sábado, dezembro 28, 2013

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Sorte a do crocodilo...



Reflexão de vida:
- Mestre, como faço para me tornar um sábio?
- Boas escolhas.
- Mas como fazer boas escolhas?
- Experiência - diz o mestre.
- E como adquirir experiência, mestre?
- Más escolhas. 



Obs - Absolutamente verdadeiro para o comum dos mortais... Como diz o povo: "aprendemos à custa dos nossos erros" -


 Tudo o que aprendi na vida foi à custa das más 
escolhas que fiz. Com as boas ficarei sempre por 
saber como seria...

BOAS FESTAS

O Homem do Talhinho...

Rir faz bem...

Se pensa que já viu tudo desengane-se...

O ESPECTÁCULO QUE VAI VER É ÚNICO NO MUNDO.
O CUSTO DE CADA ENTRADA POR PESSOA ERA DE 150 EUROS PARA A 5ª FILA, LÁ ATRÁS.

VOCÊ VAI FICAR NA PRIMEIRA FILA... E SEM PAGAR NADA. OK?  


Baía, cidade onde António Balduíno foi rei e senhor...
JUBIABÁ

Episódio Nº 200

(Último Episódio)


Um dia ele dará adeus e agitará um lenço do tombadilho de um navio. A música do realejo chora uma despedida. Mas ele não dará adeus como estes homens e mulheres da primeira classe, que dão adeus para os amigos, para os pais e irmãos, para esposas chorosas, para noivas tristes.

Ele dará adeus como aquele marinheiro louro que está no fundo do navio e agita o boné para a cidade toda, para as prostitutas do Taboão, para os operários que fizeram a greve, para os malandros que estão na “Lanterna dos Afogados”, para as estrelas onde está Zumbi dos Palmares, Para o céu claro e a lua amarela, para o velho italiano do realejo, para António Balduíno também.

Ele dará adeus como marinheiro. Adeus para todos, que ele fez a greve e aprendeu a amar a todos os mulatos, todos os negros, todos os brancos, que na terra, no bojo dos navios sobre o mar, são escravos que estão rebentando as cadeias.

E o negro António Balduíno estende a mão calosa e grande e responde ao adeus de Hans, o marinheiro.


A B C DE ANTÓNIO BALDUÍNO


«Este é o A B C de António Balduíno
Negro valente e brigão
Desordeiro sem pureza
Mas de bom coração.
Conquistador de natureza
Furtou mulata bonita
Brigou com muito patrão
…………………………….
……………………………..

Morreu de morte matada
Mas ferido à traição»

(Do ABC de António Balduíno)

O A B C de António Balduíno, trazendo na capa vermelha um retrato do tempo em que o negro era jogador de boxe, é vendido no cais, nos saveiros, nas feiras, no Mercado Modelo, nos botequins, pelo preço de duzentos réis, a camponeses moços, marinheiros alvos, a jovens carregadores do cais do porto, a mulheres que amam os camponeses e os marinheiros, e a negros tatuados, de largo sorriso, que trazem ora uma âncora, ora um coração e um nome gravados no peito.


Pensão Laurentina (Conceição da Feira), 1934.


FIM DA HISTÓRIA


Para os que acompanharam a história do Jubiabá e não estão familiarizados com as expressões brasileiras segue um glossário com o significado de palavras caracteristicamente da cultura tradicional brasileira:

 Abacaxi – Espécie de ananás.

Abará – Pastéis de feijão com pimenta e outros condimentos.

Acarajé – Pastéis de massa de feijão cozido

Agogô – Ferrinho que os negros percutem com uma banqueta, durante as cerimónias de feitiçaria.

Auçá – Carne seca, cortada aos bocadinhos, com molho de pimenta.

Baticum – Falatório, altercação.

Batuta – Bonita. Festa batuta, festa de arromba.

Beiju – Espécie de filó feita de tapioca.

Bóia – Comida, refeição.

Bolinar – Acariciar, apalpar.

Bodoque – Funda de elástico.

Bonde – Carro eléctrico.

Bruaca – Mulher velha, marafona.

Caçuá – Seirão – Espécie de rede.

Cafuné – Estalido que se dá com as unhas, na cabeça.

Camisu – Espécie de blusa ou camisa, sem fralda.

Candomblé – Batuque, ligado à macumba.

Carona – grátis, entrada de favor, bpleia.

Cutuba – Excelente.

Dobrado – Marcha militar.

Esculhambação – Desarranjo, desordem, pândega, desmoralização.

Frege – Tasca – conflito.

Fumo – Tabaco.

Jagunço – Valentão.

Lapo – Lenho, golpe.

Macumba – Rito espiritualista do negro brasileiro, que participa do catolicismo, do feiticismo e da tradição tupi.

Massapé – Terra fértil.

Molecote – Moleque taludo.

Molecagem – Garotice, partida própria de moleque.

Munguzá – Papas de ilhó inteiro.

Nagô – Nome genérico de várias tribos africanas que deram maior contingente de escravos. A língua falada por elas.

Ogan – Autoridade honorária, no candomblé.

Orixá – Divindades negras.

Oxalá – O supremo Orixá, que se divide em duas divindades: Oxaliã, o deus jovem e Oxolufã, o deus velho.

Oxossi – O deus da caça na mitologia afro-brasileira.

Pai de Santo – Espécie de iluminado e director religioso em quem descem as divindades no candomblé.

Pitar – Fumar.

Pongar – Pular

Porre – Bebedeira.

Porre Mãe – Bebedeira tremenda.

Remeleixo – Dança desenfreada.

Repetição – Arma automática, espingarda de repetição.

Sarabá – Mulato ruivo.

Sopapo – Murros – Reboco de barro atirado à mão.

Tapear – Enganar, iludir.

Tira – Agente da polícia.

Torcer – Manifestar-se a favor de alguém.

Torcedor – Partidário acérrimo.

Trem – Comboio

Turumbamba – Altercação, desordem.

Xingar – Insultar com palavras.

sexta-feira, dezembro 27, 2013

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Um soninho descansado no aconchego dos seus amigos...



Pablo Alborán - Perdóname

Uma linda, linda, canção no cenário único e belo da cidade de Lisboa. 



José Carlos Ary dos Santos
José Carlos Ary


dos Santos




Era o dia 18 de Abril de 1951. A manhã estava soalheira e a velhinha camioneta do Colégio de S. João de Brito, à data, o espaço com maior densidade de meninos ricos por metro quadrado da cidade de Lisboa, regressava ao ponto de partida depois de ter recolhido os alunos para mais um dia de aulas, muitas rezas e ponta pés na bola nos intervalos.

Eu era dos primeiros a embarcar juntamente com outro colega, o Jorge Manuel Barahona Vanzeler (há nomes assim, colam-se a nós e por cem anos que vivamos temo-los sempre na ponta da língua), menino de família que era acompanhado até à porta do solar onde vivia por uma criada impecavelmente fardada.

Lembro-me bem dele porque durante a viagem, desde os Caminhos-de-Ferro, a Sta. Apolónia, até ao Colégio, ao fundo da Alameda das Linhas de Torres, tínhamos muito tempo para conversar e contar histórias de livros de aventuras de que eu era grande apaixonado.

A viagem decorria sempre de forma pachorrenta. A nossa camioneta, provavelmente, ainda do tempo da última Grande Guerra, de formas arredondadas e que tratávamos por um nome carinhoso que, na minha memória, não resistiu ao tempo nem aos anos, só tinha que avançar entre a recolha de cada aluno sem o contratempo do trânsito que era então coisa desconhecida na nossa velha Lisboa.

Finalmente, abrandava, virava à direita, parava junto ao portão e motorista tocava o “klacson”, como então se dizia, até que um trabalhador da quinta o vinha abrir.

À nossa frente uma alameda e ao fundo, correndo aos saltos e agitando os braços na direcção da camioneta, um menino de calções, gordo e desajeitado, gritava:

-Morreu o Carmona, Morreu o Carmona, (era o Presidente da República) Vamos para Casa!

Era o Ary, inconfundível, exuberante, esfusiante, meio louco, que por morar ali perto chegava primeiro e soube logo da notícia pois as sobrinhas do Presidente tinham ido à capela do Colégio, ainda de madrugada, encomendar a Deus a alma do tio.

O Ary era uma explosão de energia, de irreverência que escandalizava e surpreendia quando saltava para as costas do padre, professor de português, rodeava-lhe o pescoço com os braços e o obrigava a correr imitando um cavaleiro.

O Ary era uma força da natureza e se alguém poderia escrever os versos que se seguem, pela sua genialidade, esse alguém só poderia ser o José Carlos Ary dos Santos que a si próprio se definia:

“Poeta de combate disparate
Palavrão de machão no escaparate
Porém morrendo aos poucos de ternura”


Faleceu em 1984, com 48 anos, quando os restos do fulgor da sua idade jovem já não conseguiram suportar os excessos de uma vida que foi uma explosão de emoções  que ele nunca conseguiu dominar porque faziam parte do seu génio de poeta. Leiam os versos que se seguem e encontram o Ary dos Santos... No passado dia 7 foi aniversário do seu nascimento, 76 anos. No encerrar de mais um ano as minhas homenagens a um colega de colégio e um dos maiores poetas portugueses.




Poeta Castrado Não!


Serei tudo o que disserem
por inveja ou negação:
cabeçudo dromedário
fogueira de exibição
teorema corolário
poema de mão em mão
lãzudo publicitário
malabarista cabrão.
serei tudo o que disserem:
poeta castrado não.

Os que entendem como eu
as linhas com que me escrevo
reconhecem o que é meu
em tudo quanto lhes devo:
ternura como já disse
sempre que faço um poema;
saudade que se partisse
me alagaria de pena;
e também uma alegria
uma coragem serena
em renegar a poesia
quando ela nos envenena

Os que entendem como eu
a força que tem um verso
reconhecem o que é seu
quando lhes mostro o reverso:

Da fome já não se fala
-é tão vulgar que nos cansa-
mas que dizer de uma bala
num esqueleto de criança?

Do frio não reza a história
-a morte é branda e letal-
mas que dizer da memória
de uma bomba de napalm?

E o resto que pode ser
o poema dia a dia?
-Um bisturi a crescer
nas coxas de uma judia;
um filho que vai nascer
parido por asfixia?!
Ah não me venham dizer
que é fonética a poesia!

Serei tudo o que disserem
Por temor ou negação:
Demagogo mau profeta
Falso médico ladrão
Prostituta proxeneta
Espoleta televisão.
Serei tudo o que disserem
Poeta castrado não!




“ Ser poeta é escolher as palavras que o povo 

merece”

José Carlos Ary dos Santos

Cada um é para o que nasce....


Atento aos Sinais...

             


Ele fora sempre um homem profunda e sinceramente religioso, cumpridor dos seus deveres, chefe de família e cristão exemplar. Ao longo da vida nunca tinha falhado uma missa e a sua relação com Deus era coloquial.

Ultimamente, no fim das suas orações, pedia insistentemente:

 - Oh, Deus, quando decidires levar-me avisa-me com antecedência, a máxima que te for possível. Sabes, tenho muitos amigos de quem me quero despedir e há sempre umas coisas de que a gente gostava de fazer por último.

E sempre que ia à Igreja repetia a Deus, empenhadamente, este pedido.

Um dia, de repente, morreu.

Católico impoluto, subiu ao céu e São Pedro o foi receber pessoalmente às portas do paraíso.

 - Venho muito zangado, diz ele. Pede a Deus para me receber: quero falar com ele.

 - Vou ver se ele te pode atender… e deixou-o só.

 - De regresso diz-lhe: Anda comigo, ele vai falar contigo.

Frente a frente, o bom homem desabafa:

 - Em vida, tinha-te feito um pedido com toda a insistência para que me avisasses com antecedência da minha morte e, afinal, de repente,  sem mais nem menos, levaste-me sem nenhum aviso. Fui sempre um servo teu, fiel e respeitador, não merecia que me fizesses isto…

Responde Deus:

 - Mas, estás a ser muito injusto:

- Lembras-te de quando te apareceram os teus primeiros cabelos brancos?

 - Sim, lembro.

 - Lembras-te quando puseste a primeira prótese para substituir os dentes que, entretanto, tiveste que arrancar?

 - Sim, lembro.

 - Lembras-te dos óculos que tiveste de comprar para poderes continuar a ler o teu jornal com o cafezinho da manhã que não dispensavas?

 - Sim, lembro.

 - Lembras-te das tuas dificuldades de audição de que a tua mulher reclamava por ter de repetir tudo até ouvires?

 - Sim, lembro.

 - Lembras-te das palavras que a tua memória começou a recusar-te e te levava a dizer que ficavam debaixo da língua?

 - Sim, lembro.

- Lembras-te das dores e achaques que começaste a sentir um pouco por todo o corpo?

 - Sim, lembro.

 - E lembras-te das referências subtis que a tua mulher te fazia por espaçares cada vez mais as relações sexuais?

 - Sim, lembro.

 - E acusas-me de que não te avisei???



NOTA - Só podia estar muito distraído!....

A greve o salvou...
JUBIABÁ

Episódio Nº 199






E quando Lindinalva morreu, ele que pensava que pensava que seu A B C já estava perdido, que nada mais faria, quis entrar pela estrada do mar para ser feliz como um morto.

Porém os homens do cais, os homens do mar, lhe ensinaram a greve. O mar lhe mostrou o caminho de casa. E ele olha para o mar verde, amarelado pela lua. De muito longe vem a voz de Maria Clara:


«A estrada do mar é larga, Maria…»


Um velho no cais deserto toca realejo. A musica vem em surdina e se espalha pelos saveiros, pelas canoas, pelos transatlânticos, pelo grande mar misterioso de António Balduíno.

Se não fosse a greve o mar engoliria o seu corpo numa noite em que a lua não brilhasse. Se não fosse a greve ele teria desistido de ser cantado num A B C, de ver Zumbi dos Palmares brilhando como Vénus.

Um vulto passa ao longe. Será Robert, o equilibrista, que desapareceu misteriosamente do circo? Mas pouco importa. A música do realejo é plangente.

A voz de Maria Clara se sumiu no mar. E amará Maria Clara à luz da lua. As ondas do mar molharão os corpos e assim e o amor ainda será melhor.

A areia alva do cais prateada com a lua. A areia prateada do cais onde o negro António Balduíno amou tantas mulatas que eram todas Lindinalva, a sardenta.

Se não fosse a greve o seu corpo de afogado seria depositado na areia e os siris chocalhariam como chocalhavam no corpo de Viriato, o Anão.

Brilha a luz de um saveiro. O vento levará até ele a melodia do realejo que o velho italiano toca?

Um dia - pensa António Balduíno – hei-de viajar, hei-de sair para outras terras.

Um dia ele tomará um navio, um navio como aquele holandês que está todo iluminado, e partirá pela estrada larga do mar.

A greve o salvou. Agora sabe lutar. A greve foi o seu A B C .

O navio vai largar. Os marinheiros souberam da greve, contarão em outras terras que os negros lutaram. Os que ficam dão adeuses. Os que vão limpam lágrimas. Porque chorar quando se parte?

Partir é uma aventura boa, mesmo quando se parte para o fundo mar como partiu Viriato, o Anão. Mas é melhor partir para a greve, para a luta.

Um dia António Balduíno partirá num navio e fará greve em todos os portos. Nesse dia dará adeus também.

Adeus, minha gente que eu já vou. Zumbi dos Palmares brilha no céu. Sabe que o negro António Balduíno não entrará mais pelo mar para a morte. A greve o salvou.

quinta-feira, dezembro 26, 2013

Grupo Coral de Ganhões e Dulce Pontes

A linda música alentejana que canta os dramas do seu povo: ... tanta terra abandonada e gente sem trabalho...

Fernando Pessoa


Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.

Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se casar?

Minha alma procura-me
Mas eu ando a monte,
Oxalá que ela
Nunca me encontre.

Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser,
Viverei fugindo
Mas vivo a valer


IMAGEM

Vincen Van Gogh  - Café Terrence On the Place Du Forum



Enfermeira Perdida

Depois de terem operado um elefante, diz um dos veterinários a outro: 
- Não deixamos nada lá dentro, pois não? 
- Não... mas... onde é que se meteu  a enfermeira? 

Divórcio Judeu




Na antevéspera do Ano Novo Judaico, Boris Sylberstein, patriarca judeu e a mulher, Sara, moradores num Kibutz perto de Telavive, visitam um dos seus filhos na capital de Israel: 

- Jacobzinho, odeio ter que te estragar o dia, mas o Pai precisa de te dizer que a Mãe e eu nos vamos separar, depois destes 45 anos!

- O Pai enlouqueceu! O que é que está a dizer? - grita Jacob. 

- Já não conseguimos sequer olhar um para o outro. Vamos separar-nos e acabou-se! Liga à tua irmã Raquel a contar. 

Apavorado, o rapaz liga para a irmã, que vive em Viena e conta-lhe a terrível notícia. Raquel fica em estado de choque, ao telefone: 

- Os nossos pais não podem separar-se de maneira nenhuma! Chama já o Pai ao telefone! 

O ancião atende e a filha balbucia na maior emoção: 

- Não façam nada até nós chegarmos aí amanhã, ouviu?

Vou telefonar também ao Moisés para São Paulo, ao Salomão para Buenos Aires e à Ester para Nova Iorque e amanhã à noite estaremos aí todos. Ouviu bem Pai?

Desliga, sem esperar pela resposta do Pai. O velho pousa o auscultador no descanso, vira-se para a mulher e, sem que Jacob ouça, diz-lhe em voz baixa:

- Pronto, Sara, vêm todos para a Ano Novo. Só que, desta vez, não temos de lhes pagar as passagens...!

As obras de Sta Engrácia....
As Obras de Santa 

Engrácia



- Reza a lenda que ...

“Simão Pires, um cristão­ novo, cavalgava todos os dias até aos convento de Santa Clara para se encontrar, às escondidas, com Violante.

A jovem tinha sido feita noviça à força por vontade do seu pai, fidalgo que não estava de acordo com o seu amor.

Um dia, Simão pediu à sua amada para fugir com ele, dando-lhe um dia para decidir. 

No dia seguinte, Simão foi acordado pelos homens do rei que o vinham prender acusando-o do roubo das relíquias da igreja de Santa Engrácia que ficava perto do convento.

Para não prejudicar Violante, Simão não revelou a razão porque tinha sido visto no local. Apesar de ter invocado a sua inocência, foi preso e condenado à morte na fogueira, o que se realizaria junto da nova igreja de Santa Engrácia, cujas obras já tinham começado.

Quando as labaredas envolveram o corpo de Simão, este gritou que “Era tão certo morrer inocente como as obras nunca mais acabarem!”.

Os anos passaram e a freira Violante foi um dia chamada a assistir aos últimos momentos de um ladrão que tinha pedido a sua presença. Revelou-lhe que tinha sido ele, o ladrão das relíquias e sabendo da relação secreta dos jovens, tinha incriminado o Simão. Pedia-lhe agora o perdão que Violante lhe concedeu.

Entretanto, um facto singular acontecia, as obras da igreja iniciadas à época da execução de Simão pareciam nunca mais ter fim. De tal forma que o povo se habituou a comparar “Tudo aquilo que não mais acaba” às obras de Santa Engrácia.”


Na realidade, levou cerca de 350 anos porque foi fundada em 1568 mas ruiu em 1681 e a sua reconstrução durou até cerca de meados do Século XX. É hoje conhecida pelo Panteão Nacional.

Nem Jubiabá sabia que a luta verdadeira era a greve...
JUBIABÁ

Episódio Nº 198


Era qualquer coisa mais séria que barulho, que briga. Era uma luta dirigida para um fim, sabendo o que queria, uma luta bonita.

Ali na greve todos se amavam, se defendiam e lutavam contra a escravidão. A greve merecia um A B C. Não bastava o samba que António Balduíno canta enquanto pensa:

                                   «Não teve luz
                                     E também não teve pão
                                     Ficou mudo o telefone
                                     Sem ter comunicação
                                     Durante a greve não houve jornal
                                     Também não teve bonde
                                      Para nenhum ramal»


Verdade tudo aquilo que o samba dizia. Aqueles homens, que António Balduíno sempre desprezara, como escravos incapazes de reagi, paralisaram toda a vida da cidade.

António Balduíno pensava que ele e os seus malandros, desordeiros que viviam de navalha em punho, é que eram fortes, livres e donos da cidade religiosa da Baía.

E esta sua certeza fizera que ele ficasse triste e quase suicida quando teve de trabalhar nas docas. Mas agora ele sabe que não é assim.

Os trabalhadores são escravos mas estão lutando para se libertar. Bem que o samba diz.

                                  «As fabricantes
                                    Pararam um instante
                                    Até que os operários
                                     Saíssem triunfantes
                                     Agora reina grande alegria
                                     Viva os operários da nossa Baía»


Ele julgara que a luta, luta aprendida nos A B C lidos nas noite do morro, nas conversas em frente à casa de sua tia Luísa, nos conceitos de Jubiabá, na música dos batuques, era ser malandro, viver livre, não ter emprego.

A luta não é esta. Nem Jubiabá sabia que a luta verdadeira era a greve, era a revolta dos que estavam escravos. Agora o negro António Balduíno sabe. É por isso que vai tão sorridente, porque na greve recuperou a sua gargalhada de animal livre.

Canta os dois últimos versos do samba em voz tão alta que assusta a pálida prostituta que parece uma virgem e que na janela da velha casa da Ladeira da Montanha rega um vaso de flores.


A noite desceu e a lua sobe do mar para junto das estrelas. O Gordo andará na rua Chile de braços estendidos a perguntar onde está Deus.

Zumbi dos Palmares é que brilha no céu. Para os homens brancos, é Vénus, o planeta. Para os negros, para António Balduíno, é Zumbi, o negro que morreu para não ser escravo.

Zumbi sabia aquelas coisas que só agora António Balduíno aprendera. Os saveiros dormem. Apenas “O Viajante sem Porto”, sai, de lanterna acesa, carregado de abacaxis.

Maria Clara vai em pé cantando. Dela vem o cheiro poderoso do mar. Ela nasceu no mar, o mar é o seu inimigo e o seu amante.

António Balduíno também ama o mar. Sempre viu no mar o caminho de casa.

quarta-feira, dezembro 25, 2013


Um Bom Dia de Natal para Todos





O Frio de um Dia de Inverno

O frio aproxima uma pessoa de si própria. Saímos à rua e dentro do casaco, para nos protegermos do frio ofensivo do exterior, apertamo-nos como se, afinal, muito dentro de casaco não estivesse um, mas dois.

Não um sujeito, mas dois sujeitos. E por isso mesmo sair à rua num dia de inverno é finalmente dar um passo em direcção a uma outra parte do nosso corpo.

Um homem que na rua aperta o casaco e assim se aperta a si próprio faz, em caminhada livre e a céu aberto, uma rápida auto - sessão de análise psicológica e psicanalítica e física e etc. e tudo.

Frio e sol, perfazem então uma combinação sensata e perfeita.

Protege-te e comemora, eis o que nos diz, cada um a seu tempo, o sol e o frio.

No calor o nosso corpo afasta-se de nós, afasta-se do centro. Está para ali à minha frente ou ao meu lado.

No frio, pelo contrário, o corpo torna-se aquilo que eu quero proteger e aquilo que me protege. Por isso é que nos apertamos muito no inverno, no exterior.

Temos de fazer duas acções opostas ao mesmo tempo. Proteger e ser protegido. No inverno, o corpo ocupa menos espaço. De facto, é impossível exigir reflexão a um povo que viva debaixo do sol e do calor permanentes.

Acima de trinta graus de temperatura, filosofar é perder a vida e o exterior. Abaixo de oito graus, não pensar é não ter cabeça.

É assim mesmo, como se fosse uma fórmula meio química meio existencial: o homem só pensa em determinados assuntos e com certa profundidade quando avança pela cidade com temperaturas abaixo de oito, sete, seis graus.

Cada cidadão, enrolado no seu casaco, caminha com o rosto de quem reflecte longamente sobre o essencial.

Em Lisboa, em Dezembro, pensa-se mais – isso é evidente.



Belíssima Crónica de
Gonçalo M. Tavares

(Revista a Visão)

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