Anunciadores de boas novas e a m..... da Democracia que temos
Esta “conversa” era já passado não fosse um Ensaio de Viriato Soromenho Marques publicado na Revista Visão de 18 de Maio intitulado “Fracos Reis” os tais que faziam a “fraca gente” no dizer de Camões.
O ensaísta defende que por causa dos maus dirigentes políticos que temos actualmente, Europa e América incluídas, nos estamos a constituir em fraca gente. Os cidadãos assumem-se e são tratados como consumidores de produtos televisivos tendo a democracia revestido o formato de um grande reality, show em que o grande objectivo é ir ao encontro do espectador dizendo-lhe coisas agradáveis para ele não mudar de canal. No fundo, é a tese segundo a qual as imagens veículadas pela televisão, essa caixa negra hoje a cores e digital, nos rouba a faculdade de pensar moral e políticamente os grandes desafios sociais do nosso tempo, como alí é sugerido num post do Macroscopio - regressando a Johann Gutenberg.
Os políticos que tratavam os seus concidadãos como pessoas adultas, merecedoras de respeito a quem se falava verdade quando ela “doía” e lançavam desafios para o futuro quando o presente estava carregado de ameaças, pertencem todos ao passado.
Corremos o risco, diz Viriato Soromenho, na democracia em que vivemos, de eleger não os melhores mas sim aqueles que nos trazem as melhores notícias.
Estas referências a uma realidade que infelizmente conhecemos e sabemos serem verdadeiras, reconduziram-me a um passado recente, a tal “conversa” a que me referi inicialmente, e que se reporta à última campanha eleitoral, quando o PS e José Sócrates se deslocaram a Santarém no seu comício de propaganda e ao qual decidi assistir nas belíssimas instalações do CNEMA onde tem lugar a Feira Nacional de Agricultura, interessado que estava na vitória do PS com maioria absoluta como ponto de partida para uma governação pelo menos estável, e tanto quanto possível eficaz na resolução dos tais problemas estruturais do país.
Não levava grandes expectativas relativamente àquilo que ia ouvir. Todos sabemos que estas reuniões são, principalmente, momentos de exaltação partidária com a finalidade de assegurar o voto no partido mas, atendendo à situação difícil em que o país se encontrava sempre esperei ouvir, pelo menos do responsável do partido, José Sócrates, uma palavra que fosse de realismo e seriedade apelando ao trabalho, ao rigor, à disciplina, à poupança, à produtividade, ao sacrifício, enfim, a todas estas “coisas” que podendo não serem agradáveis de ouvir servem para estimular, desafiar, porque de desafio se trata quando temos de recuperar de uma crise, melhorar a economia, endireitar o défice, em suma, preparar um futuro melhor.
Mas nem uma palavra, uma palavrinha que fosse, que nos preparasse, nos advertisse, nos chamasse a atenção para aquilo que no fundo a maioria dos presentes, pessoas honestas, chefes de família, sabiam que inevitavelmente ia ter que acontecer porque não há milagres.
Em vez disso foram as promessas categóricas e demagógicas de que os impostos não iam aumentar e que, com o PS, tudo iria ser um mar de rosas como se tal fosse possível.
Saí desse comício indisposto, desiludido, pior ainda, triste, a democracia do meu país menorizava os seus cidadãos, tratava-os como crianças a quem se dava um rebuçado para se portarem bem, senti-me desconsiderado, depois de o ter sido pela ditadura era-o agora pela democracia nas pessoas daqueles senhores e senhoras que em breve nos iriam governar com maioria absoluta.
Tem razão Viriato Soromenho, os políticos transformaram-se em anunciadores de boas novas, correndo o risco de se parecerem com aquele Ministro Iraquiano que em entrevista à CNN afirmava que a guerra estava longe de estar perdida produzindo essas afirmações de costas voltadas para os tanques americanos que os telespectadores viam entrar na cidade.
Aliás, sobre a natureza e a condição da democracia que temos, recordo aqui dois excepcionais posts feitos pelo Jumento a semana passada, e que de certo modo ilustram este ponto de vista que denuncia o carácter medíocre e subrepresentativo do nosso sistema político: corrupto, falho de ideias, de projectos para a nação e, cada vez mais hipócrita e interesseiro relativamente aos interesses legítimos das populações que era suposto servirem, com espírito de missão.
Escusava bem V. Soromenho de me ter recordado mais esse momento infeliz da vida política do meu país que, pelo menos em directo, não tenciono reviver.