Memórias Futuras
Olhar o futuro pelo espelho retrovisor da história. Qual história? Que futuro?
sábado, abril 27, 2013
Para este sábado, véspera do descanso do Domingo para os que têm a sorte de ter um trabalho, escolhi este mail pelas suas belas imagens cheias de côr e, como todos sabemos, côr é vida... A música é de um Grupo, A Côr do Som" que fez êxito no começo da década de 80 no Rio de Janeiro.
Dizia Jesus que “a fé
move montanhas” mas o que Jesus não sabia é que a fé movia uma substância
chamada “endorfinas”, descobertas em 1975, e que funcionam como morfina natural
que acalma a dor e faz sentir melhoras. Uma descarga de “endorfinas” pode fazer
com que um doente se levante, recobre a vista, se cure. O Dr. Nicanor Arriola,
ortopedista muito conhecido em Iqui ros,
Perú, relata a seguinte experiência:
- "Um dia um
ancião, em cadeira de rodas, entrou no meu copnsultório com a sua família.
Examinei-lhe os músculos e concluí que não tinha nada, sofria de uma
"parelesia histérica". Então, recordando o que fazia Jesus,
levantei-me, pus-me diante dele e com uma voz de autoridade e ternura
disse-lhe: levanta-te e anda! e o ancião pôs-se de pé e cambaleante, caminhou
até mim. A família considerou um milagre."
O nosso corpo é a melhor
farmácia que temos, reage às doenças e produz as substâncias curativas que
necessitamos. O milagre somos nós próprios que os fazemos.
António Balduíno |
JUBIABÁ
Episódio Nº 2
Estavam numa raiva porque
o negro apanhava. Eles haviam pago os três mil reis de entrada para ver o
campeão baiano dar naquele branco que se dizia campeão da Europa Central.
E agora estavam assistindo
era o negro apanhar. Não estavam satisfeitos, moviam-se inqui etos e oram vivavam o branco, ora o vaiavam. E
respiraram aliviados quando o gongo soou, dando fim ao round.
António Balduíno veio para
o canto do ring se segurando às cordas. Aí, o homem magro que mordia o cigarro
inútil, cuspiu e gritou:
- Onde está o negro António Balduíno que
derrubava brancos?
Aqui lo
António Balduíno ouviu. Bebeu um gole da garrafa de cachaça que o Gordo lhe
oferecia e virou para a assistência, procurando o dono daquela voz.
Voz que voltou, metálica:
- Quedê o derrubador de brancos?
Desta vez, parte da
multidão acompanhou o homenzinho e disse em coro:
- Quede? Quede?
Aqui lo
doeu a Balduíno como uma chibatada. Não sentia nenhum dos socos do branco, mas
sentia aquela censura dos torcedores. Disse ao gordo:
- Quando eu sair daqui
dou uma surra neste sujeito. Marque ele…
E, quando soou o sinal de
recomeçar a luta o preto se atirou em cima de Ergin. Pôs um soco na boca do
alemão e em seguida um no ventre. A multidão reconhecia novamente o seu campeão
e gritou:
- Aí, António Balduíno! Aí, Baldo! Derruba
ele…
O negro baixo voltou a
ritmar pancadas nos joelhos. O magro sorria.
O negro continuava a dar e
sentia uma grande raiva dentro de si.
Foi quando o alemão voou
para cima dele querendo acertar no outro olho de Balduíno. O negro livrou o
corpo com um gesto rápido e como a mola de uma máqui na
que se houvesse partido distendeu o braço bem por baixo do queixo de Ergin, o
alemão.
O campeão da Europa
Central descreveu uma curva com o corpo e caiu com todo o peso.
A multidão rouca, aplaudia
em coro:
- Bal-do…
Bal-do… Bal-do…
O juiz contava:
- … seis… sete… oito…
António Balduíno olhava
satisfeito o branco estendido a seus pés. Depois passou os olhos pela
assistência que o vaiara, procurando o homem que dissera que ele não era mais o
derrubador de brancos. Como não o achasse, sorriu para o Gordo. O juiz contava:
- …nove…dez…
Suspendeu o braço de
Balduíno. A multidão berrava mas o negro só ouvia a voz metálica do homem do
cigarro:
- Aí negro, você ainda derruba brancos…
sexta-feira, abril 26, 2013
Ontem foi 25 de Abril... A última aparição de Zeca Afonso. As pessoas do público, suas amigas e admiradoras sentem-no e muitas delas choraram. A doença estava a fazer o seu percurso final.
O nosso respeitável sobreiro |
As
Árvores, Minhas
Irmãs
Irmãs
Conta-se
a história daquele homem que já muito velhinho, sentindo-se doente, saiu
ao seu qui ntal e por momentos
abraçou cada uma das suas árvores. Depois, regressou a casa, deitou-se e morreu
tranqui lo. Para ele, era indiferente
que uma fosse figueira, outra laranjeira e três ou quatro oliveiras. A todas,
ao longo de uma vida, tratara de igual modo. Regara-as, arrancara-lhes os ramos
secos e tratara da terra que as possuía.
Elas, em troca, deram-lhe a sombra à
qual se recolhia no fim das tardes solarengas de verão e os frutos:
figos pretos de tamanho médio, doces
e saborosos, laranjas grandes e sumarentas e azeitonas pretas que ele retalhava, demolhava para perderem o sabor
azedo e depois temperava com sal e orégãos. Com nacos de pão de trigo caseiro
eram o melhor acompanhamento.
De certa forma, é uma falácia
afirmarmos que somos donos das árvores… Elas vivem muito mais tempo que nós. Já
cá estavam quando nascemos, cá ficam depois de morrermos e as suas vidas
correspondem à vida de gerações de pessoas. Algumas, chegam mesmo a manterem-se
vivas durante séculos, para não referir já o velho pinheiro chamado de “matusálém”,
na Califórnia, que pela contagem dos anéis, já leva 4.800 anos de existência.
- As Sequóias “Sempre Verdes” da
costa norte-americana do Pacífico batem todos os recordes chegando a atingir, a
mais alta de todas, 115,6
metros . A Sequóia “Gigante”, a maior árvore do mundo,
tem cerca de 1.500 m3
de volume o que significa que para a transportar seria necessária uma frota de
40 camiões TIR.
Não empatava o trajecto do velho Vauxal comprado logo a seguir à guerra, era eu ainda menino, porque ele aprendera a desviar-se e já lá tinha o trilho marcado para que não houvessem dúvidas no trajecto.
Um dia, o meu pai pensou no dinheiro que podia fazer com a sua madeira transformada em carvão e matou-o. Eu, garoto, infelizmente assisti. Vieram uns homens com uns machados e começaram a cortar-lhe as raízes que estavam fora da terra, para o enfraquecer. Depois ataram-lhe cabos de aço às pernadas mais altas e com alavancas e roldanas fixadas no chão puxaram, puxaram até que as raízes, escondidas debaixo da terra, rebentaram e ainda hoje sinto vontade de tapar as orelhas para não ouvir os roncos surdos que saíam das entranhas da terra, como se fossem gritos de protesto e de dor.
Uns
anos mais tarde, foi a vez do pinheiro manso. Era muito alto, completamente
direito e teria já muita idade. Estava sozinho naquela encosta numas terras,
junto à aldeia, que eram do meu avô. No tempo das pinhas íamos debaixo dela –
nós chamávamos-lhe “pinheira” porque nos parecia mais lógico. Dava-nos pinhas e
no tempo delas íamos apanhá-las e à noite abríamo-las ao calor do fogo da
lareira e era uma festa com as cascas dos pinhões a saltarem para todo lado ao
sabor das marteladas e a minha avó a ralhar porque tinha de ser ela a varrer o
que eu e o meu irmão sujávamos. Nunca mais voltei a comer pinhões tão
saborosos.
Também
um dia o meu pai o matou. A sua madeira, muito boa, depois de aparelhada, para a
construção de casas, deve ter rendido bom dinheiro e durante toda a minha vida,
sempre que passava na estrada evitava olhar para o local onde ela já não estava
para não ter o desgosto de a não ver.
A
terceira árvore era uma delicada tangerineira no qui ntal
da minha avó. Havia lá mais mas aquela era muito pequenina, airosa e redondinha
e nenhuma das outras dava tangerinas tão doces e saborosas. Ainda miúdo de calções,
sentava-me no poial, junto dela, e saboreava deliciado as tangerinas com a
sensação que elas as tinha criado só para mim.
Mas
o homem, tem-se permitido destruir sem dó nem piedade esta herança fabulosa de
vida, sacrificando no altar de interesses mesqui nhos
de pessoas muito ricas que podem pagar tudo, seja a que preço for, florestas
cheias de vida animal de uma maneira perfeitamente criminosa.
No
fundo, prevalece o egoísmo da geração presente numa postura que se traduz no
tal: “quem vier atrás que feche a porta…”
Nem sempre terá sido assim.
O homem do paleolítico vivia em
comunhão com a natureza numa época em que predominavam as florestas. No silêncio da noite, nos seus locais
de dormida, ele ouvia os sons do vento perpassarem por entre as folhas dos
ramos mais altos e sensíveis das árvores que o rodeavam.
Humilde, frágil, dependente da
natureza, mas muito sagaz e observador, pensou aproveitar aquele relacionamento
entre árvores e deuses a seu favor utilizando aquelas como intermediárias entre
ele e os deuses.
O negro António Balduíno |
Episódio nº 1
A multidão se levantou
como se fosse uma só pessoa. E conservou um silêncio religioso. O juiz contou:
- Seis…
Porém antes que contasse
sete o homem loiro se ergueu sobre um braço, com esforço, e juntando todas as
forças se pôs de pé. Então a multidão se sentou novamente e começou a gritar.
O negro investiu com fúria
e os lutadores se atracaram em meio ao tablado. A multidão berrava:
- Derruba ele! derruba ele!
O Largo da Sé pegara uma
enchente naquela noite. Os homens se apertavam nos bancos, suados, olhos
puxados para o tablado onde o negro António Balduíno lutava com Ergin, o
alemão.
A sombra da igreja
centenária se estendia sobre os homens. Raras lâmpadas iluminavam o tablado.
Soldados, estivadores, estudantes, operários, homens que vestiam apenas camisa
e calça, seguiam ansiosos a luta.
Pretos, brancos e mulatos
torciam pelo negro António Balduíno que já derrubara o adversário duas vezes.
Daquela última vez parecia que o branco já não se levantaria mais.
Porém antes que o juiz
contasse sete ele se levantou e continuou a lutar. Houve entre a assistência
palavras de admiração.
Alguém murmurou:
- O alemão é macho mesmo…
No entanto continuaram a
torcer pelo negro, alto, que era campeão baiano de peso - pesado.
Gritavam agora sem parar
desejosos que luta tivesse um fim, e que esse fim fosse com Ergin estendido no
chão.
Um homenzinho magro, cara
chupada, mordia um cigarro apagado. Um negro baixote ritmava os berros com
palmadas nos joelhos:
- Der-ru-ba
ele… Der-ru-ba-ele…
E se moviam inqui etos, gritavam que se ouvia na Praça Castro
Alves.
Mas aconteceu que no outro
round, o branco veio com raiva em cima do negro e o levou às cordas. A multidão
não se importou muito esperando a reacção do negro.
Realmente Balduíno qui s acertar na cara sangrenta do alemão. Porém
Ergin não lhe deu tempo e o socou violência atingindo-o no rosto, fazendo do
olho do negro uma posta de sangue.
O alemão cresceu de
repente e escondeu o preto que agora apanhava na cara, nos peitos, na barriga. Balduíno
foi novamente às cordas, se segurou nelas, e ficou passivamente sem reagir.
Pensava unicamente em não cair e se atracava com força às cordas.
Na sua frente, o alemão
parecia o diabo a lhe martelar a cara. O sangue corria no nariz de Balduíno, o
seu olho direito estava fechado, tinha um rasgão por baixo da orelha. Via
confusamente o branco na sua frente, pulando, e ouvia muito longe os berros da
assistência. Esta vaiava. Via o seu herói cair e gritava:
- Dá nele, negro!
Isso no princípio. Aos poucos,
a multidão foi ficando silenciosa, abatida, vendo o negro apanhar. E quando
voltou a gritar foi para vaiar.
- Negro fêmea! Mulher com calça! Aí, loiro! Dá
nele.
quinta-feira, abril 25, 2013
do 25 de
Abril de 1974
Impossível não
assinalar esta data, 25 de Abril de 1974, porque ela celebrará sempre o dia
histórico em que o “ Movimento dos Capitães” derrubou o regime que durante mais
de quarenta anos perseguiu os cidadãos com a PIDE, polícia política que prendia
e castigava as pessoas que discordavam do regime e manifestavam essa
discordância e possuía a Censura que impedia que as ideias circulassem na
imprensa, nos livros e oralmente entre as pessoas.
Por outras palavras, restabeleceu no
país a liberdade. Esta é a responsabilidade que cabe ao 25 de Abril, à Revolução
que, felizmente, foi dos Cravos e que deve ser imputada ao Movimento dos
Capitães do MFA, cidadãos que nela se envolveram e a levaram à prática, sem
esquecer o contributo que ao longo dos anos foi sendo dado por muitas outras
pessoas.
Restabelecida a liberdade, tudo o que
de então para cá aconteceu no país é da responsabilidade dos portugueses e das
conjunturas políticas que desde então vivemos.
Um povo só pode ser responsabilizado
plenamente pelo curso da sua história nos períodos em que os cidadãos não vivam
oprimidos por um poder que os ameace na sua liberdade e integridade física.
Numa situação destas há uma distorção forçada dos comportamentos que alteram o
rumo da história que inevitavelmente seria outra se vivida em liberdade.
Acusar o 25 de Abril do que quer que
seja para além do restabelecimento da liberdade no país, só se entende por
juízos precipitados, falta de discernimento ou por um comprometimento directo
com interesses ligados ao regime anterior por quem, com essas acusações,
pretenda uma pequena vingança.
Esperar-se-ia que as forças militares
que derrubaram pela força o poder anterior pretendessem, após isso, exercê-lo,
não obstante as desinteressadas intenções sempre anunciadas em situações deste
género mas, em vez disso, o poder militar vitorioso chamou representantes da
sociedade civil e encarregou-os de constituir um governo livre e democrático.
Na história das revoluções esta mais
parecia uma história da carochinha em que no final o jovem herói casa com a
princesa, tem muitos filhos e são felizes para sempre… mas desta vez não foi
história de “princesas”.
O
Movimento dos Capitães, responsável pela revolução, após a vitória, chamou um
General insuspeito de revolucionário e pediu-lhe que assumisse o controle da
situação tendo em vista a passagem a uma situação transitória de elaboração de
uma nova Constituição que antecedesse eleições livres e democráticas.
A pureza dos ideais do 25 de Abril
estava consumada e os jovens capitães mantiveram-se fiéis à sua palavra
comprovando que se a juventude se caracteriza, naturalmente, pela ingenuidade e
imaturidade, neste caso ela provou ser pura, desinteressada, generosa e
sincera.
Realçado este aspecto essencial do 25
de Abril, muitas coisas aconteceram de então para cá de erradas, que nos
prejudicaram, que foram motivo de grandes “confusões”, especialmente no período
do PREC (Período Revolucionário Em Curso) mas que constituiram, também, uma
fase de grande efervescência ideológica, voluntarismo e de um despertar depois
de tantos anos de “um apagado e vil silêncio”.
Passamos a viver numa democracia de
partidos políticos, forma adoptada pela generalidade dos países europeus, com
as especificidades próprias do temperamento, cultura e educação de cada um
deles. Como dizia Churchil: “de todos os regimes o menos mau...”.
E quem não tem queixas da democracia
em que vive? Quem não atribui aos políticos que nos governam as origens dos
males que nos afligem? Quem não os responsabiliza, com ou sem razão, esquecendo
que no mínimo somos nós que os elegemos e com isso nos tornamos
co-responsáveis de tudo quanto acontece?
Depois, foi a “inevitável” integração na Comunidade Europeia que nos abriu as
fronteiras alargando o nosso espaço económico, financeiro e de trabalho, com
uma nova moeda, esquecido que foi o escudo, com a entrada de milhões de euros,
em grande parte responsáveis por esta “nova cara” do país mas que desmantelou,
por responsabilidade nossa a agricultura, as pescas e uma indústria
desmotivada.
Todos
temos que assumir a nossa quota-parte de responsabilidade quando vivemos em
liberdade numa sociedade que não nos persegue, prende e castiga pelas nossas
ideias e comportamentos no respeito por um quadro legal que livremente
estabelecemos.
Mas, se compararmos uma sociedade a
um enorme e complexo computador, logo nos lembraremos dos vírus que os afectam
e dos quais nenhum está livre. Nesse outro enorme “computador” que é a nossa
sociedade, o principal vírus foi o da “partidocracite” com corrupção, tráfego
de influências, negócios misturados com política…
A corrupção e o enriquecimento
ilícito que lhe está associado têm a ver, fundamentalmente, com pessoas e o
exercício do poder. Os partidos, especialmente os que alternam no governo, têm
os meios e estrita obrigação de lutar contra ela, colocando-o no Código Penal
como um crime, perseguindo-o e punindo-o exemplarmente mas não o fizeram…
Ninguém ainda foi condenado e preso por ser corrupto e beneficiar do tráfico de influências.
A “partidocracite”, empolando os
interesses dos respectivos partidos, na defesa ou na luta pelo poder,
sobrepondo-os aos da comunidade, confundindo-os com os do país, é infelizmente de uso corrente na maioria das sociedades democráticas,
salvaguardadas as legítimas opções políticas com que cada partido se apresenta
ao eleitorado.
Reconheçamos que a luta contra este
vírus é muito difícil porque ele se disfarça e aparece revestido de muitas
formas que confundem os cidadãos.
Celebrar hoje o 25 de Abril de 1974,
é confrontarmo-nos com aqui lo que fomos
e não fomos capazes de fazer no quadro de liberdade que ele nos devolveu, já lá
vão trinta e nove anos.
Naturalmente, que a ditadura de
Salazar deixou um quadro pouco favorável ao nosso desenvolvimento futuro,
fundamentalmente em termos culturais e de mentalidade. Todos sabemos que as
ditaduras são castradoras e isso tem um enorme preço no futuro pela falta de
formação e responsabilização das pessoas.
Não
mais as legítimas desculpas da Censura, das perseguições da Polícia Política,
do medo da denúncia, do analfabetismo, das fronteiras passadas a salto, do
silêncio, da ignorância do mundo, não mais… de tudo isso ficou-nos a liberdade
que a Revolução dos Cravos nos trouxe.
E
hoje, passados estes 39 anos, encontramo-nos nesta terrível encruzilhada de não
sabermos como avançar e ao mesmo tempo ter medo de voltar a trás.
Fazer
prognósticos do nosso futuro político está hoje ao sabor do estado de espírito
de cada um… os pessimistas dirão que o país irá desaparecer no turbilhão das
suas dificuldades financeiras, retalhado pelos credores… os outros, os
optimistas, avisam que Portugal já cá está há muitos séculos ao longo dos quais
passou por tudo o que é mau: pestes, fome, invasões, guerras.
Pais de emigração, contando com os seus descendentes, vivem hoje no estrangeiro, mais de 15 milhões de portugueses, e esta tem sido a principal forma de resistir...
Diremos que, resistir,
está-nos na massa do sangue.
Mais
uma vez assim será. Daqui a um ano
cá estarei para vos falar da Revolução dos Cravos, a do 25 de Abril de 1974.
O PAÍS DO CARNAVAL
Admirador da obra de Jorge Amado,
rendido aos seus romances, alguns transcritos aqui
no Memórias Futuras como os “das suas outras quatro mulheres”: Gabriela, Tereza
Batista, Dona Flor e a Tieta, assaltou-me a curiosidade de saber que livro teria escrito este escritor na juventude dos seus 18 anos de idade.
Pois bem, aqui
ficou o País do Carnaval, provavelmente o que abordou o tema mais profundo, menos história e mais questões intrigantes do que fazer com vida, onde procurar a Felicidade...
Paulo Rigger, o personagem principal,
acaba frustrado, desiludido com o seu país e com a sua vida e regressa à Europa
onde tinha estudado, para esquecer aquela má experiência na sua terra natal.
Tem um romance de amor fugaz a que põe termo por
preconceitos de virgindade da rapariga ele, que se julgava um jovem moderno, educado em Paris, superior a essas tradições machistas da sociedade antiga. Uma desilusão e uma raiva contra si próprio...
Revolta-se contra a sociedade da sua
terra natal, e muitos motivos teria com certeza para isso, mas é ele que falha
ao virar as costas ao amor perante a confissão de uma jovem corajosa que o
amava mas que pôs a honestidade na primeira linha da relação.
Há a tentação de procurar ver no jovem
Jorge Amado, de 18 anos, o personagem Paulo Rigger. Todos nós, que tivemos
essa idade e alguns que estudaram, lembram-se dos “desafios” que então colocávamos
à vida e à sociedade e que com os anos se foram esbatendo e desvanecendo.
Afinal, a vida de cada um de nós, é um
“pequeno acidente” na história da humanidade a que pertencemos. “Comandados” por
heranças genéticas e culturais, sujeitos à ditadura dos nossos hormonas,
impelidos pela necessidade de sobreviver em competição, deixa-se de pensar na
Felicidade para passar a coisas mais comezinhas do dia a dia que nos vão
absorvendo, às vezes, consumindo-nos em preocupações constantes…
Da vida, fica-nos uma experiência fugidia e, entre outras coisas, as
histórias enriquecedoras de Jorge Amado, forjadas nesse caldinho rico de culturas de um povo
constituído por europeus, índios, negros e mestiços que foi o seu, lá em São Salvador da Bahia,
na parte Sul do Nordeste brasileiro.
JUBIABÁ
Jubiabá é a história que se segue, o
primeiro grande romance de Jorge Amado, escrito em 1935 e que o lançou para a
categoria de um dos maiores romancista do mundo. O livro esgotou no Brasil
sucessivas edições e logo foram negociados os direitos para a sua publicação em
francês, russo, inglês, alemão, sueco, dinamarquês e espanhol. Foi um
verdadeiro “best-seller”.
Pela palavra dos seus críticos, o livro
é um grito de humanidade e justiça que emociona os leitores através da
narrativa que nos transporta ao íntimo de um povo laborioso e pobre.
Mais de setenta e cinco anos passaram
sobre esse Brasil que já não é o mesmo do Jubiabá mas esta distância dá-nos a
garantia que estávamos então mais próximos das origens de uma sociedade em
gestação carregada de tradições de uns e de outros e que ali se encontraram com os que já lá estavam.
Não conheço a história e vou ter, por
isso, o prazer de a ler convosco, episódio em episódio. Nenhum
romance pode abdicar da curiosidade e do suspense do seu enredo e dos livros
que aqui já transcrevemos do Jorge
Amado ficámos bem cientes da sua mestria em conduzir os personagens da história
para além da riqueza e autenticidade dos diálogos só possíveis a um grande
escritor que fosse mesmo baiano.
quarta-feira, abril 24, 2013
Um bêbedo entra num bar e pede ao balcão três cafés
- Três cafés?
- Pergunta, atónito, o empregado. - Sim, um para mim, outro para ti e outro prá p*** da tua mãe!!!
No dia seguinte, o mesmo bêbedo repete o mesmo pedido, no mesmo café e ao mesmo empregado:
Três cafés...
- Três?...-
- Sim .. Três ... um para mim, outro para ti e outro prá p*** da tua mãe!!!
Desta vez o empregado "passou-se", saiu do balcão, agarrou no bêbedo e deu-lhe uma sova e peras! No dia seguinte, todo entrevado, o bêbedo vai na mesma ao café, dirige-se ao balcão e o empregado com um sorrisinho cínico pergunta-lhe:
Então, três cafézinhos, não é verdade?....
Não. - Responde o bêbedo.
Só dois: um para mim e outro prá p*** da tua mãe! Pra ti não, porque o café altera-te o sistema nervoso...
Maria João Rodrigues |
Ninguém tem o monopólio da razão nem do amor ao país
Apenas
dois anos depois da crise de 2011, vive-se, de novo, um momento de grande
instabilidade política. A meio do seu mandato, o Governo tem sérias
dificuldades em governar, não consegue entendimentos com os partidos da
oposição e com os parceiros sociais, enfrenta o descontentamento da população e
a avaliação negativa por líderes políticos e comentadores. Apesar do apoio da
maioria parlamentar, sucedem-se as dificuldades na coligação e na coordenação
política que ameaçam o Governo de desintegração ou de implosão.
Muitos
se perguntam se o mandato será concluído, havendo já quem peça eleições
antecipadas ou um Governo de iniciativa presidencial.
É
normal existirem governos que não chegam ao fim da legislatura e não cumpram os
quatro anos de mandato previstos na lei, mas não é desejável. Sobretudo quando
isso acontece de forma repetida e consecutiva, deixando de ser exceção e
passando a regra. Na atual conjuntura, não é desejável também porque, todos o sabemos,
do processo de eleições antecipadas não sairá uma solução de estabilidade
governativa.
Teremos
de novo o PS e o PSD como partidos mais votados e o CDS, o PCP e o BE como
partidos com expressão minoritária. Estaremos a decidir sobre se o primeiro-ministro
deve ser o líder do PS ou o do PSD, não sobre a composição da coligação
necessária para responder aos desafios da situação atual.
Qualquer
resultado exigirá uma negociação envolvendo, pelo menos, o PS, o PSD e o CDS.
Ora, não há qualquer razão para acreditar que, após eleições antecipadas, será
possível, com os mesmos líderes partidários, construir os entendimentos que nos
últimos dois anos foram impossíveis. O mais provável será, pelo contrário, o
país entrar numa espiral de ingovernabilidade e de instabilidade política,
semelhante aquela em que a Itália já se encontra.
Não
são eleições antecipadas que nos podem salvar. O que nos pode salvar é um
entendimento entre partidos políticos, concertado com os parceiros sociais, em
torno da identificação clara dos principais problemas do país e da forma de os
resolver.
Para
enfrentar a crise, há os que consideram que deve ser dada prioridade aos
problemas financeiros, não havendo, neste momento, outra coisa a fazer senão
reduzir o défice e a dívida a qualquer preço. Outros consideram que a
prioridade deve ser atribuída às questões económicas e sociais, devendo-se,
neste momento, centrar a intervenção pública na promoção do crescimento
económico.
Outros,
ainda, reclamam a urgência da negociação com a troika dos
termos do resgate e reclamam das instituições da União Europeia uma nova
orientação para enfrentar a crise. Estes discursos e preocupações raramente se
encontram.
Cada
grupo fala para si próprio, enquanto o país fica cada vez mais exangue, sem
ânimo, parecendo morrer devagar.
Defendo
que, neste momento, para sair da crise e da atual situação deve ser dada
prioridade à construção de um entendimento interpartidário. Tal exige humildade
e convicção por parte dos líderes políticos.
Humildade
no reconhecimento de que ninguém tem sempre razão, mas mesmo quando se tem razão
a opinião dos outros importa.
Convicção
de que um entendimento é desejável, possível e indispensável.
É
verdade que no nosso país tem sido impossível construir acordos políticos
interpartidários duráveis e gerais. Das raras vezes em que o acordo foi
conseguido teve âmbito sectorial (por exemplo, nas áreas da justiça, da
educação ou da defesa nacional) e colapsou antes de produzir os efeitos
pretendidos, em particular porque os líderes partidários não souberam resistir
às tentações do populismo e do tacticismo.
Assistimos também, demasiadas vezes, com a
mudança de governos ou de ministros, à destruição de políticas públicas ou de
programas sem qualquer avaliação ou consideração pelos resultados já obtidos,
apenas por puro revanchismo ou radicalismo político.
Nada disto contribui para criar o clima de
confiança necessário à construção de entendimentos. Bem pelo contrário,
contribui para alimentar uma permanente crispação e guerrilha.
O
momento exige mais. Exige que os líderes partidários coloquem de lado agendas
de ajuste de contas e de radicalização ideológica e procurem entender-se sobre
o que precisamos de fazer para sair da crise.
O
primeiro passo só pode ser dado pelos líderes dos partidos no Governo. Porém,
não chegam afirmações retóricas sobre entendimentos e consensos. É necessário
que se suspendam parte das políticas radicais em curso e se aceite encontrar
soluções negociadas para os problemas do país.
É
necessário que quem governa reconheça que não tem o monopólio da razão nem do
amor ao país.
Maria João Rodrigues
Nota
Concordo
inteiramente com esta análise isenta, realista e verdadeira de Maria João Rodrigues, que eu admiro há muitos anos. Afecta ao PS, Presidente da Fundação
Luso-Americana para o Desenvolvimento e Professora de Políticas Públicas no
ISCTE-IUL nunca se envolveu muito na vida partidária para a qual não está talhada.
Estou
igualmente convencido que a generalidade das pessoas conhecedoras da realidade
política deste país e não endeusadas a qualquer partido subscreveriam também esta
análise.
O que
Maria de Lourdes Rodrigues não diz porque não pode, é que infelizmente, a lógica
partidária, mais preocupada com o interesse e futuro dos seus líderes, que será
também o das elites que os apoiam, irá prevalecer ao interesse da generalidade
dos portugueses dentro daquela concepção de que a solução que for boa para o
partido é a que melhor servirá o país…
É a democracia que temos… São os políticos que temos…
Seduzem
e convencem impondo-se, não pelo seu próprio valor, mas pelas promessas irrealistas e as estratégias ziguezagueantes de preservação do poder no partido.
Assim,
que não se espere nada que cheire a solução vinda cá de dentro…
Com muito optimismo poderá esperar-se que seja a Europa e os credores, na defesa dos seus próprios interesses, a trazerem a solução através do aprofundamento da Europa política, financeira e fiscal que vai fazer sangrar ainda mais a generalidade dos portugueses, mais de uns do que outros, como sempre acontece, e levar o resto da soberania portuguesa do tipo: "governem-nos que nós não somos competentes..."
Com muito optimismo poderá esperar-se que seja a Europa e os credores, na defesa dos seus próprios interesses, a trazerem a solução através do aprofundamento da Europa política, financeira e fiscal que vai fazer sangrar ainda mais a generalidade dos portugueses, mais de uns do que outros, como sempre acontece, e levar o resto da soberania portuguesa do tipo: "governem-nos que nós não somos competentes..."
De
qualquer maneira, a alternativa, o regresso ao escudo, em termos de sacrifícios, será da mesma
ordem ou pior, salvando-se, um bocadinho, o orgulho dos portugueses.
DO
CARNAVAL
Episódio Nº 81
Lia os jornais. Rapazes
fundavam legiões fascistas, o partido comunista tomava vulto. Materialistas e
católicos discutiam decretos do Governo, tocantes ao ensino.
A insatisfação notava-se
nas colunas dos jornais, a dúvida pesava na face dos moços.
- Acho que vai haver uma grande desgraça…
Os diários noticiavam que
o povo corria ao interior de Minas gerais onde uma Santa curava. Minúcias.
Detalhes voluptuosamente lidos.
Paulo Rigger tinha vontade
de esganar a todos. Por que não se tornavam felizes. Não esqueciam problemas?
Não esqueciam tudo? Não ficavam muito bons? Ele qui sera
ser bom. Ajudar a todos. Não podia. Odiava os semelhantes. Não lhes perdoava a
imbecilidade…
Eu fui o aventureiro da
Felicidade… Pobre D. Quixote!
- Que dia o Senhor escolheu para viajar,
patrão… Domingo de Carnaval…
E o preto carregador
lamentava. Ele não ouvia, ensimesmado, soturno. Desceu. Chamou um táxi.
- Leve-me ao porto.
- A que horas quer estar lá, senhor?
- Dentro de quarenta minutos.
-Impossível -
declara o chofer. Em dia de carnaval leva-se horas e horas a atravessar
a Avenida.
- Leve-me até onde puder. Irei a pé o resto do
caminho…
Saltou do automóvel e
começou a evitar a multidão alucinada. Sambava-se nas ruas. Paulo Rigger com o
chapéu amassado nas mãos, cabelo revolto, olhos abertos, enraivecido, ia
abrindo caminho a socos e cotoveladas.
- Sai, diabo!
- Eh, meu branco, vamos sambá…
A mulata puxou-o. Os
umbigos uniram-se. Ela dobrou-se, voluptuosa.
- Deixe-me, negra!
- Arrancou dali, a romper a massa.
Afinal, talvez este povo
esteja com razão. No carnaval talvez esteja tudo…
- Com que roupa?...
E a mocinha histérica
jogava-lhe lança-perfumes.
- Vá para o diabo que a carregue!
E notava-se ainda mais infeliz.
Quando chegara da Europa, todo instinto, sabia sentir a carne. Hoje, era dúvida
unicamente…
Alcançou o navio no último
momento. Poucos passageiros, ingleses e argentinos a admirar a cidade que se
vestia de treva.
A noite se apossara do Rio
de Janeiro. Paulo Rigger no tombadilho, comparava a cidade carnavalesca,
envolta em trevas, à sua alma.
De repente, fez-se luz na
cidade, que apareceu brilhante, livre das trevas. O navio afastava-se
vagarosamente…
Paulo Rigger, nervoso,
lábios apertados, olhou. No Corcovado, Cristo, braços abertos, parecia abençoar
a cidade pagã.
Tornou-se maior a tristeza
nos olhos de Paulo Rigger. Levantou os braços num gesto de supremo desespero e
murmurou fitando a imagem gigantesca:
- Senhor, eu quero ser bom! Senhor, eu quero
ser sereno…
Lá longe, desaparecia
lentamente o País do Carnaval
FIM
terça-feira, abril 23, 2013
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