sexta-feira, junho 28, 2013

VAMOS DE FÉRIAS

Amanhã vou de férias, quebrar a rotina lá nas praias do Algarve, lindas como não há outras. Temos que aproveitar... Daqui a um ano não sei se estarei vivo, se estarei doente ou se o Estado ainda tem dinheiro para me pagar. Agora é um dia de cada vez sem deixar para depois o que ainda se pode fazer hoje. Entrámos numa nova perspectiva do tempo e da vida nestas "sobras" que ela amavelmente nos vai concedendo... passem bem.

A partir de 15 do próximo mês, diariamente, cá estaremos. 

IMAGEM

Meio escondida na fortaleza de Maputo, em Moçambique, a estátua de Mouzinho de Albuquerque lá resistiu impávida aos ventos da história mesmo tendo feito o que fez ao Gungunhana, em Chaimite, em 1895. Nada de ressentimentos...


Histórias de Crianças



Uma menina estava conversando com a professora que lhe disse que era fisicamente impossível a uma baleia engolir um ser humano porque apesar de ser um animal muito grande, a sua garganta era muito pequena. Mas a menina afirmou que Jonas tinha sido engolido por uma baleia.

Irritada, a professora repetiu que uma baleia não podia engolir um ser humano porque era fisicamente impossível.

A menina então, disse:

- Quando eu morrer e for para o céu, vou perguntar a Jonas.

- Então, a professora disse:

- E se o Jonas tiver ido para o inferno?

- Então é a senhora que vai perguntar.


XXX


Uma professora, na creche, observava as crianças da sua turma desenhando. Ocasionalmente, passava pela sala para ver os trabalhos de cada criança. Quando chegou junto de uma menina que trabalhava intensamente perguntou-lhe o que desenhava.

- A menina respondeu:

- Estou a desenhar Deus.

- A professora parou e disse:

- Mas ninguém sabe como é Deus.

Sem levantar os olhos do desenho a menina respondeu:

- Vão ficar a saber dentro de um minuto.


XXX



Uma honesta menina de sete anos admitiu calmamente a seus pais que o Luís Miguel lhe havia dado um beijo depois da aula.

- E como aconteceu isso, perguntou a mãe assustada.

Não foi fácil, respondeu a filha, mas três colegas minhas me ajudaram a segura-lo.


XXX


Uma menina estava observando a mãe a lavar os pratos na cozinha e percebendo que ela tinha vário cabelos brancos sobressaindo da vasta cabeleira escura, perguntou:

- Por que tens tantos cabelos brancos, mamã?

- Bem, quando fazes alguma coisa de ruim, me fazes chorar, me entristeces, um dos meus cabelos fica branco.

- Mamã:

- Por que é que então, todos os cabelos da avó estão brancos?...

XXX


Um menino de três anos foi com o pai ver uma ninhada de gatinhos que tinham acabado de nascer.

De volta a casa, excitado, contou à mãe que havia gatinhos e gatinhas.

- Como é que soubeste isso? – perguntou a mãe.

- O papá levantou-os e olhou para baixo, respondeu o filho, acho que estava lá a etiqueta.


XXX


Todas as crianças tinham ficado na fotografia e a professora estava a persuadi-las a que cada uma ficasse com uma cópia da fotografia do grupo.

- Já repararam como irá ser engraçado, daqui por uns anos, dizerem:

- Olha ali a Catarina, é uma grande médica, e o Luís Miguel é advogado… e uma voz lá de trás: “olha a professora, coitada, já morreu!

JOANA - AMANHÃ TALVEZ



As Finanças notificaram hoje o senhor Vasco Simplício da Cunha Gama para o pagamento do Imposto Único de Caravelas relativo à embarcação “São Gabriel”.

Segundo o Imprensa Falsa conseguiu apurar, o imposto em falta refere-se aos anos de 1497 até 2012, pois Vasco da Gama nunca mandou abater a caravela. Relativamente ao IUC de 2013 o mesmo pode ser liquidado até Julho, porque é o primeiro registo dela.

Até hoje, as Finanças não tinham descoberto o proprietário desta embarcação, mas depois de lerem o diário da viagem de Vasco da Gama à Índia que a UNESCO inscreveu hoje na lista de Memória do Mundo, foi fácil identificar o contribuinte faltoso.

Entretanto, Vasco da Gama já contestou dizendo que arrancou logo para a Índia, nem teve tempo de ir às Finanças, mas, por outro lado, o navegador diz que foi o rei D. Manuel I que ficou de pagar isso, até porque, na verdade, a caravela era dele.

Esta contestação não caiu bem junto das autoridades, que consideram que o descobridor difamou o Chefe de Estado, tendo sido enviada a respectiva contestação para a Procuradoria Geral da República. Vasco da Gama poderá agora ter de vir a pagar, para além do IUC da caravela, uma multa por ofensas ao Chefe de Estado.

Desenvolvimento e educação trazem manifestação...
BRASIL


Não param as cedências do poder no Brasil face às ondas de contestação social dos manifestantes. Uma das maiores reivindicações foi agora aprovada pelo Senado, na quarta-feira, passando a considerar-se a corrupção como crime hediondo com o consequente agravamento das penas dos condenados por tal crime.

Como já tínhamos feito referência, a Câmara dos Deputados já tinha satisfeito outras exigências tais como o arquivo da proposta que limitava as investigações do Ministério Público aos deputados, a redução dos impostos sobre os transportes e a atribuição de todas as receitas do petróleo às áreas da Educação e da Saúde.

Parece que, no essencial, as reivindicações estão satisfeitas mas será isso suficiente para pôr termo aos desfiles, em alguns casos com violência, que proliferam por todas as cidades do Brasil quando o Mundial de Futebol está aí à porta?

Partiu-se de um aumento dos bilhetes nos Transportes Públicos  que foi suspenso e veja-se onde já vamos... Parece a Caixa de Pandora que uma vez aberta é difícil de a repor no lugar.

Dilma, percebendo a importância e gravidade dos acontecimentos partiu logo de avião a aconselhar-se com o promotor e responsável da sua eleição a Presidente, Lula da Silva, líder carismático do Partido dos Trabalhadores que promoveu, enquanto Presidente, reformas que estão na base da melhoria das condições de vida dos brasileiros e do surgimento desta classe de jovens esclarecidos mas críticos e exigentes... não há bela sem senão!

MONOTEÍSMO

Richard Dawkins – “A Desilusão de Deus”

(continuação – Parte II)


É convencional supor que os Pais Fundadores da república norte-americana eram deístas (em geral, acreditam que as ideologias religiosas devem tentar reconciliar e não contradizer a ciência, ou seja, o deísmo pode ser considerado uma derivação do teísmo agnóstico. Assim, um dos princípios fundamentais desta posição é baseada na consolidação de que Deus existe e criou o universo físico, mas não interfere com ele).

Não há dúvida de que muitos deles o eram, embora já tenha sido afirmado que os mais notáveis de entre eles poderão ter sido ateus. Aquilo que escreveram sobre religião no seu tempo não me deixa dúvidas de que, na sua maior parte, eles teriam sido ateus nos tempos de hoje.

As opiniões religiosas dos Pais Fundadores revestem-se, hoje em dia, de um grande interesse para os propagandistas da direita americana, ansiosos por nos impingirem a sua versão da história.

É frequente apontar-se o paradoxo existente na circunstância dos EUA, fundados sobre uma base de secularismo, serem hoje o mais beato dos países da cristandade, enquanto a Inglaterra, com uma igreja oficial chefiada pelo monarca constitucional, está entre os países com menor grau de religiosidade.

Estão constantemente a perguntar-me porque isto acontece e eu não sei.

É possível que a Inglaterra se tenha fartado de religião após uma aterradora história de violência entre crenças, com protestantes e católicos a substituírem-se alternadamente na mó de cima e cada um dos grupos a matar sistematicamente o outro.

Outra hipótese reside no facto da América ser uma nação de imigrantes. Um colega chamou-me a atenção para o facto de estes, desenraizados da estabilidade e do conforto dos parentes que tinham na Europa, poderem muito bem ter abraçado a Igreja como uma espécie de substituto da família em solo estrangeiro.

É uma ideia interessante e que vale a pena investigar com maior profundidade. Não há dúvida de que muitos norte-americanos vêem a sua igreja local como uma importante unidade identitária, efectivamente dotada de alguns dos atributos do agregado familiar.

Outra hipótese, ainda, é que o fanatismo religioso dos EUA provenha paradoxalmente do secularismo da sua Constituição.

Precisamente porque os EUA são, juridicamente, um país secular, a religião ter-se-ta tornado um negócio. Rivalizando entre si, as igrejas rivais competem para conseguir fiéis – e não menos pelo gordo dízimo que estes trazem consigo – mantendo a rivalidade através de todas as técnicas agressivas de venda conhecidas no mercado.

O que funciona para os detergentes também funciona para Deus e o resultado é uma espécie de mania da religião por parte das classes menos instruídas.

Por oposição, em Inglaterra a religião tornou-se, sob a égide da Igreja oficial, pouco mais do que um agradável passatempo social, dificilmente reconhecido como religioso.

JUBIABÁ

Episódio Nº 54



MACUMBA

Foi feito despacho de Exu, para que ele não viesse perturbar a boa marcha da festa. E Exu foi para muito longe, para Pernambuco ou para África.

A noite caía pelos fundos das casas e era aquela noite calma e religiosa da Baía de Todos os Santos. Da casa do pai de santo Jubiabá vinham sons de atabaque, agogô, chocalho, cabaça, sons misteriosos da macumba que se perdiam no pisca-pisca das estrelas, na noite silenciosa da cidade. Na porta, negras vendiam acarajé e abará.

E Exu, como tinham feito o seu despacho, foi perturbar outras festas mais longe, nos algodoais da Virgínia ou nos candomblés do morro da Favela.

Num canto, ao fundo da sala de barro batido, a orquestra tocava. Os sons dos instrumentos ressoavam monótonos dentro da cabeça dos assistentes.

Música enervante, saudosa, música velha como a raça, que saía dos atabaques, agogôs, chocalhos, cabaças.

A assistência, apertada em volta da sala, junto à parede estava com os olhos fitos nos “ogans” que ficavam sentados em quadrado no meio da sala. Em torno dos “ogans” gritavam as “feitas”.

Os “ogans” são importantes, pois eles são sócios do candomblé e as “feitas” são as sacerdotisas, aquelas que podem receber o santo.

António Balduíno era o “ogan”, Joaquim também, mas o Gordo ainda não era e estava a meio da assistência, bem junto de um homem, branco e magro, calvo, que espiava a cena muito atento, procurando acompanhar a música monótona com pancadas nos joelhos.

Do outro lado, um jovem negro de roupa azul estava envolvido pela música e pelos cânticos, esquecido que tinha vindo observar.

O resto da assistência era formada por homens pretos, homens mulatos que se apertavam contra negras gordas, vestidas com anáguas e camisas decotadas e colares ao pescoço. As “feitas” dançavam lentamente, sacudindo o corpo.

De repente, uma negra velha que estava encostada à parede da frente, perto do homem calvo, e que de há muito tremia nervosa com a música e com os cânticos, recebeu o santo. Foi levada para a camarinha. Mas como ela não era “feita” da casa, ficou lá até que o santo a abandonou e foi pegar uma negrinha moça que também entrou para o quarto das sacerdotisas.

O orixalá era Xangô, o deus do raio e do trovão, e como desta vez ele tinha pegado uma “feita”, a negrinha saíu da camarinha vestida com roupas de santo: vestido branco e contas brancas pintalgadas de vermelho, levando na mão um bastãozinho.

A mãe do terreiro puxou o cântico, saudando o santo:

«… Endurô dêmin Ionan ê yê!

A assistência cantou em coro:

«… A umbó k’ó wá jô!

E a mãe do terreiro estava dizendo no seu cântico nagô:

«… Abram alas para nós, que viemos dançar»
  

quinta-feira, junho 27, 2013

IMAGEM
Quando a colheita da alfazema pare ser um acto de culto...


FADO - A VOZ DE UM POVO

Não há um português, e muito menos um lisboeta, que não reaja emocionalmente a este mail e se tiver longe, noutros países, aí até dói...

Baptista- Bastos
A almoçarada
   




«O vistoso Grupo Excursionista Passos Coelho & Compinchas foi a uma almoçarada em Alcobaça. Deslocou-se, o grupo, em potentes automóveis, levando consigo, convenientemente, os guarda-costas habituais. Um número incontável de viajantes. Poderiam, talvez, viajar de autocarro, mas não. A decisão foi tomada em Conselho de Ministros anterior, com a veemência que deliberações desta natureza exigem e justificam. No presumível autocarro, a excursão seria mais divertida: um bulício de conversas e de risos, uma troca de histórias matreiras, acaso inconfidências risonhas e intercâmbio de pequenos segredos.

O selecto conjunto ia discretear sobre as maleitas da pátria e, porventura, encontrar soluções para o que nos aflige. Poderia, a reunião, ter sido em Algés, na Trafaria ou na Tia Matilde. Qual quê? O recato do mosteiro e o meditativo silêncio eram convites indeclináveis à grave reflexão a que se propunha aquela gente considerável.

Acontece um porém: na capela ia celebrar-se um casamento, e um repórter curioso aproximou-se, lampeiro, de gravador em punho. Esclareceu a jovem, vestida a rigor com véu e flor de laranjeira, a coincidência de o Governo estar ali, e ela também para o enlace desejadamente jubiloso. Espavorida, fugiu para o interior do monumento, sem a complexidade indecisa dos que olham para o poder com reverente obséquio. Entendeu, provavelmente, a noiva que o encontro não era sinal auspicioso e que a presença simultânea de tantos ministros dava azar.

Tomando as coisas pelo seu nome, acerca de que conversaram, aqueles que tais; que valores absolutos como a verdade, o bem, o sagrado, a beleza alinharam no que disseram? Adquiriram consciência de que a unidade dos valores morais está a desintegrar-se rapidamente, por culpa própria? O recolhimento piedoso do local era propício a actos de meditação e, por decorrência, à contrição e ao remorso.

Mais prosaicamente, que comeram os excursionistas? Embrulharam lanche? Levaram marmita? Passear, decididamente, não. O coro de protestos, de vaias e de insultos que os recebeu teria afugentado qualquer ideia de turismo. No final, o ministro Poiares Maduro, em resposta à ânsia noticiosa dos jornalistas, disse umas frases inócuas. Percebeu-se, no enredo, que o encontro de Alcobaça redundara em nada, rigorosamente em nada; que nada se decidira, que tudo fora absurdo, confuso e disperso.

Poiares Maduro é, certamente, bom rapaz, e só por isso tem uma aparência formal de tranquilidade infalível. A voz ainda está em formação, e não me parece que possua sabedoria administrativa e astúcia suficientes para enfrentar as armadilhas que o aguardam. O partido que suporta o Governo é um saco de lacraus. Dividido em grupos de interesses, até já perdeu o sentido da cortesia. E a almoçarada, em Alcobaça foi uma sessão de despropósito, consequente com o estado do Governo.» [DN]
   
Autor:

Baptista-Bastos.
   

Manifestações no Brasil
Manifestações 

no 

Brasil



Na madrugada do passado dia 26 de Junho a Câmara dos Deputados aprovou uma proposta que obriga a canalizar 75% das receitas do petróleo para a Educação e 25% para a Saúde contrariando Dilma que queria a totalidade dessas receitas para a Educação. Na prática estamos a falar de 100.000 milhões de euros... falta agora passar no Senado.

Mas houve mais:

 - A proposta de Emenda Constitucional que protegia os deputados das investigações do Ministério Público foi rejeitada no Parlamento.

Estas medidas, tomadas quando o Brasil em peso se levanta desfilando com cartazes significativos, são bem o sintoma de que o poder só verga quando confrontado com a força e determinação dos cidadãos ou seja: não se trata de decisões tomadas a pensar no bem das pessoas, se assim fosse, já teriam sido tomadas... O que se trata agora é de salvar a pele... não merecem a nossa confiança.



MONOTEÍSMO



O grande mal indizível no centro da nossa cultura é o monoteísmo. A partir de um texto bárbaro da Idade do Bronze conhecido como Antigo Testamento, evoluíram três religiões anti-humanas – o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo. Trata-se de religiões de um deus do céu. São literalmente patriarcais – Deus é o Pai Todo-Poderoso – daí o desprezo pelas mulheres desde há 2.000 anos nos países atormentados por esse deus do céu e pelos seus representantes masculinos na terra.

Gore Vidal (escritor norte-americano nascido em 1925)


A mais velha das três religiões abraâmicas, e nítido antepassado das outras duas, é o judaísmo: originariamente era um culto tribal de um único Deus ferozmente antipático, doentiamente obcecado por restrições sexuais, pelo cheiro da carne queimada, pela sua própria superioridade relativamente aos deuses rivais e pela exclusividade da tribo do deserto que elegeu como sua.

Durante a ocupação romana da Palestina, o Cristianismo foi fundado por Paulo de Tarso enquanto facção do Judaísmo, uma facção menos implacavelmente monoteísta e também menos fechada que, levantando os olhos do meio dos judeus, os erguia para o resto do mundo.

Vários séculos mais tarde, Maomé e os seus seguidores regressaram ao monoteísmo intransigente da versão original judaica, embora sem a sua vertente exclusivista.

Fundaram, assim, o Islamismo com base num novo livro sagrado, o Corão ou Quran, ao qual acrescentaram uma poderosa ideologia de conquista militar para a propagação da fé.

Também o Cristianismo se propagou por meio da espada, brandida primeiro pelas mãos dos Romanos – depois do Imperador Constantino o ter promovido de culto excêntrico a religião oficial – posteriormente pelos cruzados e, mais tarde, pelos conquistadores espanhóis e outros invasores e colonos europeus, com o respectivo acompanhamento missionário.

Para os meus objectivos presentes, as três religiões abraâmicas podem ser, de um modo geral, tratadas como indistintas.

Salvo menção em contrário, terei sobretudo em mente o Cristianismo, mas apenas porque é versão que me é mais familiar.

Para os referidos objectivos, as diferenças têm menos importância do que as semelhanças. E não visarei minimamente outras religiões, como o Budismo e o Confucionismo. Na verdade há razões para afirmar que não se trata de religiões, mas sim, sistemas éticos ou filosofias de vida.


A simples definição da Hipótese Deus com que comecei este capítulo tem de ser substancialmente descarnada se a quisermos aplicar ao Deus abraâmico. Ele não só criou o universo, como é também um Deus “pessoal” que habita dentro desse universo, ou talvez fora dele (o que quer que isso signifique), possuindo as qualidades desagradavelmente humanas às quais já aludi.
(continua)

JUBIABÁ
JUBIABÁ

Episódio Nº 53

Saíram correndo. Lá estava na borda do cais. Um grupo de homens cercava o corpo. Devia ter passado uns três dias na água pois inchara e crescera. Os olhos muito abertos pareciam fitar o grupo. O nariz já andava meio comido e sentia-se dentro do corpo siris que faziam um barulho esquisito.

Pegaram o corpo e o levaram para “A Lanterna dos Afogados”. Juntaram duas mesas e o botaram em cima. Os siris faziam barulho por baixo da pele do cadáver. Pareciam chocalhos tocando. Seu António trouxe uma vela do balcão para enfiar na mão do que já não abria. Joaquim disse:

 - Só cresceu depois de morto.

O Gordo estava rezando:

- Coitado! Não tinha ninguém por ele…

Uns homens que bebiam cachaça vieram ver. As mulheres olhavam e afastavam com medo. Seu António ainda segurava a vela, pois ninguém tinha coragem de ir botar na mão do defunto.

António Balduíno pegou na vela e se aproximou do defunto. Abriu a mão grossa do afogado e meteu a vela dentro. Falou:

 - Ele era sozinho, gente… Ele tava procurando acertar com o caminho de casa e entrou pelo mar…

Ninguém entendia. Alguém perguntou onde ele morava.

Jubiabá que vinha chegando quis saber:

 - Boa noite pra ocês todos. O que foi?

 - Ele tava, pai Jubiabá, procurando o olho da piedade. Mas ele não achou nunca e se matou. Ele não tinha nem pai nem mãe, nem ninguém para cuidar dele. Morreu porque não encontrou o olho da piedade…

Ninguém entendeu mas tremeram quando Jubiabá disse:

 - Ojú ànum fó ti iká, Li ôkú.

O Gordo contava com muitos detalhes e de uma maneira muito triste a história de Viriato, o Anão, a um dos homens que bebiam cachaça.

Segundo o Gordo, uma vez Viriato, vira três anjos e uma mulher vestida de roxo que era sua mãe e o estava chamando para o céu.

Aí se jogara n’ água.

De repente, nomeio de toda aquela gente, António Balduíno se sentiu só com o cadáver e teve medo. Um medo doido. Ficou tremendo, batendo os queixos.

Se lembrou de todo o mundo: a sua tia Luísa que enlouquecera. Leopoldo que fora assassinado. Rosendo, doente, gritando pela mãe, Filipe, o Belo, debaixo do automóvel, o velho Salustiano se suicidando no cais, o corpo de Viriato, o Anão, cheio de siris que chocalhavam.

E pensou que eram todos eles muito infelizes, vivos e mortos. E os que nasceriam depois também. Só não sabia porque eram tão infelizes.


O temporal apagou a luz da “Lanterna dos Afogados”.

quarta-feira, junho 26, 2013

IMAGEM

A Mulher e a Enxada

Da classe dos explorados ela foi a mais explorada... e tudo começou quando a humanidade descobriu o arado. Até aí ela percorria os campos à volta das aldeias com as suas crianças  recolhendo alimentos e levava para casa mais de 60% do que se comia.


Biografia da Dilma Rousseff - Presidente do Brasil

Ajuda a compreender as manifestações que estão ocorrendo por tudo quanto é Brasil...

Por muita imaginação que tivesse não faria um discurso destes no momento da entrega de uma filha ao futuro marido. Assemelha-se a uma conversa muito elaborada de um grande negociante. A filha deve ter-se sentido como uma mercadoria elogiada no momento da transacção... mas pode ser que na terra dela se use assim... Alguém gostou muito e a colocou na Internet e eu reproduzo-a porque estes pais que falam com Deus para lhe fazerem pedidos que, pelos vistos, são todos atendidos,  fazem-me lembrar o Abraão do qual este deve ser um descendente directo... mas é curiosa de ouvir a história que ele conta...

DIVINA TRINDADE
(continuação – Parte III)

Richard Dawkins


Como é que gregos, romanos e vikings lidavam com estes enigmas politeológicos? Seria Vénus apenas mais um nome para Afrodite, ou seriam elas duas deusas do amor distintas?

Seriam Thor e o seu martelo uma manifestação de Wotan, ou um deus distinto? O que importa isso? A vida é demasiado curta para nos importarmos com distinções entre diferentes ficções da nossa imaginação.

Uma vez abordado o politeísmo, que mencionei para me precaver de eventuais acusações de omissão, não vou falar mais no assunto.

Para ser mais breve, referir-me-ei a todas as divindades, sejam elas politeístas ou monoteístas, simplesmente como «Deus».

Eu censuro o sobrenaturalismo em todas as suas formas, e o modo mais eficaz de prosseguir será concentrando-me na forma que muito provavelmente é a mais familiar para o meu leitor – aquela que invade ameaçadoramente todas as nossas sociedades.

A maioria dos meus leitores terá sido educada numa das três “grandes” religiões monoteístas dos nossos dias, todas elas com origem no mitológico patriarca Abraão pelo que é conveniente nunca esquecer esta afinidade de tradições.

Alguma crítica dirá: “O Deus em que Richard Dawkins não acredita é um Deus em que também eu não acredito: um velho de barbas brancas que está no céu.”

Esta é uma ideia de diversão para desviar atenções. Sei que o leitor não acredita num velho barbudo sentado numa nuvem, pelo que não percamos tempo com isso.

Não vou atacar nenhuma versão concreta de Deus ou de deuses. Vou atacar Deus, todos os deuses, tudo o que seja sobrenatural, onde e sempre que tenha sido ou venha a ser inventado.
(continua no Monoteísmo)


O Sindicalista do PCP
Mário Nogueira, os Professores
e os desgraçados dos Alunos


 Por Miguel Sousa Tavares

A minha entrada no ensino foi feita numa pequeníssima aldeia rural do norte. Éramos uns 80 alunos, da 1ª à 4ª classe, todos juntos na mesma e única sala de aula da escola - que não me lembro se tinha ou não casas-de-banho, mas sei que não tinha qualquer espécie de aquecimento contra o frio granítico, de Novembro a Março, que nos colava às carteiras duplas, petrificados como estalactites. Lembro-me de que o "recreio" era apenas um pequeno espaço plano, enlameado no Inverno, e onde jogávamos futebol com uma bola feita de meias velhas e balizas marcadas com pedras. A escola não tinha um vigilante, um porteiro, uma secretária administrativa. Ninguém mais do que a D. Constança, a professora que, sozinha, desempenhava todas essas tarefas e ainda ensinava os rios do Ultramar aos da 4ª classe, a história pátria aos da 3ª, as fracções aos da 2ª, e as primeiras letras aos da 1ª. Ela, sozinha, constituía todo o pessoal daquilo a que agora se chama o 1º ciclo. Se porventura, adoecesse, ou se na aldeia houvesse, que não havia, um médico disposto a passar-lhe uma baixa psicológica ou outra qualquer quando não lhe apetecesse ir trabalhar, as 80 crianças da aldeia em idade escolar ficariam sem escola. Mas ela não falhou um único dia em todo o ano lectivo e eu saí de lá a saber escrever e para sempre apaixonado pela leitura. Devo-lhe isso eternamente.

Nesse tempo, não havia Parque Escolar, não havia pequenos-almoços na escola (que boa falta faziam!), não havia aquecimento nas salas, não havia o recorde de Portugal e da Europa de baixas profissionais entre os professores, não havia telemóveis nem iPads com os alunos, não havia "Magalhães" ao serviço dos meninos, mas sim lousas e giz, os professores não faziam greves porque estavam "desmotivados" ou "deprimidos" e a noção de "horário zero" seria levada à conta de brincadeira. Era assim a vida.

Não vou (notem: não vou) sustentar que assim é que estava bem. Limito-me a dizer que tudo é relativo e que nada do que temos por adquirido, excepto a morte, o foi sempre ou o será para sempre. E sei que na Finlândia - o país considerado modelo no ensino básico e secundário pela OCDE - os professores trabalham mais horas do que aqui, não faltam às aulas e ganham proporcionalmente menos. Com resultados substancialmente melhores, do único ponto de vista que interessa aos pais e aos contribuintes: o desempenho escolar dos alunos.

Só uma classe que recusou, como ultraje, a possibilidade de ser avaliada para efeitos de progressão profissional - isto é, uma classe onde os medíocres reivindicaram o direito constitucional de ganharem o mesmo que os competentes - é que se pode permitir a irresponsabilidade e a leviandade de decretar uma greve aos exames nacionais. Nisso, são professores exemplares: transmitem aos alunos o seu próprio exemplo, o exemplo de quem acha que os exames, as avaliações, são um incómodo para a paz de um sistema assente na desresponsabilização, na nivelação de todos por baixo, na ausência de estímulo ao mérito e ao esforço individual.

Mas a greve dos professores vai muito para lá deles: reflecte o estado de espírito de uma parte do país que não entendeu ou não quer entender o que lhe aconteceu. Deixem-me, então recordar: Portugal faliu. O Portugal das baixas psicológicas, dos direitos adquiridos para sempre, das falcatruas fiscais, das reformas antecipadas, dos subsídios para tudo e mais alguma coisa, dos salários iguais para os que trabalham e os que preguiçam, faliu. Faliu: não é mais sustentável. Podemos discutir, discordar, opormo-nos às condições do resgate que nos foi imposto e à sua gestão por parte deste Governo: eu também o faço e veementemente. Mas não podemos, se formos sérios, esquecer o essencial: se fomos resgatados, é porque fomos à falência; e, se fomos à falência, é porque não produzimos riqueza que possa sustentar o modo de vida a que nos habituámos. Se alguém conhece uma alternativa mágica, em que se possa ter professores sem crianças, auto-estradas sem carros, reformas sem dinheiro para as pagar, acumulando dívida a 6, 7 ou 8% de juros para a geração seguinte pagar, que o diga. Caso contrário, tenham pudor: não se fazem greves porque se acaba com os horários zero, porque se estabelece um horário semanal (e ficcional) de 40 horas de trabalho ou porque o Estado não pode sustentar o mesmo número de professores, se os portugueses não fazem filhos.

Por mais que respeite o direito à greve, causa-me uma sensação desagradável ver dirigentes sindicais, dos professores e não só, regozijarem-se porque ninguém foi trabalhar. Ver um sindicalismo de bota-abaixo constante, onde qualquer greve, qualquer manifestação, é muito mais valorizada e procurada do que qualquer acordo e qualquer negociação - como se, por cada português com vontade de trabalhar, houvesse outro cujo trabalho consiste em dissuadi-lo desse vício. Assim como me causa impressão, no estado em que o país está, saber que quase 200.000 trabalhadores pediram a reforma antecipada em 2012, mesmo perdendo dinheiro, e apesar de se queixarem da crise e dos constantes cortes nas pensões. Porque a mensagem deles é clara: "Eu, para já, mesmo perdendo dinheiro, safo-me. Os otários que continuarem a trabalhar e que se vierem a reformar mais tarde, em piores condições, é que lixam!" É o retrato de um país que parece ter perdido qualquer noção de destino colectivo: há um milhão de portugueses sem trabalho e grande parte dos que o têm, aparentemente, só desejam deixar de trabalhar. Será assim que nos livraremos da troika?

As coisas chegaram a um ponto de anormalidade tal, que, quando o ministro da Educação, no exercício do seu mais elementar dever - que é o de defender os direitos dos alunos contra a greve dos professores - convoca todos eles para vigiar os exames, aqui d'El Rey na imprensa bem-pensante que se trata de sabotar o legítimo direito à greve. Ou seja: que haja professores (que os há, felizmente!) dispostos a permitir que os alunos tenham exames é uma violação ilegítima do direito dos outros a que eles não tenham exames. Di-lo o dr. Garcia Pereira, o advogado dos trabalhadores e do dr. Jardim, infalível defensor da classe operária, e o mesmo que, no final do meu tempo de estudante, na Faculdade de Direito de Lisboa, invocando os ensinamentos do grande camarada Mao, decretava greve aos "exames burgueses" - que o fizeram advogado.

Não contesto que as greves, por natureza, causem incómodos a outrem - ou não fariam sentido. Mas há limites para tudo. Limites de brio profissional: um cirurgião não resolve entrar em grave quando recebe um doente já anestesiado pronto para a operação; um controlador aéreo não entra em greve quando tem um avião a fazer-se à pista; um bombeiro não entra em greve quando há um incêndio para apagar. Eu sei que isto que agora escrevo vai circular nos blogues dos professores, vai ser adulterado, deturpado, montado conforme dê mais jeito: já o fizeram no passado, inventando coisas que eu nunca disse, e só custa da primeira vez. Paciência, é isto que eu penso: esta greve dos professores aos exames, por muitas razões que possam ter, é inadmissível.

Texto publicado na edição do Expresso de 15 de Junho de 2013


OBS - Em resumo, MST, sabe que não é justo estabelecer um paralelismo entre a "sua" escola primária ou a minha escola primária, por maioria de razão quanto mais recuarmos pior, e as condições de ensino de hoje.
A aposta na educação não foi uma opção do regime de Salazar, e isso todos nós sabemos e MST igualmente.

Quando embarquei, em fins de 1962 para a guerra em Angola, tinha no meu pelotão uma maioria de rapazes que pouco mais sabiam que escrever o seu nome. Com a 3ª Classe já possuíam o 1º Grau da Instrução Primária e com a 4ª, que eram raros, o Exército aproveitava-os para os graduar em cabos. Como atenuante a circunstância de serem quase todos oriundos de aldeias do interior de Portugal.

O Ensino, tal como a Saúde, foi uma das grandes apostas da democracia do pós 25 de Abril, com prejuízo do ensino profissional pois havia "fome" de doutores. Foi uma explosão de escolas, de professores, de faculdades, de ensino generalizado que, fatalmente, não podia ser de boa qualidade.

Os professores aumentaram, constituíram-se numa força reivindicativa de grande poder nas mãos da CGTP/PCP e os governos foram satisfazendo essas exigências por motivos políticos até chegarmos a um Parque Escolar que, em alguns casos, parece das arábias e o 12º Ano, antigo Curso Complementar dos Liceus,  tornado  legalmente obrigatório a toda a população.

Em termos de política de governo, descontados alguns exageros, eu também direi que investir na juventude é investir no futuro mas, num país com gravíssimas limitações financeiras, com uma dívida astronómica, juros anuais de mais de 7000 milhões por ano, sem acesso ao crédito que durante anos alimentou grande parte da Despesa Pública, com uma população de crianças que bateu o record negativo de  menos de 200.000 nascimentos no ano passado, como é possível manter este número de professores e estes montantes de despesa com a Educação? 

É aqui que batem as greves, nesta situação terrível de restrições financeiras de um país que faliu e que, por isso, "impôe" desemprego de funcionários públicos, entre os quais professores, já que outros, os das empresas privadas, aparecem apenas nas Estatísticas do IEFP na categoria de Desempregados sem terem a voz do Mário Nogueira a pugnar por eles.

António  Balduíno
JUBIABÁ

Episódio Nº 52

Na festa da casa de Arlindo, em Brotas, fizera um escarcéu danado, só porque António Balduíno dançara algumas vezes com Delfina, uma mulata sarará.

Quisera dar na outra, chegou a arrancar o sapato do pé. António Balduíno ria alto gozando a disputa das duas. Em casa Joana perguntou.

- O que é que você achou de bonito naquela peste’

- Você está com ciúme dela?

- Eu ? Vê lá… daquele couro… Uma bruaca velha, caindo de podre… Não sei o que é que você viu nela.

- Isso é que você não sabe… Ela tem seus segredos…

António Balduíno ria e rolava com ela na cama cheirando o seu cangote perfumado. Lembrava-se de quando a conhecera. Fora numa festa no Rio Vermelho. Dera em cima dela de longe, tocando coisas no violão.

Ela ficou toda caída. No outro dia, que era um Domingo, se encontraram e foram à matiné no Olímpia. Ela lhe contara uma história muito comprida para provar que era donzela e ele acabara acreditando.

Ficou desinteressado mas foi ao encontro marcado para quinta-feira porque não tinha que fazer naquela noite. Ficaram passeando no Campo Grande, ele sem ter conversa porque ela era donzela e donzelas não interessam ao negro.

Perto da hora de entrar para o emprego ela contou.

- Olhe eu vi que você é bonzinho e respeitador… pois vou falar a verdade para você. Eu não sou donzela, não…

- Ah! não é não.

- Foi meu tio, um tio que morava lá em casa. Faz três anos. Eu estava sozinha, mamãe tinha ido trabalhar…

- E seu pai?

- Nunca conheci… Meu tio se aproveitou. Me pegou e foi a pulso.

- Que desgraçado… - no fundo, António Balduíno, simpatizava com o tio.

- Nunca mais conheci homem nesses três anos… Agora gostei de você…

António Balduíno desta vez estava reconhecendo que era tudo invenção da cabrocha, mas não disse nada. Não deixou ela voltar para o emprego naquela noite e, como não tinha para onde a levar, foi mesmo para o cais do porto, para diante dos navios e do mar.

Depois alugaram aquele quartinho nas Quintas, onde diariamente Joana mentia e ciumava.

O negro não acreditava mas começava a se aborrecer.


Estava na Lanterna dos Afogados, certa noite de temporal, quando o gordo entrou afobado. Joaquim que conversava com António Balduíno avisou:

- Lá vem o Gordo…

- Vocês sabem o que aconteceu?

- Os estivadores acharam um defunto no cais…

Aquilo era comum e eles não se impressionaram. Mas o Gordo acrescentou:

- Era Viriato…

- Quem?

- Viriato, o Anão.

terça-feira, junho 25, 2013

FANTASIA DUPLA - MAGIA DA MELHOR


Desperdício de Alimentos - Economize 20%


IMAGEM

O Palhaço - Reprodução recente de uma pintura de Paula Rego que esteve exposto em Londres, na sua última exposição (Jan-Março de 2013). É uma figura de "Palhaço Rico" onde se reconhece perfeitamente as feições de Cavaco Silva com um pé no pedestal a mamar nos seios de uma velha decrépita aperaltada com um chapéu. O Palhaço com a mão esquerda coça os "tomates". A velha pode representar a política ou a nação e o Quadro chama-se "The Laste Feed" "A Última Mamada".


A ÚLTIMA MAMADA

A SANTÍSSIMA TRINDADE
Richard Dawkins (Parte II)


A outra coisa que eu não consigo deixar de comentar é a confiança sobranceira com que as pessoas religiosas afirmam ínfimos pormenores acerca dos quais não têm nem poderiam ter a mínima prova.

Talvez seja precisamente o facto de não existir prova que corrobore ou negue opiniões teológicas o que instiga a típica hostilidade draconiana relativamente aos que têm opinião ligeiramente diferente.

Mas é sobretudo o ramo católico romano do Cristianismo que leva ao extremo o seu recorrente namoro com o politeísmo.

À Santíssima Trindade junta-se Maria, “Rainha dos Céus”, deusa em tudo menos no nome, e seguramente logo atrás do próprio Deus enquanto destinatária de orações.

O panteão é ainda engrossado por um exército de santos cujo poder de intervenção os torna, se não semi-deuses, pelo menos de serem abordados dentro da área de intervenção de cada um.

O Fórum da Comunidade Católica oferece solicitamente uma lista de 5.120 santos com as respectivas áreas de competência, que incluem dores de barriga, vítimas de maus tratos, anorexia, traficantes de armas, ferreiros, ossos partidos, técnicos de bombas e desarranjos intestinais, e isto para nos ficarmos só pela letra B.

Alem disso, não nos podemos esquecer dos quatro coros das hostes de anjos distribuídos por nove ordens: serafins, querubins, tronos, dominações, virtudes, potestades arcanjos (que são os comandantes9 e os nossos já velhos conhecidos anjos com destaque para o conhecido e sempre vigilante anjo-da-guarda.

O que impressiona mais na mitologia católica é a ligeireza inconsequente com que estas pessoas vão congeminando pormenores, tudo fruto da mais descarada invenção.

E não se pense que isto são coisas dos tempos antigos da igreja católica: o Papa João Paulo II (1920 – 2005) criou mais santos do que os seus antecessores todos juntos no decorrer dos últimos séculos.

Os seus devaneios politeístas ficaram bem marcados quando, em 1981, foi vítima de uma tentativa de assassínio em Roma tendo atribuído a Nossa Senhora de Fátima a circunstância de ter sobrevivido: «Uma mão materna guiou a bala».

Dá vontade de perguntar porque não guiou ela a bala de forma a nem sequer o atingir? E a equipe de cirurgiões que o operou durante seis horas não teve nenhum mérito? -  Ou as suas mãos também foram guiadas maternalmente pela senhora de Fátima?

O Papa referiu-se concretamente a Nossa Senhora de Fátima e não a uma outra Nossa Senhora. Talvez na altura, a Nossa Senhora de Lurdes, ou de Guadalupe ou de Medjugorje, ou de Akita, ou de Zeitun, ou de Garabandal, ou de Knock, estivessem ocupadas com outras incumbências.
(continua)                                    

JUBIABÁ

Episódio Nº 51


Já vai? – perguntou Joaquim

 - Vou pegar a saída do cinema.

Saiu se arrastando na bengala, curvo, coberto de farrapos.

- Ele já se acostumou a andar assim – disse Joaquim.

 - Por que é que ele só conversa coisas tristes? – o Gordo não sabia, mas tinha pena porque era muito bom.

 - Ele sabe mais do que a gente – afirmou António Balduíno.

Na outra mesa um mulato de pastinha explicava a um negro:

 - Moisés mandou para o mar e atravessou com os cristãos todos…

 - Eu converso para me divertir – falou Joaquim.

O Gordo se queixou:

 - Ele não devia ter feito isso hoje que era dia do meu aniversário…

 - O quê?

 - Contar coisa triste… Tirou toda a graça.

 - Nada. Vamos fazer uma farra na casa de Zé Camarão. A gente arranja umas morenas – convidou António Balduíno.

O Gordo pagou as despesas. Na outra mesa o mulato contava a história do rei Salomão que tinha seiscentas mulatas.

 - Macho bom – disse António Balduíno soltando uma gargalhada.

Fizeram a farra, se entupiram de cachaça, amaram umas cabrochas bem bonitas, mas não conseguiram esquecer Viriato, o Anão, que não tinha ninguém para tratar sua maleita.

Joana fazia cenas por causa de outras mulatas, que eram amadas igualmente por António Balduíno. Mulata que aparecesse na sua frente era mulata amigada com ele.

Na força dos seus dezoito anos, fortes e malandros, criara um grande prestígio entre as cabrochas da cidade, empregadas, lavadeiras, negrinhas que vendiam acarajé e abará.

Ele sabia conversar com elas e terminava sempre por levá-las para o areal, onde se enroscavam, sem sentir a areia que entrava pela carapinha.

Ele as amava e não as via mais. Passavam pela sua vida como aquelas nuvens que passavam pelo céu e que serviam para ele fazer as comparações com elas:

 - Os olhos de você de tão pretos parecem aquela nuvem…

 - Chi! Vai chover…

 - Então vamos para casa… Eu sei de um lugar onde a gente fica bem abrigado.

Porém Joana tinha aquele perfume no cangote. Se agarrava a ele, brigava quando sabia que o negro dera em cima de uma cabrocha qualquer, dizem até que fez feitiço para que ele não a abandonasse.


Tinha amarrado numa cueca do amante penas de galinha preta, e uma farofa de azeite de dendê onde cinco vinténs de cobre apareciam. Pôs tudo isso na porta de António Balduíno numa noite de lua cheia.

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