sábado, janeiro 09, 2016

A Coreia do Sul
O Génio Coreano














Ontem falei aqui da Coreia do Norte, do seu regime político ditatorial e paranóico e de um chefe endeusado que trata os cidadãos como um rebanho de súbitos que o seguem e veneram.

Isto é verdade, todo mundo conhece as imagens dessa veneração, das paradas, dos militares ridiculamente medalhados da cabeça aos pés, dos posteres e retratos  de dimensões anormais com as caras do filho, Kin Junh-Un e do pai, fundador do regime, Kim Il Sung... tudo isto é verdade mas não anula o essencial: o génio do povo coreano que está bem expresso a Sul do paralelo 38, na Coreia do Sul.

Com os seus 50 milhões de habitantes, o dobro da do norte, é a 2ª economia mundial, 15º país do índice de desenvolvimento da ONU e está no topo do registo das patentes científicas.

Lideram no desempenho escolar a nível mundial e têm empresas líderes, como a Samsung, Hyundai ou a LG. O meu automóvel, aqui na pontinha da Europa, é um Kia, sul-coreano.

E tudo isto assenta numa base cultural, comum a todo o povo coreano, na tradição confucionista que assenta no trabalho árduo e no apreço pelo conhecimento.

A Norte, é o desaproveitamento destas qualidades por um regime anacrónico que não consegue competir com a democracia pujante do sul e se resguarda num poderio militar que amedronta os vizinhos e serve para alimentar a propaganda interna.

Norte e Sul são hoje inimigos como o eram entre 1950/53 quando estiveram em guerra que terminou com a separação definitiva por uma linha traçada no terreno sobre o paralelo 38.

Quando, do espaço, se olha de noite para toda a península coreana, a Norte é uma escuridão à excepção de um pontinho de luz, a capital, Pyongyang. A Sul, predomina a luminosidade mais intensa em Seul e Busan.

E, no entanto, quando terminou a colonização Japonesa, a Coreia do norte tinha a quase totalidade da infraestrutura industrial e recursos minerais e mesmo na fase de reconstrução, a vantagem parecia ainda estar do lado comunista.

Quando, no início da década de 60, o Norte ainda ganhava ao Sul, comparando os níveis de vida, ele era aqui, mais baixo do que em algumas nações africanas recém-independentes.

Hoje, é o que se vê: um Norte pobre e um Sul próspero a tal ponto que a reunificação do país é completamente irrealista.

A Norte, a fome dos anos 90 já passou e o regime autorizou que as explorações agrícolas privadas proliferassem, bem como mercados informais.

Há novos prédios, rede de telemóvel e anúncios a carros mas... imagine-se o que poderia ser a Coreia reunificada se todos os cientistas que investem em bombas nucleares se dedicassem a produzir tecnologia que melhorasse a vida das pessoas.

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A Bela e os Búfalos...



Gato Fedorento - A Liga dos Últimos



Que resultado: Luz ou trevas?
Tieta do Agreste
(Jorge Amado)

EPISÓDIO Nº 49


















Tieta, Leonora e Elisa preparam-se para ir ao encontro de Ascânio, mas ele salta à frente de todos e se afasta no caminho de casa, em marcha batida.


- Vai tomar banho. Depois de viajar na marinete de Jairo ninguém pode fazer nada sem gastar água e sabão. Muito menos ver a criatura dos seus sonhos… - esclarece dona Carmosina: - Daqui a pouco bate por aqui.

Demoraram-se na Agência dos Correios, à espera. Aminthas vem juntar-se ao grupo, comentam o diálogo já agora histórico. Aminthas acrescenta o diálogo final: doutor Caio, lívido na madrugada, querendo falar sem poder, os olhos fuzilando. Osnar e ele, Aminthas, saíram de mansinho, não fosse ele ter um ataque de apoplexia.

O tempo passa, Barbozinha surge, traz uma rosa na mão, uma rosa chá. Ao ver Tieta estende-lhe a flor.

- Colhi para você, no jardim de dona Milú, ia levá-la a casa de Perpétua mas os meus guias dirigiram-me os passos para aqui. Pena não ter mais três para homenagear todas as presentes.

- E Ascânio, vai aparecer ou não? – interroga Elisa, cansada de esperar.

Leonora, a criatura dos sonhos de Ascânio, na opinião de dona Carmosina, aguarda em silêncio, olhos postos na rua. 

Nem sinal de Secretário de Prefeitura, de cavaleiro andante, limpo ou empoeirado. O jeito é mandar chamar.

O moleque Sabino, requisitado, abandona a sorveteria, vai correndo com o recado para Ascânio; esperam-no impaciente na Agência dos Correios, venha rápido. Para matar o tempo vão tomar sorvete de cajá, servido pelo próprio árabe. 

Amanhã será de pitanga, difícil saber qual o mais gostoso. Voltem para comparar e decidir.

Finalmente desponta na esquina o caleiro andante, o passo lento, a face descomposta, Cavaleiro da Triste Figura. Mesmo antes de ele subir o degrau da porta da Agência dos Correios todos se dão conta da derrota do campeão de Agreste na batalha travada em Paulo Afonso. Os destroços do guerreiro, o fracasso da missão, o rosto em luto, sepulcral.

- Negativo, não foi, pergunta Aminthas – Eu avisei. Não havia nenhuma possibilidade. Ainda bem que o motor vai aguentando: quando pifar voltaremos ao fifó.

- Não se importe – disse Leonora, você fez o que pôde. Cumpriu o seu dever.

- Foi horrível, humilhante. O director da Companhia, o que fica permanente em Paulo Afonso, nem queria me receber. 

Tive que pedir e suplicar e por fim me atendeu. Nem comecei a expor, me cortou a palavra. Não podia perder tempo, esse assunto do Agreste estava encerrado, não havendo nenhuma possibilidade de instalação da luz da usina no município.

A Prefeitura não recebeu o memorando, negando o pedido? Então? Não adiantava falar com os técnicos, Agreste tem de esperar sua vez e não vai ser tão cedo, daqui a alguns anos, quando levarmos força e luz aos últimos recantos dos Estados servidos pela Hidrelétrica.

Agora, impossível, meu caro. Não adianta argumentos, deixe-me trabalhar, meu tempo é precioso.

Ascânio suspende o relato, abana as mãos. Onde o entusiasmo, o ânimo de luta? Evaporaram-se, rolaram na cachoeira, esmagados pelo director da Companhia.

- No fim ainda me gozou. Tem uma única maneira, disse. Obtenha uma ordem do Presidente da Companhia do Vale de São Francisco, do presidente, não de um director igual a mim, mandando instalar luz em Agreste e no dia seguinte lá estaremos. Passe bem. Riu e me voltou as costas.

Um silêncio pesado cai sobre a Agência dos Correios. A primeira a abrir a boca, dona Carmosina:

- Filho da mãe! É por isso que eu sou contra essa gente.

Leonora aproxima-se de Ascânio:

- Não se aflija tanto, tudo no mundo tem jeito – os doces olhos plenos de ternura.

Tieta levanta-se da cadeira onde ouvira em silêncio.

- Quem é o presidente, Ascânio e o que é essa mesma Companhia! Me ilumine o pensamento.

Ascânio, ainda sem graça, deprimido, explica o que é a Companhia do Vale de São Francisco, a importância da Hidrelétrica de Paulo Afonso, termina citando o nome do deputado que exerce a Presidência da grande empresa estatal, aquele que manda e decide, o único a poder mudar planos estabelecidos.

Mas como atingi-lo? - Impossível.

Quem tem razão é Aminthas: mais do que importância económica, falta a Agreste o prestígio de um grande chefe, alguém cujo pedido seja uma ordem.

Tieta repete o nome do deputado:

- Já ouvi falar mas não conheço pessoalmente. Mas, em São Paulo, não tem político importante com quem eu não me dê – esclarece – Todos amigos de Filipe, todos frequentam minha casa. Carmô, Ascânio me ajudem a redigir um telegrama. Ou melhor, dois.

Pronuncia nomes ilustres, manda chuvas em São Paulo e no país. Dona Carmosina escreve. Tieta pede que intervenham a favor do Agreste junto ao presidente da Companhia do Vale de São Francisco, seguem-se as razões detalhadas por Ascânio mas a principal é o interesse de Antonieta, o favor que lhe farão e ela ficará devendo.

- Telegrama enorme – observa dona Carmosina – vai custar uma nota.

- A Prefeitura paga – adianta-se Ascânio.

- Quem paga sou eu, meu filho, que estou enviando. Carmô assine Tieta do Agreste. Os amigos mais íntimos me tratam assim, era como Filipe gostava de me chamar.

Ainda não haviam retornado a casa de Perpétua e já a notícia dos telegramas abalava a cidade – dona Antonieta Esteves Cantarelli telegrafara a um senador paulista e ao próprio Ademar, amigos do peito do falecido Comendador, pedindo a instalação em Agreste da luz de Paulo Afonso.

Os comentários cívicos cobrem os ecos do fescenino diálogo sobre os hábitos sexuais de Osnar; se as mensagens telegráficas não resultarem em iluminação feérica, já terão servido à moral pública.

Sucedem-se as hipóteses; possui a viúva realmente tanto prestígio, conhece, trata, é íntima de senadores e governadores ou está fazendo farol?

Qual o resultado: luz ou trevas? 

Até apostas são feitas. Fidélio bota dinheiro no sucesso, Aminthas continua pessimista, por que esses lordes de São Paulo se hão de mover por Agreste, o cu do mundo? Dobra a aposta Fidélio.

Por quê? Tieta poderia responder que se moverão exactamente por serem lordes e ela a Tieta do Agreste. 

 O QUE É O 69 ?



 











Menino de 6 anos questiona:

- Mãe, 69 é o quê?

- Bem, meu filho, 69 é uma posição sexual onde o homem coloca a boca na piriquita da mulher e a mulher coloca a boca no pinto do homem e os dois se chupam, lambem, essas coisas, entendeu meu filho? 

-Caaaaramba mãe, eu só queria saber se era par ou ímpar!


Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 150






















Lúcido e com sangue frio, o príncipe mandou-a sentar num banco enquanto se afastava até à janela, colocando alguma distância física entre eles.

Ouviu-se um grito e Chamoa gemeu:

 - É ele, conheço a sua voz! Ó meu Deus acudi-me que fui apanhada!

Afonso Henriques tentou serená-la.

Deixai-me ser eu a falar.

Nesse instante a porta abriu-se de par em par, e um enfurecido Paio Soares entrou pela sala rugindo:

 - O que se passa aqui?

Levantando-se, Chamoa forçou um sorriso espantado

 - Meu marido, haveis chegado finalmente!

Paio Soares mirou-a, e depois ao príncipe e berrou.

 - O que estais a fazer sozinhos?

A rapariga fingiu-se pasmada com aquela pergunta e, piscando as pestanas, justificou-se:

 - Nada, apenas conversamos.

Atrás de Paio Soares haviam entrado Gomes Nunes de Pombeiro e Elvira. Aliviados ao verem que nada de anormal se passava, trocaram olhares cúmplices.

Contudo, o Mordomo-Mor deu dois passos na direcção do príncipe. Zangado e já com a mão na espada rosnou:

 - Como vos atreveis a chifrar-me?

Tranquilo, Afonso Henriques, retorquiu:

 - Acusais o príncipe de Portugal?

Paio Soares suspendeu o seu colérico balanço, mas manteve-se ríspido e perguntou:

 - Que conversais com minha mulher?

O príncipe acalmou-se um pouco. O marido de Chamoa recuara nas acusações e já admitia que se tratava apenas de um diálogo.

Intrometendo-se entre eles, Gomes Nunes de Pombeiro declarou:

 - A culpa foi minha! Pedi a Chamoa que falasse com o príncipe!

O Mordomo-Mor de Dona Teresa, de testa franzida, quis conhecer o motivo daquela estranha iniciativa paternal.

- Porque temo por Toronho! – reconheceu Gomes Nunes.

A seu lado Elvira acrescentou, dirigindo-se a Paio Soares:

- Sabeis o que se passou em Ricobayo! Toronho não está a salvo. Nem vós nem Dona Teresa conseguem proteger-nos!

Após um toque irritado à esposa de que não devia falar por ele, Gomes Nunes exclamou:

- Jamais prestarei vassalagem a Afonso VII! Só Afonso Henriques me pode proteger da fúria do rei! Vós não podeis!

Paio Soares, apesar de incomodado, compreendeu e aceitou aquelas explicações. Então, o príncipe dirigiu-se a ele:

- Prometi a vossa esposa que protegerei Tui. E pedi-lhe em troca para deixar minha mãe.

O marido de Chamoa ficou confundido pela inesperada proposta. Momentos depois, abanou a cabeça, chocado.

Ides fazer a guerra a vossa mãe e a vosso primo? É uma loucura! Com que tropas ides lutar? Com a curta guarnição de Guimarães?

Dirigindo-se de novo a Gomes Nunes, afirmou com convicção

Afonso VII deu-nos um ano. Confiai em mim!

Mirando a sua sogra, Elvira, continuou:

 - Confiai em vosso irmão Fernão! Chamoa é uma Trava, como vós! Toronho não será invadido pelo rei!

Depois, olhou para o príncipe e acrescentou:

- Um dia servir-vos-ei como servi vosso pai. Por agora sirvo vossa mãe e não a vou trair.

Foi tal a veemência com que falou que Gomes Nunes, Elvira e mesmo Chamoa pareceram acreditar finalmente que o Mordomo-Mor os podia proteger da ira régia.

Ainda encostado à parede, Afonso Henriques sorriu levemente. Então suspirou, começou a andar para a porta e, ao passar por Gomes Nunes disse:

 - Podeis contar comigo se necessitardes.

Sorriu pela última vez à sua amada e despediu-se.

 - Adeus Chamoa, estais mais bela do que nunca!


Em passada larga abandonou a sala, deixando a rapariga corada, Paio Soares enciumado e Gomes Nunes dividido entre duas lealdades.

sexta-feira, janeiro 08, 2016

Está cada vez mais gordo...
A Coreia do Norte e

a bomba de hidrogénio

















Este país, que, não esqueçamos, continua oficialmente em guerra com a Coreia do Sul, entretém-se a amedrontar os seus vizinhos do Sul, rebentando no sub-solo bombas de hidrogénio, que talvez não o sejam tanto... e mimando-os com frases tão ameaçadoras como esta:

 - “Um evento assustador para o mundo e um passo de gigante para o povo norte-coreano que diariamente realiza milagres.”

A Coreia do Norte evoluiu de um País para um Hospício de Alienados Mentais, dirigido, aparentemente, por um jovem que não parece ter os 34 anos que já possui.

Kin Jung-un, com um corte de cabelo ridículo e um rosto de menino imberbe e caprichoso, desenvolveu o culto da sua imagem perante quem as mulheres choram e o povo rasteja em adoração e que ele enxota, incomodado.

Dispõe da vida de milhões de súbitos e elimina de forma cruel eventuais ou imaginários inimigos políticos, alguns deles parentes chegados, que lhe serão apontados por aqueles que, talvez, esperam chegar a sua vez...

Manda matá-los com extremos requintes de crueldade como àquele familiar que foi atirado a cães esfomeados para ser devorado.

A Coreia do Norte não consegue alimentar os seus quase 24 milhões de habitantes, nos seus 120.000 km2, e esta estratégia das bombas parece ser um estratagema para conseguir ajuda alimentar.

Aquele homem, de rosto infantil, na linha de seu pai, fez a Coreia do Norte recuar dois mil anos, até ao tempo dos Imperadores loucos que levaram o Império Romano à ruína.

Também eles se faziam adorar como deuses comportando-se como gente alienada de “péssimos fígados” que jogavam com a vida de quantos lhe estavam próximos.

O mundo vê isto e pasma mas, depois do que tem sido mostrado pelos terroristas do dito Estado Islâmico, já não há razões para espantos... para além de que, ele, o mundo, tem outros problemas com que se preocupar tais como: Contas, Deficits, Juros, Falências de Bancos, ... todas essas coisas das Finanças que quando se desequilibram vão-nos sempre aos bolsos...

A China dá-lhes cobertura política e com esta história das bombas de hidrogénio, talvez mais bombas que hidrogénio, só podem sentir-se incomodados...

Os Sul-Coreanos, vizinhos e povo irmão, vão distanciando-se, - são até já mais altos porque se alimentam com deve ser, ao contrário da fome porque passam os parentes do norte -  “atingem-nos”, agora, com altifalantes dispersos ao longo da fronteira e balões com que lhes enviam mensagens com informações sobre os dois lados de um mesmo país.

A sul, uma sociedade livre que seguiu a via do desenvolvimento, a outra, a norte, que enveredou por uma ditadura com o culto da personalidade de um chefe meio louco  endeusado.

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A morte com pés de veludo...



Gato Fedorento - Gente que não vai a lado nenhum



Tieta do Agreste
(Jorge Amado)


EPISÓDIO Nº 48



















DA TRISTE VOLTA DO CAVALEIRO ANDANTE, ESCORRAÇADO, E DOS TELEGRAMAS ENVIADOS POR TIETA MOTIVANDO COMENTÁRIOS, HIPÓTESES E APOSTAS – PRECEDIDOS, VOLTA E TELEGRAMA, DO DIÁLOGO ENTRE OSNAR E DOUTOR CAIO VILASBOAS QUE POR FRASCÁRIO E INÚTIL NÃO DEVIA FIGURAR EM OBRA LITERÁRIA PRETENSAMENTE SÉRIA


T
ieta e Leonora aguardam a chegada da marinete na Agência dos Correios. Esperar a marinete, assistir ao desembarque dos passageiros, é das mais excitantes diversões do Agreste.

Quando o atraso é grande, a espera torna-se por vezes enfadonha mas, em compensação, não se paga nada. Há sempre um grupo de vadios rondando a porta do cinema onde Jairo estaciona o glorioso veículo. Outros ficam de tocaia no bar, os ilustres batem papo com dona Carmosina.

Elisa veio encontrá-las na Agência, muito excitada, querendo saber se dona Carmosina estava a par do acontecido entre Osnar e doutor Caio Vilasboas; na véspera Astério a acordara para lhe contar o escabroso diálogo.

Esse Osnar não passa de um patife, não respeita ninguém: afinal doutor Caio é médico, possui terras e rebanhos, é compadre da Senhora de Sant’Ana, madrinha da sua filha Ana, cidadão de idade, devoto e respeitável.

Dona Carmosina está a par, é claro. Aminthas, testemunha do encontro, amanhecera em casa de dona Milú; relatara, palavra por palavra, a conversação na madrugada. Pois bem, de tudo o que Osnar dissera, nada se compara, na opinião de dona Carmosina ao deboche final, pois esse doutor Caio é santo-de-pau-oco, minha filha, por fora Senhor São Bento, por dentro pão bolorento. Osnar é um porreta, de vez em quando lava a alma da gente.

Tieta interrompe a discussão, curiosa de saber de que conversa se trata, capaz de causar tanto riso, de provocar indignação e entusiasmo.

Dona Carmosina não se faz de rogada, capricha nos detalhes. 

Sucedera há dois dias, naquela noite em que Osnar e Aminthas ficaram até tarde em casa de Perpétua, saindo depois a mariscar nas ruas.

Altas horas, quando voltaram da beira do rio, Osnar acompanhado de uma quenga de baixa extração, encontraram-se com o doutor Caio Vilasboas, um catão, vindo de atender à velha dona Raimunda, asmática incurável.

Fosse algum pobre de Deus agonizando, o doutor não abandonaria o calor da cama, mas a velha dona Raimunda tinha dinheiro grosso, destinado em testamento a pagar a conta do médico quando o Senhor a chamasse ao seu seio.

Ao ver Osnar despedir-se da esfarrapada criatura, medonhosa, doutor Caio, psicólogo amador, abelhudo de nascença, não se conteve:

- Satisfaça-me, caro Osnar, a curiosidade, respondendo a uma pergunta que me permito fazer-lhe.

- Mande brasa, meu doutor, sou seu criado às ordens.

- Você é um rapaz endinheirado, já meio entrado em anos mas sendo solteiro ainda passa por rapaz, de boa família, com hábitos de asseio, tendo com que pagar cortesã de melhor nível, por que não frequenta a casa dirigida pela rapariga que atende por Zuleika Cinderela, onde, segundo me consta – lá estive na exercício sagrado da medicina e não como cliente – praticam esse infame comércio de mulheres limpas, de belo porte e figura amena, por que prefere essas imundas, essas bruxas?

- Primeiro permita, meu doutor, que eu lhe informe ser um dos fregueses predilectos das meninas da casa de Zuleika e da própria patroa, boa de rabo. Parte sensível da minha renda se esvai naquele antro. É certo, porém, que não desprezo um bucho quando saio de caçada, vez por outra. Alguns, devo confessar bastante deteriorados.

- E por quê? Deixe que eu lhe diga tratar-se de apaixonante problema de psicologia digno de memória dirigida à Sociedade de Medicina Psiquiátrica.

- Vou-lhe dizer por que, meu doutor, e escreva a razão se quiser, não me oponho. Se chamo um bucho aos peitos quando calha o motivo é não viciar o pau, o Padre-Mestre.

- Padre-Mestre?

- Foi o apelido que ele ganhou, dado por uma beata ainda passável com quem andei praticando umas sacanagens, meu doutor.

Imagine se eu servisse ao Padre-Mestre somente pitéus finos, material de primeira, formosuras, perfumarias, e ele se acostumasse apenas a comer do bom e do melhor.

De repente, um dia, por uma circunstância qualquer, dessas que acontecem quando a gente menos espera, me vejo obrigado a pegar um estrepe em más condições e o Padre-Mestre, viciado, se recusa, fica peruruca, brocha.

Não lhe dou vício, vou comendo as bonitas e as feias e tem cada feia que vale mais do que um exército de bonitas porque uma coisa, meu doutor, é mulher para se ver e admirar a imagem e outra é o gosto da boceta.

Doutor Caio emudece, o queixo caído, Osnar conclui:

- De suas visitas profissionais à pensão de Zuleika, ouvi falar; Sílvia Sabiá me contou muito em segredo que chuparino igual a vosmicê não há por essas bandas. Meus sinceros parabéns.

Enquanto riem as quatro – esse Osnar é de morte! – buzina na curva a marinete, naquela quinta feira por milagre quase no horário, desprezível atraso de vinte minutos, Jairo recebendo felicitações dos passageiros.



A Confissão do Joãozinho

 ao 70 anos de idade.


















Joãozinho, aos 70 anos, residindo numa  pequena e pacata cidade, abordou o padre na rua e segredou-lhe:


- Padre, eu nunca me confessei mas, como estou ficando velho, acho que chegou a hora !!! Só que eu gostaria de me confessar com um anjo... Tem jeito???

- Mas meu filho, com um anjo??? Isso é meio difícil!!! Olha, se minha presença o inibe, eu posso dar poderes ao sacristão para ouvir sua confissão!!!

- Não, seu padre, eu tenho dois pecados gravíssimos os quais só posso confessar a um anjo, tenho certeza!!!

- Bem, então, no domingo, vá a igreja e assista a missa. Após a missa, eu providenciarei um anjo para ouvir suas confissões.

Joãozinho, eufórico, exultou:

- Muito obrigado, seu padre, o senhor não pode nem imaginar a Paz que o senhor está me devolvendo !!!



E assim ...



Joãozinho, aos 70 anos, aliviado por ter resolvido o seu problema e o padre preocupado com o problema que acabara de arranjar.



Chegando a igreja, o padre chamou o sacristão, contou-lhe a história e começaram a traçar o plano para levar um anjo ao confessionário.
- Faremos o seguinte, disse o padre: vou vesti-lo de anjo, amarro uma corda em volta do seu corpo, vou descendo-o sobre o confessionário e conforme for descendo você abana as asas. O que acha???
- Perfeito, disse o sacristão; O seu Joãozinho está velho, enxerga pouco, não vai notar nada.

Domingo, Joãozinho assistiu à missa inteira, aguardou que todos saíssem da igreja e o sacristão fechou a porta.

Levantou-se do banco e se encaminhou para o confessionário.

Passaram-se alguns minutos e lá veio o sacristão abanando as asas sobre o confessionário. Joãozinho se ajoelhou. E o 'anjo', com voz angelical, perguntou:
- Meu filho, por que você não quis se confessar nem com o padre e nem com o sacristão?
- Sabe o que é, seu anjo, é que eu estou comendo a mãe do padre e a mulher do sacristão!!! Entendeu agora porque eu não queria me confessar com eles?
- Entendi, meu filho, disse o "anjo" - Então eu lhe dou como penitência, 200 Ave Marias pela mãe do padre e 2000 Pai Nossos pela mulher do sacristão.
Está bem assim, meu filho???
- Justíssimo, seu anjo, respondeu Joãozinho. Por isso que eu queria me confessar com quem entende. 2000 Pai Nossos pela mulher do sacristão, contra 200 Ave Marias pela mãe do padre é mais que justo, pois a mulher do sacristão é 10 vezes mais gostosa que a mãe do padre.
- Muito obrigado seu anjo, já vou agora mesmo, lá pro altar, pagar a penitência !!!


O "anjo" aguardou um instante, fez um sinal para o padre que o puxou de volta e, curioso, indagou:

- E aí, meu filho, como foi a experiência???

- Horrível seu padre... horrível!!!
 

Desci como anjo, subi como corno,

puxado por um filho da puta!!!


Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 149






















Chamoa levou as mãos ao peito. Só ouvia falar em perigos, invasões, guerras. Aflita partilhou os seus terrores.

 - A criança que eu carrego e a de vossa mãe vão nascer no meio de uma guerra. Tenho medo, medo por elas, medo por vós!

O príncipe recordou-se das palavras de Celanova, que temia também a guerra, como a maioria das mulheres. Irritado declarou:

 - Já vos perdi, não vou perder o Condado!

Prometeu que ia lutar contra a mãe e contra o Trava e, se preciso, contra Afonso VII, recusando-se à vassalagem. E iria igualmente defender Toronho e Celanova que, tal como Límia, Astorga e Zamora, eram territórios que lhe pertenciam.

Chamoa bateu as pestanas, receosa e perguntou.

 - E meu marido? – Tereis de lutar contra ele?

Afonso Henriques manteve-se pensativo por uns instantes, e depois um brilho novo nasceu-lhe nos olhos, quando exclamou:

- Tendes de o convencer a juntar-se a mim! Com Paio Soares os portucalenses seriam muito mais fortes!

Chamoa, sabendo da improbabilidade da situação, sentou-se num banco e lamentou-se:

- Meu marido e meu amado em guerra! Meu Deus, acudi-me!

De forma inesperada nasceu nela um impulso de revolta contra aquelas circunstâncias, pois confessou:

- Se não esperasse um filho, fugiria convosco hoje mesmo!

Contente, o príncipe aproximou-se e com os dedos da mão procurou secar-lhe os olhos molhados, sorrindo-lhe. Chamoa fungou mas depois riu-se, como uma criança que faz uma descoberta e comentou:

 - Haveis estado com Raimunda, desde Viseu? Sei que a filhais! Meu tio Fernão e meu marido também têm espiões!

Afonso Henriques olhou-a de novo nos olhos e garantiu que desde a Páscoa não voltara a estar com a outra. Chamoa tinha dúvidas como sempre têm as mulheres. Então, o príncipe disse numa voz meiga:

 - É de vós que preciso, como a terra precisa da chuva e do sol!

A relutância da rapariga foi vencida e encantada com esta declaração tocou-lhe na barba e murmurou:

- Está mais crescida. Encostando a sua cara à dele fechou os olhos e confessou:

 - Quando meu marido entra em mim, é em vós que eu penso.

Afonso Henriques beijou-a e abraçou-a com ternura, apenas com o silêncio e uma vela trémula como testemunhas. Mas logo Chamoa recordou:

 - Não podemos, estou grávida!

Enervado, para combater a tentação, Afonso Henriques afastou-se e Chamoa temeu que ele se fosse embora.

Esperai! A minha mãe diz que podemos...murmurou. Aconselhou-me que nos encontrássemos em segredo.

Depois de um momento pasmado, o príncipe ganhou novo alento e reaproximou-se exclamando:

 - Aqui ninguém nos vê, ninguém nos ouve!

Porém, ela continuava ansiosa, temia a chegada do marido e voltou a recuar. Afonso Henriques, cada vez mais entusiasmado, sugeriu:

 - Beija-me como em Viseu!

Ela chegou a ajoelhar-se, mas quando lhe abriu a dalmática ouviu-se grande algazarra lá fora. Aterrada, Chamoa pôs de pé.


 - Será meu marido que chega? 

quinta-feira, janeiro 07, 2016

América, Deus e as Armas





















Quando a população das Ilhas Britânicas, por razões de natureza religiosa e económica, começou a rumar à América dos Índios, deixando definitivamente para trás as suas raízes, passamos a ter a América dos Colonos.

A imensidão do território que os esperava, o espaço vazio, o isolamento, as dificuldades que tiveram de resolver e ultrapassar, a novidade de tudo o que encontraram, desenvolveu nestas pessoas um terrível sentimento de orfandade e, dominados por ele, agarraram-se a Deus e às armas.

As memórias de tudo o que tinha ficado para trás, da herança do passado, cristalizou nos seus cérebros e funcionou como pilar das suas novas vidas.

Recomeçaram do zero num espaço desconhecido mas, ao mesmo tempo, desafiante.

Na construção dessa nova sociedade duas grandes preocupações: segurança e justiça. A grande protecção só poderia vir de Deus, por isso, a Bíblia na cabeceira da cama, mas para a outra protecção, que não era divina, havia a espingarda pendurada na parede à mão de semear.

Para o resto, o Xerife e o Juiz eram os bons, os bandidos e os índios, os maus.

Aprendemos tudo isto nos filmes de western, ainda dos anos 50. Nós próprios, em criança, também brincámos aos cowboys aos “tiros” uns aos outros.

Na ausência de uma sociedade estruturada, desenvolveu-se o individualismo e a solidariedade como forma de sobrevivência.

Todos os sentimentos e instintos de homens  entregues a si próprios, ficaram livres para se expandirem sem o olhar correctivo e atento da sociedade tradicional da velha Grã-Bretanha.

O colono americano teve que se defender a si, à família, casa e animais, e na ausência de uma autoridade, era à sua arma que ele entregava a sua segurança.

No princípio, em vários Estados da América do Norte era assim: um homem sem a pistola à cintura sentia-se despido. 

Todos os polícias e forças da ordem que o deviam proteger estavam ali, na sua cintura, e hoje, em 2015, a pistola lá continua pela força dessa tradição quando já não faz sentido algum e com os riscos denunciados.

Obama fala ao país e comove-se até às lágrimas quando se refere às crianças vítimas das armas acessíveis a toda a gente mas a lei americana, a que representa a ala conservadora, obsoleta, religiosa, republicana, não quer mudar sendo que, agora, são já os seus interesses ligados à indústria da armas que estão em jogo.

Obama, no fim do seu mandato, depois de se ter emocionado à frente da nação americana, irá fazer tudo o que estiver ao seu alcance mas o espectáculo que deu foi bem o retrato da sua impotência.

A esperança reside na eleição de Hillary Clinton, uma feroz defensora de uma lei das armas ainda mais restritiva.

O lema dos E.U.A é: - “Em Deus confiamos”, e esta religiosidade foi expressa em moedas há mais de um século, mas a confiança nas armas é ainda mais antiga pelo que, qualquer mudança, não será fácil nem rápida e contará sempre com opositores viscerais.

Obama nem sequer cumpriu o serviço militar, ao contrário de George Washington, Kennedy, Búfalo Bill...  e estes é que fazem a mitologia americana.

Pessoalmente, o assassínio de três homens incompatibilizaram-me com a América: os irmãos Kennedy e Luther King.

Já lá vão muitos anos mas nunca esqueci a morte dessas pessoas que tanto admirava. Por elas, nunca quis visitar a América, fiquei sentido para sempre...

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