A cadelinha do 5º dt.º
A Cadelinha do 5º Dtº
E num dia, igual a outros tantos, quando saía para tomar o meu cafezinho matinal lá estava, colado no vidro da porta do meu prédio, aquele papel da Agencia Funerária com a cruz negra bem visível a anunciar a morte de um dos moradores.
Era a minha vizinha do 5º Dto com quem me cruzava frequentemente quando ela levava pela trela, para o passeio higiénico, a cadelinha que mais parecia uma bolinha de carne em cima de quatro patinhas.
-“Os meus sentimentos” disse eu ao viúvo na primeira oportunidade…”é a vida”…acrescentei.
-“Obrigado meu vizinho, felizmente foi tão rápido que nem chegámos a saber do que morreu… fechou os olhos simplesmente”.
Era assim a minha vizinha, despachada a viver, despachada a morrer, um dia cheia de vida no outro dia sem ela.
Às vezes, encontrava-a no café que ficava junto da mercearia da nossa rua, meia sentada na cadeira como estivesse sempre de partida ou pouco habituada às pausas para descanso e a cadelinha deitada aos seus pés como se fosse um acrescento seu.
Não era pessoa para grandes diálogos, quando falava era em monólogos, bem sonantes, sem cuidar de quem a ouvia, eram desabafos que não aceitavam o contraditório porque quem sabia da vida era ela, mulher de trabalho que tinha criado e educado uma filha e servido não sei quantos senhores e senhoras por esse mundo fora, País de Gales, Londres, Miami, trabalhando a sério, cumprindo ordens, satisfazendo e aturando os caprichos de gente rica, em suma, dobrando a espinha e a alma… “não era como agora em que os jovens só querem é gozar.”
Talvez por isso, aos oitenta anos, o azedo que se escapa dos seus desabafos e o orgulho de uma vida inteira de trabalho que não chegou para lhe adocicar a velhice.
A minha vizinha do 5º Dtº morreu em paz, tudo o que em consciência devia ter feito na vida ela fez e por isso, quando chegou a hora, nem um ai, ou um simples adeus, simplesmente fechou os olhos, a missão tinha chegado ao fim.
Vi o meu vizinho uns dias mais tarde com a cadelinha pela trela e os meus olhos abriram-se de espanto, o animal estava pela metade.
-“Então, vizinho, que aconteceu à cadelinha que nem parece a mesma?”
-“Oh meu vizinho, ia morrendo de desgosto, durante uma semana recusou-se a ingerir fosse o que fosse para além de água, tive que a levar ao veterinário… agora já está melhorzinha…”
Não fora o apoio do dono e a intervenção do médico veterinário e a “Princesa” não teria querido continuar a viver sem a sua amiga, companheira e protectora.
Sinceramente, não tenho pelos animais domésticos o mesmo “respeito” e “admiração” que tenho pelos selvagens, fundamentalmente por uma questão de passado e de origem:
Os animais domésticos são uma criação nossa para satisfazer necessidades e alguns, até, simples caprichos, têm as formas e as características que nós quisermos dar-lhes segundo os nossos desejos.
Falta-lhes, relativamente aos selvagens, a autenticidade que só a natureza lhes poderia dar porque cada animal selvagem que existe, e só porque existe, é um vencedor, um campeão, um sobrevivente a todos os desafios.
Mas abro duas excepções:
-Uma delas é o cavalo porque a beleza e proporcionalidade das suas formas, o porte e a elegância das suas linhas, a imagem que deixa atrás de si quando cavalga livremente pela planície constituem um momento de beleza de rara inspiração da natureza que sempre nos seduziram.
Há mais de trinta mil anos os cavalos já se “passeavam” pintados nas paredes das grutas pelos nossos antepassados do paleolítico numa proporção muito maior do que aquela em que os mesmos cavalos entravam na sua alimentação o que significa que, já nesse tempo, os homens gostavam mais de os ver do que de os comer.
-A outra excepção, porque sou um sentimental, é a cadelinha do 5º Dt., a “Princesa” de seu nome e não só.
E num dia, igual a outros tantos, quando saía para tomar o meu cafezinho matinal lá estava, colado no vidro da porta do meu prédio, aquele papel da Agencia Funerária com a cruz negra bem visível a anunciar a morte de um dos moradores.
Era a minha vizinha do 5º Dto com quem me cruzava frequentemente quando ela levava pela trela, para o passeio higiénico, a cadelinha que mais parecia uma bolinha de carne em cima de quatro patinhas.
-“Os meus sentimentos” disse eu ao viúvo na primeira oportunidade…”é a vida”…acrescentei.
-“Obrigado meu vizinho, felizmente foi tão rápido que nem chegámos a saber do que morreu… fechou os olhos simplesmente”.
Era assim a minha vizinha, despachada a viver, despachada a morrer, um dia cheia de vida no outro dia sem ela.
Às vezes, encontrava-a no café que ficava junto da mercearia da nossa rua, meia sentada na cadeira como estivesse sempre de partida ou pouco habituada às pausas para descanso e a cadelinha deitada aos seus pés como se fosse um acrescento seu.
Não era pessoa para grandes diálogos, quando falava era em monólogos, bem sonantes, sem cuidar de quem a ouvia, eram desabafos que não aceitavam o contraditório porque quem sabia da vida era ela, mulher de trabalho que tinha criado e educado uma filha e servido não sei quantos senhores e senhoras por esse mundo fora, País de Gales, Londres, Miami, trabalhando a sério, cumprindo ordens, satisfazendo e aturando os caprichos de gente rica, em suma, dobrando a espinha e a alma… “não era como agora em que os jovens só querem é gozar.”
Talvez por isso, aos oitenta anos, o azedo que se escapa dos seus desabafos e o orgulho de uma vida inteira de trabalho que não chegou para lhe adocicar a velhice.
A minha vizinha do 5º Dtº morreu em paz, tudo o que em consciência devia ter feito na vida ela fez e por isso, quando chegou a hora, nem um ai, ou um simples adeus, simplesmente fechou os olhos, a missão tinha chegado ao fim.
Vi o meu vizinho uns dias mais tarde com a cadelinha pela trela e os meus olhos abriram-se de espanto, o animal estava pela metade.
-“Então, vizinho, que aconteceu à cadelinha que nem parece a mesma?”
-“Oh meu vizinho, ia morrendo de desgosto, durante uma semana recusou-se a ingerir fosse o que fosse para além de água, tive que a levar ao veterinário… agora já está melhorzinha…”
Não fora o apoio do dono e a intervenção do médico veterinário e a “Princesa” não teria querido continuar a viver sem a sua amiga, companheira e protectora.
Sinceramente, não tenho pelos animais domésticos o mesmo “respeito” e “admiração” que tenho pelos selvagens, fundamentalmente por uma questão de passado e de origem:
Os animais domésticos são uma criação nossa para satisfazer necessidades e alguns, até, simples caprichos, têm as formas e as características que nós quisermos dar-lhes segundo os nossos desejos.
Falta-lhes, relativamente aos selvagens, a autenticidade que só a natureza lhes poderia dar porque cada animal selvagem que existe, e só porque existe, é um vencedor, um campeão, um sobrevivente a todos os desafios.
Mas abro duas excepções:
-Uma delas é o cavalo porque a beleza e proporcionalidade das suas formas, o porte e a elegância das suas linhas, a imagem que deixa atrás de si quando cavalga livremente pela planície constituem um momento de beleza de rara inspiração da natureza que sempre nos seduziram.
Há mais de trinta mil anos os cavalos já se “passeavam” pintados nas paredes das grutas pelos nossos antepassados do paleolítico numa proporção muito maior do que aquela em que os mesmos cavalos entravam na sua alimentação o que significa que, já nesse tempo, os homens gostavam mais de os ver do que de os comer.
-A outra excepção, porque sou um sentimental, é a cadelinha do 5º Dt., a “Princesa” de seu nome e não só.