Memórias Futuras
Olhar o futuro pelo espelho retrovisor da história. Qual história? Que futuro?
sábado, fevereiro 16, 2013
Quase quatro anos depois de nos ter deixado permitam-me
que relembre aqui , com muitas
saudades à mistura, a minha carta de despedida ao meu querido sobrinho Victor
José.
Adeus, meu querido…
Que
posso fazer quando me apercebo que não voltarei a receber mais uma das tuas
chamadas de telemóvel em que, invariavelmente, perguntavas: “então meu
querido?”, que não seja tentar reter lágrimas de saudade?
Foi anteontem, era mais uma das
sardinhadas que organizavas em tua casa, pretexto para reunires os teus amigos,
especialmente aqueles de quem gostavas como se fossem teus irmãos.
Tínhamos começado a almoçar quando o
teu “amigo-irmão”, Rui Silvério, recebeu um toque no telemóvel que lhe enviaste
depois de te teres levantado da mesa sem nos apercebermos.
Pressentindo que se aproximava mais
um “surto” da esclerose múltipla de que sofrias, ausentaste-te para uma outra
parte da casa sem que depois conseguisses evitar um mudo pedido de SOS.
Foram minutos de pânico, desespero,
em que cada um de nós procurou agarrar a vida que se escoava de ti. Os apelos
eram dramáticos: “vá, companheiro, reage, abre os olhos, vive…” mas neste
último “surto” já não haveria retorno.
Com os teus amigos de quem tanto
gostavas à tua volta, em desespero, perfeitamente atordoados, tinhas adormecido
para sempre em paz e sem sofrimento.
Ao longo de cerca de vinte anos, até
aos quarenta e cinco, carregaste uma sentença de morte denominada esclerose
múltipla mas durante esses anos em que o “copo foi enchendo até à gota que o
fez transbordar”, na expressão do Zé Manel, médico, amigo,“irmão”, tu viveste…
caramba, se viveste, como qualquer outro mortal dificilmente conseguirá viver
em cem anos que cá esteja.
Durante anos exploraste estufas na
nossa aldeia da Concavada produzindo principalmente feijão verde e meloa com os
elogios dos técnicos da especialidade mas, lutando contra um micro clima que
era adverso, foste obrigado a desistir.
Montaste uma empresa
de serviços na área das limpezas industriais e na Central Eléctrica do Pego,
competindo com outras bem mais poderosas, foste sempre ganhando todos os
concursos periódicos para a renovação do contrato de prestação dos serviços,
pelas tuas imensas capacidades de trabalho, inteligência e qualidade das
relações humanas que desenvolvias.
Em colaboração com o
teu pai, meu único irmão, do qual, em muitos aspectos, eras uma continuação,
montaste com total sucesso uma actividade de comércio de móveis que exigia
permanentes deslocações à Holanda.
Construíste e
exploraste um empreendimento turístico em Pipa, no Brasil e mantiveste negócios
no imobiliário em João
Pessoa e Natal.
Em incursões
prolongadas a Cuba, percorrendo o seu interior, conseguiste trazer a Portugal
músicos daquele país que actuaram e ganharam dinheiro melhorando as condições
de vida na sua terra e abrindo-lhes as perspectivas do mundo deixando atrás de
ti, por essas terras e essas gentes, um rasto de humanidade.
Tudo isto fizeste com respeito pelos
outros, sem amachucar ninguém, ajudando, estendendo a mão, semeando amigos,
deixando por todo o lado por onde passaste pessoas que te adoraram.
Foi assim porque o coração que
finalmente se recusou a manter-te vivo por mais não poder, era grande,
enorme... e bom.
Na minha qualidade de homem
orgulho-me que tenhas sido meu sobrinho e se me é permitido este desabafo,
dizer que aqui lo que aconteceu
contigo só não constitui a maior injustiça deste mundo porque não há critérios
ou preocupações de justiça nestas coisas.
Às cegas, ao acaso, as escleroses
múltiplas e muitos outros males são por esse mundo distribuídos pelas pessoas
sem cuidar de nada, de forma totalmente aleatória e eu próprio me sentia
incomodado por ter a saúde que tu não tinhas, sentia-me "injustiçado"
porque tu eras melhor, mais humano e corajoso que eu e a maioria de nós.
Sei que relativamente a estas coisas
da vida e da morte pensavas como eu: desligado o interruptor da vida
regressamos ao mesmo local onde sempre estivemos até nascer. Tal como então,
nada nem ninguém jamais te incomodará mas atrevo-me a dizer, que mesmo com esclerose múltipla, pelas muitas pessoas que te amaram nesta vida, foi um feliz
acaso teres vindo a este mundo.
Adeus, meu querido.
Tio Jaqui m.
Junho de 2009
João XXIII |
DUAS SURPRESAS
Bento XVI |
A surpresa de Giuseppe Roncalli reside
no inesperado da sua eleição. Ele não fazia parte, nem remotamente, do grupo de
cardeais, que se esperava poderem ser eleitos.
Hannah Arendt coloca na boca de uma
criada romana a pergunta que subjaz à maior reforma da Igreja em mais de mil
anos:
«Minha
senhora, este Papa era um verdadeiro cristão».
“Mas, como foi isso possível? Como pôde
um verdadeiro cristão sentar-se no trono de S. Pedro? Pois não teve ele
primeiro de ser nomeado bispo, arcebispo e cardeal para, finalmente, ser eleito
Papa? Ninguém se terá apercebido de quem ele era?”
Para Arentd, a força de João XXIII
residia na pureza elementar da sua fé, e na unidade desta com um infalível
juízo moral. Não se enganava nunca na distinção entre o bem e o mal. Poucos se
poderão orgulhar de, no leito de morte, afirmarem:
“Todos os dias são bons para nascer,
todos os dias são bons para morrer”.
Ao contrário de monsenhor Roncalli, o
cardeal Ratzinger surpreende na sua saída e não pela sua eleição. Há muito que
ele se encontrava na lista de sucessão de João Paulo II, um soldado do aparelho
mais íntimo da Igreja. Uma mistura complexa de professor, inqui sidor e burocrata.
Surpreendeu por ser o primeiro Papa a
renunciar desde 1415. Estamos apenas no início de perceber a vastidão de
consequências, não só para a Igreja, do gesto de um Papa que reconhece
publicamente os limites da condição humana.
Numa era de barbárie crescente, de
super-homens e outros aprendizes de feiticeiro, um acto que assume a grandeza
da fragilidade só pode ser visto como um bem público.
Para já, na hora da despedida, o
desabafo sentido:
-
«Os javalis entraram na vinha do Senhor»
Viriato Soromenho Marques
(Prof. Universitário)
Viriato Soromenho Marques
(Prof. Universitário)
DO
CARNAVAL
Episódio Nº 24
No único quarto da casa havia um a única cama. Julie
deitou-se. Rigger achou que seria desaforo passar a noite em claro por causa de
uma rameira. E deitou-se também.
Ela, no canto encolhida, deixava transparecer, de propósito,
o seio. Ele sentiu que o seu pé tocava no de Julie. Um arrepio correu-lhe o
corpo. Quis levantar-se, mas não pôde. Ela virou-se na cama e encostou-se a
ele. Paulo acariciou-a. Abraçaram-se. Possuíram-se.
E, no grande momento, ela pediu:
- Perdoe-me…
- Não!
Empurrou-a. Apertou-lhe a garganta. Ela gritou.
Soltou. Soltou-a. Tinha uma vontade louca de esmagá-la. Disse-lhe nomes feios.
Ela sorriu. Ele deu-lhe um soco. Julie gritou:
- Covarde!
E ele bateu-lhe até cansar-se. Depois, deixou-a chorando
na cama. Saiu. Aspirou com força o ar da noite. A lua, no alto, escondeu-se
atrás de uma nuvem.
E o vento parecia cantar-lhe nos ouvidos a marcha
carnavalesca.
Dá nela…
Dá nela…
VI
Meses de intenso trabalho. O “Estado da Bahia”
tirava-lhe todo o tempo. Deveria aparecer por aqueles dias. Paulo Rigger e José
Lopes não saíam da redacção, em longas conversas.
Aqueles dois homens extremamente diferentes se
entendiam. Ambos não estavam satisfeitos com a própria vida. Ambos sentiam a
necessidade de algo que não sabiam o que fosse., algo que lhes faltava.
Eles chegaram à conclusão de que se vive para qualquer
coisa superior. Qual seria ela? Ricardo Braz afirmava que a finalidade da vida,
isto é, a Felicidade, só se encontra no amor.
Jerónimo Soares
insinuava a medo que talvez a religião satisfizesse essa ânsia de finalidade de
todos os homens.
Paulo Rigger inclinava-se para o que dizia Ricardo.
José Lopes não duvidava que Jerónimo tivesse razão, mas não chegavam nunca àquela
certeza a que os outros tinham chegado. Entre eles, Pedro Ticiano, agora com
uma terrível doença nos olhos que lhe ia roubando a vista, jurava sobre a
experiência dos seus sessenta e cinco anos, que o homem superior não tem
finalidade. Vive por viver…
- Mas Ricardo Braz é superior e entretanto garante que
o amor, o casamento, a vida burguesa trazem a Felicidade.
- Mas ele já
amou? Já casou? Quando amar, quando se casar, se decepcionará…
José Lopes estava com Ticiano. O amor não podia dar a
Felicidade…
E, vitorioso:
- E a
saciedade? E a tragédia da saciedade?
Agora podia ser que o sobrenatural – Deus, a religião –
consolasse.
sexta-feira, fevereiro 15, 2013
DECLARAÇÃO DE GUERRA
A situação não se alterou de Janeiro de 2011 para cá mas eles que não nos provoquem porque com a crise que por aqui vai facilmente podemos perder a cabeça... "perdidos por um, perdidos por mil". A salvação deles está na EDP. Sendo agora os donos cortam-nos a luz e sem energia não há guerra...
Há 40 anos atrás com a música ligeira italiana em alta esta era uma das minhas favoritas... Lembram-se dela?
ILHA PARADISÍACA |
CADA QUAL À SUA
MANEIRA...
Numa
ilha maravilhosa e deserta no meio do imenso oceano, após um terrível
naufrágio, encontram-se as seguintes pessoas:
- Dois italianos e uma italiana;
- Dois franceses e uma francesa;
- Dois alemães e uma alemã;
- Dois gregos e uma grega;
- Dois ingleses e uma inglesa;
- Dois búlgaros e uma búlgara;
- Dois japoneses e uma japonesa;
- Dois chineses e uma chinesa;
- Dois americanos e uma americana
- Dois irlandeses e uma irlandesa;
- Dois portugueses e uma portuguesa;
Passado um mês,
nesta ilha absolutamente paradisíaca, no meio do nada, a situação era a
seguinte:
- Um dos italianos matou o outro por causa da italiana;
- Os dois franceses e a francesa vivem felizes juntos num ménage-a-trois;
- Os dois alemães marcaram um horário rigoroso de visitas alternadas à alemã;
- Os dois gregos dormem um com o outro e a grega limpa e cozinha para eles;
- Os dois ingleses aguardam que alguém os apresente à inglesa;
- Os dois búlgaros olharam longamente para o oceano, depois olharam longamente
para a búlgara e começaram a nadar;
- Os dois japoneses enviaram um fax para Tóqui o
e aguardam instruções;
-Os dois chineses abriram uma farmácia/bar/restaurante/lavandaria e
engravidaram a chinesa para lhes fornecer empregados para a loja.
- Os dois americanos estão a equacionar as vantagens do suicídio porque a
americana só se queixa do seu corpo, da verdadeira natureza do feminismo, de
como ela é capaz de fazer tudo o que eles fazem, da necessidade de realização,
da divisão de tarefas domésticas, das palmeiras e da areia que a fazem parecer
gorda, de como o seu último namorado respeitava a opinião dela e a tratava
melhor do que eles, de como a sua relação com a mãe tinha melhorado e de que,
pelo menos, os impostos baixaram e também não chove na ilha...
- Os dois irlandeses dividiram a ilha em Norte e Sul e abriram uma destilaria.
Não se lembram se o sexo está no programa por ficar tudo um bocado embaciado
depois de alguns litros de whisky de coco. Mas estão satisfeitos porque, pelo menos,
os ingleses não se estão a divertir...
- Quanto aos dois portugueses e a portuguesa que também se encontram na ilha,
até agora não se passou nada porque resolveram constituir uma comissão
encarregada de decidir qual dos dois homens seria autorizado a requerer por
escrito o estabelecimento de contactos íntimos com a mulher.
Acontece que a
comissão já vai na 17ª reunião e até agora ainda nada se decidiu, até porque
falta ainda aprovar as actas das 5 últimas reuniões, sem o que o processo não
poderá andar para a frente. Vale ainda a pena referir que, de todas as
reuniões, 3 foram dedicadas a eleger o presidente da comissão e respectivo
assessor, 4 ficaram sem efeito dado ter-se chegado a conclusão que tinham sido
violados alguns princípios do Código de Procedimento Administrativo, 8 foram
dedicadas a discutir e elaborar o regulamento de funcionamento da comissão e 2
foram dedicadas a aprovar esse mesmo regulamento.
É ainda notável que muitas
das reuniões não puderam ser realizadas ou concluídas, já que duas não
continuaram por falta de quórum, uma ficou a meio em sinal de protesto pelo
agravamento das condições de vida e 5 coincidiram com feriados ou dias de
ponte...
- Posso saber porque é que tu estás
chateada desde que eu cheguei ?
Irritada, a mulher responde:
- Hoje fazemos 25 anos de casados e estamos aqui ,
sentados à frente desta televisão...
- Ora bolas !.. Eu estava tão atarefado que me esqueci completamente !..
Perdoa-me, minha querida. Vai pôr o teu melhor vestido de noite, que vamos sair? Vais ter uma noite inesquecível !..
Irritada, a mulher responde:
- Hoje fazemos 25 anos de casados e estamos a
- Ora bolas !.. Eu estava tão atarefado que me esqueci completamente !..
Perdoa-me, minha querida. Vai pôr o teu melhor vestido de noite, que vamos sair? Vais ter uma noite inesquecível !..
- Ah... amooooor, eu sabia que tu não
eras um monstro insensível.
À entrada do restaurante, o gerente, todo solícito:
- Prepare a mesa do senhor Gonçalves.
Diz a mulher:
-Parece que eles te conhecem bem por aqui ,
querido!
- Ah é !... Acho que já cá vim para almoçar com alguns clientes.
Eles acabam de jantar e o marido propõe de irem a uma boite. À entrada há uma fila enorme. O marido diz à mulher que vai tratar do assunto e dirige-se ao porteiro:
- Oi meu..., como tás matulão ???
E o porteiro:
- Está tudo bem, Sr. Gonçalves. Pode entrar!
Dentro da boite, o dono vem falar com eles:
- Boa noite, Sr. Gonçalves!
E diz, logo em seguida:
- Toca a vagar de imediato a mesa do senhor Gonçalves !..
A mulher, desconfiada:
- Tu vens sempre aqui ?
- Ah, não !.. O dono é um cliente da firma...
Uma vez na mesa, a empregada vem e diz:
- O mesmo de sempre, Sr. Gonçalves ?
Nesse instante, uma mulher que terminava um strip-tease em cima do palco grita:
- E a cuequi nha..., é para quem ?!..
A boite, em peso, grita:
- Gonçalves... Gonçalves... Gonçalves...
A esposa, furiosa, sai da boite, e o marido vai atrás... e ambos entram num táxi. O marido tentando apaziguar as coisas:
- Querida, não vamos estragar esta noite maravilhosa, com certeza eles confundiram-me com outro Gonçalves...
- Mas tu estás a pensar que eu sou alguma idiota ?!.. Canalha !.. Não me toque mais !.. Blá, blá, blá... eu sou mesmo uma otária... blá, blá, blá...seu grande filho-da-puta, blá, blá, blá...
À entrada do restaurante, o gerente, todo solícito:
- Prepare a mesa do senhor Gonçalves.
Diz a mulher:
-Parece que eles te conhecem bem por a
- Ah é !... Acho que já cá vim para almoçar com alguns clientes.
Eles acabam de jantar e o marido propõe de irem a uma boite. À entrada há uma fila enorme. O marido diz à mulher que vai tratar do assunto e dirige-se ao porteiro:
- Oi meu..., como tás matulão ???
E o porteiro:
- Está tudo bem, Sr. Gonçalves. Pode entrar!
Dentro da boite, o dono vem falar com eles:
- Boa noite, Sr. Gonçalves!
E diz, logo em seguida:
- Toca a vagar de imediato a mesa do senhor Gonçalves !..
A mulher, desconfiada:
- Tu vens sempre a
- Ah, não !.. O dono é um cliente da firma...
Uma vez na mesa, a empregada vem e diz:
- O mesmo de sempre, Sr. Gonçalves ?
Nesse instante, uma mulher que terminava um strip-tease em cima do palco grita:
- E a cue
A boite, em peso, grita:
- Gonçalves... Gonçalves... Gonçalves...
A esposa, furiosa, sai da boite, e o marido vai atrás... e ambos entram num táxi. O marido tentando apaziguar as coisas:
- Querida, não vamos estragar esta noite maravilhosa, com certeza eles confundiram-me com outro Gonçalves...
- Mas tu estás a pensar que eu sou alguma idiota ?!.. Canalha !.. Não me toque mais !.. Blá, blá, blá... eu sou mesmo uma otária... blá, blá, blá...seu grande filho-da-puta, blá, blá, blá...
Nisso, o motorista de táxi vira-se e
diz:
- Ó Gonçalves... queres que eu ponha a puta pra fora do carro?...
- Ó Gonçalves... queres que eu ponha a puta pra fora do carro?...
DO
CARNAVAL
Episódio Nº 23
Havia dez dias que estavam
na roça. Paulo Rigger sentia-se feliz. Tinha a certeza que Julie lhe pertencia
inteiramente. E quem teria a coragem de deitar os olhos para a amante do
patrão. Também, Julie não iria dar ousadia a nenhum daqueles brutos, mais
animais que homens.
Toda a manhã, Rigger
montava e dava um pulo ao povoado. Trazia jornais e revistas que lia à noite, à
luz do candeeiro, antes de deitar-se. Julie nunca o acompanhava. Pretextava não
gostar de andar a cavalo.
Naquela sexta-feira,
Rigger saíra cedo. O céu, um pouco nublado, ameaçava chuva. Assim mesmo, ele
seguiu. Pôs o burro a trote. No meio da estrada, porém, as nuvens se faziam
mais carregadas. Paulo resolveu voltar.
Quando chegou não
encontrou Julie em casa.
Saiu a procurá-la pela roça. Que teria ela ido fazer? Talvez
colher tangerinas…
Rigger ia descendo
despreocupadamente o atalho que levava à fonte quando, olhando por acaso para
um lado, empalideceu.
Debaixo de uma jaqueira,
Julie e Honório, abraçados, sorriam. Ela tinha as saias suspensas, deixando à
mostra as coxas alvas.
Rigger não fez escândalos.
Voltou para casa 3e esperou…
Julie chegou ao meio-dia.
Notou a cara zangado de Rigger. Temeu que ele houvesse descoberto tudo mas,
treinadíssima naquelas situações, não se embaraçou:
- Chegou há muito tempo, meu amor?
- Há muito já.
- Eu andava passeando por
aí, pela roça.
- Já sei. Prepare as
malas. Nós viajaremos amanhã.
Ela não discutiu. Entrou
para o quarto. Ele saíu a procurar Algemiro.
Encontrou-o junto a uma “barcaça”
vendo secar o cacau.
- Algemiro, despeça Honório.
- Mas, patrão, ele deve 600$000 à casa!
- Arranje um meio de ele pagar e despeça-o. Se
ele não tiver dinheiro mande prendê-lo.
Ele tem uma casa no
povoado. Com o aluguel sustenta uma filha no colégio. Em Ilhéus.
- Quanto vale a casa?
- Uns 500$000.
- Tome a casa.
- E foi saindo.
Algemiro acompanhou-o.
Falou baixinho:
- Patrão, se qui ser
pode liqui dar-se o homem… Ou dar uma
surra. Afinal, ele não devia olhar para o “jirau” do patrão…
- Não, tome a casa, somente.
quinta-feira, fevereiro 14, 2013
Partida para uma caçada |
A conversa de um bosquí mano
Vale a pena contar uma pequena história relatada por um
bosquímano, membro da tribo !Kung San ( o ponto de exclamação indica um
estalido produzido com a língua e que não tem equi valente
em línguas europeias).
Os bosquímanos, juntamente com os pigmeus, são o povo mais
antigo do mundo, aquele que está mais próximo dos nossos antepassados remotos.
Numa entrevista ao antropólogo Richard Lee, na
década de setenta, o bosquímano explica os costumes do seu povo:
- «Imagine um homem que andou a caçar. Ele não pode voltar para casa
e anunciar como um fanfarrão: “Matei uma coisa grande no mato”.
Não, primeiro tem de se
sentar em silêncio até eu ou outra pessoa qualquer chegar ao pé da fogueira
dele e perguntar: “Que viste hoje?”
Então ele responde
calmamente: “Ah, eu não sou nada bom a caçar. Não vi nada de nada…talvez só uma
coisinha pequena”. Depois, eu sorrio de mim para comigo porque fiquei a saber
que ele matou qualquer coisa grande».
A conversa brincalhona continua enquanto vão buscar o animal
morto:
- “Quer dizer que nos
arrastaste a todos até aqui para nos
obrigares a levar para casa o teu monte de ossos? Ah, se eu soubesse que era
assim tão magro não teria vindo. E pensar que abdiquei de um belo dia à sombra
para isto…Em casa podemos ter fome, mas pelo menos temos água fresca para
beber.”
Qual o objectivo desta conversa? - O entrevistado explica:
- “Quando um jovem caça e consegue muita carne, passa a ver-se como
um chefe ou um homem importante e pensa em nós como seus servos ou inferiores.
Não podemos aceitar isso. Recusamos quem é fanfarrão, pois um dia o seu orgulho
levá-lo-á a matar alguém. Por isso falamos sempre dos animais que ele caça como
se fossem uma coisa insignificante. Desta maneira, esfriamos-lhe o coração e
tornamo-lo simpático.”
Os bosquímanos estavam conscientes do desejo de afirmação do
jovem através do animal que conseguira abater para alcançar uma posição de
superioridade na sociedade, e sabiam que isso poderia torná-lo perigoso para os
restantes membros do grupo.
A “receita” foi uma lição de
humildade com o objectivo de garantir uma sociedade onde todos eram iguais
independentemente dos animais que cada um conseguia matar.
Entre nós, fazemos o contrário... estimulamos o brio, o orgulho, a vaidade pessoal, o espírito competitivo e, à partida, como o entrevistado reconhece, esses "ingredientes" estavam no espírito do jovem caçador mas, a sociedade é sábia e precavida. Não o fora e há muito ter-se-ia auto-destruído.
Entre nós, fazemos o contrário... estimulamos o brio, o orgulho, a vaidade pessoal, o espírito competitivo e, à partida, como o entrevistado reconhece, esses "ingredientes" estavam no espírito do jovem caçador mas, a sociedade é sábia e precavida. Não o fora e há muito ter-se-ia auto-destruído.
Num deserto, onde aparentemente nada
existe, este povo não só conseguiu sobreviver como, ainda por cima, ser a gente
mais feliz e bem disposta do mundo.
Reveion do Rio de Janeiro |
O PAÍS
DO
CARNAVAL
Episódio Nº 22
- Hein?
- Um Jornal?
- O que é que o Gomes diz?
- Sim, um jornal diário… O “Estado da Bahia”…
A grande aspiração deles era possuir um diário.
Tomariam conta da Bahia. Ninguém poderia com eles. Ganhariam uma fortuna. E
agora Gomes gritava que eles teriam um diário.
Mas Ricardo duvidou:
- Ora, isso é apenas uma ideia!...
- Umas ideia que já está se transformando em
facto.
- Explique esse negócio, Gomes – suplicou Lopes.
- Lá vai. O prefeito de uma dessas cidades do
interior quer que nós fundemos um jornal. Jornal dos Municípios… Será uma
sociedade anónima. Cada prefeito entra com um tanto. Nós entramos com a pena.
Compraremos as máqui nas e o jornal
defenderá os actuais prefeitos e as suas administrações. Que tal?
Pedro Ticiano seria o
director, José Lopes o redactor-chefe. Rigger, Ricardo e Jerónimo comporiam a
redacção. Ele, Gomes, director comercial, cavaria os negócios. Nas horas vagas
faria reportagens. Uma negociata. De primeira…
- De facto…
- Esmagaremos a canalha, esmagaremos a canalha
– gozava o Ricardo. A canalha era o apelido que ele dava aos mulatos seus
inimigos, que lhe invejavam a “pose de deputado”. Você é um génio, Gomes, quero
dizer, esse prefeito é um génio…
Ticiano propôs se bebesse
em honra do prefeito.
Ticiano pediu cigarros.
Por conta do “Estado da Bahia” explicou.
Saíram a arqui tectar planos, sonhadores. Já pensavam em ter a
Bahia nas mãos. A princípio trabalhariam sem ambições de lucro. Depois, então…
Talvez enriquecessem. E
ficassem conhecidos no País. Publicariam livros. Viveriam, enfim.
José Lopes pensou:
- Não acredito. Naturalmente, teremos desilusões,
aborrecimentos…
Ricardo Braz também achava
aqui lo pouco para uma vida. “O trabalho
não basta. É preciso amor…”
Só o Gomes, satisfeito,
ria muito mostrando os maus dentes. O seu vulto alteava-se e ele marchava a
passos largos. Estava a caminho da vitória…
quarta-feira, fevereiro 13, 2013
Foi
Almoçar a Casa
Numa galeria de
arte, uma mulher está parada em frente de um quadro
muito estranho, cujo nome era:
"Foi almoçar a casa".
Nele, estão representados três
negros, nus, sentados num banco de jardim, com os seus pénis em primeiro plano
mas, curiosamente, o homem do meio tem o pénis cor de rosa...
- Desculpe-me - diz a mulher ao
funcionário da galeria:
- Eu estou curiosa a
respeito desses negros. Porque é que o homem do meio tem o pénis cor de rosa?
O funcionário responde:
-Receio que a
senhora não tenha interpretado bem o quadro. Esses homens não são negros; eles
trabalham numa mina de carvão, e o homem que está sentado no meio foi almoçar a
casa.
A Pobreza e a Riqueza
Mais
do que os ricos e os pobres, que sempre os houve, falemos da Pobreza e da
Riqueza à escala dos países, dos povos, dos continentes para chegar à conclusão
que nunca, até agora, qualquer um dos muitos especialistas nestas matérias
conseguiu apresentar uma razão ou conjunto de razões que, de uma vez, nos
explique porque há nações ricas e outras pobres ou, de outra maneira, porque é
que os países ricos continuam ricos e os pobres continuam pobres chegando ao ponto
de brincar com a situação dizendo que, “quando chove sopa as
pessoas nos países pobres são sempre surpreendidas com garfos na mão”.
Este tema devia pôr toda a gente a pensar porque é intrigante,
porque se trata de uma realidade tão persistente que se corre o risco de a
aceitar como algo de inelutável, daquelas coisas que fazem parte da natureza,
que são hoje assim porque sempre o foram e sempre o serão.
Há duas escolas de pensamento segundo as quais a riqueza não era mais que
o triunfo do Bem sobre o Mal ou, vice-versa, do Mal sobre o Bem.
Para uma dessas escolas, os europeus eram mais inteligentes,
estavam melhor organizados, eram trabalhadores mais conscienciosos; Os outros,
eram ignorantes, arrogantes, indolentes, retrógrados, supersticiosos.
Para a outra escola, invertem-se as categorias: os europeus eram
agressivos, cruéis, gananciosos, hipócritas e sem escrúpulos; Os outros, as suas
vítimas, eram infelizes, fracas e inocentes.
A primeira corrente de pensamento deve ter feito as delícias dos
nazis para quem este tipo de argumentos vinha mesmo ao encontro da supremacia
da dita raça ariana…
Mas, brincadeiras à parte, às vezes dou comigo a pensar duas
coisas:
-A primeira é, se para alguns, não foi reposta a luta pela
sobrevivência dos primórdios da humanidade em que todos os nossos antepassados
até ao “homo sapiens sapiens” pura e simplesmente não conseguiram sobreviver e
desapareceram da face da terra.
É que, se não é assim parece… milhões de pessoas do continente
africano já teriam desaparecido se os alimentos não lhes fossem atirados de
avião ou levado em camiões, porque a imagem recolhida por um observador
externo, chegado ali de repente e desconhecedor de tudo o resto, era a de uma
população que se extingue.
E, no entanto, estes mesmos milhões de pessoas, são “homo
sapiens sapiens” como nós, que passaram o grande teste inicial da sobrevivência
e correm hoje o risco, não de desaparecer geneticamente, mas de verem os seus
efectivos populacionais reduzidos drasticamente pela guerra, fome e doença.
-Em segundo lugar, a pergunta que apetece fazer é: então, em que
espécie de armadilha caíram eles para, depois de um tão longo percurso terem
voltado ao ponto zero das suas existências, quando a população mundial é hoje
de sete biliões de pessoas comparadas com as dezenas de milhar ao tempo em que
a sobrevivência da nossa espécie se colocou efectivamente?
Entretanto, uma outra espécie de pobreza, provavelmente
respeitante ainda a um maior número de pessoas é aquela que encontramos nos
subúrbios das grandes cidades por todo o mundo, que se traduz numa miséria
material e, acima de tudo, moral que, não eliminando fisicamente, degrada e
desvirtua as pessoas constituindo o mais grave problema social de todos os
países quer sejam eles do grupo dos Ricos ou dos Pobres.
Mas, a Riqueza que persiste, em contraposição com a Pobreza que
não despega, faz-me lembrar uma espécie de comboio que passou: quem o apanhou,
apanhou, os outros ficaram a vê-lo ou então não estavam na Estação onde ele se
formou e de onde partiu.
Nós, portugueses, tivemos imensa responsabilidade na formação
deste comboio quando abrimos as vias marítimas ao comércio do mundo e
proporcionamos a imensa gente que ganhasse dinheiro com esse comércio.
De seguida, toda essa movimentação comercial preparou as condições
para que, juntamente com as descobertas científicas e tecnológicas dos séculos
XVIII e XIX, o comboio da Riqueza fosse posto em marcha puxado pela máqui na do Capitalismo e os europeus, por razões
históricas, culturais e geo-estratégicas, estavam lá.
As sociedades Rurais deram lugar à sociedade Industrial, a que
esteve na origem dos países Ricos e Pobres, da exploração das matérias primas,
da produção em série, da educação em massa e, finalmente, chegamos agora à
sociedade do Conhecimento, a do Click, a do ensino diversificado e
especializado, aquela em que os filhos, porque nasceram nela, ensinam os pais.
Será que esta nova sociedade do Conhecimento irá contribuir, com
a ajuda dos fenómenos da Globalização a mais oportunidades para todos em todo o
mundo, ao esbater progressivamente esta realidade do mundo Rico e do mundo
Pobre mesmo à custa de algumas convulsões temporárias na sociedade dos ricos?
Eu tenho muitas dúvidas, pois a sociedade do Conhecimento
parece-me ser um mundo de Grupos, uma vez que o conhecimento muito
especializado e diversificado, mesmo quando se nasce no tempo dele, não se
nasce com ele, e se o mesmo não for acessível à generalidade das pessoas
teremos ainda mais desigualdades.
Assim, um mundo especializado poderá ser um mundo cada vez mais
difícil para a generalidade das pessoas que se confrontarão com dificuldades
crescentes numa sociedade de elites.
Por esta razão, qualquer avanço na resolução deste mistério dos
Países Ricos que continuam Ricos e dos Países Pobres que continuam Pobres, terá
de resultar de políticas.
Exige-se a intervenção de pessoas, determinadas, convictas,
suficientemente influentes e poderosas na vida política internacional que
consigam desencadear um movimento que tenha a ousadia de ir aos alicerces desta
questão.
Aqui lo a que estamos
a assistir na actual política de Barack Obama, nos EUA - reparemos no seu
discurso proferido esta madrugada propondo, entre outras coisas, um aumento de
mais de 24% no salário mínimo - dá-me
esperanças de que alguma coisa deste género possa vir a acontecer no futuro.
Não teve já a humanidade líderes políticos que ficaram na
história pela coragem de fazerem a guerra para imporem religiões, ideologias
políticas e para construírem impérios, então, por que não há-de haver um líder
que fique na história por declarar guerra à injustiça e desigualdade que vai no
mundo, porque é disto que se trata?
Obama está no início do segundo mandato, em guerra aberta com o Congresso
dominado pelos Republicanos defensores e protectores dos ricos e poderosos.
Até
que ponto é que ele, descomprometido relativamente a uma próxima eleição a que
já não pode concorrer, não vai procurar ficar, por mérito próprio, na história
dos Presidentes dos E.U.A?
Não
vai ser fácil. A correlação de forças políticas não é linear. O sistema protege
os ricos e a democracia pode acrescentar votos mas não poder ou riqueza.
Realisticamente,
a batalha dos Pobres é uma batalha perdida. Mesmo agora, na resignação do Papa,
será que não lhe pesa na consciência não ter conseguido varrer os vendilhões do
Vaticano?
Olhemos
à nossa volta… onde vemos nós o triunfo dos pobres? Já o foi no Estado Social,
avanço enorme da Europa do pós guerra mas que agora parece estar a atravessar
dificuldades porque os ricos não estão com vontade de contribuir para o seu
fortalecimento.
Tudo
o que se conseguir neste campo vai resultar de uma luta, de uma confrontação
que se vai arrastar no tempo, sociedade por sociedade.
Ponhamos
os olhos nas sociedades dos Países Nórdicos. Imitemo-los em tudo o que eles
fizerem de melhor que nós a começar pelas leis. É aqui
que tudo começa…