira, julho 26, 2010


DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS


Episódio Nº 182



Assim foi a alegre festa de noivado. Nas voltas que o mundo dá, o doutor Teodoro veio parar nas ante-salas do leito de dona Flor, na fímbria de sua espera. Todo escabriado não tinha experiência de namoros e conquistas, seu trato mais íntimo com mulheres reduzindo-se ao encontro semanal com Otaviana. Se um dia o farmacêutico vira na rapariga a trêfega Tavinha Manemolência, recebendo ela então além da moeda sonante o agrado de uma palavra doce, com o passar do tempo aquele tráfico de sentimentos reduziu-se a um hábito de gentilezas e cordialidades, de confortáveis atenções, com doces e licor, conversa e cama, despido de galanteios e ternuras de namoro ou de xodó.

Na despedida novamente dona Flor ofereceu a face ao casto ósculo (ou medroso ou tímido, mas sobretudo acanhado) do prometido noivo. Mas sentiu o tremor de sua mão ao tocar-lhe os dedos húmidos. Pensou que o doutor Teodoro também queimava por dentro, igualzinho a ela.

Naquela noite dona Flor sonhou com ele e só com ele e o viu um gigante moreno, forte, invencível, o peito largo, um zarro, como dizia dona Gisa estalando a língua: vinha e a arrebatava.

Assim foram os esponsais de dona Flor. Pelas ruas em torno não se discutia outra coisa. Aliás, não era discussão e, sim, assentimento unânime. Não surgiu voz discordante, todos simpatizando com o noivado do boticário e da viúva, feitos um para o outro, na opinião geral.

Primeiro dona Flor estabeleceu um prazo de pelo menos meio ano para a data do casório. Foi essa uma das raras proposições discutidas pelo noivo. Por que tanto tempo? – quis saber doutor Teodoro, se não tinham enxoval a preparar, problemas a resolver? De acordo com ele estavam amigas e comadres e a própria dona Flor veio-lhe a dar razão, reduzindo a três meses aquele tempo de timidez, de sofreado anseio.

Três meses de bonança, quando foram se acostumando (facilmente) um com o outro e se deram bem, melhor a cada dia. Nesse período, nos serões de conversas longas, com a participação de dona Norma ou de outra amiga, decidiram sobre todos os detalhes da vida em comum a ser iniciada em breve.

Acertaram morar em casa de dona Flor, não só porque para o doutor Teodoro era cómodo, ficando a residência próxima à drogaria, como porque dona Flor se recusara, terminante, a encerrar as actividades da escola, como ele propusera. A farmácia lhe rendendo o bastante para viverem com modesto conforto – argumentou doutor Teodoro – por que manter aquela trabalheira?

Mas dona Flor acostumara-se e certamente não saberia viver sem as suas alunas, as turmas ruidosas, as risadas, os diplomas, o discurso e as lágrimas na formatura e um dinheiro seu. De maneira alguma nem falasse nisso.

No mais, tudo de acordo. Mesmo o leito de ferro, pelo qual ela sentia secreta estima, agradando-lhe sua forma antiga, e por cuja sorte temera – talvez não quisesse o doutor dormir na cama onde o primeiro esposo a possuíra tantas vezes – não foi motivo de debate. Quando, num balanço, estabeleceram a relação do que comprar para compor a casa a seu agrado (uma escrivaninha onde o farmacêutico tomasse suas notas e guardasse seus papéis, por exemplo, foram de peça a peça a examinar e decidir; chegando ao quarto ele propôs comprar novo colchão, estando o velho cheio de calombos, de altos e baixos. Existiam uns colchões de mola, novidade recente, magníficos. Ele mesmo tinha um mas de solteiro.

Quanto ao leito, não valeria a pena pintá-lo, já que iam pintar a casa e
certos móveis? E foi tudo.

CANÇÕES BRASILEIRAS

REGINA DUARTE - TEMA DA NOVELA "VÉU DA NOIVA"
Uma das mais lindas canções da MPB e Regininha foi a sua melhor intérprete, cheia de graça e de charme...

CANÇÔES ANGLO - SAXÓNICA

ELVIS PRESLEY - TAKE MY HAND PRECIOUS LORD
esta canção é da autoria de Thomas A. Dorsey, em 1939, depois da morte da sua primeira mulher e do flho também falecido durante o parto. Ninguém a interpretaria com mais sentimento e dor do que o Elvis Presley

domingo, julho 25, 2010


ENTREVISTAS


FICCIONADAS


COM JESUS CRISTO

Entrevista Nº 46


TEMA – EXISTE O PURGATÓRIO?



Raquel – Emissoras Latinas continua junto das antigas muralhas de Jerusalém e novamente damos as boas vindas ao nosso convidado especial, Jesus Cristo.

Jesus – A paz seja contigo, Raquel.

Raquel – O senhor falou do inferno e dos diabos e negou rotundamente a sua existência.

Jesus – Assim é.

Raquel – Contudo, uma infinidade de pregadores e de sermões falam e continuam falando desse tema.

Jesus – Parece que acreditam mais no diabo do que em Deus porque falam mais do diabo do que de Deus.

Raquel – Na sua última entrevista o senhor disse-nos que falar do diabo foi um grande negócio. Que quis dizer exactamente?

Jesus – Que com o diabo semeia-se o medo e com o medo colhem-se moedas.

Raquel – Mas há quem seja de opinião que esse medo sirva para que as pessoas se portem bem.

Jesus – Não, o medo só serve para fazer escravos.

Raquel – Um pouquinho de medo não fará bem? Do inferno talvez não, mas… do purgatório?

Jesus – O que é isso do purgatório, Raquel?

Raquel – O purgatório é um lugar onde nos purificamos com fogo para entrarmos limpos no céu… É isso que está na Bíblia, não é?

Jesus – Os fariseus que conheci inventaram uma série de purificações com a água… não lhes ocorreu a purificação com o fogo… que eu saiba as Escrituras não dizem uma palavra sobre esse tal purgatório.

Raquel – E o senhor tem algo para dizer?

Jesus – Que Deus não é cruel para meter num forno a nenhum dos seus filhos. Atrás dessas chamas, já te disse, tem de haver um negócio…

Raquel – Pois perguntemos a Richard Dawkins (Prémio Nobel em 1973, Professor Catedrático da Universidade de Oxford), especialista em deuses e diabos… escuta bem o que diz o doutor Dawkins:

R. Dawkins – Perfeitamente, Raquel Perez. O purgatório foi criado pela Igreja no Sec. XIII. Como já tinham o inferno, que era um lugar de penas eternas, inventaram o purgatório que era uma ante-sala para tormentos passageiros. Para entrarem no céu, as almas do defunto tinham de passar por ali.

Raquel – E como saíam de lá?

R. Dawkins – Pagando.

Raquel – Como, pagando?

R. Dawkins – Para que a espera não fosse muito longa e dolorosa, os Papas começaram a vender “amnistias”: indultos de cem dias, de quinhentos dias e de mil dias. Comprando essas “amnistias” diminuíam as penas do purgatório…

Raquel – As famosas indulgências?

R. Dawkins – As famosíssimas indulgências. Um negócio redondo.

Jesus – Não te dizia, Raquel?

R. Dawkins – Depois começaram a vender por adiantado. Se tinham grandes pecados pagavam e podiam livrar-se até mesmo do inferno. Se não fossem tão grandes pagavas menos e descontavam dias ou meses no purgatório adiantando, assim, a entrada no céu.

Raquel – Como quem compra bilhetes para um jogo de futebol.

R. Dawkins – Exacto. Trezentos anos depois, o Papa Leão X organizou melhor o negócio e pôs preços para cada pecado. Qualquer delito podia ser perdoado pagando ao Vaticano. Qualquer: violação de crianças, incestos, assassinatos e até matar a própria mãe. Não havia pecado que não se perdoasse a troco de dinheiro.

Raquel – As receitas seriam enormes, não?

R. Dawkins – Incalculáveis. Com essas receitas construíram-se a Basílica de São Pedro, em Roma, e todos os Palácios do Vaticano que hoje os turistas visitam deslumbrados.

A compra das indulgências foi a cereja em cima do bolo da corrupção, ou a gota de água que fez transbordar o copo. Martinho Lutero levantou a sua voz contra a corrupção e daí nasceram os Protestantes. Foi a divisão da Igreja Católica.

Raquel – Muito obrigado, doutor Richard Dawkins. Que lhe parece tudo isto, Jesus Cristo?

Jesus – É abominável o que nos foi contado. Na verdade te digo, Raquel, que aqueles mercadores que corri do Templo com o chicote, eram aprendizes ao lado destes idólatras do deus do dinheiro.

Raquel – Que mais podemos acrescentar? De Jerusalém, Raquel Perez, Emissoras Latinas.



NOTA


A Invenção do Purgatório – A palavra “purgatório” significa lugar de limpeza e foi proclamado no Concílio de Lyon:

“Aqueles que morrem na caridade de Deus com verdadeiro arrependimento dos seus pecados, antes de cumprirem os frutos da penitência, são purificados depois da morte com penas purgatórias”.

Esta doutrina do “purgatório” revela bem como funciona a mente teológica. O “purgatório” era uma espécie de ilha de Nova York para os milhares e milhares de emigrantes que afluíam aos EUA, no século XIX e meados do XX, mas de natureza divina. Uma ante-câmara para aquelas almas cujos pecados não são suficientemente maus para merecerem logo o inferno precisando ainda de uma reciclagem, uma purificação, antes de poderem entrar na zona livre de pecados que é o céu.


A Venda das Indulgências – Se há alguma instituição à qual se pode atribuir, com propriedade, a expressão de “dinheiro mal ganho” foi a Igreja católica com o dinheiro das indulgências. Elas terão mesmo constituído um dos maiores contos-do-vigário de toda a história que deixará a roer de inveja os trapaceiros da Iurd.

Em 1903 o Papa Pio X, ainda tinha uma tabela para calcular o número de dias de remissão do purgatório que cada membro da hierarquia tinha competência para conceder: 200 dias para os Cardeais; 100 dias para os arcebispos e 50 dias para os Bispos.

Mas as indulgências também podiam ser pagas com orações rezadas por outras pessoas, após a morte, em intenção ao defunto. Claro que essas orações eram pagas em dinheiro e quem fosse muito rico podia garantir o futuro da sua alma por todo o sempre.

A Luta com Lutero – Em 1517, o frade dominicano alemão, Johann Tetzel , percorre a Alemanha a promover a venda das indulgências que eram documentos selados pelo Papa para, com esse dinheiro financiar a construção da Basílica de são Pedro, à data, um templo como muitos outros.

Quando Tetzel chegou a Wittenberg, cidade de Lutero, este cravou na porta da Igreja um documento com 95 razões a provar a falsidade da doutrina do purgatório e, naturalmente, recusando o poder das indulgências. A partir desse momento de justa revolta estava iniciada na Alemanha a Reforma Protestante.

Uma dessas 95 razões dizia o seguinte:

- “Por que é que o Papa, cuja fortuna é superior a qualquer outra das maiores fortunas, não constrói uma Basílica de São Pedro com o seu próprio dinheiro em vez de o fazer com o dinheiro dos próprios crentes?”

O Papa emitiu uma bula condenando Lutero por “cometer erros heréticos, escandalosos e ofensivos aos ouvidos piedosos…” e que aquilo “era obra de um bêbado alemão que quando estivesse sóbrio mudaria de opinião”.

Lutero queimou em Wittenberg a bula Papal e, de seguida, o Papa excomungou-o.


As Provas da Existência do Purgatório – O que verdadeiramente fascina na doutrina do purgatório são as “provas” com que os teólogos as fundamentam: provas tão espectacularmente débeis que tornam ainda mais cómico o arrojo ligeiro com que são afirmadas.

Na Enciclopédia Católica, a entrada referente ao purgatório tem uma secção chamada “provas”. A evidência principal para a existência do purgatório é a seguinte: - Se os mortos fossem directamente para o céu ou para o inferno com base nos pecados que cometeram na Terra, não fazia sentido rezar por eles… por que rezar pelos mortos senão houver uma crença no poder da oração para proporcionar refrigério àqueles que estavam excluídos dos olhos de Deus… e nós rezamos pelos mortos, não é? Portanto o purgatório deve existir, caso contrário as nossas orações não fariam sentido”.

Isto é um bom exemplo daquilo que, na mente dos teólogos, passa por ser um raciocínio lógico.

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