sexta-feira, junho 20, 2008


Os Novos Sacerdotes do Templo


“Os senhores Francisco Cardoso dos Reis e José Benoliel receberam, para se deslocarem na qualidade de Presidente e Vogal do Conselho de Gerência da CP respectivamente, cada um deles, um Mercedes 220 CDI no valor de 70.000 euros os quais, entre muitos outros extras, podem vir até a serem equipados com Televisão.

Deste luxo usufruirão também os restantes vogais da Administração, já que a encomenda, num total de 350.000 euros, prevê a entrega de mais três automóveis.

Nos últimos dois anos, a CP apresentou um défice de 376 milhões de euros.”

Esta notícia, no tempo da Censura, teria sido cortada e eu não teria, ao lê-la, passado pela vergonha e sentido a revolta que ela me provocou.

Mais tarde, às vezes, por portas e travessas, corriam uns zunzus e ficava-se a saber que uns fulanos do Conselho de Gerência da CP, empresa pública que dava milhões de prejuízo, tinham recebido para se deslocarem e pavonearem a sua vaidade e “importância” um automóvel que custou o equivalente ao rendimento de quase 6 anos de trabalho de um funcionário com um salário médio de 1.000 euros mensais.

E eu ficaria a pensar: “…pois, isto só é possível porque existe esta inadmissível censura à sombra da qual é possível acontecerem coisas que de outra forma não aconteceriam”.

Então, só havia coragem para certos abusos porque, pensávamos nós, o segredo encobria do povo os seus autores que assim ficavam no anonimato e podiam continuar de cabeça levantada.

Na pior das hipóteses a dúvida instalava-se no nosso espírito.

- Seriam eles capazes de fazerem o que fizeram se tivessem que passar pela vergonha de serem apontados a dedo como esbanjadores do erário público quando, ainda por cima, se trata de despesas feitas com recurso a importações aumentando o desequilíbrio na Balança Comercial de um país como o nosso que tanto se esforça para equilibrá-las através das exportações?

Mas felizmente a Censura desapareceu e infelizmente a dúvida também e a resposta aí está:

- São, sim senhor, estes senhores não têm pudor, melhor dizendo, vergonha em mostrar aos trabalhadores e aos cidadãos em geral que as dificuldades da empresa e do país não têm nada a ver com eles que constituem uma casta à parte, ungidos que foram à nascença por um dom especial que faz deles homens de excepção como, antigamente, no época dos Faraós, acontecia com os grandes Sacerdotes do Templo aos quais seria impensável faltar qualquer iguaria mesmo que o povo morresse à fome em consequência de uma qualquer praga que destruísse as colheitas.

Estes senhores são hoje a reincarnação dos Grandes Sacerdotes do Templo e na sua qualidade de semideuses limitam-se a receber em vida os privilégios (e, neste caso, só estamos a falar de automóveis…) que lhes são devidos, apenas isso…

A Censura, afinal, não servia para nada, não teria evitado fosse o que fosse e a sua abolição, no que diz respeito a este assunto, apenas trouxe à tona de água para conhecimento de todos nós a existência desta casta de privilegiados.

Um dia ainda os veremos a construir por aí umas pirâmides para prolongarem, com as honras e a comodidade devidas, os privilégios que lhes deverão continuar a ser prestados na vida do além…

quinta-feira, junho 19, 2008


Finalmente… Barack Obama


Não mais voltei ao tema Barack Obama porque, no fundo, estava convencido que a força do Partido Democrático no qual os Clinton são peças importantes, acabariam por se impor afastando do poder um político, que por mais brilhante que se apresentasse, era um desconhecido para a maioria do povo americano e ainda por cima mestiço numa sociedade com antecedentes raciais tão acentuados quanto recentes.

Por isso, quando naquela noite, já adiantada, das minhas férias em Fuengirola, frente à TV fiquei a saber pela Sky News que, finalmente, Hillary Clinton tinha saído da corrida e Obama iria ser nomeado candidato do Partido Democrático às eleições americanas, senti uma profunda e sincera alegria, desproporcionada até, se considerarmos que como cidadão de um pequeno país europeu aquela eleição nem sequer me dizia directamente respeito.

Mas a verdade é que em determinados momentos da vida dos países nós sentimo-nos seus cidadãos e eu nessa qualidade de americano do mundo, desejava uma vitória dos Democratas mas desejava ainda mais a de Obama porque a sua capacidade de sedução ultrapassou com facilidade o Atlântico e tanto quanto me apercebi muitos foram aqueles que deste lado se deixaram conquistar por ele.

A política também é paixão e quem não gosta de se deixar apaixonar? …é uma outra dimensão da nossa existência que implica riscos acrescidos, é verdade, mas que nos transporta a estados de alma que fora dela não existem.

No amor, na política, no desporto, na arte, na própria ciência, todos os seus grandes intérpretes e personagens podem ter essa capacidade para nos seduzirem e encantarem.

Hillary não defrontou outro candidato, ela confrontou-se, no dizer dos seus próprios assessores, com um fenómeno. A qualquer outro teria ganho com facilidade e, no entanto, os 20 pontos de vantagem iniciais não lhe foram suficientes para derrotar Obama.

Na boca de outro qualquer que não fosse a do falecido Luther King, a expressão “Ies We Can” teria soado a falso, a demagogia barata, simples fórmula publicitária para tentar vender qualquer coisa.

Contudo, no encadeado do discurso de Obama, na sua voz de barítono, na sequência cadenciada das suas palavras ditas sem recurso a textos escritos, essa expressão ganhou a força e a capacidade mobilizadora, especialmente da juventude, que o levaram à vitória.

Os seus dons de oratória, a sua capacidade de persuasão através da palavra só vieram demonstrar a importância da retórica no espaço público comprovando a razão que assistia a Platão e a Aristóteles quando, sobre essa importância, escreveram pilhas de livros como muito bem salientou João Miguel Tavares na sua crónica do Diário de Notícias.

Obama não é sedutor, nasceu sedutor e por isso a sua genuinidade servida por uma formação académica perfeitamente adequada à sua missão (2 Graduações, uma em Ciências Políticas e outra em Direito nas Universidades de Colúmbia e Harvard) e um passado exemplar de preocupação sincera com os problemas sociais.

O seu primeiro emprego, por opção sua, foi em Chicago, em 1985, como organizador de comunidade. O ordenado era de 13.000 dólares anuais incluindo as despesas para o automóvel o que o colocava no limiar da pobreza mas foi esse o trabalho que ele quis por se sentir especialmente motivado para o fazer.

Na entrevista para a sua admissão perguntaram-lhe qual era para ele o maior problema da sociedade ao que ele respondeu de imediato, a injustiça e, de imediato, também foi admitido.

Trabalhando para o Projecto de Comunidades em Desenvolvimento numa zona de Chicago muito difícil, atingida pelo desemprego ele mobilizou os residentes para promoverem mudanças nas suas vidas, fazendo loby para a criação de centros de emprego, para a construção de mais parques, para a retirada de amianto da casa das pessoas e era muito bom na resolução dos conflitos.

Loretta Augustine-Herron uma das fundadoras do projecto comunitário “mulheres com idade para ser mãe” com quem Obama trabalhou dizia a seu respeito que ele era “suave e directo e explicava as coisas de forma a não deixar ninguém ofendido”.

Yvone Loyde, mãe de 11 filhos disse que Obama os preparou para lidarem com os burocratas dizendo-lhes a quem se deviam dirigir e o que deviam dizer e estava lá tentando ajudar. “Quando se é dona de casa a vida toda e tudo o que se fez foi criar 11 filhos não se sabe muito do mundo exterior e ele ensinou-nos. E se algo ele não sabia ele descobria. «Deixe-me pesquisar a esse respeito» eram as suas palavras preferidas.”

Não sei o que mais me seduz em Obama se as suas qualidades oratórias se o profundo humanismo destes procedimentos.

Perguntaram a ambos os candidatos se aceitavam reunir-se sem condições prévias com os líderes do Irão, Síria, Venezuela, Cuba e Coreia do Norte.

Hillry deu a resposta convencional: “Primeiro enviaria representantes de alto nível para apalpar o terreno.”

Obama respondeu directamente que “sim, que o faria.”

Não quis mostrar-se como “um duro”e à primeira vista esta resposta parecia ter sido um enorme erro mas dias depois as sondagens demonstravam que a maioria dos votantes concordava com ele. Estava feita a ruptura com a ortodoxia e marcado um inovador programa de política externa.

Há políticos que ocultam as suas debilidades e pretendem parecer mais fortes do que são o que não acontece com Obama que aceita as suas vulnerabilidades qualidade esta que lhe permite contactar com toda a gente, especialmente os mais jovens.

Quando questionado dá sempre a impressão que, antes de falar, pensa um fracção de segundo mais do que o resto dos políticos e esse lapso de tempo poderá representar a diferença entre quem procura respostas dentro de si e quem as papagueia na ponta da língua.

Todas as dúvidas que me assaltavam quanto à nomeação de Obama como candidato pelo partido Democrata às eleições presidenciais desapareceram agora quanto à sua vitória final sobre o candidato Republicano porque o seu trajecto me parece, a partir daqui, perfeitamente imparável de acordo com os 6 pontos de vantagem que hoje mesmo foram divulgados.

Esta confiança na eleição de Obama para Presidente do E.U.A. abre-me uma esperança para o futuro porque vejo nele um homem providencial, não propriamente por ser um grande orador, que é mais importante para as vitórias eleitorais, ou pelas suas qualidades de inteligência, ou conhecimentos académicos.

È evidente que sem estas qualidades o seu percurso teria sido impossível mas o que mais me entusiasma em Obama é o seu carácter e a sua determinação a favor dos outros, especialmente daqueles que resolveu ajudar nos bairros problemáticos da cidade de Chicago e que estou certo, amanhã, serão os dos bairros problemáticos de todo o mundo.

Homens destes não costumam chegar às cúpulas do Poder e se isso vier a acontecer, como espero no dia 4 de Novembro próximo, não só me reconciliarei interiormente com a América, como lhe ficarei grato pelo exemplo de democracia do seu povo e especialmente da sua juventude.

E estou longe de estar sozinho neste sentir: logo depois da sua candidatura à Casa Branca está a gerar-se uma onda de optimismo e a imagem dos E.U. no estrangeiro está a melhorar de acordo com uma sondagem do Instituto Pew em 25 países e se os europeus votassem Obama receberia 52% e Mc Cain 15%.

Num mundo global tão complexo e problemático como aquele em que vivemos um homem pouco ou nada pode fazer mas…se esse homem for Obama e acumular com a Presidência dos E.U., talvez possa ajudar a melhorar as coisas, porque é no homem que é preciso ter fé!

quarta-feira, junho 18, 2008


A GASOLINA ESTÁ CARA?


Está cara e vai continuar cada vez mais cara sem que possamos fazer, aparentemente, seja o que for relativamente ao seu preço.

Trata-se de um produto procurado por todos os países do mundo e apenas produzido por alguns que neste momento, perante tão rápidas e vertiginosas subidas, se enchem de dinheiro desequilibrando completamente a repartição da riqueza ainda mais do que já estava.

Pudera, falar de petróleo é falar de energia e sem energia o mundo não anda.

Tivemos agora, na passada semana, uma pequena amostra do que isso significa.

Eu estava de férias no sul de Espanha e com um pouco de sorte lá consegui, procurando nesta e naquela estação de serviço, acabar por atestar o depósito de forma a poder regressar de férias no sábado.

Eu acho, que às vezes, é preciso passar por certas aflições para tomar consciência da importância e da responsabilidade que cada um de nós tem no alimentar de certas situações porque a tendência é refugiarmo-nos no anonimato da multidão dos consumidores de energia que somos todos nós, em todo o mundo e pensar:

“que adianta eu alterar seja o que for no meu comportamento se sou apenas um neste oceano imenso de consumidores?”

Neste fim-de-semana decidi elaborar raciocínios muito simples e actuar de acordo com eles independentemente daquilo que os outros fizessem.

Se a gasolina, pelo seu preço, se está a transformar num produto de luxo eu apenas tenho que levar até às últimas consequências, porque não poderei eliminar completamente, a diminuição do seu consumo.

Na prática, significa andar a pé nos pequenos percursos, utilizar o comboio como meio de transporte alternativo e quando tiver que andar mesmo de automóvel, conduzir de maneira diferente porque se o preço da gasolina é aquele que está fixado na bomba da Gasolineira, o pé que carrega no acelerador é meu e nele quem manda sou eu.

Contas feitas, numa viagem de 460 km, depósito atestado à saída de Fuengirola e à chegada a Badajoz, gastei, num motor de 1,8 c.c., 28,47 litros de gasolina o que dá uma média 6,18 aos 100km e se traduziu, relativamente aos 7,5 que em anteriores viagens costumava gastar, numa economia da ordem dos 20% que fez baixar o preço da gasolina de 1,22 euros para 98 cêntimos o litro.

Circulei a uma velocidade entre os 90 e os 110 K/H, tirando partido do relevo da estrada e de ter podido fazer este ano toda a viagem em Auto-Vias, que são auto estradas não pagas que tornam desnecessárias as ultrapassagens e as desmultiplicações de motor.

A diferença teve a ver com a velocidade a que costumava circular, entre os 130/150, para os 90/110 k/h nunca esquecendo que o acelerador é como uma torneira que quanto mais se carrega mais se abre.

E tudo isto é uma questão de hábitos…

Circulamos a 150 nas auto-estradas porque nos habituamos a circular a essa velocidade permitida com toda a facilidade pelos actuais automóveis sem quebras da segurança.

Da mesma maneira, podemos habituarmo-nos a circular 30 Km abaixo dessa velocidade porque o ganho de tempo à chegada é ridículo, a segurança aumenta e o diálogo com os companheiros de viagem é mais fácil.

E por que não andar mais vezes a pé, de todos os exercícios o mais acessível e benéfico?

E o comboio, quase caído em desuso, que nos liberta do perigo das estradas, e do problema dos estacionamentos?

De qualquer forma, vamos mesmo ser obrigados a mudar de hábitos e por isso talvez seja preferível partir para eles voluntariamente, por nossa iniciativa, como se fossemos nós a comandar o processo.

No fundo, os novos hábitos fazem melhor à saúde e à vida e quando, dentro de uns anos, esta guerra que agora foi despoletada entre automóveis e combustíveis estiver resolvida pelas alterações que nuns e noutros se irão registar, iremos “olhar” para eles de uma forma mais desprendida, menos dependente e mais saudável.

Como dizia o outro senhor, especialista em combustíveis, que há umas semanas atrás interveio no programa dos Prós e Contras: são só precisos quatro anos, até ao próximo Campeonato Europeu, passam num instante…

A partir daí estarão disponíveis no mercado produtos de origem renovável que, incorporados, na gasolina farão baixar os preços e se não vier a ser este o processo, a inteligência dos cientistas e dos técnicos e o sentido de oportunidade dos homens de negócios, logo arranjarão outra maneira de podermos voltar a olhar para o automóvel como o meio de transporte que trouxe à minha geração o sonho, o romantismo e a liberdade e marcou positivamente uma época que, talvez por ter sido a minha, a mais linda de todas elas.

O automóvel não pode continuar por muito mais tempo a constituir para o seu possuidor um peso na consciência, um contributo para o aumento do buraco do ozono, do aquecimento global, do congestionamento do tráfego urbano, da crise do petróleo e um factor de destabilização do mundo.

Como brinquedo, na versão miniatura e ainda na década de 50, ele fez as minhas delícias e das crianças da minha geração, anos mais tarde constituíram paradigma de sucesso, objectos de troféu, enormes, lindos, cintilantes nas suas cores e aplicações cromadas com os acentos revestidos de cabedal.

Eles eram a concretização, na Europa, do “América Dream”, o reencontro com uma felicidade merecida depois dos anos da guerra.

Por favor, libertem novamente o automóvel, ainda que com versões novas e modificadas, andando a pilhas, à electricidade, com a energia do sol, do vento, do hidrogénio…sei lá, mas sem problemas de consciência e dores de cabeça para o seu utilizador.

O automóvel deve voltar a ser um objecto que se ame e não que se odeie e isso só é possível com uma grande ajuda dos governos com políticas de transporte que, em definitivo, percebam que não podem permitir que os automóveis se destruam a eles próprios pela acumulação interminável de carros e mais carros entupindo as cidades, preenchendo tudo quanto é espaço nos centros urbanos, no solo e no sub-solo.

Compete aos governos garantir aos cidadãos a liberdade de circularem e viverem nas suas cidades e no entanto assistimos, em muitas delas, a cenas patéticas de milhares e milhares de pessoas metidas todos os dias dentro de milhares de automóveis, horas e horas num desperdício de tempo, dinheiro e da própria vida.

Este cruzar de braços por parte dos governos, esta complacência perante o agravar de uma situação pode ser melhor entendida se pensarmos que os combustíveis são a fonte de receita por excelência dos Estados.

Por exemplo, na gasolina de 95 octanas o Estado cobra 42% de impostos acrescidos de mais 17% de IVA ou seja, de 1,51 Euros/litro, quase 89 cêntimos constituem receita dos Estados e esta relação de cumplicidade de interesses também tem contribuído para o arrastar desta situação porque os governos não têm condições para prescindirem de tão avultadas importâncias na estrutura dos seus Orçamentos.



E agora o problema vai ser resolvido tumultuosamente pela subida vertiginosa do preço do petróleo numa situação absurda de que quando ninguém acautela a solução de um problema é ele que se resolve por si próprio e a solução pode vir de onde menos se espera.

Sinceramente, tenho dúvidas de que tudo seja mau nesta subida descontrolada do preço dos combustíveis mas, infelizmente, dos traumas da solução ninguém nos vai livrar.

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