Memórias Futuras
Olhar o futuro pelo espelho retrovisor da história. Qual história? Que futuro?
sábado, agosto 06, 2011
ELZA LARANJEIRA - EU SEI QUE VOU TE AMAR
Nasceu em 1925 e faleceu em 1986, tendo sido uma das cantoras mais importantes e requisitadas da rádio paulista. Apreciem a qualidade do timbre da sua voz e perceberão porquê. Esta linda canção, que haveria de ser um êxito anos mais tarde, foi um sucesso seu no Brasil em 1959.
TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 172
Anteontem ele me disse que aqui, em Estância restaurava as forças, repunha-se das chateações. Não achou que ele estava diferente?
- Para mim, o doutor foi sempre o mesmo desde o primeiro dia.
- Diz para cortar a conversa mas não se contem:
Só posso dizer-lhe que igual a ele não existe outro. Não me pergunte mais.
Reinou silêncio por um instante. Doutor Amarílio suspira, Tereza está com razão, de nada adianta futucar na vida do doutor, dessa vez nem a paz de Estância nem a presença da amiga conseguiram dar-lhe alento ao coração.
- Minha filha, eu entendo o que se passa com você, o que está sentindo. Se dependesse de mim ele ficaria aqui até à hora do enterro e nós, você, eu, mestre João, que realmente lhe quisemos bem, o levaríamos ao cemitério. Só que não depende de mim.
- Eu sei, sempre me coube pouco tempo, não me queixo, não houve um só minuto que não fosse bom.
- Vou tentar me comunicar com os parentes, a filha e o genro estarão em Aracaju. Se o telefone não funcionar, tem que se enviar um próprio com um recado. – Antes de sair informa-se: - É preciso mandar uma pessoa para lavar e vestir o corpo ou Lulu e Nina dão conta?
- Eu cuido dele, por ora ainda é meu.
_ Quando voltar trago o atestado médico e o padre.
Padre para quê se o doutor não tinha fé em Deus? Nem por isso, é bem verdade, deixava de concorrer para as festas da paróquia, nem de levar padre à usina para dizer missa na festa da Senhora Sant’ Ana. Padre Vinícius, tendo estudado Teologia em Roma, aprendera a beber vinho, bom conviva na mesa de jantar.
10
Sob a garrida presidência de Tereza Batista, vestida no capricho com panos trazida da Bahia, o doutor tinha real prazer em reunir em torno da mesa de jantar, além do médico, o amigo Nascimento Filho, seu contemporâneo na Faculdade de Direito, o padre Vinícius e Lulu Santos, vindo especialmente de Aracaju.
Conversavam de um tudo, discutindo política e culinária, literatura, religião e arte, os acontecimentos mundiais e brasileiros, as últimas ideias em debate e a moda cada dia mais escandalosa, a assustadora mudança de costumes e o avanço da ciência.
Sobre certos temas – literatura, arte, culinária – só quase o doutor e João Nascimento opinavam, tendo o clínico horror à arte moderna, garranchos sem arte nem sentido, sendo o padre alérgico à maioria dos escritores contemporâneos, mestres de pornografia e impiedade, afirmando Lulu Santos não existir no mundo prato capaz de comparar à carne-de-sol com pirão de leite, afirmação, aliás, não de todo indefensável.
Em troca, inveterado leitor, frustrado literato, velho bonachão, havendo largado ao meio o curso de Direito para curar-se em Estância de fraqueza do peito, ali se fixando para não mais sair, vivendo de rendas bem administradas, ensinando português e francês no ginásio só para encher o tempo, João Nascimento Filho sabia do último livro e do último quadro e sonhava comer pato laqueado de Pequim. (clik na imagem e aumente)
- Para mim, o doutor foi sempre o mesmo desde o primeiro dia.
- Diz para cortar a conversa mas não se contem:
Só posso dizer-lhe que igual a ele não existe outro. Não me pergunte mais.
Reinou silêncio por um instante. Doutor Amarílio suspira, Tereza está com razão, de nada adianta futucar na vida do doutor, dessa vez nem a paz de Estância nem a presença da amiga conseguiram dar-lhe alento ao coração.
- Minha filha, eu entendo o que se passa com você, o que está sentindo. Se dependesse de mim ele ficaria aqui até à hora do enterro e nós, você, eu, mestre João, que realmente lhe quisemos bem, o levaríamos ao cemitério. Só que não depende de mim.
- Eu sei, sempre me coube pouco tempo, não me queixo, não houve um só minuto que não fosse bom.
- Vou tentar me comunicar com os parentes, a filha e o genro estarão em Aracaju. Se o telefone não funcionar, tem que se enviar um próprio com um recado. – Antes de sair informa-se: - É preciso mandar uma pessoa para lavar e vestir o corpo ou Lulu e Nina dão conta?
- Eu cuido dele, por ora ainda é meu.
_ Quando voltar trago o atestado médico e o padre.
Padre para quê se o doutor não tinha fé em Deus? Nem por isso, é bem verdade, deixava de concorrer para as festas da paróquia, nem de levar padre à usina para dizer missa na festa da Senhora Sant’ Ana. Padre Vinícius, tendo estudado Teologia em Roma, aprendera a beber vinho, bom conviva na mesa de jantar.
10
Sob a garrida presidência de Tereza Batista, vestida no capricho com panos trazida da Bahia, o doutor tinha real prazer em reunir em torno da mesa de jantar, além do médico, o amigo Nascimento Filho, seu contemporâneo na Faculdade de Direito, o padre Vinícius e Lulu Santos, vindo especialmente de Aracaju.
Conversavam de um tudo, discutindo política e culinária, literatura, religião e arte, os acontecimentos mundiais e brasileiros, as últimas ideias em debate e a moda cada dia mais escandalosa, a assustadora mudança de costumes e o avanço da ciência.
Sobre certos temas – literatura, arte, culinária – só quase o doutor e João Nascimento opinavam, tendo o clínico horror à arte moderna, garranchos sem arte nem sentido, sendo o padre alérgico à maioria dos escritores contemporâneos, mestres de pornografia e impiedade, afirmando Lulu Santos não existir no mundo prato capaz de comparar à carne-de-sol com pirão de leite, afirmação, aliás, não de todo indefensável.
Em troca, inveterado leitor, frustrado literato, velho bonachão, havendo largado ao meio o curso de Direito para curar-se em Estância de fraqueza do peito, ali se fixando para não mais sair, vivendo de rendas bem administradas, ensinando português e francês no ginásio só para encher o tempo, João Nascimento Filho sabia do último livro e do último quadro e sonhava comer pato laqueado de Pequim. (clik na imagem e aumente)
8º ENTREVISTA FICCIONADA COM JESUS
NA SUA SEGUNDA VINDA À TERRA
SOB O TEMA: “FUGA PARA O EGIPTO”
RAQUEL - Amigas e amigos das Emissoras Latinas Latinas. Alguns de vocês acharão estranho que nós tenhamos obtido a exclusividade das entrevistas com Jesus Cristo nesta sua segundo sua vinda à terra. Questionar-se-ão por ele só dar entrevistas a mim. Que diz sobre isto, Mestre, melhor, Jesus? Não quer fazer declarações à imprensa?
JESUS - O que acontece, Raquel, é que os outros jornalistas, tal como os saduceus do meu tempo, procuravam-me no Templo, ou sob as nuvens do céu ou para eu detectar sinais maravilhosos… o mesmo de sempre.
RAQUEL - Todavia, ainda há pessoas à sua espera na esplanada de Jerusalém. E que perguntam se vai chegar, quando chega se vai encontrar-se com o Papa de Roma, o Presidente dos Estados Unidos, o Parlamento Europeu, com…se você será perguntado, se quando você chegar vai se encontrar com o Papa de Roma, o presidente dos Estados Unidos, o Parlamento Europeu, com… com…
JESUS – Contigo, Rachel. Não és tu que me estás a entrevistar?
RAQUEL - Pois, sendo assim, aproveito esta nova oportunidade que me dá ... Vê aquele burro?... É sobre isso que lhe quero perguntar.
JESUS - Sobre isso? Sobre o burrito?
RAQUEL – Não sobre aquele em particular mas sobre o outro, aquele em que fugiu com os seus pais, Maria e José, quando recém-nascido.
JESUS – Os meus pais fugiram? E de onde fugiram eles?
RAQUEL – O senhor deve saber. Não se lembra quando o rei Herodes mandou matar todas as crianças menores de dois anos nascidas em Belém?
JESUS - Herodes, o carrasco, matava pessoas crescidas, não crianças. Torturava, massacrava… mas os que conspiraram contra ele.
RAQUEL - Mas quando o senhor nasceu, Herodes estava apavorado pensando que lhe ia roubar a coroa.
JESUS – Que coroa lhe ia eu levar se ainda estava amamentando?
RAQUEL - Bem, isso é o que conta é o evangelho de Mateus. Aqui está, o senhor mesmo pode lê-lo.
JESUS – De novo, Mateus!... Isso escreveu para dar mais emoção na história…
RAQUEL - Mais emoção? Porquê, para quê?
JESUS – É como nas histórias. Meus a fugirem para o Egipto montados num jumento para me salvarem…
RAQUEL - Mas, se fosse uma história, por que iriam viajar tão longe? Poderiam ter-se escondido em algum lugar na Judeia…
JESUS - Aí está o detalhe. Certamente, Mateus tinha lido a história daquele faraó egípcio malvado que matou crianças judias… e Moisés, recém-nascido, salvo dentro de uma cesta flutuando no rio…
RAQUEL - Isso é o que conta o filme O Príncipe do Egipto. Eu vi-o.
JESUS - Isso é o que relata o Êxodo, Raquel. A mim, não me poderiam pôr a flutuar num qualquer rio aqui na Palestina porque não há muita água… Por isso, os meus pais colocaram-me num burro e fugi para o Egipto… E a morte de Herodes, outra história… voltei ao Egipto para me apresentar como o novo Moisés, o grande libertador.
RAQUEL – Uma feia manipulação…
JESUS - Não, uma bonita comparação. Por que não?
RAQUEL - Então, se eu entendi bem, o senhor nunca viajou para o Egipto nem viu as pirâmides…
JESUS - Não, nunca vi tais maravilhas. E por falar em viagens, aonde quero ir é a Nazaré. Tenho muito curiosidade para ver como está agora a terra onde nasci e me criei. Talvez possamos montar este burro…?
RAQUEL Não, de burro, não. Tomamos outro táxi como aquele que nos trouxe aqui a Belém. Poucas horas depois estaremos em Nazaré. Que acha?
JESUS - Sim, Raquel, aqui quem manda és tu.
RAQUEL – Não, nas Emissoras Latinas mandam o senhor e os nossos ouvintes que estão ansiosos por ouvirem novas revelações.
Continuem connosco, a jornalista Raquel Perez.
JESUS - O que acontece, Raquel, é que os outros jornalistas, tal como os saduceus do meu tempo, procuravam-me no Templo, ou sob as nuvens do céu ou para eu detectar sinais maravilhosos… o mesmo de sempre.
RAQUEL - Todavia, ainda há pessoas à sua espera na esplanada de Jerusalém. E que perguntam se vai chegar, quando chega se vai encontrar-se com o Papa de Roma, o Presidente dos Estados Unidos, o Parlamento Europeu, com…se você será perguntado, se quando você chegar vai se encontrar com o Papa de Roma, o presidente dos Estados Unidos, o Parlamento Europeu, com… com…
JESUS – Contigo, Rachel. Não és tu que me estás a entrevistar?
RAQUEL - Pois, sendo assim, aproveito esta nova oportunidade que me dá ... Vê aquele burro?... É sobre isso que lhe quero perguntar.
JESUS - Sobre isso? Sobre o burrito?
RAQUEL – Não sobre aquele em particular mas sobre o outro, aquele em que fugiu com os seus pais, Maria e José, quando recém-nascido.
JESUS – Os meus pais fugiram? E de onde fugiram eles?
RAQUEL – O senhor deve saber. Não se lembra quando o rei Herodes mandou matar todas as crianças menores de dois anos nascidas em Belém?
JESUS - Herodes, o carrasco, matava pessoas crescidas, não crianças. Torturava, massacrava… mas os que conspiraram contra ele.
RAQUEL - Mas quando o senhor nasceu, Herodes estava apavorado pensando que lhe ia roubar a coroa.
JESUS – Que coroa lhe ia eu levar se ainda estava amamentando?
RAQUEL - Bem, isso é o que conta é o evangelho de Mateus. Aqui está, o senhor mesmo pode lê-lo.
JESUS – De novo, Mateus!... Isso escreveu para dar mais emoção na história…
RAQUEL - Mais emoção? Porquê, para quê?
JESUS – É como nas histórias. Meus a fugirem para o Egipto montados num jumento para me salvarem…
RAQUEL - Mas, se fosse uma história, por que iriam viajar tão longe? Poderiam ter-se escondido em algum lugar na Judeia…
JESUS - Aí está o detalhe. Certamente, Mateus tinha lido a história daquele faraó egípcio malvado que matou crianças judias… e Moisés, recém-nascido, salvo dentro de uma cesta flutuando no rio…
RAQUEL - Isso é o que conta o filme O Príncipe do Egipto. Eu vi-o.
JESUS - Isso é o que relata o Êxodo, Raquel. A mim, não me poderiam pôr a flutuar num qualquer rio aqui na Palestina porque não há muita água… Por isso, os meus pais colocaram-me num burro e fugi para o Egipto… E a morte de Herodes, outra história… voltei ao Egipto para me apresentar como o novo Moisés, o grande libertador.
RAQUEL – Uma feia manipulação…
JESUS - Não, uma bonita comparação. Por que não?
RAQUEL - Então, se eu entendi bem, o senhor nunca viajou para o Egipto nem viu as pirâmides…
JESUS - Não, nunca vi tais maravilhas. E por falar em viagens, aonde quero ir é a Nazaré. Tenho muito curiosidade para ver como está agora a terra onde nasci e me criei. Talvez possamos montar este burro…?
RAQUEL Não, de burro, não. Tomamos outro táxi como aquele que nos trouxe aqui a Belém. Poucas horas depois estaremos em Nazaré. Que acha?
JESUS - Sim, Raquel, aqui quem manda és tu.
RAQUEL – Não, nas Emissoras Latinas mandam o senhor e os nossos ouvintes que estão ansiosos por ouvirem novas revelações.
Continuem connosco, a jornalista Raquel Perez.
sexta-feira, agosto 05, 2011
RUI VELOSO - NÃO HÀ ESTRELAS NO CÉU
O nosso Rui Veloso tem um reportório onde é difícil escolher. Esta, foi sempre para mim, uma das mais bonitas. A voz e a música do Rui e as letras de Carlos Tê, seu parceiro inseparável. Licenciado em Filosofia, escreve letras para outras Bandas, crónicas no Jornal e tem um romance publicado "Vôo Melancólico do Melro" e é igualmente cantor. Parelha de qualidade insuperável.
AS BONECAS DE CROCHÉ....
Um homem e uma mulher estavam casados há mais de 60 anos.
Eles tinham compartilhado tudo um com o outro e conversado sobre tudo. Não havia segredos entre eles, com excepção de uma caixa de sapato que a mulher guardava em cima de um armário e tinha avisado ao marido que nunca abrisse aquela caixa e nem perguntasse o que havia nela.
Por todos aqueles anos ele nunca nem pensou sobre o que estaria naquela caixa de sapatos.
Um dia a velhinha ficou muito doente e o médico falou que ela não sobreviveria.
Sendo assim, o velhinho tirou a caixa de cima do armário e a levou para perto da cama da mulher.
Ela concordou que era a hora dele saber o que havia naquela caixa.
Quando ele abriu a tal caixa, viu 2 bonecas de croché e um pacote de
dinheiro que totalizava 95 mil Euros.
Ele perguntou a ela o que aquilo significava, ela explicou:
- Quando nós nos casamos minha avó me disse que o segredo de um casamento feliz é nunca argumentar/brigar por nada. E se alguma vez eu ficasse com raiva de você que eu ficasse quieta e fizesse uma boneca de croché.
O velhinho ficou tão emocionado que teve que conter as lágrimas enquanto pensava: somente 2 bonecas preciosas estavam na caixa. Ela ficou com raiva de mim apenas duas vezes em todos estes anos de vida e amor.
- Querida !!! - Você me explicou sobre as bonecas, mas e esse dinheiro todo de onde veio ?
Um homem e uma mulher estavam casados há mais de 60 anos.
Eles tinham compartilhado tudo um com o outro e conversado sobre tudo. Não havia segredos entre eles, com excepção de uma caixa de sapato que a mulher guardava em cima de um armário e tinha avisado ao marido que nunca abrisse aquela caixa e nem perguntasse o que havia nela.
Por todos aqueles anos ele nunca nem pensou sobre o que estaria naquela caixa de sapatos.
Um dia a velhinha ficou muito doente e o médico falou que ela não sobreviveria.
Sendo assim, o velhinho tirou a caixa de cima do armário e a levou para perto da cama da mulher.
Ela concordou que era a hora dele saber o que havia naquela caixa.
Quando ele abriu a tal caixa, viu 2 bonecas de croché e um pacote de
dinheiro que totalizava 95 mil Euros.
Ele perguntou a ela o que aquilo significava, ela explicou:
- Quando nós nos casamos minha avó me disse que o segredo de um casamento feliz é nunca argumentar/brigar por nada. E se alguma vez eu ficasse com raiva de você que eu ficasse quieta e fizesse uma boneca de croché.
O velhinho ficou tão emocionado que teve que conter as lágrimas enquanto pensava: somente 2 bonecas preciosas estavam na caixa. Ela ficou com raiva de mim apenas duas vezes em todos estes anos de vida e amor.
- Querida !!! - Você me explicou sobre as bonecas, mas e esse dinheiro todo de onde veio ?
- Ah, esse é o dinheiro da venda das bonecas. Só sobraram duas.
ORAÇÃO :
Senhor, dai-me sabedoria para entender os homens, amor para perdoá-los e paciência para aturá-los, porque se eu pedir força, eu bato neles até matar, pois EU NÃO SEI FAZER CROCHÉ ...
Amem!
ORAÇÃO :
Senhor, dai-me sabedoria para entender os homens, amor para perdoá-los e paciência para aturá-los, porque se eu pedir força, eu bato neles até matar, pois EU NÃO SEI FAZER CROCHÉ ...
Amem!
HISTÒRIAS
DE HODJA
Hodja gabava-se muitas vezes junto de Tamerlão como sendo um grande arqueiro e que nunca errava um tiro. Um dia Tamerlão desafia-o:
- “Vamos, Hodja, quero ver isso”
Colocam o alvo. Hodja retrocede alguns passos, estica o seu arco e dispara uma flecha: A flecha vai muito para além do alvo. Calmamente, Hodja diz:
- “Assim, é como um Arqueiro Real lança uma flecha”.
Lança outra flecha e esta vai ainda mais longe do alvo. Hodja está tranquilo:
- “Assim, é como o nosso chefe da polícia lança uma flecha”
À terceira, a flecha atinge o alvo. Assobiando orgulhosamente olha para Tamerlão e diz:
- “Assim, Senhor, é como se pratica tiro com o arco com o Nasrudin Hodja.
TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 171
- Boa noite. Está parando aqui moça de nome Tereza… Gabi não o deixou concluir; milagre de Tereza, aquisição sem preço, a fama chegara aos ouvidos do doutor, ali trazendo-o de cliente:
- É verdade, sim senhor, beleza de menina, menos de quinze anos, novinha em folha, coisa rica, às ordens do doutor.
- Ela vai comigo… - Tirou da carteira algumas notas, entregando-as à emocionada proxeneta: - Vá buscá-la…
- O doutor vai levar ela? Por esta noite ou por uns dias?
- De uma vez. Não vai voltar. Vamos, dê-se pressa.
Das mesas os clientes observavam em silêncio; Arruda retornara ao bar, mas, apalermado, desistira de servir. Gabi engoliu protesto, razões e argumentos, segurou o dinheiro, várias notas de quinhentos, nada ganharia em discutir, restando-lhe apenas esperar o regresso de Tereza quando o doutor se cansasse e a despedisse. Ia demorar um pouco, um mês ou dois, por aí, não mais.
- Sente-se doutor, tome alguma coisa enquanto preparo a mala e ela se arruma…
- Não precisa nada, basta a roupa do corpo, nada mais. Nem precisa se arrumar.
Colocou-a na garupa do cavalo e a levou embora.
9
Terminado o exame, doutor Amarílio cobre o corpo com o lençol:
- Fulminante, não foi?
- Disse ai e morreu, nem me dei conta… - Tereza estremece, cobre o rosto com as mãos.
O médico vacila na pergunta incómoda:
- Como foi? Jantou muito, comida pesada e logo depois… Não foi?
- Comeu somente uma posta de peixe, um pouco de arroz e uma rodela de abacaxi. Tinha tomado merenda às cinco horas, umas pamonhas. Depois, saímos, andando até à ponte, na volta ele sentou na rede, no jardim, e conversámos por mais de duas horas. Já passava das dez quando recolhemos.
- Sabe se ele teve algum aborrecimento ultimamente?
Tereza não respondeu, não tinha o direito de alardear os desgostos do doutor, repetir termos da conversa, queixas e agruras, nem mesmo para o médico. Morrera de repente, de que serve saber se de doença ou aperreação? Vai por acaso lhe restituir a vida? O médico prossegue:
- Falam que Jairo, filho dele deu um desfalque no Banco, um rombo sério, e que o doutor, ao tomar conhecimento…
Interrompe-se pois Tereza faz-se desentendida, ausente e rígida, a fitar o rosto do defunto; logo continua, numa explicação:
- Só desejo saber a causa do coração ter dado prego. Era um homem de boa saúde, mas cada um de nós tem seus motivos de aborrecimento, é isso que mata a gente. (clik na imagem e aumente)
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
À 7ª ENTREVISTA SOB O TEMA:
“COMO DEU MARIA À LUZ” (3 e últ.)
Maria Deu à Luz em Pé
Acompanhada por outras mulheres deu Maria à luz, na posição de pé, o seu filho Jesus. Em imagens emotivas, esse momento foi reconstruído no documentário que Alan Bookbinder da televisão BBC estreou a 21 de Dezembro de 2002 sob o título "A Virgem Maria."
Assim também descreve o nascimento de Maria e das mulheres da galileia, a psicóloga e jornalista, britânica, Lesley Hazleton no seu livro "Maria, uma virgem de carne e osso” (Ediciones Martínez Roca, 2005), talvez a recriação da história de Maria mais fascinante, sugestiva e fundamentada que conhecemos.
Como um “Raio de Sol"
A Igreja propõe como um dogma de fé católica que Maria foi sempre virgem antes, durante e após o parto. Já no século XV, um conhecido hino de Natal usou a metáfora de um "raio de sol através do vidro sem o quebrar ou manchar” para se referir à virgindade de Maria.
Esta imagem foi incorporada séculos mais tarde, no Catecismo de Pio X e desde então muitos catequistas a popularizaram em todo o mundo católico. Entre os protestantes há opiniões diferentes: alguns sustentam a concepção virginal de Jesus, outros não. A maioria das igrejas protestantes não acredita no nascimento virginal e crêem que Maria teve outros filhos para além de Jesus.
Assim também descreve o nascimento de Maria e das mulheres da galileia, a psicóloga e jornalista, britânica, Lesley Hazleton no seu livro "Maria, uma virgem de carne e osso” (Ediciones Martínez Roca, 2005), talvez a recriação da história de Maria mais fascinante, sugestiva e fundamentada que conhecemos.
Como um “Raio de Sol"
A Igreja propõe como um dogma de fé católica que Maria foi sempre virgem antes, durante e após o parto. Já no século XV, um conhecido hino de Natal usou a metáfora de um "raio de sol através do vidro sem o quebrar ou manchar” para se referir à virgindade de Maria.
Esta imagem foi incorporada séculos mais tarde, no Catecismo de Pio X e desde então muitos catequistas a popularizaram em todo o mundo católico. Entre os protestantes há opiniões diferentes: alguns sustentam a concepção virginal de Jesus, outros não. A maioria das igrejas protestantes não acredita no nascimento virginal e crêem que Maria teve outros filhos para além de Jesus.
quinta-feira, agosto 04, 2011
JAIR RODRIGUES - DEIXA ISSO PRA LÁ
Infelizmente a versão original de 1966 não está disponível no YouTube para compartilhar. É que se eu tivesse de escolher uma canção que fosse sinónimo do Brasil e dos seus cantores, o "Deixa Pra Lá/Vem chegando a Madrugada " e Jair Rodriues seriam dos escolhidos. Podem ouvi-la no Youtube. A canção e a voz esplêndida e genuina de Jair dizem bem da alegria do povo brasileiro... irradiando felicidade, vontade de viver. Cláudia Leite, nascida em 1980, 41 anos depois de Jair, nasceu no Rio e foi para Salvador com 1 ano. É cantora, compositora, dançarina e apresentadora. Desde 2003 que não pára de ganhar Prémios todos os anos. Foi mãe em 2009, sempre trabalhando: "Gravidez é vida, quero partilhar a minha alegria com o público".
Um alentejano está a comer ao balcão de um restaurante na estrada quando entram três motoqueiros de Lisboa, tipo "Abutres" (aqueles gajos que vestem roupas de couro preto, cheias de coisas cromadas e que gostam de mostrar a sua força quando estão em bando).
O primeiro, vai até ao alentejano, apaga o cigarro em cima do bife dele e vai sentar-se na ponta do balcão.
O segundo, vai até o alentejano, cospe no copo dele e vai sentar-se na outra ponta do balcão.
O terceiro, vira o prato do alentejano e também vai sentar junto dos outros...
Sem uma palavra de protesto, o alentejano levanta-se, põe o boné, já gasto, na cabeça e vai-se embora.
Depois de algum tempo, um dos motoqueiros diz ao empregado do restaurante:
- Aquele gajo não era grande homem!
- Era mesmo um banana, remata o segundo motoqueiro.
E o empregado:
- E nem grande motorista ... Acabou de passar com o tractor dele por cima de três motas !!!
O primeiro, vai até ao alentejano, apaga o cigarro em cima do bife dele e vai sentar-se na ponta do balcão.
O segundo, vai até o alentejano, cospe no copo dele e vai sentar-se na outra ponta do balcão.
O terceiro, vira o prato do alentejano e também vai sentar junto dos outros...
Sem uma palavra de protesto, o alentejano levanta-se, põe o boné, já gasto, na cabeça e vai-se embora.
Depois de algum tempo, um dos motoqueiros diz ao empregado do restaurante:
- Aquele gajo não era grande homem!
- Era mesmo um banana, remata o segundo motoqueiro.
E o empregado:
- E nem grande motorista ... Acabou de passar com o tractor dele por cima de três motas !!!
TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 170
- É crime grave…
- Não me faça perder mais tempo, já sei que é crime grave, e é por isso mesmo que lhe ofereço o posto de juiz de direito em Cajazeiras. Decida logo, não me faça perder o tempo nem a cabeça – Bate na coxa com o rebenque.
Ergue-se lentamente o doutor Pio Alves, vai em busca dos autos. Não adianta opor-se, se o fizer será recambiado para Barracão e outro assinará o arquivamento, ganhando as boas graças do doutor.
Em verdade o processo está pleno de ilegalidades, a começar pela prisão e os sucessivos espancamentos da menor, interrogada sem audiência do juizado competente, sem advogado designado para lhe proteger os interesses até a recente intervenção de Lulu Santos e, ainda por cima, a falta de provas e de testemunhas dignas de fé, processo realmente repleto de falhas, os prazos estourados, assistem razões de sobra a favor do arquivamento.
Um juiz honesto não se deixa levar por mesquinhos sentimentos de vingança, indignos de um magistrado. Além disso que importância tem mais o arquivamento de mais um processo nas comarcas do sertão? Nenhuma, é claro.
O doutor Pio aprendeu História Universal na leitura de Zevaco e Dumas: Paris vale uma missa. E Cajazeiras não vale, por acaso, uma sentença?
Quando termina de escrever, letra miúda, escrita lenta, termos em latim, levanta os olhos para o doutor junto à janela e sorri:
- Eu o fiz em atenção ao senhor e à sua família.
- Obrigado e parabéns senhor juiz de Cajazeiras do Norte.
Emiliano vem até junto da mesa, toma dos autos e os folheia.
Lê aqui e ali, trechos da denúncia, do interrogatório, dos depoimentos, o de Tereza, o do jovem Daniel, que asco! Larga os autos na mesa, vira as costas, vai saindo:
- Conte com a nomeação, senhor juiz, mas não se esqueça de que tudo quanto se passa nesta terra me interessa.
Ainda irritado voltou à usina, mas, tendo ido dias depois a Aracaju dar uma olhadela na sucursal do Banco, lá se encontrou com Lulu e no decorrer da conversa soube estar Tereza na ignorância da sua interferência no caso e do seu interesse por ela. Ah! então não se enganara Emiliano ao julgá-la: o fulgor dos olhos confirmado ainda na véspera pela leitura dos autos. Além de bonita era valente.
Antecipou o regresso, não quis esperar o trem do dia seguinte, viajando para a usina de automóvel, dando pressa ao chofer – em certos trechos a estrada não passava de caminho para tropas de burros e carros de boi. Chegou de noite e logo partiu a cavalo para Cajazeiras, o tempo de tomar banho e mudar de roupa.
Dirigiu-se directamente à pensão de Gabi. Desmontando, cruzou os batentes do prostíbulo, acontecimento inédito, nunca antes ali pusera os pés. Quando garçon Arruda o viu, largou bebidas e clientes, saiu correndo para chamar Gabi.
A caftina veio tão depressa a ponto de, ofegante, não poder falar: honra inaudita, um milagre. (clik na imagem e aumente)
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
À 7ª ENTREVISTA COM JESUS SOB O TEMA:
“COMO DEU À LUZ MARIA”. (2)
Parir de pé: Um Direito Humano.
Ao longo da história e em todo o mundo, as mulheres não davam à luz deitadas mas sim, de cócoras ou em pé, segurando-se a uma árvore, uma corda, ou apoiadas em outras mulheres. No século XVII o médico francês François Mauriceau começou a deitar as mulheres quando iam dar à luz.
Depois disso, as casas começam a ser substituídos por hospitais e parteiras por médicos. E dar à luz deitada tornou-se um negócio, porque o médico ia ser o protagonista do jogo e um ato natural tornou-se quase uma doença.
A posição horizontal é arriscada para o parto. Deitada, a pélvis da mulher se achata e o canal do nascimento fica rígido. Hoje, muitas mulheres estão voltando à prática tradicional e experimentam os benefícios de dar à luz na posição vertical.
Previnem-se infecções impedidas por um melhor fluxo de líquidos, a cabeça do bebé encaixa-se melhor e o útero expande-se mais rapidamente. Esta posição também facilita a oxigenação da mãe e do bebé, há menos sangramento e as contracções do parto são mais rápidas, facilitando o parto e a expulsão da placenta.
A posição vertical também faz diminuir a dor do parto. Portanto, remos que falar de um novo direito humano: O direito de dar à luz em pé.
Depois disso, as casas começam a ser substituídos por hospitais e parteiras por médicos. E dar à luz deitada tornou-se um negócio, porque o médico ia ser o protagonista do jogo e um ato natural tornou-se quase uma doença.
A posição horizontal é arriscada para o parto. Deitada, a pélvis da mulher se achata e o canal do nascimento fica rígido. Hoje, muitas mulheres estão voltando à prática tradicional e experimentam os benefícios de dar à luz na posição vertical.
Previnem-se infecções impedidas por um melhor fluxo de líquidos, a cabeça do bebé encaixa-se melhor e o útero expande-se mais rapidamente. Esta posição também facilita a oxigenação da mãe e do bebé, há menos sangramento e as contracções do parto são mais rápidas, facilitando o parto e a expulsão da placenta.
A posição vertical também faz diminuir a dor do parto. Portanto, remos que falar de um novo direito humano: O direito de dar à luz em pé.
quarta-feira, agosto 03, 2011
FÁFÁ DE BELÉM - FOI ASSIM
Uma linda canção do início da carreira de Fáfá, 1977. Trata-se de um "bolero" e reparem na letra de muita qualidade, o arranjo musical e a interpretação irrepreensível da Fáfá. Seria uma preocupação daqueles tempos?...
TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 169
De raiva e inveja fez-se honesto, carga incómoda, capital de juro baixo. Do doutor Emiliano tinha medo e ódio, responsabilizando-o pela longa temporada a marcar passo em mísera pretoria: candidato a juiz de direito em Cajazeiras do Norte, onde a esposa herdara umas terras boas de gado, fora preterido em nome de reles advogado da capital, cujo único título era o de marido chifrudo de uma parenta dos Guedes. Já tinha sido lavrada a nomeação do doutor Pio quando Emiliano interveio, obtendo a designação do cornudo. Tempos depois e a muito custo conseguira a promoção a juiz de direito, servindo na comarca de Barracão mas sua meta continuava a ser Cajazeiras do Norte, de onde poderia administrar a fazendola, tornando-a lucrativa fonte de renda, talvez ampliá-la.
Ao ser enviado para substituir doutor Eustáquio no discutido processo, julgou chegado a doce hora da vingança: por seu gosto Daniel seria o acusado principal e não apenas cúmplice, mas, infelizmente, dura lex sed lex!, quem erguera a faca fora a moleca.
Atrás do juiz vem o escrivão, morto de curiosidade; com um gesto doutor Emiliano o despede, fica na sala a sós com o magistrado.
- Deseja falar comigo, doutor? Estou às ordens. – Esforça-se o juiz para manter-se grave e digno, mas o lábio se contrai num tique nervoso.
- Sente-se, vamos conversar – ordena Emiliano como se fosse ele o magistrado, a suprema autoridade ali, no Fórum.
O juiz vacila: onde sentar-se? Na alta cadeira de espaldar, posta em cima do estrado para marcar a hierarquia e impor respeito a todos os demais, colocando-se acima do doutor, em posição de briga? Falta-lhe coragem e senta-se junto à mesa. O doutor continua de pé, o olhar perdido fora da janela, e assim fala, a voz neutra:
- O doutor Lulu Santos trouxe-lhe um recado meu, o senhor não recebeu?
- O provisionado esteve comigo, arrazoou e eu o atendi mandando em liberdade a menor mantida presa pelo delegado. Ele assinou termo de responsabilidade.
- Será que ele não lhe deu todo o recado? Mandei-lhe dizer para arquivar o processo. Já o arquivou, juiz?
Acentua-se o tique no lábio do juiz, as cóleras do doutor são tão famosas, se bem raras. Busca forças na amargura:
- Arquivar? Impossível. Trata-se de crime de morte cometido na pessoa de importante cidadão desta comarca…
Importante? Um pulha. Impossível, porquê? Do processo consta um jovem estudante, meu aparentado,, filho do juiz Gomes Neto, dizem que o senhor exige sua pronúncia.
- Na qualidade de cúmplice… - baixa a voz – se bem, a meu ver, seja mais do que isso, seja co-autor do delito.
- Apesar de bacharel em Direito, não vim aqui como advogado nem tenho tempo a perder. Ouça, doutor: o senhor deve saber quem manda nesta terra, já tirou a prova antes. Disseram-me que ainda deseja ser juiz em Cajazeiras. Está em suas mãos, pois eu continuo a achar que Lulu não lhe deu todo o recado.
Lavre agora mesmo a sentença de arquivamento, duas linhas bastam. Mas se lhe dói a consciência, então eu lhe aconselho a voltar para Barracão o quanto antes, deixando o resto do processo para juiz à minha escolha e gosto. Está em suas mãos, decida. (clik na imagem e aumente)
Ao ser enviado para substituir doutor Eustáquio no discutido processo, julgou chegado a doce hora da vingança: por seu gosto Daniel seria o acusado principal e não apenas cúmplice, mas, infelizmente, dura lex sed lex!, quem erguera a faca fora a moleca.
Atrás do juiz vem o escrivão, morto de curiosidade; com um gesto doutor Emiliano o despede, fica na sala a sós com o magistrado.
- Deseja falar comigo, doutor? Estou às ordens. – Esforça-se o juiz para manter-se grave e digno, mas o lábio se contrai num tique nervoso.
- Sente-se, vamos conversar – ordena Emiliano como se fosse ele o magistrado, a suprema autoridade ali, no Fórum.
O juiz vacila: onde sentar-se? Na alta cadeira de espaldar, posta em cima do estrado para marcar a hierarquia e impor respeito a todos os demais, colocando-se acima do doutor, em posição de briga? Falta-lhe coragem e senta-se junto à mesa. O doutor continua de pé, o olhar perdido fora da janela, e assim fala, a voz neutra:
- O doutor Lulu Santos trouxe-lhe um recado meu, o senhor não recebeu?
- O provisionado esteve comigo, arrazoou e eu o atendi mandando em liberdade a menor mantida presa pelo delegado. Ele assinou termo de responsabilidade.
- Será que ele não lhe deu todo o recado? Mandei-lhe dizer para arquivar o processo. Já o arquivou, juiz?
Acentua-se o tique no lábio do juiz, as cóleras do doutor são tão famosas, se bem raras. Busca forças na amargura:
- Arquivar? Impossível. Trata-se de crime de morte cometido na pessoa de importante cidadão desta comarca…
Importante? Um pulha. Impossível, porquê? Do processo consta um jovem estudante, meu aparentado,, filho do juiz Gomes Neto, dizem que o senhor exige sua pronúncia.
- Na qualidade de cúmplice… - baixa a voz – se bem, a meu ver, seja mais do que isso, seja co-autor do delito.
- Apesar de bacharel em Direito, não vim aqui como advogado nem tenho tempo a perder. Ouça, doutor: o senhor deve saber quem manda nesta terra, já tirou a prova antes. Disseram-me que ainda deseja ser juiz em Cajazeiras. Está em suas mãos, pois eu continuo a achar que Lulu não lhe deu todo o recado.
Lavre agora mesmo a sentença de arquivamento, duas linhas bastam. Mas se lhe dói a consciência, então eu lhe aconselho a voltar para Barracão o quanto antes, deixando o resto do processo para juiz à minha escolha e gosto. Está em suas mãos, decida. (clik na imagem e aumente)
HISTÓRIAS
DE HODJA
Hodja está a pôr na cabeça o seu turbante mas por mais que tente não consegue prender a extremidade na parte traseira do turbante.
Então, irritado, decide levá-lo ao mercado e vendê-lo. O leilão tem lugar no bazar e um comprador faz uma oferta tão alta que Hodja adverte:
“Olha, meu irmão, não ofereças tanto porque quando tentares enrolar o turbante na cabeça a extremidade é curta e não dá para a prenderes.”
Então, irritado, decide levá-lo ao mercado e vendê-lo. O leilão tem lugar no bazar e um comprador faz uma oferta tão alta que Hodja adverte:
“Olha, meu irmão, não ofereças tanto porque quando tentares enrolar o turbante na cabeça a extremidade é curta e não dá para a prenderes.”
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
À 7ª ENTREVISTA COM JESUS SOB O TEMA:
“COMO DEU À LUZ MARIA” (1)
Parir: Um Acto Comunitário
Entre os nossos parentes animais mais próximos, os macacos, as mães podem ajudar ao nascimento dos seus filhos, guiando-os através do canal do parto com as mãos, limpando-lhes o nariz e a boca para respirarem o mais depressa possível, libertando-os, cortando com os dentes o cordão umbilical. O parto entre os macacos, é, portanto, um ato a solo.
Na nossa espécie, não: a mãe não pode ver o rosto de seu filho e não pode ajudá-lo, pois poderia provocar-lhe danos. Portanto, em todas as culturas humanas, a mãe procura ajuda quando vai para trabalho de parto, não dando à luz sozinha. O nascimento entre os humanos é uma actividade social, comunitária, um acto que cria comunidade. A imagem tradicional do nascimento de Jesus numa caverna solitária não é histórica nem realista. Não resulta do relato em qualquer Evangelho, mas apenas de uma composição imaginativa para reforçar e tentar "encaixar" no dogma do "parto virginal".
Na nossa espécie, não: a mãe não pode ver o rosto de seu filho e não pode ajudá-lo, pois poderia provocar-lhe danos. Portanto, em todas as culturas humanas, a mãe procura ajuda quando vai para trabalho de parto, não dando à luz sozinha. O nascimento entre os humanos é uma actividade social, comunitária, um acto que cria comunidade. A imagem tradicional do nascimento de Jesus numa caverna solitária não é histórica nem realista. Não resulta do relato em qualquer Evangelho, mas apenas de uma composição imaginativa para reforçar e tentar "encaixar" no dogma do "parto virginal".
terça-feira, agosto 02, 2011
HERMES AQUINO - NUVEM PASSAGEIRO (1976)
Não foi tão passageira quanto isso apesar dos jovens que fazem coro na plateia serem hoje respeitáveis chefes de família...Depois de 35 anos reencontramo-la como quem reencontra pessoa amiga e que abraçamos com a comoção própria das amizades que ficaram...simples e sinceras.
TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 168
Dos lados da cozinha chegam as vozes abafadas de Lula e Nina. Tereza toma a mão estendida do médico:
- Doutor Emiliano morreu.
- O quê?
Precipita-se doutor Amarílio para o quarto. Tereza acende a lâmpada forte do abajur junto à confortável cadeira de braços onde Emiliano sentava-se para ler – muitas vezes lia em voz alta para Tereza arrodilhada no chão, a seus pés. Doutor Amarílio toca o corpo, o lençol molhado, ai, pobre Tereza. Muda e ausente, Tereza recorda minuto por minuto os anos decorridos.
8
Ao chegar a Cajazeiras do Norte e ao saber de Tereza na pensão de Gabi, a reacção do doutor foi de irritação e mau humor. Decidiu largá-la à sua sorte, a fulana não pagava a pena. Ele, doutor Emiliano Guedes, dera-se ao trabalho de incomodar um amigo, advogado capaz e astuto, fazendo-o vir de Aracaju para retirá-la da cadeia e da circulação, pô-la em segurança, e a idiota, em vez de manter-se à espera, saía correndo para o prostíbulo, irreprimível vocação de marafona. Que a exercesse então.
No fundo achava-se o doutor menos despeitado pela forma como Tereza agira do que por se ter enganado julgando-a digna de interesse e protecção. Ao encontrá-la na roça de Justiniano, pareceu-lhe enxergar nos olhos negros de menina um fulgor raro e significativo. Também o relato dos sucessos posteriores, confirmaram-lhe aquela boa impressão inicial.
Errara, por mais incrível que pareça, revelando-se a sujeita rameira das piores, cabendo razão à prima Beatriz, devassa e maternal. O fulgor dos olhos não passara concerteza de raio de sol a iluminar-lhe a vista. Paciência.
Sendo a capacidade de conhecer e qualificar e qualificar as pessoas elemento fundamental para o comando exercido pelo doutor, senhor de terras e capitão de indústrias, banqueiro, sentia-se vaidoso de acertar no julgamento á primeira vista e, por isso mesmo, era-lhe difícil esconder o desaponto quando errava. A decepção o fez voltar-se para o juiz substituto, precisando descarregar em alguém o despeito a lhe amargar a boca. Dirigiu-se à Prefeitura, onde se situava o Fórum em sala do andar superior. Encontrou apenas o escrivão, que, ao vê-lo só lhe faltou pedir a bênção: quanta honra, meu doutor! O juiz ainda não chegara mas ia chamá-lo num instante, estava o meritíssimo hospedado na pensão de Agripina, ali pertinho.
O nome dele? Doutor Pio Alves, pretor durante muitos anos, finalmente juiz de direito em Barracão. Enquanto espera, da janela aberta sobre a praça, o doutor contempla o burgo triste e o desaponto cresce, não gosta de ser contrariado, menos ainda de enganar-se. Uma decepção a mais; pela vida afora vão-se acumulando os desencantos.
Solene, uma sombra de preocupação nos olhos, um tique nervoso no lábio, entra na sala o juiz substituto, doutor Pio Alves, pleno de azedume e de ressentimento. Permanece vítima de injustiças, sempre passado para trás, cedendo lugar e vez aos protegidos, julga-se alvo de um complô do clero, governo e povo, unidos para derrotá-lo a cada passo. Julgador ranzinza, mão pesada na sentença, insensível a qualquer argumento que não fosse a letra da lei. Quando lhe vinham falar em flexibilidade, compreensão, lástima, clemência, em sentimentos humanitários, respondia enfático:
- Meu coração é o sacrário da lei, nele inscrevi o axioma latino dura lex sed lex. (clik na imagem e aumente)
Histórias
de Hodja
Hodja pede aos seus amigos para ser enterrado de cabeça para baixo.
Perguntaram-lhe por quê.
- “Ora”, respondeu, “quando o fim do mundo vier tudo vai ficar de cabeça para baixo e cada um de nós terá de dar a volta – eu serei o único que já estarei virado, por isso levantar-me-ei primeiro e sem dificuldades”.
Hodja pede aos seus amigos para ser enterrado de cabeça para baixo.
Perguntaram-lhe por quê.
- “Ora”, respondeu, “quando o fim do mundo vier tudo vai ficar de cabeça para baixo e cada um de nós terá de dar a volta – eu serei o único que já estarei virado, por isso levantar-me-ei primeiro e sem dificuldades”.
7ª ENTREVISTA FICCIONADA
COM JESUS SOB O TEMA:
“COMO MARIA DEU À LUZ”
RAQUEL - Éh, Mestre… Jesus… Onde se meteu?
JESUS - Shalom, Raquel!
RAQUEL – Tenho-o procurado durante toda a manhã…
JESUS - Estava aqui conversando com pastores ... contavam-me das terras que lhes tiraram…
RAQUEL - Eu digo-lhe que vários colegas meus têm contactado as Emissoras Latinas interessados em agendarem entrevistas com o senhor… Mas pelo que eu vejo, o senhor prefere falar com os pastores…
JESUS - Não, eu falo com quem chega…
RACHEL - Pois fale comigo… atenção Estúdios, ao vivo com Jesus Cristo, com quem temos uma questão pendente… ontem o senhor começou a falar sobre o parto de sua mãe Maria, lembra-se?
JESUS - Sim, lembro-me. E o que queres saber?
RAQUEL - Bem, isso, como ela deu à luz sendo Virgem. Bem, sua mãe… entende, são questões muito íntimas…
JESUS - Íntimas? Os partos no meu tempo não tinham nada de secreto. Quando uma mulher chegava a hora de dar à luz, toda a vizinhança sabia disso e corriam para chamar as parteiras, parentes…
RAQUEL - Na ausência de hospitais, atendiam a mulher em casa.
JESUS - Sim, era o costume.
RAQUEL - E a deitavam?
JESUS - Como deitar? No meu tempo paria-se de pé.
RAQUEL - Ah, certo, de pé… eu já vi isso no Discovery...
JESUS – Sabes como se fazia? Uma corda pendurada no teto para que a mãe a segurasse com força quando as dores começassem. Outra mulher punha-se por trás para a apoiar.
RAQUEL - E a parteira?
JESUS - A parteira colocava-se de frente, sentada entre as pernas da mãe, ajudando-a respirar. Outras mulheres aqueciam água e bálsamos.
RAQUEL - E enquanto isso, o que faziam os homens?
JESUS - Esperavam. Sentavam-se no chão, em silêncio, esperando. Às crianças mandavam-nas buscar erva-doce para misturar com o vinho e dar de beber às pobres que estavam segurando a corda, puxa…puxa…puxa… até aparecer a cabeça do bebé e nascer a criatura!
RAQUEL - E lá se iam todos para as suas casas.
JESUS – Não, em vez disso, vinham mais. As mulheres começaram a cantar, a gritar de alegria pelo bebé… os homens comemoravam… a parteira a limpar o sangue e a cortar o umbigo ... uma festa!
RAQUEL – E a sua mãe Maria deu à luz assim?
JESUS – Claro, como haveria de ser senão desta maneira?
RAQUEL - Bem, eu li em alguns catecismos ... que o senhor veio ao mundo ... como um raio de luz que passa através do vidro sem quebrá-lo ou manchá-lo.
JESUS - Não entendo o que queres dizer, Raquel.
RAQUEL - Bem… que ... sua mãe deu à luz sem romper o selo da virgindade.
JESUS - Selo? Que selo?
RAQUEL – Quero dizer… o hímen… bem, entenda que é uma questão difícil para mim…
JESUS- Não, Raquel, é simples. Minha mãe deu à luz como todas as mulheres dão à luz, se romperam as águas, quebraram-se os selos e deu à luz como todos as outras.
RAQUEL - Isso significa que ...
JESUS - Não faças enredos, Raquel. A porta da vida é santificada quando se abre e não quando está fechada.
RAQUEL - Mas ... Mas se foi assim durante o parto… precisamos perguntar o que aconteceu antes e depois…
JESUS – A cada dia com o seu trabalho e a cada entrevista também.
RAQUEL - Sim, vamo-nos despedir mas vós, queridos ouvintes, não queriam saber mais sobre Maria, a mãe de Jesus? Ou não estaremos nós a actuar como paparazzis de microfone?
De Belém, cobrindo a surpreendente segunda vinda de Jesus Cristo à terra, Raquel Perez, Emissoras Latinas.
JESUS - Shalom, Raquel!
RAQUEL – Tenho-o procurado durante toda a manhã…
JESUS - Estava aqui conversando com pastores ... contavam-me das terras que lhes tiraram…
RAQUEL - Eu digo-lhe que vários colegas meus têm contactado as Emissoras Latinas interessados em agendarem entrevistas com o senhor… Mas pelo que eu vejo, o senhor prefere falar com os pastores…
JESUS - Não, eu falo com quem chega…
RACHEL - Pois fale comigo… atenção Estúdios, ao vivo com Jesus Cristo, com quem temos uma questão pendente… ontem o senhor começou a falar sobre o parto de sua mãe Maria, lembra-se?
JESUS - Sim, lembro-me. E o que queres saber?
RAQUEL - Bem, isso, como ela deu à luz sendo Virgem. Bem, sua mãe… entende, são questões muito íntimas…
JESUS - Íntimas? Os partos no meu tempo não tinham nada de secreto. Quando uma mulher chegava a hora de dar à luz, toda a vizinhança sabia disso e corriam para chamar as parteiras, parentes…
RAQUEL - Na ausência de hospitais, atendiam a mulher em casa.
JESUS - Sim, era o costume.
RAQUEL - E a deitavam?
JESUS - Como deitar? No meu tempo paria-se de pé.
RAQUEL - Ah, certo, de pé… eu já vi isso no Discovery...
JESUS – Sabes como se fazia? Uma corda pendurada no teto para que a mãe a segurasse com força quando as dores começassem. Outra mulher punha-se por trás para a apoiar.
RAQUEL - E a parteira?
JESUS - A parteira colocava-se de frente, sentada entre as pernas da mãe, ajudando-a respirar. Outras mulheres aqueciam água e bálsamos.
RAQUEL - E enquanto isso, o que faziam os homens?
JESUS - Esperavam. Sentavam-se no chão, em silêncio, esperando. Às crianças mandavam-nas buscar erva-doce para misturar com o vinho e dar de beber às pobres que estavam segurando a corda, puxa…puxa…puxa… até aparecer a cabeça do bebé e nascer a criatura!
RAQUEL - E lá se iam todos para as suas casas.
JESUS – Não, em vez disso, vinham mais. As mulheres começaram a cantar, a gritar de alegria pelo bebé… os homens comemoravam… a parteira a limpar o sangue e a cortar o umbigo ... uma festa!
RAQUEL – E a sua mãe Maria deu à luz assim?
JESUS – Claro, como haveria de ser senão desta maneira?
RAQUEL - Bem, eu li em alguns catecismos ... que o senhor veio ao mundo ... como um raio de luz que passa através do vidro sem quebrá-lo ou manchá-lo.
JESUS - Não entendo o que queres dizer, Raquel.
RAQUEL - Bem… que ... sua mãe deu à luz sem romper o selo da virgindade.
JESUS - Selo? Que selo?
RAQUEL – Quero dizer… o hímen… bem, entenda que é uma questão difícil para mim…
JESUS- Não, Raquel, é simples. Minha mãe deu à luz como todas as mulheres dão à luz, se romperam as águas, quebraram-se os selos e deu à luz como todos as outras.
RAQUEL - Isso significa que ...
JESUS - Não faças enredos, Raquel. A porta da vida é santificada quando se abre e não quando está fechada.
RAQUEL - Mas ... Mas se foi assim durante o parto… precisamos perguntar o que aconteceu antes e depois…
JESUS – A cada dia com o seu trabalho e a cada entrevista também.
RAQUEL - Sim, vamo-nos despedir mas vós, queridos ouvintes, não queriam saber mais sobre Maria, a mãe de Jesus? Ou não estaremos nós a actuar como paparazzis de microfone?
De Belém, cobrindo a surpreendente segunda vinda de Jesus Cristo à terra, Raquel Perez, Emissoras Latinas.
segunda-feira, agosto 01, 2011
VEJA E SINTA A MAGIA DA MÚSICA E DA DANÇA EM PLENA TIMES SQUARE
(utilize todo o ecrã)
(Repare na expressão de felicidade dos transeuntes que observam a cena)
QUANDO A MEDICINA
FOR PRIVADA
De repente, entra um médico no bloco operatório e grita:
- Parem tudo!!! Parem o transplante!!! Há uma rejeição!...
- Uma rejeição...? Do rim, doutor? - pergunta um dos médicos da equipa.
- NÃO!!! Do cheque !!!. O cheque não tem cobertura!...
O cirurgião e o pós-operado:
- Doutor, eu entendo que esteja vestido de branco, mas porquê tanta luz?
- Meu filho, eu sou São Pedro...
- Parem tudo!!! Parem o transplante!!! Há uma rejeição!...
- Uma rejeição...? Do rim, doutor? - pergunta um dos médicos da equipa.
- NÃO!!! Do cheque !!!. O cheque não tem cobertura!...
O cirurgião e o pós-operado:
- Doutor, eu entendo que esteja vestido de branco, mas porquê tanta luz?
- Meu filho, eu sou São Pedro...
TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 167
Desejava excluir o filho do processo, no qual o juiz substituto, um canalha, o envolvera na qualidade de cúmplice e em posição ridícula – trata-se daquele pretor candidato à vaga de juiz de direito em Cajazeiras, preterido em benefício de Eustáquio a pedido exactamente do doutor Emiliano, lembra-se, primo?, agora a vingar-se no pobre rapaz, o desalmado, exigindo do promotor a pronúncia de Daniel junto com a prostituta. Ela queria, além disso, a transferência do marido para outra comarca, pois em Cajazeiras do Norte já não lhe era possível servir em paz à causa da justiça nem escrever sonetos; Eustáquio não deseja voltar e tem razão, mas também não pode permanecer na capital em eterna licença a infernizar a vida da família. Dona Beatriz pede, por fim, ao querido primo lenço limpo para nele enxugar as lágrimas de esposa e mãe – com tais desgostos não há plástica que dê jeito, primo.
Identificando Tereza no confuso relato de dona Beatriz, o doutor mesmo antes de ocupar-se dos assuntos da parentela, tomara providências referentes à segurança da menina, comunicando-se da Bahia com Lulu Santos em Aracaju. Amigo de confiança, de provada dedicação, o rábula era manhoso conhecedor das malhas da lei e de como contorná-las. Tire a menina da cadeia e a ponha a salvo, em lugar seguro, acabe com esse processo, mande arquivar.
Não foi difícil tirar Tereza da cadeia. Menor de idade, com pouco mais de quinze anos, sua prisão em cárcere comum constituía ilegalidade monstruosa, sem falar nas surras. O juiz atendeu de imediato e lavou as mãos das sevícias: nunca mandara bater, isso era lá com o delegado, amigo do capitão. Quanto a arquivar o processo, porém, manteve-se irredutível, disposto a levá-lo até ao fim.
Situando-se Cajazeiras do Norte no estado da Bahia e sendo Lulu Santos provisionado em Sergipe, não quis o rábula insistir. Tendo internado Tereza no convento de freiras, comunicou ao usineiro a recusa do juiz substituto e foi aguardar novas ordens em Aracaju.
Ignorando a interferência do doutor e de acordo com Gabi, que a procurara na cadeia, parecendo dela se compadecer, Tereza fugiu do convento e ingressou na vida.
7
Velhote, gordo, risonho e comilão, receitando dieta para os outros e devorando de um tudo desbragadamente, naqueles seis anos o médico Amarílio Fontes fizera-se íntimo do doutor, comendo sal da mesa farta e temperada de Tereza; vinha regalar-se a cada estada de Emiliano em almoços e jantares sem igual – em Estância só em casa de João Nascimento filho se comia assim tão bem, mas os vinhos e licores franceses trazidos na bagagem do doutor, ah! esses eram incomparáveis. O usineiro amiudara as visitas a Estância, ampliando também o tempo de demora: um dia, caro Amarílio, virei para ficar, não há terra melhor para se envelhecer devagarinho do que Estância.
Na porta, bate palmas pró-forma. Vai entrando sem esperar convite, o recado o alarmara: esses homens fortes imunes às enfermidades, parecendo feitos de aço, quando adoecem, quase sempre a coisa é grave. Ao escutar as palmas do médico, Tereza saiu do quarto vindo ao seu encontro. Alarmou-se ainda mais o doutor ao ver a moça:
- É assim tão grave, comadre? – Dizia-lhe comadre com afecto; médico oficial da casa, atendera Tereza por ocasião do aborto, desde então o compadrio. (clik na imagem e aumente)
Identificando Tereza no confuso relato de dona Beatriz, o doutor mesmo antes de ocupar-se dos assuntos da parentela, tomara providências referentes à segurança da menina, comunicando-se da Bahia com Lulu Santos em Aracaju. Amigo de confiança, de provada dedicação, o rábula era manhoso conhecedor das malhas da lei e de como contorná-las. Tire a menina da cadeia e a ponha a salvo, em lugar seguro, acabe com esse processo, mande arquivar.
Não foi difícil tirar Tereza da cadeia. Menor de idade, com pouco mais de quinze anos, sua prisão em cárcere comum constituía ilegalidade monstruosa, sem falar nas surras. O juiz atendeu de imediato e lavou as mãos das sevícias: nunca mandara bater, isso era lá com o delegado, amigo do capitão. Quanto a arquivar o processo, porém, manteve-se irredutível, disposto a levá-lo até ao fim.
Situando-se Cajazeiras do Norte no estado da Bahia e sendo Lulu Santos provisionado em Sergipe, não quis o rábula insistir. Tendo internado Tereza no convento de freiras, comunicou ao usineiro a recusa do juiz substituto e foi aguardar novas ordens em Aracaju.
Ignorando a interferência do doutor e de acordo com Gabi, que a procurara na cadeia, parecendo dela se compadecer, Tereza fugiu do convento e ingressou na vida.
7
Velhote, gordo, risonho e comilão, receitando dieta para os outros e devorando de um tudo desbragadamente, naqueles seis anos o médico Amarílio Fontes fizera-se íntimo do doutor, comendo sal da mesa farta e temperada de Tereza; vinha regalar-se a cada estada de Emiliano em almoços e jantares sem igual – em Estância só em casa de João Nascimento filho se comia assim tão bem, mas os vinhos e licores franceses trazidos na bagagem do doutor, ah! esses eram incomparáveis. O usineiro amiudara as visitas a Estância, ampliando também o tempo de demora: um dia, caro Amarílio, virei para ficar, não há terra melhor para se envelhecer devagarinho do que Estância.
Na porta, bate palmas pró-forma. Vai entrando sem esperar convite, o recado o alarmara: esses homens fortes imunes às enfermidades, parecendo feitos de aço, quando adoecem, quase sempre a coisa é grave. Ao escutar as palmas do médico, Tereza saiu do quarto vindo ao seu encontro. Alarmou-se ainda mais o doutor ao ver a moça:
- É assim tão grave, comadre? – Dizia-lhe comadre com afecto; médico oficial da casa, atendera Tereza por ocasião do aborto, desde então o compadrio. (clik na imagem e aumente)
HISTÓRIAS
DE HODJA
Num dia de Inverno, Hodja sobe à montanha para cortar lenha. Sente muito frio e as suas mãos e pés começam a ficar gelados. Sussurra então para consigo próprio: “Eu acho que estou a morrer… posso até já estar morto” e deita-se no chão.
Apareceram então lobos que se lançaram ao burro. Hodja vira-se e diz aos lobos:
- “Comam, comam! Pobre burro, o seu dono está morto e ainda por cima é comido pelos lobos”.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
À 6ª Entrevista SOB O TEMA:
“ANJOS; REIS E ESTRELAS” (4º e último)
Não Há Religiões Puras
Mais interessante e instrutivo é conhecer as influências que, sobre os escritos da Bíblia e as tradições cristãs, têm as tradições religiosas dos outros povos daqueles tempos. Essas influências demonstram que geneticamente não existem "raças puras", neste caso, não existe "religião pura". E que o racismo tem a sua contrapartida no dogmatismo religioso, exclusivo e intolerante.
A tradição dos Reis Magos, por exemplo, é uma influencia do culto de Mitra, base da religião dos persas (actual Irão), denunciado até pelas palavras: os sacerdotes de Mitra são chamados de "mogs”, a que no Ocidente deu lugar à palavra "mágico".
E mais ainda: segundo a tradição, os três "homens sábios" que trouxeram a Jesus ouro, incenso e mirra chamados de Melchior, Gaspar e Baltasar, tinham os seus nomes derivados da Manucher, Garshasp e Bastavarai, que foram três reis mitológicos da Pérsia, hoje o Irão.
Mais interessante e instrutivo é conhecer as influências que, sobre os escritos da Bíblia e as tradições cristãs, têm as tradições religiosas dos outros povos daqueles tempos. Essas influências demonstram que geneticamente não existem "raças puras", neste caso, não existe "religião pura". E que o racismo tem a sua contrapartida no dogmatismo religioso, exclusivo e intolerante.
A tradição dos Reis Magos, por exemplo, é uma influencia do culto de Mitra, base da religião dos persas (actual Irão), denunciado até pelas palavras: os sacerdotes de Mitra são chamados de "mogs”, a que no Ocidente deu lugar à palavra "mágico".
E mais ainda: segundo a tradição, os três "homens sábios" que trouxeram a Jesus ouro, incenso e mirra chamados de Melchior, Gaspar e Baltasar, tinham os seus nomes derivados da Manucher, Garshasp e Bastavarai, que foram três reis mitológicos da Pérsia, hoje o Irão.
domingo, julho 31, 2011
HOJE É
DOMINGO
(Da Minha Cidade de Santarém)
(Da Minha Cidade de Santarém)
Comprometi-me convosco, no passado Domingo, a contar-vos uma história do meu passado de guerra ocorrida em Novembro de 1963, no coração dos Dembos, bem no centro do norte de Angola. Seria a minha última operação em teatro de guerra após a qual regressaria a Luanda e seguiria para outro local em paz, consumindo tempo, aguardando que chegasse ao fim a minha comissão para voltar então à minha família, aos meus amigos, à minha terra.
Afinal, o que então não sabia, é que esse tempo que me faltava cumprir seriam os 15 meses mais felizes e despreocupados da minha vida, mas isso eu o devo ao continente africano, àquela natureza, àquelas paisagens que nos aproximam das nossas origens como espécie, dos primórdios da nossa existência e, também, às gentes que ali viviam, as pessoas do povo Luena, no Alto-Zambeze, nas chamadas “terras do fim-do-mundo…”
A operação desenrolou-se tendo como base e ponto de partida uma fazenda de café, Maria Fernanda de seu nome, e nela participaram tropa sedeada na própria fazenda e outras, como o meu Grupo de Combate, vindos de Luanda de propósito.
A saída era em simultâneo, de madrugada, os itinerários diferentes para cada Grupo e o objectivo era de “limpeza” da zona, coisa perfeitamente delirante tendo em conta a dimensão da área, a riqueza da vegetação e o desconhecimento e pouco à vontade que possuíamos quando comparados com o das populações que faziam da floresta a sua casa.
Fomos largados de viaturas naquilo a que eles chamavam “picada”, trilhos de estradas de “terra batida”que já tinham deixado de o ser porque quando não utilizadas rapidamente são invadidos pelo capim e restante vegetação que literalmente se apodera delas em pouco tempo.
Deveríamos caminhar para Norte até encontrar uma outra picada na perpendicular do sentido que levávamos e onde as viaturas nos aguardariam para nos reconduzirem à fazenda Maria Fernanda.
Com o meu Grupo ia um outro que pertencia à guarnição militar da própria fazenda e que era comandado por um Alferes licenciado em medicina mas que não tendo ainda feito o estágio hospitalar cumpria a comissão como alferes de Infantaria.
O seu estado de espírito não podia ser pior. Estava deprimido e era completa a saturação e o desinteresse que manifestava por tudo quanto o rodeava.
Antes de partirmos acercou-se de mim e disse-me:
- “Não quero saber disto para nada, você comanda e eu vou ser apenas mais um soldado”… não mais o vi nem tão pouco dei pela sua presença…sumiu-se!
A operação decorreu num vale profundo de encostas bem acentuadas que se prolongava no sentido sul/norte e que tinham sido desmatadas até uma certa altura para aproveitarem o terreno na parte mais baixa e fértil.
Era agricultura de subsistência das populações que se tinham subtraído ao controle das autoridades portuguesas e viviam refugiadas no mato. Alguns deles, com armas, teriam recebido instrução militar e atacavam as tropas portuguesas nos acampamentos e nas picadas com minas anti-carro e emboscadas.
Começamos a deslocação para norte, pela encosta do lado esquerdo do vale, na orla do terreno que estava desmatado e encobertos pela vegetação da floresta.
Era-nos assim relativamente fácil observar o que se passava à nossa direita, mais abaixo, sem que o contrário fosse possível. Caminhávamos uns atrás dos outros numa fila que se prolongava por dezenas de metros e durante algum tempo nada aconteceu.
De repente ouvi um tiro, depois mais tiros, um alvoroço, alguns soldados descem a correr a encosta, atravessam o vale e perseguem pessoas que fogem em desespero subindo a encosta do outro lado. Regressam passado pouco tempo os que tinham saído em perseguição e a calma restabelece-se progressivamente…o drama estava consumado.
Uma jovem tinha sido morta por uma bala disparada de muito longe por um soldado. A bala entrara pelas costas e atravessara-lhe o coração causando-lhe morte instantânea. Um outro soldado cortou-lhe um dedo para trazer de recordação como troféu de guerra e eu… tive uma enorme vontade de fugir dali, desaparecer…eu que era o comandante daquela tropa e nem sequer podia recriminar o soldado que matou a jovem porque ele apenas cumprira as instruções do Quartel General de matar tudo o que mexesse, a tal “limpeza” a que já me referi.
Não conheci bem este soldado no sentido de que não tive com ele grande convivência. Era da minha Companhia mas não do meu Grupo de Combate. Tinha um aspecto possante, bem constituído fisicamente, de alcunha “o boi”, proveniente, de certo, de uma das nossas muitas aldeias como a maioria deles e no máximo teria a escola primária.
- Dizer-lhe que a utilização de uma arma, mesmo numa situação de guerra, é sempre da responsabilidade de quem a utiliza, faria algum sentido para ele?
- Manifestar-lhe o meu desagrado não seria estabelecer a confusão na sua cabeça?
- Perguntar-lhe se ele gostaria que fossem à sua aldeia e lhe matassem a irmã ou a namorada quando ela estivesse simplesmente a trabalhar no campo, era justo?
Do outro soldado, do que cortou o dedo do cadáver da jovem para recordação, não procurei saber na altura quem era, sentia demasiada vergonha, por mim e por ele.
Quarenta e cinco anos mais tarde, de cabeça baixa, envergonhado e arrependido disse-me em voz baixa…“eu era um garoto…” mas não seríamos todos nós uns garotos?
Foram para mim momentos de pânico e desorientação, não queria estar ali nem mais um minuto e por isso dei instruções para que continuássemos o nosso trajecto o mais rapidamente possível.
Atacar civis, pessoas indefesas, surpreendendo-as, não era guerra nenhuma era um morticínio, um assassinato.
Em todas as anteriores operações, cansado daquelas marchas, do calor, do ar saturado de humidade que não nos deixava respirar, do peso da espingarda, cartucheiras, bornal, capa de borracha, cantil que depressa esvaziava… quando à noite me deixava cair o que me esperava era sempre um sono profundo e descansado tendo por almofada o meu bornal e por lençóis a capa de borracha.
Sempre?... não! Naquela noite quase não preguei olho, os gritos de dor dos familiares da jovem morta ecoavam por todo aquele vale.
Eram gritos lancinantes, doridos, acusatórios e o silêncio que se lhes seguia parecia total, como se os bichos da floresta tivessem decidido calar-se nessa noite para eu melhor os poder ouvir. Noite irrepetível, perseguido por gritos que sentia serem ameaçadores de pessoas que expressavam a sua dor mas também a sua raiva, o seu justo desejo de vingança.
No outro dia, ainda o sol não nascera e já nos tínhamos posto em marcha que só não era forçada porque as condições do terreno e da vegetação não o permitia.
Era ténue a minha esperança de conseguir escapar à emboscada que de certo me esperaria em qualquer ponto do percurso. Quantos iríamos morrer? Os guerrilheiros não podiam permitir que a tropa fosse ao seu terreno, que era a sua casa, matar uma jovem do seu povo da mesma forma que se caça uma gazela e saísse do emaranhado de toda aquela vegetação com total impunidade. Era para eles uma questão de honra como seria para mim no lugar deles.
Por isso, começamos a andar ainda quase de noite e continuávamos a apressar o andamento na esperança de sair dali depressa antes que eles tivessem tempo de armar a emboscada.
Já era bem de dia quando o vale se bifurcou. Eu devia continuar em frente, sempre para norte, sempre por aquele vale. O Quartel-General sabia bem que era ao longo dele que se encontravam as populações e por isso o itinerário era aquele e não outro.
Mas chegados àquela bifurcação decidi desrespeitar as ordens, seguir pelo vale da esquerda, de vegetação muito mais densa de tal forma que era praticamente impossível montar ali uma emboscada ou o que quer que fosse e em distância parecia-me encurtar caminho.
Disse aos homens para encherem os cantis num fio de água que por ali passava e foi nesse momento, com eles agachados a recolherem a água e eu em pé, que o tiroteio começou.
Eles pensaram exactamente aquilo que eu iria fazer, aquele era o sítio certo para a emboscada, antes de fugir pelo vale da esquerda que tendo uma vegetação tão densa não permitiria qualquer acção militar.
Entretanto, os tiros prosseguiam e eu continuava de pé, indiferente, num aparente e ilusório desafio: …"vá, estou aqui, de pé, acertem-me se forem capazes, vinguem a vossa jovem que nós matámos…”
- “Meu alferes, saia daí, esconda-se, que eles matam-no!”… gritou-me o Maia, (já falecido) deitado atrás de um tronco de uma árvore caída no terreno.
Dirigi-me para junto dele, normalmente, com o passo de quem muda de mesa na esplanada do café e a inconsciência do perigo própria de quem não nasceu para aquelas coisas. Ainda hoje recordo não ter tido naqueles momento nenhuma sensação de medo... "aquelas balas não eram para mim... eu apenas estava assistindo a um filme de aventuras no cinema Politiama..."
Afinal, o que então não sabia, é que esse tempo que me faltava cumprir seriam os 15 meses mais felizes e despreocupados da minha vida, mas isso eu o devo ao continente africano, àquela natureza, àquelas paisagens que nos aproximam das nossas origens como espécie, dos primórdios da nossa existência e, também, às gentes que ali viviam, as pessoas do povo Luena, no Alto-Zambeze, nas chamadas “terras do fim-do-mundo…”
A operação desenrolou-se tendo como base e ponto de partida uma fazenda de café, Maria Fernanda de seu nome, e nela participaram tropa sedeada na própria fazenda e outras, como o meu Grupo de Combate, vindos de Luanda de propósito.
A saída era em simultâneo, de madrugada, os itinerários diferentes para cada Grupo e o objectivo era de “limpeza” da zona, coisa perfeitamente delirante tendo em conta a dimensão da área, a riqueza da vegetação e o desconhecimento e pouco à vontade que possuíamos quando comparados com o das populações que faziam da floresta a sua casa.
Fomos largados de viaturas naquilo a que eles chamavam “picada”, trilhos de estradas de “terra batida”que já tinham deixado de o ser porque quando não utilizadas rapidamente são invadidos pelo capim e restante vegetação que literalmente se apodera delas em pouco tempo.
Deveríamos caminhar para Norte até encontrar uma outra picada na perpendicular do sentido que levávamos e onde as viaturas nos aguardariam para nos reconduzirem à fazenda Maria Fernanda.
Com o meu Grupo ia um outro que pertencia à guarnição militar da própria fazenda e que era comandado por um Alferes licenciado em medicina mas que não tendo ainda feito o estágio hospitalar cumpria a comissão como alferes de Infantaria.
O seu estado de espírito não podia ser pior. Estava deprimido e era completa a saturação e o desinteresse que manifestava por tudo quanto o rodeava.
Antes de partirmos acercou-se de mim e disse-me:
- “Não quero saber disto para nada, você comanda e eu vou ser apenas mais um soldado”… não mais o vi nem tão pouco dei pela sua presença…sumiu-se!
A operação decorreu num vale profundo de encostas bem acentuadas que se prolongava no sentido sul/norte e que tinham sido desmatadas até uma certa altura para aproveitarem o terreno na parte mais baixa e fértil.
Era agricultura de subsistência das populações que se tinham subtraído ao controle das autoridades portuguesas e viviam refugiadas no mato. Alguns deles, com armas, teriam recebido instrução militar e atacavam as tropas portuguesas nos acampamentos e nas picadas com minas anti-carro e emboscadas.
Começamos a deslocação para norte, pela encosta do lado esquerdo do vale, na orla do terreno que estava desmatado e encobertos pela vegetação da floresta.
Era-nos assim relativamente fácil observar o que se passava à nossa direita, mais abaixo, sem que o contrário fosse possível. Caminhávamos uns atrás dos outros numa fila que se prolongava por dezenas de metros e durante algum tempo nada aconteceu.
De repente ouvi um tiro, depois mais tiros, um alvoroço, alguns soldados descem a correr a encosta, atravessam o vale e perseguem pessoas que fogem em desespero subindo a encosta do outro lado. Regressam passado pouco tempo os que tinham saído em perseguição e a calma restabelece-se progressivamente…o drama estava consumado.
Uma jovem tinha sido morta por uma bala disparada de muito longe por um soldado. A bala entrara pelas costas e atravessara-lhe o coração causando-lhe morte instantânea. Um outro soldado cortou-lhe um dedo para trazer de recordação como troféu de guerra e eu… tive uma enorme vontade de fugir dali, desaparecer…eu que era o comandante daquela tropa e nem sequer podia recriminar o soldado que matou a jovem porque ele apenas cumprira as instruções do Quartel General de matar tudo o que mexesse, a tal “limpeza” a que já me referi.
Não conheci bem este soldado no sentido de que não tive com ele grande convivência. Era da minha Companhia mas não do meu Grupo de Combate. Tinha um aspecto possante, bem constituído fisicamente, de alcunha “o boi”, proveniente, de certo, de uma das nossas muitas aldeias como a maioria deles e no máximo teria a escola primária.
- Dizer-lhe que a utilização de uma arma, mesmo numa situação de guerra, é sempre da responsabilidade de quem a utiliza, faria algum sentido para ele?
- Manifestar-lhe o meu desagrado não seria estabelecer a confusão na sua cabeça?
- Perguntar-lhe se ele gostaria que fossem à sua aldeia e lhe matassem a irmã ou a namorada quando ela estivesse simplesmente a trabalhar no campo, era justo?
Do outro soldado, do que cortou o dedo do cadáver da jovem para recordação, não procurei saber na altura quem era, sentia demasiada vergonha, por mim e por ele.
Quarenta e cinco anos mais tarde, de cabeça baixa, envergonhado e arrependido disse-me em voz baixa…“eu era um garoto…” mas não seríamos todos nós uns garotos?
Foram para mim momentos de pânico e desorientação, não queria estar ali nem mais um minuto e por isso dei instruções para que continuássemos o nosso trajecto o mais rapidamente possível.
Atacar civis, pessoas indefesas, surpreendendo-as, não era guerra nenhuma era um morticínio, um assassinato.
Em todas as anteriores operações, cansado daquelas marchas, do calor, do ar saturado de humidade que não nos deixava respirar, do peso da espingarda, cartucheiras, bornal, capa de borracha, cantil que depressa esvaziava… quando à noite me deixava cair o que me esperava era sempre um sono profundo e descansado tendo por almofada o meu bornal e por lençóis a capa de borracha.
Sempre?... não! Naquela noite quase não preguei olho, os gritos de dor dos familiares da jovem morta ecoavam por todo aquele vale.
Eram gritos lancinantes, doridos, acusatórios e o silêncio que se lhes seguia parecia total, como se os bichos da floresta tivessem decidido calar-se nessa noite para eu melhor os poder ouvir. Noite irrepetível, perseguido por gritos que sentia serem ameaçadores de pessoas que expressavam a sua dor mas também a sua raiva, o seu justo desejo de vingança.
No outro dia, ainda o sol não nascera e já nos tínhamos posto em marcha que só não era forçada porque as condições do terreno e da vegetação não o permitia.
Era ténue a minha esperança de conseguir escapar à emboscada que de certo me esperaria em qualquer ponto do percurso. Quantos iríamos morrer? Os guerrilheiros não podiam permitir que a tropa fosse ao seu terreno, que era a sua casa, matar uma jovem do seu povo da mesma forma que se caça uma gazela e saísse do emaranhado de toda aquela vegetação com total impunidade. Era para eles uma questão de honra como seria para mim no lugar deles.
Por isso, começamos a andar ainda quase de noite e continuávamos a apressar o andamento na esperança de sair dali depressa antes que eles tivessem tempo de armar a emboscada.
Já era bem de dia quando o vale se bifurcou. Eu devia continuar em frente, sempre para norte, sempre por aquele vale. O Quartel-General sabia bem que era ao longo dele que se encontravam as populações e por isso o itinerário era aquele e não outro.
Mas chegados àquela bifurcação decidi desrespeitar as ordens, seguir pelo vale da esquerda, de vegetação muito mais densa de tal forma que era praticamente impossível montar ali uma emboscada ou o que quer que fosse e em distância parecia-me encurtar caminho.
Disse aos homens para encherem os cantis num fio de água que por ali passava e foi nesse momento, com eles agachados a recolherem a água e eu em pé, que o tiroteio começou.
Eles pensaram exactamente aquilo que eu iria fazer, aquele era o sítio certo para a emboscada, antes de fugir pelo vale da esquerda que tendo uma vegetação tão densa não permitiria qualquer acção militar.
Entretanto, os tiros prosseguiam e eu continuava de pé, indiferente, num aparente e ilusório desafio: …"vá, estou aqui, de pé, acertem-me se forem capazes, vinguem a vossa jovem que nós matámos…”
- “Meu alferes, saia daí, esconda-se, que eles matam-no!”… gritou-me o Maia, (já falecido) deitado atrás de um tronco de uma árvore caída no terreno.
Dirigi-me para junto dele, normalmente, com o passo de quem muda de mesa na esplanada do café e a inconsciência do perigo própria de quem não nasceu para aquelas coisas. Ainda hoje recordo não ter tido naqueles momento nenhuma sensação de medo... "aquelas balas não eram para mim... eu apenas estava assistindo a um filme de aventuras no cinema Politiama..."
-“Meu alferes, as balas aos seus pés até levantavam pó!” - disse-me o Maia quando me deitei ao seu lado.
Entretanto, alguém gritou que eles estavam em cima das árvores a fazerem fogo para cima de nós e logo tudo quanto tinha folhas e ramos foi varrido pelas rajadas das espingardas automáticas G3.
Nitidamente, o efeito de surpresa tinha passado e o nosso maior poder de fogo estava a impor-se.
Chamei o homem da bazuca, o “Capela”, e mandei-o disparar duas granadas na esperança de que alguma delas conseguisse passar por entre as árvores e explodisse contra a outra encosta do outro lado do vale.
A primeira rebentou logo à nossa frente, quase por cima das nossas cabeças, deu cabo de uma árvore que estava próxima e “choveram” bocadinhos de madeira para cima de nós.
Gritei-lhe: - “É pá, levanta o cano dessa merda para ver se consegues fazer a granada passar por cima das árvores!
Inspirado pelos “deuses da guerra”, o homem da bazuca, à segunda tentativa, conseguiu que a granada passasse por entre as árvores, as sobrevoasse e estourasse contra a encosta do vale, em frente, lá no outro lado.
O efeito ultrapassou tudo o que se poderia esperar: o estrondo do rebentamento multiplicado vezes sem conta pelo eco, possível pelo facto das encostas serem suficientemente íngremes e próximas a funcionarem como paredes em frente uma da outra, parecia coisa do apocalipse.
De repente, “vinte exércitos” tinham entrado em cena e accionado os seus dispositivos de lançamento de granadas. Quando, finalmente, os ecos dos rebentamentos se deixaram de ouvir, a guerra tinha acabado, a calma e o silêncio estabeleceram-se como se nada ali tivesse acontecido.
O “Capela” e a bazuca tinham acabado de ganhar a guerra…
Levantámo-nos lentamente olhando e perguntando uns pelos outros e inacreditavelmente estavam todos bem, apenas um sargento enfermeiro, de mais idade e pesado, tinha desmaiado de comoção mas estava a recuperar.
Tiveram a oportunidade de uma justa vingança e não a aproveitaram. Dispararam de surpresa de cima das árvores a distâncias que não eram muito grandes e poderiam ter-nos causado inúmeras baixas…éramos mais de cinquenta alvos.
Em vez disso, não acertaram em ninguém, a jovem não foi vingada… mas eles tentaram, cumpriram a sua obrigação, provavelmente com feridos ou mortos pois foram vistos alguns a atirarem-se das árvores, não sabemos se atingidos ou não.
A continuação da marcha foi penosa, momentos houve em que a vegetação de tão densa que era aprisionava-nos de pernas e braços, obrigando a recuos e avanços que eram uma autêntica luta contra o emaranhado dos ramos.
Finalmente, exaustos de cansaço, fome e sede porque no meio de toda aquela confusão e na pressa de abandonar o local nem enchemos os cantis de água, lá chegámos ao destino, já de noite mas vivos e sem feridos.
Aquilo que a cada um de nós nos separou da morte nesse dia, foi um simples capricho do acaso.
Quarenta e oito anos depois convenço-me cada vez mais que é ele, o acaso, que comanda o processo, sempre o comandou. Todo a evolução, em grande medida, foi determinado pelo acaso e as nossas humildes vidas, claro, não lhe podiam fugir.
Pensei muitas vezes, ao longo de todos estes anos, naquela jovem com um sentimento de culpa pela sua morte. Propositadamente, não quis vê-la para não lhe recordar o rosto pela vida afora mas é fácil imaginá-lo e ele tem-me acompanhado, sinal de que a minha consciência não está completamente descansada.
Afinal, eu era o comandante daquela Operação e antes dela começar deveria ter dado instruções a todos os soldados para que, a menos que fôssemos atacados, ninguém daria tiros sem minha autorização. Esta ordem ficou por dar e custou a vida àquela rapariga e a minha consciência carregará sempre esse peso.
Para ela, flores…todas as flores deste mundo!
Bom Domingo para todos.
Entretanto, alguém gritou que eles estavam em cima das árvores a fazerem fogo para cima de nós e logo tudo quanto tinha folhas e ramos foi varrido pelas rajadas das espingardas automáticas G3.
Nitidamente, o efeito de surpresa tinha passado e o nosso maior poder de fogo estava a impor-se.
Chamei o homem da bazuca, o “Capela”, e mandei-o disparar duas granadas na esperança de que alguma delas conseguisse passar por entre as árvores e explodisse contra a outra encosta do outro lado do vale.
A primeira rebentou logo à nossa frente, quase por cima das nossas cabeças, deu cabo de uma árvore que estava próxima e “choveram” bocadinhos de madeira para cima de nós.
Gritei-lhe: - “É pá, levanta o cano dessa merda para ver se consegues fazer a granada passar por cima das árvores!
Inspirado pelos “deuses da guerra”, o homem da bazuca, à segunda tentativa, conseguiu que a granada passasse por entre as árvores, as sobrevoasse e estourasse contra a encosta do vale, em frente, lá no outro lado.
O efeito ultrapassou tudo o que se poderia esperar: o estrondo do rebentamento multiplicado vezes sem conta pelo eco, possível pelo facto das encostas serem suficientemente íngremes e próximas a funcionarem como paredes em frente uma da outra, parecia coisa do apocalipse.
De repente, “vinte exércitos” tinham entrado em cena e accionado os seus dispositivos de lançamento de granadas. Quando, finalmente, os ecos dos rebentamentos se deixaram de ouvir, a guerra tinha acabado, a calma e o silêncio estabeleceram-se como se nada ali tivesse acontecido.
O “Capela” e a bazuca tinham acabado de ganhar a guerra…
Levantámo-nos lentamente olhando e perguntando uns pelos outros e inacreditavelmente estavam todos bem, apenas um sargento enfermeiro, de mais idade e pesado, tinha desmaiado de comoção mas estava a recuperar.
Tiveram a oportunidade de uma justa vingança e não a aproveitaram. Dispararam de surpresa de cima das árvores a distâncias que não eram muito grandes e poderiam ter-nos causado inúmeras baixas…éramos mais de cinquenta alvos.
Em vez disso, não acertaram em ninguém, a jovem não foi vingada… mas eles tentaram, cumpriram a sua obrigação, provavelmente com feridos ou mortos pois foram vistos alguns a atirarem-se das árvores, não sabemos se atingidos ou não.
A continuação da marcha foi penosa, momentos houve em que a vegetação de tão densa que era aprisionava-nos de pernas e braços, obrigando a recuos e avanços que eram uma autêntica luta contra o emaranhado dos ramos.
Finalmente, exaustos de cansaço, fome e sede porque no meio de toda aquela confusão e na pressa de abandonar o local nem enchemos os cantis de água, lá chegámos ao destino, já de noite mas vivos e sem feridos.
Aquilo que a cada um de nós nos separou da morte nesse dia, foi um simples capricho do acaso.
Quarenta e oito anos depois convenço-me cada vez mais que é ele, o acaso, que comanda o processo, sempre o comandou. Todo a evolução, em grande medida, foi determinado pelo acaso e as nossas humildes vidas, claro, não lhe podiam fugir.
Pensei muitas vezes, ao longo de todos estes anos, naquela jovem com um sentimento de culpa pela sua morte. Propositadamente, não quis vê-la para não lhe recordar o rosto pela vida afora mas é fácil imaginá-lo e ele tem-me acompanhado, sinal de que a minha consciência não está completamente descansada.
Afinal, eu era o comandante daquela Operação e antes dela começar deveria ter dado instruções a todos os soldados para que, a menos que fôssemos atacados, ninguém daria tiros sem minha autorização. Esta ordem ficou por dar e custou a vida àquela rapariga e a minha consciência carregará sempre esse peso.
Para ela, flores…todas as flores deste mundo!
Bom Domingo para todos.