Memórias Futuras
Olhar o futuro pelo espelho retrovisor da história. Qual história? Que futuro?
sábado, janeiro 21, 2017
contra a
“carnificina”...
Nestas coisas da política, pelo menos em termos de discursos, vale
tudo mesmo que seja à custa do mais elementar bom senso dos destinatários.
Trump fez um discurso de posse e perante os presidentes dos últimos
40 anos, except uando Reagan, já
falecido em 2004 e Bush pai, que não assistiu por estar doente, teve o desplante
de afirmar que os triunfos deles não foram os triunfos do povo anunciando até
ter chegado, com ele, o fim da carnificina a que os americanos têm estado
sujeitos com os presidentes anteriores e de quem ele os vem salvar.
Perdeu-se um bom momento para um acidente diplomático histórico
se, pelo menos alguns ex- presidentes, tivessem abandonado a cerimónia.
Se acrescentarmos que estas palavras pertencem a um candidato
eleito que é milionário e que nomeou para o seu governo, para além de generais,
outros milionários como ele, não sobra nenhum respeito pelos cidadãos.
Há quem seja de opinião que a vitória de Trump é filha do medo, o
medo dos outros, do desconhecido, da mudança tecnológica e, vai daí, em vez de
elegerem um Presidente escolhem um patrão que lhes ofereça alguma segurança
contra a ameaça de desemprego...
Com estes “estados de espírito” os discursos populistas são como
manteiga em focinho de cão, lambidos até à ultima gota. Nada há de mais perigoso do que pessoas acossadas e medrosas que
quanto mais receiam mais se expõem.
O medo é útil, ao longo da história da humanidade ter-nos-á salvo
muitas vezes a vida mas agora os riscos que se correm exigem discernimento em
vez de medo.
O mal está feito, Trump foi eleito e de certeza iremos sofrer
mas não aprender com as consequências das suas decisões enquanto presidente e futuro iremos eleger outro Trump
qualquer que nos apareça e eu ainda sou do tempo daquele que era pequenino e usava um ligeiro bigode...
Podemos julgar que a humanidade tem o futuro garantido dado o equi líbrio de forças que se anulam, mas não tem. A China
representa hoje um novo poder, comercial e militar, o que torna estes homens,
grandes, loiros e de melena, que nos caem como moscas na sopa, representarem um
enorme perigo.
sexta-feira, janeiro 20, 2017
A qualidade do discurso de investidura envergonhou Barack Obama |
A Investidura
de
Trump
Hoje, com a investidura de Trump, é um dia triste para a América
que passa a ser representada por uma personalidade simplesmente indecente.
Afirma-se possuidor de uma fortuna de 10.000 milhões de dólares
mas a estimativa, segundo a Forbes, ela não passará de 3.700 milhões, sendo que
a sua dívida está calculada em 450 milhões.
De qualquer maneira, como ele sempre se recusou a apresentar a sua
Declaração de Rendimentos, o que não deve ser fácil com 500 empresas espalhadas
por todo o mundo em 16 ou 17 países, de 4 continentes, para além de ser um
devedor crónico de impostos ao Estado, compreende-se a confusão que se
estabelece no meio de tantos milhões.
O que já não se compreende muito bem é que este homem passe a ser,
a partir de hoje, Presidente da maior, de longe, potencia militar do mundo,
sujando a imagem de um país que tem sido, no pós-guerra, o timoneiro e o fiel equi librador de poderes.
Por isso, o mundo está de luto, os EUA com mais razão e os
americanos de certo envergonhados.
Juntamente com o sinistro Putin e seu aliado Erdogran, temos uma
trilogia que deixam a União Europeia, a contas com a separação da Inglaterra, e
sem uma liderança para alem do Sr. Shauble, que não se recomenda, e nos deixa a
nós, Portugal e os países mais pobres do sul da Europa, em grande fragilidade.
Pacheco Pereira acha Trump tão mau que lhe chama revolucionário, não
no sentido que costumamos usar de lutador pelas liberdades e defesa dos mais
fracos e pobres, mas exactamente pelo contrário.
Ele acredita, ingenuamente, mas eu penso que é apenas um desejo
dele e não ingenuidade, que Trump vai ser vítima de um impeachment como Dilma o
foi no Brasil, mas eu não sou tão opt imista.
Julgo mesmo que a maior curiosidade da política internacional,
dada a projecção da América no mundo, é a de aguardar as cenas que se seguem
nos próximos capítulos porque aquele homem é mau de mais para ser verdade e
durar muito tempo continuando com os seus negócios agora como Presidente dos
EUA.
A minha esperança é que os sistemas de segurança por todo o lado
comecem a tocar as campainhas e, neste aspecto, desejo que ele continue a ser
exactamente tal como ele é para apressar a sua saída.
Como gestor, Trump, chegou aonde chegou por fraudes, expedientes e
incumprimento das suas obrigações. Ora, como ele não pode despedir os cidadãos
americanos como fazia com os trabalhadores das suas empresas, parece-me que a
sua situação como Presidente é insustentável a curto, médio ou longo prazo.
Há erros que se podem fazer em benefício próprio como empresário que
não são possíveis como Presidente...
Mê querido filho... |
CARTA
DE
UMA MÃE
ALENTEJANA
Mê querido filho,
Ponho-te estas poucas
linhas que é para saberes que tôu viva.
Escrevo devagar porque sei que não gostas de ler depressa.
Se receberes esta carta, é porque chegou. Se ela não chegar, avisa-me que eu
mando outra.
O tê pai leu no jornal que a maioria dos acidentes ocorrem a1 km de
casa. Por isso, mudámo-nos pra mais longe.
O tê pai leu no jornal que a maioria dos acidentes ocorrem a
Sobre o casaco que querias, o tê tio disse que seria muito
caro mandar-to pelo correio por causa dos botões de ferro que pesam muito.
Assim, arranquei os botões e meti-os no bolso. Quando chegar aí prega-os de
novo.
No outro dia, houve uma explosão na botija de gás aqui na cozinha. O pai e eu fomos atirados pelo ar e
caímos fora de casa. Que emoção: foi a primeira vez, em muitos anos que o tê
pai e eu saímos juntos.
Sobre o nosso cão, o
Joli, anteontem foi atropelado e tiveram de lhe cortar o rabo, por isso toma
cuidado quando atravessares a rua.
Na semana passada, o médico veio visitar-me e colocou na
minha boca um tubo de vidro. Disse para ficar com ele por duas horas sem falar.
O tê Pai ofereceu-se para comprar o tubo.
A tua irmã Maria vai ser mãe, mas ainda não sabemos se é
menino ou menina.
Portanto, nã sei se vais ser tio ou tia.
O tê mano Antóino deu-me
hoje muito trabalho. Fechou o carro e deixou as chaves lá dentro. Tive de ir a
casa, pegar a suplente para a abrir. Por sorte, cheguei antes de começar a
chuva, pois a capota estava aberta.
Se vires o Sr. Alcino, diz-lhe que mando lembranças. Se nã
o vires, nã lhe digas nada.
Tua Mãe Maria
quinta-feira, janeiro 19, 2017
Falando
com um amigo, este diz-lhe:
- Come pão, muito pão! É formidável para o sexo. O pão contém amido, tu vais ver o resultado...
- Come pão, muito pão! É formidável para o sexo. O pão contém amido, tu vais ver o resultado...
O
velhote, de seguida, sai disparado para a padaria e pede 5 pães
alentejanos.
-
Vocemecê tem convidados, sô Maneli? – interroga a padeira.
- Nã, senhori, é tudo pra mim...
- Vocemecê é que sabi sô Maneli, mas olhe que ele vai ficar duro!!!
- Ah, ah ! – diz o velhote com malícia – vejo que vocemecê tamêm já tá ó correnti
- Nã, senhori, é tudo pra mim...
- Vocemecê é que sabi sô Maneli, mas olhe que ele vai ficar duro!!!
- Ah, ah ! – diz o velhote com malícia – vejo que vocemecê tamêm já tá ó correnti
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe – todos eles príncipes – na vida.
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana…
Arre, estou farto de semi -deuses!
Onde é que há gente no mundo?”
Fernando Pessoa
St. Marteen, ilha a sul de Porto Rico que há uns bons anos atrás, em férias, tive oportunidade de visitar
Primeiro elegem-no e depois protestam?... |
Não há
desculpas...
O
homem não enganou ninguém, não escondeu nem disfarçou olhando mesmo para os
seus concidadãos com desfaçatez, quase em ar de troça.
Ele
tem uma América que é dele, a América dos deslumbrados, que os há em todos os
países e em todos os lados, que gostam deles quanto piores melhores... numa espécie
de vertigem, de atracção pelo abismo, do género daqueles bichinhos que caminham
uns atrás dos outros até caírem todos da rocha abaixo.
Parece
que a humanidade está desinteressada do futuro, cansada de viver e a América, única
grande potencia que existe pode, perfeitamente, desequi librá-la com o seu timoneiro, grande e loiro, boné encarnado na cabeça, na proa do navio,
directo ao choque frontal com o iceberg.
Como
diz Fonseca Ferreira, Obama terá sido um simples ramal que, por muito bom que
tenha sido, teve o azar de nos conduzir a Trump e este é que vai ser investido
como Presidente, por muitas manifestações e desfiles que os americanos façam
dizendo:
- “Este não é o meu Presidente!”
- “Este não é o meu Presidente!”
Trump
não é um homem normal e quem votou nele não se apercebeu que ele não é mesmo
normal.
Há dias,
o Guardian fez o título certo:
- “Deixem
de tomar Donald Trump como um Presidente normal porque ele não o é”.
Ele
irá ser o Presidente que inicia uma nova época, fruto do voto do desespero e
descontentamento, não dos que não tinham nada mas sim daqueles que querem mais ou
diferente.
Até
aqui foi a época do “antes do Trump”
seguir-se-à a de “depois do Trump” sem se saber bem, neste momento, o que será “a
de depois”, perante um fulano que para além de não ser normal é imprevisível.
A
América vai deixar de ser um país decente, sem que tenhamos a certeza que o
sistema que Trump herda, de uma sociedade de honra, princípios e valores, tem
suficientes anti-corpos que funcionem como salvaguarda do que conhecemos e
estamos habituados num país que é a única super-potência do mundo.
Inacreditável
que estejamos na mão de um anormal, perito em concursos de beleza feminina de Misses
Universos e especializado em falências fraudulentas e fuga aos impostos.
Será
que os americanos, lá por terem sido capazes de eleger um Barack Obama, e reelegê-lo,
têm agora o direito de porem à frente do país e do mundo um tipo grande, loiro
e de "melena", reconhecido pela imprensa internacional como anormal?...
terça-feira, janeiro 17, 2017
Ele próprio reconhece que não é certo da caça... |
As
ameaças
ameaças
do
futuro...
A
democracia, o voto popular, a liberdade, não têm, afinal, tanta importância
quanto isso porque o processo das escolhas está viciado.
Vejamos
a campanha de Trump e a sua vitória baseada nas promessas eleitorais:
- “Eu
vou acabar com o Obamacare, (uma espécie de Serviço Nacional de Saúde lá do sítio),
um "sítio" onde quem não tem dinheiro para pagar a uma Companhia de Seguros, fica
entregue a si próprio em termos de assistência médica.
Afinal,
o Obamacare a que Trump ameaçou pôr termo, estará apenas a ser substituído por
outro, igual, mas com outro nome, o Affor Care Act...
Quanto
às mulheres, Trump não esqueceu a sua misoginia e pensa punir aquelas que
recorram ao aborto.
A
prometida redução de impostos para as empresas, afinal, só será verdadeira
para as grandes empresas, ou seja, as do futuro Presidente, essas sim, irão
beneficiar de um sistema fiscal amigo.
E
os próprios jornais, aqueles de quem ele aceita que lhe façam perguntas, são
escolhidos por si segundo critérios pessoais da sua simpatia e próprio interesse, numa afronta
directa à liberdade de imprensa e dos leitores.
Pior
seria difícil e vive-se já num autêntico estado de indignação prometedor de que
o futuro Presidente não vai durar muito porque sendo incapaz de se aperfeiçoar chegar-se-á a uma situação insustentável.
Trump
é um homem soberbo que impressiona os cidadãos pelo “quanto pior melhor”,
desrespeitando-os descaradamente como faz aos seus empregados, menos
despedi-los só porque é impossível.
Soberbo
e fanfarrão, que desperta o asco e coloca quem votou nele no papel difícil de
autores de uma catástrofe social e política, uma espécie de tsunami de
egocentrismos como se no mundo só houvesse ele e os seus interesses.
Num
destes próximos dias irá tomar posse numa cerimónia que vai primar pela abstenção
de centenas de milhares de pessoas contrastando com a de Obama, 44º Presidente
dos E.U.A., em 20 de Janeiro de 2009, que estabeleceu o recorde da maior assistência
pública de qualquer evento já realizado em Washington, a provar que os
americanos são capazes de surpreender pelo o melhor e o pior.
segunda-feira, janeiro 16, 2017
Hoje de manhã, antes de sair de casa para tomar o meu pequeno-almoço, eu digo pequeno mas aquela meia torrada em pão caseiro com o “abatanado pingado” sabem-me tão bem que ousaria chamar-lhe, com mais propriedade, de “o grande almoço”, tocaram-me à porta.
- O senhor sabe qual é o futuro? – perguntou-me uma senhora, provavelmente ligada às “Testemunhas de Jeová”.
- Não sei, minha senhora, nem quero saber. Muito bom-dia e passe bem.
Estava terminada a conversa do futuro.
Claro que ela queria aproveitar-se da minha confessada ignorância do futuro para me “vender” o seu futuro e eu, delicadamente, despedi-a.
Que levará estas pessoas, a meio da manhã, a andarem de porta em porta a perguntarem se sabemos o futuro quando a resposta é daquelas que valem um "milhão" para quem a souber?...
Se estivesse mal disposto perguntar-lhe-ia se ela achava que se eu soubesse qual era o “futuro” lho ia dizer a ela... mas estas crenças das Testemunhas do Jeová são tão desconchavadas e estão de tal forma arreigadas, que desdizê-las é tão grave como concordar com elas. Mas que eu acredito no futuro, acredito...
Em finais de 1976 eu atravessava o pior “presente” da minha vida e foi nesse momento difícil que recebi a visita de um amigo que por acaso era vidente no sentido de que pressagiava o futuro, e que eu tinha conhecido em Moçambique.
Nunca acreditei nos futuros adivinhados por outras pessoas e por isso, mesmo desabafando com ele na qualidade de amigo, não me lembrei sequer de lhe pedir que se socorresse das suas faculdades paranormais para me dar uma palavra de ânimo mas ele, com algum pudor, atreveu-se, talvez pela angústia do meu estado de alma que era bem patente, pedir-me que lhe mostrasse a palma da mão e olhando para ela, com palavras calmas, descansou-me relativamente à minha vida futura. E assim foi, cerca de três meses depois daquela conversa, retomei o meu trabalho como funcionário público e tudo foi regressando à sua normalidade.
Como dizem os “nuestros hermanos”: “eu não acredito em bruxas mas lá que as há, há!...”
Nunca mais voltei a ver o meu amigo Salva que tendo chegado de Moçambique de visita a Portugal em 1976, tal mensageiro dos deuses, me procurou com tenacidade tendo-me desencantado numa casa que me tinha sido cedida por amizade do seu proprietário, num monte alentejano, no concelho de Abrantes, junto à aldeia dos meus avós, para me dar duas “notícias”: a primeira, que tinha brigado numa esplanada da cidade da Beira para defender a minha honestidade como funcionário público e a segunda, a que eu mais precisava de ouvir, foi de esperança no meu futuro.
Amigo Salva, se ainda fores vivo, ao fim de todos estes anos, quero que saibas que enquanto por cá andar estar-te-ei sempre grato.
domingo, janeiro 15, 2017
– Os Replicadores
Recuemos, na
companhia de Richard Dawkins, cerca de 4.000 milhões de anos, para ele nos
explicar, com base nos actuais conhecimentos científicos, como terá aparecido a
vida no planeta Terra.
Por definição ninguém estava presente
para assistir ao que aconteceu e por isso existem algumas teorias rivais mas
todas elas com características comuns e aquela que é apresentada por R. Dawkins
não andará muito longe da verdade.
A evolução por selecção natural é
satisfatória porque nos mostra uma forma pela qual a simplicidade se poderia
ter transformado em complexidade, com átomos desordenados a agruparem-se em
estruturas cada vez mais complexas e como tudo terá começado pela sobrevivência
das «coisas estáveis» o que, de acordo com a Teoria de Darwin, corresponde à
«sobrevivência do mais apt o» com a
eliminação das «coisas instáveis», menos apt as.
Vamos, agora, falar dos Replicadores que são os antepassados dos
Genes.
Antes da vida aparecer sobre a Terra
não sabemos bem que matérias-primas abundavam mas entre as mais plausíveis
teríamos a água, o dióxido de carbono, o metano e a amónia que são compostos
simples que sabemos estarem presentes em alguns dos outros planetas do nosso
sistema solar.
Recentemente, fizeram-se experiências
laboratoriais simulando as condições químicas da Terra antes do aparecimento da
vida e foi possível produzir substâncias orgânicas chamadas «purinas» e
«pirimidinas» que são já blocos da construção da molécula genética do próprio
ADN.
Se tivéssemos encontrado estes
elementos em Marte diríamos logo que eles eram um sinal da presença de vida naquele
planeta.
Processos análogos a estes
desenvolvidos agora em laboratório devem ter originado um «caldo primitivo»
que, na opinião de biólogos e químicos, constituíram os mares de há 4.000
milhões de anos atrás.
Essas substâncias orgânicas
concentravam-se localmente, talvez na espuma que secava nas margens desses
mares e sob a influência posterior de energia, como a luz ultravioleta do sol,
combinavam-se em moléculas maiores.
Se fosse hoje, essas moléculas
orgânicas não durariam sequer o tempo suficiente para serem notadas porque logo
outras bactérias ou outros seres vivos as absorveriam, mas quando essas
moléculas boiavam no caldo primitivo mais nada ainda existia pois tudo o resto
só apareceria posteriormente e portanto elas podiam boiar nesse caldo cada vez
mais denso sem serem molestadas.
Num determinado momento, por
acidente, formou-se uma molécula particularmente notável a que vamos chamar o
Replicador porque tinha essa propriedade extraordinária de ser capaz de criar
cópias.
Este acidente, que está na origem do
aparecimento do Replicador, tinha muito poucas probabilidades de acontecer,
provavelmente tantas quantas aquelas que nós temos de acertar no jackpot do
euromilhões, quase impossível nos poucos anos de vida que temos para apostar.
Mas tempo era aqui lo
que não faltava ao planeta Terra e por essa razão, no decorrer dos muitos
milhões de anos da sua existência, surgiu um dia essa molécula, que não terá
sido necessariamente nem a maior nem a mais completa, mas que criava cópias de
si própria.
Tivesse o homem a possibilidade de apostar todas as semanas
durante 100 milhões de anos e o improvável, quase impossível, tornar-se-ia mais
que provável e ganharíamos não um mas vários prémios do Euromilhões.
É que os conceitos de provável e de
improvável têm a distingui-los apenas o factor tempo porque ambos se referem a
coisas possíveis de acontecerem.
Depois, era apenas necessário que
essa molécula aparecesse uma vez…o resto seria com ela.
Temos, portanto, vários tipos de
blocos moleculares no tal caldo primitivo onde, a partir de um determinado
momento, circulava o Replicador.
Supondo agora que cada um desses
blocos tem afinidades para com os seus iguais, quando um bloco, vindo do caldo,
se encontrar próximo de uma parte do Replicador para o qual tenha afinidade,
tenderá a aderir a ele.
Os blocos que aderirem ao Replicador
dispor-se-ão, automaticamente, numa sequência idêntica à do próprio Replicador
numa cadeia estável semelhante ao Replicador original.
Este processo poderia continuar com
um empilhamento progressivo, camada após camada pois é também assim que se
formam os cristais.
As duas cadeias podiam separar-se e
passaríamos a ter dois Replicadores, cada um dos quais poderia continuar a
produzir outras cópias de si mesmo.
Uma possibilidade mais complexa é a
de que a afinidade acontecesse, igualmente, não para os seus iguais mas para um
outro tipo particular de bloco e sendo assim, o Replicador actuaria como padrão
não para uma cópia idêntica mas para uma espécie de «negativo» exactamente igual
ao positivo original.
Neste momento, para os nossos
propósitos, não importa muito que este processo de replicação original fosse
positivo-positivo ou positivo-negativo, pois o importante a salientar é que,
subitamente, uma nova forma de estabilidade apareceu no mundo.
Antes das moléculas replicadoras
terem aparecido, muito naturalmente, nenhum outro tipo de molécula seria muito
abundante no “caldo primitivo” porque tudo estava dependente dos blocos
moleculares assumirem, de forma acidental, configurações estáveis, mas quando
surgiu o Replicador este deverá ter espalhado pelo mar as suas cópias e os
outros blocos de moléculas mais pequenos tornaram-se um recurso escasso até
chegarmos a uma grande população de réplicas idênticas.
Mas, qualquer processo de replicação obedece a uma regra: nada é
perfeito, ocorrem erros.
Vamos dar um exemplo de erros num
processo de replicação:
- Antes da invenção da tipografia os
livros eram copiados à mão e isso aconteceu com os Evangelhos mas todos os
escribas, por mais cuidados que tivessem, cometiam erros e outros até nem
resistiam à tentação de fazerem pequenos «melhoramentos» nos textos.
Se todos copiassem de um único
original o sentido não seria grandemente deturpado mas sendo as cópias feitas
de outras cópias os erros começariam a acumular-se e tornar-se-iam sérios.
A primeira ideia que temos do erro é
que ele é prejudicial e no caso de documentos humanos é difícil pensar em
exemplos em que o erro possa ser encarado como um benefício.
Os eruditos da versão grega do Antigo Testamento traduziram
erradamente a palavra hebraica para «mulher jovem» pela palavra grega para
«virgem» e com este erro foram reproduzidos todos os textos de então para cá
dando origem à seguinte profecia: “Eis que uma virgem conceberá e dará à luz um
filho…” o que é consideravelmente diferente, com as inevitáveis consequências,
de uma outra profecia que teria rezado assim: “Eis que uma mulher jovem
conceberá e dará à luz um filho…”
Mas se saltarmos dos documentos
humanos para a biologia e, neste caso concreto para os Replicadores, o erro
pode, em vez de ser uma desvantagem, representar uma melhoria essencial para a
evolução progressiva da vida.
Os descendentes dos Replicadores, as
actuais moléculas de ADN, são admiravelmente fiéis mesmo comparando com a mais
alta-fidelidade, mas mesmo elas cometem erros de cópia que estão na origem da
diversidade dos seres vivos e consequentemente da evolução possível.
Muito provavelmente, os Replicadores
originais era bem mais imprecisos e os erros davam origem a cópias imperfeitas
que se formavam e propagavam enchendo o «caldo primitivo» não de réplicas
idênticas mas de diversas variedades de moléculas replicadoras todas
“descendentes” do mesmo antepassado.
Estas diversas variedades de
moléculas replicadoras entraram em «competição», em primeiro lugar porque não
tinham todas a mesma «longevidade» e as que duravam mais, logicamente, tinham
mais tempo para produzir cópias de si próprias dando lugar a uma tendência
evolutiva na direcção de uma maior longevidade.
Mas a longevidade não era o único
factor com influência no maior ou menor número de uma determinada variedade de
moléculas replicadoras, a «fecundidade» era outro.
Suponhamos que a molécula reprodutora
do tipo A forma cópias de si própria uma vez por semana, em média, e as do tipo
B formam cópias de hora a hora.
É evidente, numa hipótese destas, que
a molécula do tipo A, mesmo com maior longevidade do que a do tipo B, ficaria
em minoria.
Finalmente, um terceiro factor nesta
competição pelo predomínio:
Suponhamos que as variedades de
moléculas reprodutoras do tipo X e Y apresentam a mesma longevidade e a mesma
velocidade de se copiarem, mas a do tipo X comete menos erros de cópia pelo que
terá mais «descendentes» do que a do tipo Y que, no lugar daqueles, terá mais
“mutantes” que terão outras descendências.
A cópia de erros é um requi sito
para que ocorra evolução e esta pode parecer uma “coisa boa”, especialmente
porque nós somos filhos dela, mas na realidade não há nada que queira evoluir.
A evolução é qualquer coisa que
acontece quer queiramos ou não, apesar de todos os esforços dos replicadores
para evitar que ela aconteça.
Voltando ao «caldo primitivo», se
tivesse sido possível colher duas amostras retiradas em dois momentos
diferentes separados de alguns milhões de anos, verificar-se-ia que a segunda
amostra conteria uma maior proporção de variedades de moléculas replicadoras
com mais elevada longevidade/fecundidade/fidelidade de cópia e este é,
essencialmente, o sentido da evolução do ponto de vista biológico no que se
refere aos seres vivos e ao mecanismo da selecção natural.
Mas será que as moléculas originais
replicadoras estavam vivas?
Que importa isso?
Seja qual for a resposta não altera
os factos, a história das moléculas replicadoras terá sido, sensivelmente,
aquele que foi descrito independentemente de considerá-las «vivas» ou não.
Elas, as células Reprodutoras, foram os antepassados da vida:
foram os nossos fundadores.
Finalmente a competição para a qual Darwin chamou a atenção, não
a pensar em moléculas, mas em plantas e animais.
O «caldo primitivo» tinha uma
capacidade limitada para conter moléculas replicadoras, não só porque a Terra é
um espaço finito, mas também porque os blocos construtores devem ter sido
utilizados a um ritmo tal pelas replicadoras quando elas eram já muito
abundantes que se tornaram num bem escasso e precioso e daí a competição por
eles.
Nessa «luta» os Replicadores menos
favorecidos diminuíram de número e muitos ter-se-ão extinguido.
Eles não sabiam que estavam a lutar,
tão pouco se preocupavam com isso, era luta sem ressentimentos, aliás, sem
sentimentos de qualquer espécie mas lutavam, porque qualquer erro de cópia que
resultasse num maior nível de estabilidade relativamente aos seus rivais era
preservada e multiplicava-se automaticamente.
Com o tempo, esta luta foi-se
aperfeiçoando e alguns dos Replicadores devem mesmo ter «descoberto» como
quebrar qui micamente moléculas de
variedades rivais e como usar os blocos construtores assim libertos para
produzir as suas próprias cópias.
Estes protocarnívoros, em simultâneo,
obtinham alimento e removiam competidores.
Outros Replicadores talvez tenham
«descoberto» como se protegerem a si próprios quer qui micamente,
quer erguendo uma barreira física de proteína à sua volta constituindo, assim,
as primeiras células vivas.
Começa aqui
uma nova fase em que os Replicadores já não se limitam a existir mas também a
construir invólucros, veículos para a preservação da sua existência,
transformando-se em «Máqui nas de
Sobrevivência».
Inicialmente, essa máqui na de sobrevivência teria sido constituída apenas
por um revestimento protector mas com o aumento progressivo da competição essas
máqui nas tornaram-se maiores e mais
elaboradas num processo cumulativo e progressivo.
Teria de haver algum fim para o
aperfeiçoamento gradual das técnicas e dos artifícios usados pelos Replicadores
para assegurarem a sua continuidade no mundo?
Haveria tempo de sobra para
aperfeiçoamentos e por isso perguntamos:
Que máqui nas
bizarras de auto preservação trariam consigo nos milénios seguintes?
Qual terá sido o destino, 4.000 milhões de anos depois, para os
primeiros Replicadores?
Não se extinguiram, pois são mestres
antigos nas artes da sobrevivência mas também não andam para aí a flutuar
livremente no mar porque há muito tempo que abandonaram essa sua liberdade de
cavaleiros andantes.
Agora agrupam-se em colónias imensas,
seguros no interior de gigantescos robots desajeitados, afastados do mundo
exterior, comunicando com ele através de vias indirectas e tortuosas,
manipulando-os por controlo remoto.
Estão dentro de si e de mim; criaram-nos, de corpo e de mente e
a sua preservação é a razão da nossa existência.
Percorreram um longo caminho, esses
Replicadores.
Agora respondem pelo nome de Genes e as suas «Máqui nas de Sobrevivência»… somos nós.