Um Desafio Chamado Europa
Esse “nosso” século XX começou com a 1ª G.G. de 1914/18 (o meu tio Zé Menaia participou dela como maqueiro) onde milhares de soldados, na guerra das trincheiras, morriam para conquistarem um metro de terreno… um metro! No fim, tudo ficou “de pernas para o ar”: a Europa de Napoleão desapareceu, quatro impérios foram destruídos, incluindo o Turco-Otomano. Dinastias imperiais como a das famílias dos Habsburgos, Romanov, Hohenzollern com raízes ainda do tempo das cruzadas chegaram ao fim com uma factura de mais de 19 milhões de mortos.
Depois, a guerra em Espanha, de 1936/39 a qual, depois da 1ª G.G. de 1914/18, foi o acontecimento mais traumático antes da 2ª G. G., aquela em que todos os elementos militares e ideológicos estiveram presentes.
De um lado, a apoiar Franco, a Alemanha Nazi e a Itália Fascista e do outro a União Soviética que se solidarizou com o governo da República. Saldou-se esta guerra por 400.000 mortos em combate, um milhão de presos, 100.000 execuções e um país praticamente destruído cuja reparação só começaria na década de sessenta.
Mal resolvidos que foram os problemas da 1ª G.G. estavam criadas as condições para aquela que haveria de ser a guerra mais abrangente da humanidade: a 2ª G.G. Mundial, 1939/45, iniciada, vejam lá, mais dia, menos dia, na data em que nasci!
Mobilizou mais de 100 milhões de homens que lutaram na Europa, no Oceano Atlântico, África, Médio Oriente, Sudeste da Ásia e Oceano Pacífico.
Os opositores foram, de um lado, o da liberdade, os Aliados, do outro, o Eixo. Ganharam os Aliados com 61 milhões de vítimas, contra 12 milhões do Eixo.
Terminada que foi esta guerra iniciou-se de imediato a chamada Guerra Fria, que por pouco não aqueceu dramaticamente a quando dos mísseis de Cuba, no tempo de Kennedy e de Kruschev, e terminou com a queda do Muro de Berlim em Novembro de 1989 e o início do desmembramento da U.R.S.S.
Como a Guerra Fria não chegou, de facto, a aquecer, os europeus, excepção da região dos Balcãs, podem gabar-se de viver em paz nos últimos 65 anos.
Depois da morte do Marechal Tito que tinha governado em paz como Presidente, de 1953 a 1980, as várias comunidades da Jugoslávia, tirando partido da força da coesão gerada por ter liderado a expulsão dos alemães e pelas suas grandes qualidades de chefe político, estavam criadas as condições para a instabilidade em todo o território daquela que foi a antiga Jugoslávia e que, depois de Tito, passou a ser gerida em sistema de rotatividade pelas 6 Repúblicas que a constituem.
Por volta de 1989 a desordem era notória e a desintegração foi acelerada pela crise económica resultante do desmoronamento do Leste Europeu e, principalmente, pelo aparecimento de partidos ultra-nacionalistas em todas as repúblicas, especialmente na Croácia e na Sérvia.
Estava formado o caldo que iria levar a uma brutal guerra civil com ódios étnicos seculares a virem ao de cima e reflectidos em atrocidades cometidas por todos.
No fim, interrompido à força esse descarregar de ódios, a Sérvia e o Montenegro, em 2002, tornam-se independentes e em 2006 o Montenegro, por Referendo, separa-se da Sérvia. Entretanto, a antiga Jugoslávia tinha desaparecido do Mapa da Europa.
O Kosovo é o último episódio de toda esta dramática confusão étnica, política, social e humana. Aceite por uns, a sua independência não é reconhecida por todos, entre eles a Rússia, e a situação é de impasse tanto mais que a capacidade daquele território se impor autonomamente parece muito frágil.
A enumeração destes acontecimentos trágicos parecia indicar que a Europa está predestinada a sofrer guerras consecutivas com o seu cortejo infindável de dramas humanos como se de uma fatalidade se tratasse.
Na base destes conflitos havia razões de natureza ideológica, ambição política de ditadores, que se misturavam com a disputa de matérias-primas que eram fundamentais para a afirmação e supremacia dos países com ambições de hegemonia europeia e mundial.
Por esta razão, dois senhores, Jean Monnet e Robert Shuman, um francês e outro alemão, considerados “os pais”, os inspiradores de uma Europa com um destino comum, pensaram e levaram a cabo a criação de uma zona para o comércio regulado do carvão e do aço, a CECA (Comunidade do Carvão e do Aço), constituída em 1957, e à qual viriam a aderir, para além da Alemanha e da França, a Bélgica, Luxemburgo, Itália e Países Baixos.
Em 1973 acontece o 1º alargamento para o qual só se colocavam duas condições: os países tinham que se localizar no continente europeu e viverem em regimes democráticos que caracterizam o Estado de Direito.
Entretanto, hoje, são 27 países depois de em 2007 terem entrado a Roménia e a Bulgária a que corresponde uma população de 450 milhões de pessoas e um território de mais de 4 milhões de Km2.
Esta Europa imensa, em que cada parcela é um país que não esquece a sua história, cultura e interesses específicos, com muitas desigualdades entre si, representa um tremendo desafio agravado pela competição não só entre eles como também agora num mundo globalizado.
É por isso, que esta Europa é hoje, ao mesmo tempo, um espaço de esperança para o desenvolvimento e de garantia para a paz e, por outro, de contradições em que cada um pretende travar, a favor de um governo europeu, as inevitáveis transferências de soberania. Apesar disso reclama-se falta coesão e de um projecto político.
Percebe-se que a União Europeia não age verdadeiramente a sério, de acordo com um plano, porque lhe falta a força aglutinadora de um governo que prossiga uma visão de conjunto e os cidadãos, na actual crise financeira que alguns, mais que outros, estão a sofrer, começam a desesperar:
- “Não sei para onde vamos, mas não vamos para nada de bom…” diz o Professor Universitário Illias Evangelon, grego.
- “O euro está doente? A culpa é nossa? Os eurocratas criaram uma zona monetária única mas não um governo nem uma união política para a dirigir…” exclama um sindicalista grego que afirma também que “muitos gregos se sentem tentados pelo regresso ao nacionalismo”.
O social-democrata Helmut Kohl dizia que era preciso acelerar a construção europeia porque os chefes políticos que vierem a seguir a ele e aos da sua geração já não se lembrariam da guerra e voltariam aos nacionalismos que no Séc. XX levaram a duas tragédias mundiais.
Mário Soares, um indiscutível europeísta, político experiente e conhecedor de toda esta realidade que viveu de perto como protagonista, é um crítico do caminho que está a ser seguido:
- “O mundo está e continua em rapidíssima mudança, tornou-se multilateral e multicultural (fenómeno que a chanceler Merkel, com incompreensível falta de visão – imagine-se – afirmou estar ultrapassado) e a globalização, desregulada, fruto das novas tecnologias de comunicação que gerou um capitalismo financeiro-especulativo, dito de casino, sem princípios éticos, em que o dinheiro constitui o valor supremo.
Resultado: os “paraísos fiscais” e os chamados negócios virtuais desarticulando o sistema financeiro-económico existente, provocando falência de bancos e em outras empresas privadas causaram as maiores dificuldades a alguns estados mais fracos, mas também em outros que se julgavam fortes.”
O futuro da europa e do mundo é escrito todos os dias a cada decisão que é tomada. Nada está predestinado. A dinâmica do processo e a rapidez com que tudo acontece exige lideranças políticas de grande qualidade que, nitidamente, estão ausentes e este facto, que é percebido claramente pelos cidadãos, confere ao momento uma componente de grande intranquilidade.
É indispensável coragem, competência e visão política porque a Comunidade Europeia, espaço de paz, de liberdade e respeito pelos direitos humanos, não pode descambar em anarquia que conduz a novos nacionalismos totalitários com o que isso representa de regresso ao passado que ainda está na memória dos mais velhos. É indispensável recordar o que nos aconteceu em vida de muitos de nós… ainda não vão muitos anos!
BOAS FESTAS PARA TODOS E UM BOM 2011! (Tanto Quanto Possível…)