sexta-feira, janeiro 18, 2013

Ao jantar a francesinha sorria-lhe...
O PAÍS


DO

CARNAVAL

Episódio Nº 3



No tombadilho, Paulo Rigger abandonou-se aos seus pensamentos. Estava de volta ao Brasil depois de sete anos de ausência.

Ainda estudante de ginásio morrera-lhe o pai, riquíssimo fazendeiro de cacau no sul do Estado da Bahia. A última vontade do velho Rigger foi que mandassem seu rapaz formar-se na Europa.

E, terminado o curso ginesial, Paulo seguiu para Paris em busca do anel de bacharel. O velho Rigger queria o filho formado mas já estava muito banal a formatura no Brasil. Só podia fazer sucesso um doutor da Europa.

Paulo Rigger, em Paris, como é natural, fez tudo menos estudar Direito. Ao formar-se era um blasé, contaminado de toda a literatura de antes da guerra, um gastador de espírito, que tinha amigos entre os intelectuais e frequentava as rodas jornalísticas, fazendo frases, discutindo, sempre em oposição.

A atitude oposta era sempre a sua atitude. Não chegara, muito francês que era, a fazer uma base para a sua vida. Não tinha filosofias e fazia blagues acerca do espírito de seriedade da geração que surgia.

Dizia que o homem de talento não precisa de filosofia. Aos vinte e seis anos, era o tipo do cerebral, quase indiferente, espectador da vida, tendo perdido há muito o sentido de Deus e não tendo encontrado o sentido da Pátria.

Frio, não se emocionava. Tinha prazeres diferentes: amava ser contra as ideias dos seus vizinhos de mesa e gostava de estudar almas.

Correra toda a cidade de Paris, dos mais aristocráticos salões aos mais sórdidos cabarés, numa volúpia de escalpelar as almas, pôr-lhes à mostra sentimentos, estudá-las…

Assim, pensava, no dia em que houvesse “um caso” na sua vida, estaria preparado para enfrentá-lo, estudá-lo, dissecá-lo.

Usava monólogo porque diziam que já havia caído de moda. Aprendera em Paris a vestir-se com muita elegância e a satisfazer todos os seus desejos.

Sibarita, tinha pelos seus instintos uma quase adoração. Conhecia, assim, todos os vícios. No seu olhar cansado, muito triste, parecia viver a tragédia do homem que esgotou todas as volúpias e não se satisfez.

Nos seus lábios finos bailava sempre um sorriso mau, de escárnio, que irritava. Já descrera da felicidade. No fundo, entretanto, Paulo Rigger sentia que era um insatisfeito. Compreendia que faltava qualquer coisa na sua vida. O quê? Não o sabia. Isso torturava-o. E dedicava toda a sua vida à procura do fim.

“Sim”, murmurava no tombadilho, olhando as ondas “porque toda a vida deve ter, necessariamente um fim… Qual?”

Mas o mar, indiferente, não lhe respondia. O sol que morria desenhava no horizonte paisagens berrantes. O sol foi o primeiro cubista do mundo…

quinta-feira, janeiro 17, 2013

Esta saudade das ingenuidades dos meus tempos de meninice faz-me doer a alma... desculpem.

Parece-me que esta canção vai bem com a Matilde


A História das Três Fadas

A professora pede aos alunos que escrevam uma história sobre fadas. A do Carlinhos rezava assim:
-"Era uma vez uma prinsusa..."Aí, a professora interrompe e diz:

- "É princesa que se diz e não prinsusa!"

- "Não, Sra professora, nesta história é mesmo prinsusa."

E continua:

- "Era uma vez uma prinsusa, que vivia suzinha na turre do seu castalho e estava traste, muito traste por estar suzinha.

Resolve então enviar um bilhuto a um prinsusu que também vivia suzinho na turre do seu castalho e que também estava traste, muito traste.

Escreveu muitos bilhutos até que um dia, o prinsusu agarrou no seu cavalo e cavilgou, cavilgou, cavilgou pela florista fora, até chegar ao castalho da prinsusa!

Quando chegou à purta do castalho da prinsusa deu-lhe um pintapu e a purta caiu.

Subiu a correr até à turre da prinsusa, arrebentou com a purta do quarto da prinsusa… olhou para ela..., ela olha para ele..., ele olha para ela... e pimba, deu-lhe três fadas!!!"


A Matilde


Acabei agora de conhecer a minha segunda neta do coração, a Matilde. Um bebé perfeito que ainda não tem dois dias de vida, sem história para além da que lhe vem nos genes.

Olhando para ela, fui levado a pensar no aumento dos impostos para 2013, do corte das Despesas Públicas de 4.000 milhões, dos receios e apreensões que vão no espírito de todos os portugueses no início deste ano de 2013.
Um país deprimido, medroso mesmo, é o que a espera. No ano passado, nasceram pela primeira vez, desde há muitos anos, menos de 100.000 bebés em Portugal mas a Matilde, corajosa, com total desprezo por ventos, marés e maus presságios, atirou-se à vida para aproveitar a oportunidade que lhe coube.
Atrás de si tem a herança de milhares de gerações que a precederam, todos os seus antepassados: os recentes, os menos recentes e os remotos, estão lá todos, numa longa história de vida à qual ela vai dar continuidade. Um elo da cadeia, de uma cadeia de genes que vão lutar bravamente numa competição feroz porque é assim que manda a natureza.
Relativamente à herança ela não pode fazer nada mas o seu exemplo de vida será um contributo que virá influenciar a humanidade e a herança daqueles que a vão seguir. Cada um de nós acrescenta um tijolo no edifício. A Matilde prepara-se para começar a colocar o seu.
 O cientista e Prémio Nobel, Richard Dawkins, equiparou os nossos genes aos gangsters de Chicago porque a sobrevivência deles – leia-se a nossa, que os transportamos -  durante milhões de anos, foi em condições difíceis e muito competitivas e por isso, é natural que eles tenham desenvolvido qualidades, algumas de um egoísmo implacável, que dará lugar a comportamentos individuais egoístas.
Na minha neta Filipa, ao fim de sete anos de vida foi evidente uma grande preocupação e sensibilidade para com os outros, genuína, sincera, mas também, paralelamente, um comportamento altamente competitivo e desafiante.
O meio social em que vivemos hoje é igualmente muito competitivo. Quem não o for está em desvantagem na luta pela vida.
A Matilde vai ter ao seu dispor meios que antes não existiam e hoje nem todos dispõem. Tal como a Filipa, pode contribuir, como pessoa livre, para fazer do nosso mundo um paraíso ou um deserto, para tornar a nossa vida agradável ou um inferno e fazer história, hoje, é fazer exactamente esta escolha.
Em cada novo dia que se abre para o mundo, tudo depende de quem está vivo e do exemplo que transmitirá a quem nasce, ou seja, a todas as Matildes deste mundo que se seguirem.  


A Casa dos Bicos


- Uma curiosidade arquitectónica do Século XVI


Uns metros à frente, do Chafariz de El’ Rei, seguindo pelo mesmo passeio em direcção à Baixa Pombalina, está a "Casa dos Bicos"  uma curiosidade arquitectónica, imitando diamantes em forma de pedras (um total de 1125). É um palácio do século XVI, que pertencia a Afonso de Albuquerque, vice-rei Português da Índia, e um dos poucos edifícios que sobreviveram ao terramoto de 1755.  Acredita-se que seja um modelo dos palácios de Veneza, embora os dois pisos superiores tenham exuberantes janelas em arco, características do estilo manuelino Português.
O  seu interior é hoje ocupado pela Fundação Saramago, um espaço dedicado ao Prémio Nobel da Literatura português. Abriga especiais eventos literários e contém a biblioteca do autor. Nas proximidades, há restaurantes baratos conhecidos pelos seus tradicionais pratos de peixe grelhado, entre eles, a “velha” e saborosa sardinha assada nos meses de verão, quando ela “pinga no pão”.


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 2

A amabilidade do Sr. Bispo… A Igreja sempre caridosa…

O Senador, com o prestígio que lhe dava a posição, resumiu toda a conversa:

 - É o país de mais futuro no mundo!

 - Perfeitamente! – falou um rapaz que chegara no momento.

 - O senhor acaba de definir o Brasil. (O Senador sorriu baboso). O Brasil é o país verde por excelência. Futuroso, esperançoso… Nunca passou disso… Vocês, brasileiros, velhos que já foram e rapazes que são a “esperança da Pátria”, sonham o futuro. “Dentro de cem anos o Brasil será o primeiro do mundo”.

Garanto que aquele detestável cronista Pêro Vaz de Caminha teve essa mesma frase ao achar Cabral, por um acaso, o país que viera expressamente descobrir.

 - Não! – protestou o diplomata, elevando num gesto oratório a mão ao peito. – Hoje, todo estrangeiro conhece, graças ao nosso corpo diplomático, sem modéstia, o grande, o portentoso Brasil!

 - Entretanto, aquela francesinha que conhece o mundo todo, que já teve na casa de rendez-vouz em Pequim, já foi amante de pretos na Colónia do Cabo e ganhou dinheiro em Monte Carlo, julga que viaja para um país chamado Buenos Aires, que tem por capital o Brasil, uma cidade onde a população anda de tanga.

E posso lhe afirmar, senhor Bispo, que ela vai até lá exactamente para poder andar de tanga, pois é primitivista.

 - Ela é imoral, isso sim.

 - Vai ter uma decepção, coitada!

 - Mas, doutor Rigger, pelo menos do ponto de vista religioso, o Brasil tem progredido muito. Hoje…

 - Hoje o feitiço domina. No norte, senhor bispo, a religião é uma mistura de fetichismo, espiritismo e catolicismo. Aliás, eu não acredito que Cristo haja pregado religiões. Cristo foi apenas um romântico judeu revoltoso.

Os senhores, Padres e Papas, é que fizeram a religião… Mas se senhor pensa que essa religião domina o Brasil, está enganado. Há uma falsificação africana dessa religião. A macumba, no Norte, substitui a Igreja que, no Sul, é substituída pelas lojas espíritas. No Brasil a questão da religião é uma questão de medo.

A senhora do senador escandalizada, benzia-se. O diplomata sorria por vaidade. O Bispo que era inteligente, quis protestar.

Não houve porém tempo. Um rapaz de bordo agitava uma sineta enorme chamando para o lanche.

E todos obedeceram a Sua Majestade, O Estômago.

quarta-feira, janeiro 16, 2013

IMAGEM

CHAFARIZ DEL' REI (Fotografia de 1907). Crê-se que a sua origem remonta a tempos muçulmanos sendo, certamente, um dos chafarizes mais antigos da cidade. Situado na zona ribeirinha de Alfama, na cidade de Lisboa, conhecida pela qualidade e abundância das suas águas, desempenhou durante séculos um papel central no fornecimento de agua a Lisboa. No Reinado de D. Afonso II era chamado Chafariz de São João dos Canos e é a partir do reinada de D. Dinis que passa a ser designado por Chafariz de El-Rei. Em 1551 devido à grande afluência de pessoas, foi necessário regulamentar o acesso à agua. Estipulou-se, então, que cada uma das suas seis bicas servia um só grupo social: negros forros; moiros das galés; moças brancas; homens brancos; índias, pretas, escravos e lacaios. O traçado actual resultou de obras efectuadas no Séc. XIX.
Situado à beira da linha do eléctrico, entre o campo das Cebolas e o Museu do Fado, é-me familiar porque durante os meus primeiros dez, onze anos de vida, sempre que vinha de minha casa, no Poço do Bispo para o centro da cidade, de carro ou de eléctrico, passava à sua beira.

Esta fotografia que regista o movimento do chafariz nos primeiros anos do século passado é uma autêntica relíquia do passado.

SEM COMENTÁRIOS


Afinal não mudou de Sexo…

 Ramon e Helga passeavam agarradinhos e de mão dada pelo parque verdejante.
 
Os desejos sexuais de Ramon aumentavam, quanto mais caminhavam entre as grandes e sombrias árvores.

 Quando Ramon já não suportava tanta excitação, Helga interrompe-o:


 - Espero que você não se aborreça amor, mas quero fazer xixi.

 Apesar de espantado pelo pedido inusitado, Ramon concorda:
 - Tudo bem Helga, vai ali para trás daqueles arbustos...
 Helga segue o conselho de Ramon.


 Enquanto isso, ele, nervoso e possuído pela luxúria, escuta o som erótico da cuequinha a deslizar pelas coxas suculentas de Helga, imaginando tudo aquilo ali tão próximo e à sua disposição.

Incapaz de se conter e seguindo os seus instintos carnais, Ramon introduz o braço através dos arbustos e toca a perna dela. Suavemente sobe as mãos, mais e mais, até que... horrorizado, agarra algo grosso e quente, no meio das pernas dela.



 Muito assustado, pergunta-lhe:



- Helga! Por amor de Deus! Você mudou de sexo???*

- Não! - responde ela irritada: 

- Mudei foi de ideias,...estou a cagar!!!*


A CARTA...




Com a resistência que só os angolanos têm, Mano Mingo foi tentar mais mais uma vez emprego em mais uma entrevista.

Ao chegar ao escritório, o entrevistador observou que o candidato. Tinha o perfil desejado, as virtudes ideais e lhe perguntou:

- Qual foi seu último salário?

- 30 mil Kwanzas, respondeu Mano Mingo.

- Pois se o senhor for contratado, ganhará 10 mil dólares por mês!

- Aká.... Jura?
- Que carro o senhor tem?
- Eu tinha um carro de mão aonde punha legumes pra vender na zunga, mas tambem era alugado!
- Pois se o senhor trabalhar connosco terá um VX para si e um Vera Cruz para sua esposa, novos a estalar!
- Aiwéééé minha vida....Jura?
- O senhor viaja muito para o exterior?
- Quer dizer já fui até M'bula Tumba, visitar uns parentes...
- Pois se o senhor trabalhar aqui viajará pelo menos 10 vezes por ano, para Londres, Paris, Dubai, China, Nova Iorque, etc.
- Adjiiiiiiiii num fala mais....Jura só?
- E lhe digo mais.... O emprego é quase seu. Só não lhe confirmo agora porque tenho que falar com meu Sócio. Mas já esta praticamente garantido. Se até amanhã (6ª feira) a meia-noite o senhor NÃO receber uma carta nossa a cancelar, pode vir trabalhar na segunda-feira com todas essas regalias que eu lhe disse.
Então já sabe: se NÃO receber carta até a meia-noite de amanhã, o emprego é seu!

Mano Mingo saiu do escritório fraco das pernas mas feliz, apanhou um taxi com os ultimos 100 Kz e foi pra casa.

Agora era só esperar até a meia-noite da 6ª feira e rezar, mas tambem previniu-se e amarrou capim e colocou na esquina da rua que dava pra casa dele para que não aparecesse nenhuma maldita carta.

Sexta-feira dia do homem mais feliz não poderia haver.

E Mano Mingo ganhou coragem e reuniu a família e contou a nova.

Convocou o bairro todo para uma sentada comemorativa à base de muito cabrité, fino e música de kilape.

Sexta a tarde já tinha 2 barris de fino aberto dos 7 de kilape.

Às 21 horas a festa fervia.

O Dj (de kilape) estava a pôr todas ketas fixe, o povo dançava (era do cambua, era tudo...), a bebida era bar aberto....

22 horas, a mulher do Mano Mingo (tia Fatita) aflita, já achava que tudo era um exagero, e perguntava se a carta chegar...
A vizinha Matilde gostosa lá do bairo (mais conhecida por Beyoncé), interesseira dum raio, bixa, já dançava do cambua só pro Mano Mingo.

E o Dj tocava (grandas cassetes sim senhora pá...) !

E as pipas abriam, uma atrás da outra!

O povo cantava "deixa a vida me levar... vida leva eu... (tava lhes kuiááááá malé)!

23 horas, Mano Mingo já era o papoite do bairro, pois tudo seria pago com os 10 mil Doláres....

E também porque o ultimo evento grande no bairro foi o óbito do Man Dadão que segundo o povo "bateu de milhões, muita bebida"...

E a mulher (tia Fatita) já não se aguentava, tava aflita, uns coxe alegre e já descabelada (quer dizer já com a peruca de lado)...

Às 23h50 minutos... Vira na esquina quase a chocar (por causa do capim amarrado lembram, ya quase deu certo) e fazendo jogo de luzes, um Corolla amarelo da DHL...

Ewéééééé, era a carta!

O amistoso (boda) parou!

O Dj parou a música!

O homem do cabrité apagou o carvão!

A vizinha Matilde (bixa dum raio) afastou-se!

Tia Fatita peidou!

Todos se perguntavam, e agora? Os kilapes?
" Coitado do Mano Mingo!" Era a frase mais ouvida.

- O sr. das pipas já bêbado exclamou: "eu então quero o meu kumbú, também fiz kilape na Cuca..."!

O fino parou!

O Corolla amarelo parou!

Sai um kta kilombo e se dirigiu ao Mano Mingo:

- Senhor Domingos Makubikua? (nome do Mano Mingo)

- Si, si....simmm, só, só eu simmm...

-Tia Fatita lhe empurrou para frente e disse: " agora fala bixo de merda, não finge que es gago eu te avisei..."

A multidão não resistiu....

Ewééééééééé, bandeiraaaaa!!!!!!!!!!!

E o kilombo do Corolla diz:

- Tenho uma carta muito importante para o senhor...

Mano Mingo não acreditava...

Pegou na carta, com os olhos cheios d'água, levantou a cabeça e olhou para todos....

Silêncio total.

Não se ouvia sequer um mosquito, até o transito de repente aquela hora engarrafou à espera da noticia...!

Mano Mingo respirou fundo e abriu a carta a tremer, enquanto uma lágrima escorregava no canto do olho....

Olhou de novo para o povo e tirou a carta do envelope, abriu e começou a ler em silêncio....

O povo todo em silêncio aguardava a notícia e se perguntava:

- E agora? Quem vai pagar os kilapes?

Mano Mingo recomeçou a ler, levantou os olhos e olhou mais uma vez para o povo que olhava pra ele tipo novela da Globo...

Foi então que Mano Mingo abriu um largo sorriso, deu um berro triunfal e começou a gritar eufórico.

- É Mamã que morreeeeuuu!
-Mamã morreeeeuuu!!!!!!!

Pode continuar a festaaaaaaaaa...

E o povo gritou, ehhhhhhhh vivaaaa....

Hihihihihihi.... sempre a rir....hihihihihi

O País do Carnaval

O PAÍS DO

CARNAVAL

Episódio Nº 1


Entre o azul do céu e o verde do mar, o navio ruma o verde-amarelo-pátrio.

Três horas da tarde. Ar parado. Calor.

No tombadilho, entre franceses, ingleses, argentinos e ianques está todo o Brasil (Evoé, Varnaval!).

Fazendeiros ricos de volta da Europa, onde correram igrejas e museus. Diplomatas a dar ideia de manequins de uma casa de modas masculinas… Políticos imbecis e gordos, suas magras e imbecis filhas e seus imbecis filhos doutores.

Lá no fundo, namorando o mistério das águas, uma francesa linda como as coisas caras, aventureira viajada, da qual se dizia conhecer todos os países e todas as raças, o que equivale a dizer que conhecia toda a espécie de homem, tolera, com um sorriso condescendente, o galanteio juliodantesco de uma dúzia de filhos-família brasileiros e argentinos:

 - A senhora é linda…

 - Minha vida pela sua vida…

 - Faça um sinal e me atirarei à agua!

 - Eu queria que o navio naufragasse para poder provar quanto a amo…

Tudo isso era dito em mau francês, num mau francês de causar inveja aos rapazes que lêem Dekobrá e têm por Tiradentes uma grande paixão patriótica.

Toda essa gente sua muito debaixo da elegância das suas roupas quentes, feitas em Londres e Paris a preços elevados.

Toda a gente, menos a francesa que trazia um vestido simples de musselina branca. É, em verdade bela. Olhos verdes como o mar e pele alva. Não admira que aqueles tropicais brasileiros e argentinos gastem com ela sua retórica, tão precisa à Pátria.

Adiante, um senador, um fazendeiro, um bispo, um diplomata e a senhora do senador conversam na boa paz burguesa dos que têm o reino da terra e a certeza de comprarem o do céu.

 - Sim -  diz o fazendeiro – foi regular a safra. Mas os preços…

 - Ora, coronel, o senhor quer dizer a mim?... Mesmo pelo preço em que está, o café continua a dar um lucro fabuloso… É a riqueza de São Paulo e do Brasil.

Mesmo porque o Brasil é São Paulo! – fez a senhora do senador, bairrista de irritar.

 - Oh, minha senhora! Perdoe-me se discordo de V.ª Ex.ª  mas…

Era o diplomata que falava. Primeiro-Secretário de Embaixada em Paris, ainda estava inédito o seu primeiro serviço à Pátria. Nascera na Baía, e trazia no sangue e no cabelo a marca dos deboches dos avós portugueses com avós africanas.

 - …mas há outros grandes Estados… Olhe a Bahia, minha senhora. A Bahia, veja Vª Exª, produz tudo… cacau, Fumo, Feijão. E produz homens, minha senhora, grandes génios, Rui Barbosa era baiano…

 - Mas hoje, doutor…

 - Oh! Minha senhora, não diga… Ainda hoje grandes talentos…

E o Bispo conciliador.

 - O doutor mesmo é uma prova…

terça-feira, janeiro 15, 2013

IMAGEM
A natureza em todo o seu esplendor de cor, sombras e luzes


ELIS REGINA - POEMA

Trinta e um anos de saudade. Elis faleceu a 19/1/82 depois de ter tomado a derradeira dose de cocaína. A morte levou consigo a melhor cantora do Brasil. Cantava, interpretava, vivia o palco e a voz da forma mais intensa. Estará sempre viva em todos os tempos pois a voz e a paixão não têm idade... a vontade de a ouvir permanecerá para sempre.

PAULO DE CARVALHO - E DEPOIS DO ADEUS

A melhor voz masculina da música portuguesa, a melhor canção enviada ao festival da Eurovisão, uma música e uma letra assinadas por um grande  maestro e um enorme poeta, respectivamente, José Calvário e José Nisa, ambos, infelizmente, já falecidos.


Falando sobre Religiões…

Nasci e a religião caiu-me, literalmente, em cima. Na parede do quarto, em frente do berço, um crucifixo pendurado, na cabeceira da cama dos pais um rosário, em cima da mesa-de-cabeceira uma bíblia e quando, tempos mais tarde, a minha avó morreu disseram-me que tinha ido para o céu onde me esperava para me contar mais histórias.

Dir-se-ia que eu era uma criança católica, no entanto, não passava de uma criança filha de pais católicos da mesma forma que seria islamita se tivesse nascido de pais islamitas no Afeganistão e assim, para mim o islamismo era falso e o cristianismo verdadeiro e o contrário para o menino islamita.

A religião começa, pois, por ser uma herança cultural que os nossos pais nos transmitem ao nascer exactamente como fizeram com eles, com o apoio da estrutura social, maior ou menor, em função da sociedade de que fazemos parte.

E, como qualquer herança, quem a recebe toma-a como sua e assim, sem que pudéssemos ter tido uma palavra a dizer por sermos demasiado crianças, passamos a ter uma religião e a ser religiosos para o resto da vida com mais ou menos convicção ou mesmo sem convicção nenhuma e isto ao longo de gerações e gerações.

Entre nós, parece que a religião como legado tem vindo a perder valor pois, para além da crise de vocações de que a hierarquia da Igreja tanto se queixa, também o nível de conhecimento de aspectos básicos da religião católica anda muito por baixo.

Em 300 entrevistas efectuadas recentemente na Universidade Lusófona a maioria dos entrevistados revelou um confrangedor desconhecimento sobre as datas em que se celebram os feriados religiosos da Páscoa, Corpo de Deus e Imaculada Conceição, quem é a Santíssima Trindade, qual é o primeiro Mandamento ou como se chama o Papa, e sobre outras religiões o panorama não é diferente.

A religião do Dalai Lama revelou-se um mistério, apenas 18% souberam responder mesmo quando o líder Tibetano tinha acabado de visitar o país, e às perguntas sobre o Islão, se era uma religião monoteísta e qual a sua principal cidade santa, a maioria nem tentou responder.

Talvez um pouco por tudo isto o mediático Frei Bento Domingues se sinta na necessidade de escrever artigos intitulados “A religião não vai morrer”.

Como português, também eu recebi como herança dos meus pais, para além do curso superior que me permitiu viver a vida com dignidade, a religião católica e todos os seus sacramentos de vinculação me foram ministrados: baptismo, comunhão simples, comunhão solene, crisma e a sagrada união matrimonial.

Durante a minha juventude, enquanto aluno dos jesuítas, rezei terços, confessei-me, comunguei fiz retiros espirituais e peregrinações a Fátima.

Debalde, ao longo dos anos a herança católica foi perdendo sentido e tornou-se um monte de contradições e equívocos à luz desta religião, ou de qualquer outra.

Incapaz de me tornar adepto incondicional do que quer que seja pela crença, para alem dos valores da liberdade e do respeito pela dignidade da pessoa humana em que acredito indiscutivelmente, fiquei entregue a mim mesmo e, surpreendentemente, sinto-me bem e morrerei em paz quando chegar o momento porque não terei que me interrogar sobre o que me esperará exactamente porque nada estará à minha espera.

Ninguém nem nenhuma leitura em especial foram decisivos naquilo que sou hoje: crente na vida, descrente em Deus...

Imagine-se um mundo sem religião com as torres gémeas, sem bombistas suicidas, sem ataques ao Metropolitano de Londres, sem cruzadas, caça às bruxas, divisão da Índia, guerras israelo palestinianas, massacres de sérvio/croatas/muçulmanos, perseguição de judeus enquanto “assassinos de Cristo”, “assassinatos por motivos de honra”, televangelistas de fato lustroso e cabelo armado a tosquiar o dinheiro de rebanhos ingénuos (“Deus quer que dê até doer”.)

Imagine-se um mundo sem “talibãs” a fazerem explodir estátuas antigas, decapitações públicas de blasfemos, flagelação de mulheres por exibirem um centímetro de pele, imagine-se tudo isto e muito mais e facilmente se compreende porque, tendo nascido filho de pais católicos, não só deixei de o ser como também não sou crente em Deus.

Acrescentar, porque é justo e importante, que entendi a teoria evolucionista de Charles Darwim como a explicação racional para o desenvolvimento da vida ao cimo da terra, através dos fenómenos de mutação e selecção natural, teoria esta que hoje deixou de o ser por se ter constituído numa verdade científica obviamente comprovada.

«A vida é uma extraordinária oportunidade e eu que vou morrer considero-me bafejado pela sorte porque a maior parte das pessoas nunca vai morrer porque nunca vai chegar a nascer. As pessoas potenciais que poderiam ter estado aqui no meu lugar, mas que na verdade nunca verão a luz do dia, excedem em número os grãos de areia que existem no deserto do Sara. Seguramente que nesses fantasmas que nunca vão chegar a nascer incluem-se poetas maiores do que Camões, Pablo Neruda ou Walt Witman e cientistas maiores que do que Newton ou Einestein.
Sabemos isto porque o conjunto de pessoas potenciais pelo nosso ADN é esmagadoramente superior ao conjunto de pessoas com existência efectiva. Não obstante esta ínfima probabilidade, sou eu, é você, somos nós, que na nossa vulgaridade aqui estamos…

Como poderemos então, nós, os poucos privilegiados, que contra todas as probabilidades, ganhámos a lotaria do nascimento, atrever-nos a queixar-nos do nosso inevitável regresso a esse estado anterior do qual a vasta maioria nunca despertou?” (Richard Dawkins).

 Douglas Adams pergunta:

“Não basta ver que um jardim é belo sem ter que acreditar que lá ao fundo também esconde fadas?"


EXPLICAÇÃO


Diante da grandiosidade da natureza, o brasileiro pensou que isto fosse um circo. E virou palhaço…

Este livro pretende contar a história de um homem que, tendo vivido na velha França muito tempo, voltou à pátria disposto a encontrar o sentido da sua vida. Conta a sua luta, o seu fracasso. Conta a luta dos seus amigos, rapazes de talento, que falharam na existência.

Este livro é um grito. Quase um pedido de socorro. É toda uma geração insatisfeita que procura a sua finalidade. Nós já começamos a luta contra a dúvida. A geração que chega combate as atitudes cépticas.

Este livro narra a vida de homens cépticos que, entretanto procuraram uma finalidade. Tentaram alcança-la. Uns no amor, outros na religião. O fracasso das tentativas não é prova da sua inutilidade.

Este livro pretende ser humano. Por mais que pareçam artificiais os seus heróis, eles vivem. Porque, procurando bem, até homens inteligentes se encontram no Brasil.

Mais do que humanos, este livro tem veleidades de humanitário.

Cristo disse que se devia amar o próximo.

Acho que se deve ter amor aos semelhantes e uma grande indiferença, feita de desprezo e perdão, aos que não nos são semelhantes…

Eu não tenho veleidades literárias. Não pretendo fazer público com este romance. Não sou pornógrafo, nem jornalista de sensação.

Este livro tem um cenário triste: o Brasil. Natureza grandiosa que faz o homem de uma pequenez clássica.

A sátira, no Brasil, só a praticam os papagaios.

No norte, terra da promissão, há uma grande confusão de raças e de sentimentos. É a formação do povo. E dessa confusão está saindo uma raça doente e indolente. E todo o dia a natureza surra, com o chicote do sol, o nortista tragicamente vencido.

Este livro é como o Brasil de hoje. Sem um princípio filosófico, sem se bater por um partido. Nem comunista, nem fascista. Nem materialista, nem espiritualista. Dirão talvez que assim fiz para agradar a toda a crítica por mais diversa que fosse o seu modo de pensar.

Mas afirmo que tal não se deu. Não me preocupa o que diga do meu livro a crítica. Este romance relata apenas a vida de homens que seguiram os mais diversos caminhos em busca do sentido da existência. Não posso bater-me por uma causa. Eu ainda sou um que procura…

Eu quisera intitular este romance de Os homens que eram infelizes sem saber porquê, mas a gente tem vergonha de certas confissões. E fica-se vivendo a tragédia de fazer ironias.

Os defeitos deste livro são a minha maior honra.


                                                                           Jorge Amado
                                                                               1930

Nota


Para muitos críticos, esta obra é considerada um retrato geracional porque Jorge Amado tinha 18 anos, estudava Direito e relata a juventude ansiosa da época. Haveria de ser considerado um livro subversivo e queimado em praça pública em 1937 durante o regime do Estado Novo.
Não obstante, foi publicado em Portugal e traduzido para o Espanhol, francês e italiano.

segunda-feira, janeiro 14, 2013

IMAGEM
Forno comunitário da aldeia do Juncal.



ENTREVISTA FICCIONADA
COM JESUS Nº 95 SOB O TEMA:
“QUE RELIGIÃO FUNDOU JESUS?”



RAQUEL -  Por medidas de segurança e por desejo expresso de nosso entrevistado, Jesus Cristo, que nos disse que em poucos dias dará por concluída sua segunda vinda à Terra, nós regressamos à Galiléia, mas não identificaremos a localização de nossa unidade móvel.

JESUS -  Sim, Raquel, já está chegando a hora de partir.

RAQUEL -  São muitos os temas que temos abordado e suas declarações têm sido muito audazes. No entanto, a audiência das Emissoras Latinas manifesta que ficaram com mais perguntas que respostas.

JESUS - Essa seria uma boa colheita, uma messe abundante. Quando alguém faz perguntas, então busca.

RAQUEL -  Dizem que todas as religiões buscam a Deus.

JESUS -  As religiões ajudam só durante um tempo. Depois, temos que ir mais além da religião.

RAQUEL -  O senhor é considerado o fundador de uma religião, a religião cristã, a que domina no Ocidente.

JESUS -  Eu não fundei nada, Raquel. E muito menos para dominar. Eu quis servir. E busquei a Deus a partir da religião de meus pais, a religião judaica.

RAQUEL -  E o que encontrou?

JESUS - O Templo, os sacerdotes, a lei do sábado, jejuns, a ladainha de orações, os fariseus se achando os primeiros, ritos, sacrifícios, sangue...

RAQUEL -  Tudo negativo?

JESUS - Não, encontrei profetas que falavam com muita paixão pela justiça. Que se engajavam pelas viúvas e órfãos. E seguindo seu exemplo, comecei a proclamar o Reino de Deus.

RAQUEL -  Daí partiu seu movimento?

JESUS - Sim. Dizíamos: Deus não quer sacrifícios, mas amor. Dizíamos: nem neste templo nem em outro. Dizíamos: os últimos serão os primeiros. As pessoas encontravam um caminho, uma verdade, uma vida.

RAQUEL - Então, fundou outra religião, a religião cristã, da qual o senhor é o caminho e a verdade.

JESUS - Não, Raquel, repito que eu não fundei nenhuma religião. Eu aprendi que para encontrar Deus temos que ir mais além de qualquer religião.

RAQUEL - E quando chegarmos “mais além” das religiões… onde encontraremos Deus?

JESUS - Onde sempre tem estado. Na rua, no meio do povo, na vida, na festa, na compaixão, na justiça, no amor. Até nos lírios do campo e nos pássaros do céu. Quando já nada é sagrado, tudo começa a ser sagrado.

RAQUEL -  Senhor Jesus Cristo, no planeta Terra vivem hoje mais de seis bilhões de pessoas, e pelo menos um bilhão vêm o senhor como o Enviado de Deus. Mais ainda: adoram o senhor como a Deus.

JESUS – Quantas disseste tu? Mil entre seis mil? Ao menos, não são a maioria!

RAQUEL - E o que o senhor diz a eles, aos cristãos, aos que têm colocado sua fé no senhor e em suas palavras?

JESUS -  Que busquem a Deus como eu o busquei. Quem procura encontra e ao que bate se abre. Eu não sou a casa, eu só fui uma porta. Entrem e saiam. Livremente. E vão mais além. Mais além de mim.

RAQUEL -  E aos bilhões que não são cristãos, aos que acreditam em outras religiões ou não crêem em nenhuma, o que lhes diria?

JESUS - O mesmo, Raquel. Porque a casa de Deus está aberta para todos os homens e mulheres sem distinção. E têm muitas portas, e há espaço de sobra, e corre ar fresco por ela, como aqui, na minha terra, nesta Galiléia dos gentios.

RAQUEL -  De algum lugar da Galiléia, ao norte da Palestina, falou Raquel Pérez, Emissoras Latinas.


 Um sujeito vestindo uma camiseta escrito: "SOU POLÍTICO" entrou numa loja de armas e perguntou para o vendedor:
 - Qual é o preço de um trinta e oito ?
 - Não estamos vendendo esse revolver!
 - Então, qual é o preço daquela pistola 9 milímetros da vitrina ?
 - Também não está à venda !
 - E aquela escopeta calibre 12 da prateleira ?
 -  Ela também não está à venda.
 - Tô achando que o senhor não quer vender nada pra mim por que sou político...
 - Pois é isso mesmo !
O político sai da loja espumando de raiva.
No dia seguinte ele vai procurar o advogado , conta a história para o "doutor" e pede que ele tome alguma providência.
Tentando resolver o problema pacificamente, o advogado vai até a loja e pergunta ao vendedor: 
-  Bom dia, meu amigo. Eu gostaria de saber se você tem alguma coisa contra políticos?
 - Temos tudo o que o senhor precisar : revólveres, pistolas, metralhadoras,  bazucas e, se precisar, consigo granadas e lança-chamas...

PS. - Tiro o meu chapéu à actual Presidente do Brasil, Dilma Rousseff.

Enquanto a reacção das "vítimas" forem umas cantorias brincalhonas irá tudo bem...

Já não teria 18 anos mas ainda era um jovem...

Jorge Amado

Nasceu em 1912, em Itabuna, no Sul do Estado da Baía e, como dizia sua mãe, «com a estrela»: um homem afortunado. O seu pai queria que ele fosse doutor e ser doutor, naqueles tempos, era formar-se em Medicina, Engenharia ou Direito.

Jorge Amado, que desde os catorze anos participava em movimentos culturais e políticos, optou por Direito, fazendo a vontade ao pai mas nunca foi buscar o diploma nem exerceu a advocacia.

Em compensação, no ano da sua licenciatura, em 1935, já era um escritor conhecido, autor de quatro livros, um dos quais, o primeiro, «O País do Carnaval» que escolhi agora para transcrever no Memórias Futuras.

Tem o aliciante de ser o primeiro e revelar o escritor aos dezoito anos de idade e a sociedade brasileira no início da década de 30.

Augusto Frederico Schmidt, poeta brasileiro, que fundou em 1930 A Livraria Católica e posteriormente Livraria Schmidt Editora, ponto de encontro dos intelectuais modernistas da época e responsável por ter dado a conhecer ao mundo escritores de peso, tais como, Vinícius de Morais, Gilberto Freyre, entre outros… e, claro, Jorge Amado, escreveu-lhe uma carta após ter recebido o manuscrito, queixando-se de o ter lido rapidamente embora o pouco tempo passado com os seus personagens tivesse sido suficiente para reconhecê-los todos, um por um.

E disse mais nessa carta de muito revelador:

 - "Seu livro é um forte documento daquilo que somos hoje, nós, mocidade brasileira, mocidade sem solução, fechada em si mesma, perdida numa terra que nos dá a todo o momento a impressão de que sobramos, de que somos demais.

Seu livro acordou em mim velhas revoltas já sufocadas e recalcadas contra a vida e a terra em que vivemos. Paulo Rigger, seu personagem, não é um cerebral, não é um filho do ocidente saturado e exasperado de cultura, é apenas um pobre moço brasileiro, como eu, como você, como todos nós.

… Eu, um pouco mais velho que você, já me sinto muito distante de tudo, num desinteresse sempre crescente, pelo que alimentou o meu gosto pela vida. Não temos frescura, nem nos podemos repousar nos bons silêncios. Viemos para gritar que existimos, diante de uma nação adormecida e indiferente. Cansamos porém logo e assistimos com melancolia à vinda dos que ainda acreditam que é possível gritar, que é útil gritar.

… O país em que nascemos pesa sobre nós. Basta olhar para o Brasil de hoje, no seu aspecto político, por exemplo, para termos uma ideia do drama que se está passando aos nossos olhos. O caos de todos os lados. A mocidade não tem um sentido, não tem uma direcção, não tem uma causa. A única aspiração da nossa mocidade é a velhice.

… Seu livro tem grande importância porque como você mesmo diz os seus defeitos constituem o seu maior motivo de orgulho. Não sei de outro romance nosso que trouxesse à tona como o seu, na indecisão das suas linhas de composição, tal complexidade de problemas.

Seus personagens estão. E procuram. Não procuram apenas o sentido da pátria, da terra, mas procuram o sentido de si próprios. No geral, todos os romances brasileiros são cenários por vezes belos e verdadeiros mas sempre cenários. E será exactamente deficiência de cenário que verificamos n’ «O País do Carnaval». Qualidade e defeito do seu livro. Qualidade que eu amo.
….
Um abraço do  
 Augusto Frederico Schmid


Amanhã transcreveremos uma EXPLICAÇÃO prévia de Jorge Amado para o livro que acabara de escrever e que me pareceu também muito interessante. Depois, como sempre temos feito, episódio após episódio, para termos tempo de digerir a história e conhecermos bem os seus personagens, ponto forte dos romances de Jorge Amado, dar-vos-emos a conhecer «O País do Carnaval», primeiro romance de Jorge Amado escrito aos 18 anos de idade… o que nos permite concluir que os génios da literatura, ou de qualquer outra forma de arte, nascem, não se fazem, quando muito afinam e refinam ao longo das suas vidas como a própria vida.
  

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