Lembranças da guerra
Lembranças da Guerra (Cont.)
A Companhia 389 que estava sedeada na povoação do Pango Aluquém ficou moralmente destroçada com a morte dos camaradas vítimas da emboscada que sofreram quando faziam a protecção aos trabalhadores civis que procediam à reparação da estrada que ligava o Pango ao Úcua, onde se encontrava a minha Companhia, a 388.
Houve mesmo soldados que ficaram possuídos pelo medo de morrerem e recusavam-se a obedecer às ordens e a saírem dos seus improvisados quartéis.
Éramos todos muito jovens e não tínhamos nenhuma experiência, nem da guerra, nem de África e aquelas baixas, duas ou três semanas logo após a nossa chegada, sentimo-las como se fossem a primeira execução de uma generalizada sentença de condenação à morte faltando apenas saber quando e quais aqueles que iriam seguir-se.
À dor pelos companheiros que tinham desaparecido juntava-se agora o medo de, a seguir, sermos nós a desaparecer.
Infelizmente, nessa altura, ainda não se falava do “apoio psicológico” mas, mesmo que o houvesse, quando a dor bate fundo o remédio é mesmo sofrer e deixar que o tempo vá concertando as feridas.
O Comandante de Batalhão, o Coronel Braga Paixão, homem inteligente, fez o que estava mais indicado numa situação daquelas.
Digamos que desmontou a Companhia trocando os Grupos de Combate ou Pelotões, na denominação clássica, com os das outras Companhias do Batalhão permitindo que os soldados, na sua quase totalidade, mudassem de local e pudessem conviver com outros colegas que não tendo sido tão directamente atingidos estavam mais capazes de os ajudarem.
Agora, tantos anos depois, podemos já pensar friamente no que aconteceu e apontar o dedo ao graduado que comandava a força e que, ou foi desobedecido nas instruções dadas ou não as deu correctamente, de forma, senão a evitar, pelo menos a diminuir as consequências daquele ataque em que o inimigo actuou completamente à vontade, senhor da situação e só não conseguiu o êxito total porque o meu jeep, por mera casualidade, apareceu sem ser esperado, vindo em sentido contrário.
A guerra subversiva é uma espécie de luta entre o gato e o rato e ali, enquanto nós éramos o rato, o inimigo fazia de gato e, sendo assim, sempre que os mecanismos defensivos dos segundos não eram superiores aos do primeiro, os ratos acabavam, irremediavelmente, na boca dos gatos e foi isso que aconteceu.
A missão de proteger diariamente um grupo de trabalhadores que reparavam a estrada, passando sempre pelos mesmos sítios e sensivelmente às mesmas horas, constituía um risco demasiado grande que não foi devidamente acautelado e devia tê-lo sido pois que, pelo menos ao nível dos oficiais, o treino e a preparação recebida foram suficientes para se saber como proceder em situações daquelas.
Infelizmente, na guerra, os erros pagam-se com a vida e foi o que aconteceu…os meus camaradas foram, ingenuamente, meter-se na boca do inimigo por não cumprirem os ensinamentos dos manuais da guerra subversiva.
Acredito que tivessem procedido correctamente no primeiro dia e em alguns dos outros que se seguiram, tempo suficiente para ganharem confiança e relaxarem na atenção e nas regras de como deviam progredir no terreno pensando que, se nada tinha acontecido até então, é porque já não iria acontecer e assim, já se podia ir desatento, a ver revistas e o Unimog, demasiado afastado das restantes viaturas que o precediam, ficou isolado “na zona de morte” da emboscada.
Penso mesmo, que ela já lá estava montada há mais dias aguardando pacientemente que o erro acontecesse…
Lembro-me, como se fosse hoje, do conselho de um dos Alferes, mais velho, que no fim da sua Comissão, quando o fomos substituir, nos disse à despedida:
-“Não se esqueçam que vocês nunca os vêm mas eles vêem-vos permanentemente e só esperam pelos vossos erros.”
Erros deste género foram cometidos na última viagem de regresso a Luanda por militares que tinham acabado a Comissão na Região de Nabuangongo e iam embarcar para Portugal.
A Companhia 389 que estava sedeada na povoação do Pango Aluquém ficou moralmente destroçada com a morte dos camaradas vítimas da emboscada que sofreram quando faziam a protecção aos trabalhadores civis que procediam à reparação da estrada que ligava o Pango ao Úcua, onde se encontrava a minha Companhia, a 388.
Houve mesmo soldados que ficaram possuídos pelo medo de morrerem e recusavam-se a obedecer às ordens e a saírem dos seus improvisados quartéis.
Éramos todos muito jovens e não tínhamos nenhuma experiência, nem da guerra, nem de África e aquelas baixas, duas ou três semanas logo após a nossa chegada, sentimo-las como se fossem a primeira execução de uma generalizada sentença de condenação à morte faltando apenas saber quando e quais aqueles que iriam seguir-se.
À dor pelos companheiros que tinham desaparecido juntava-se agora o medo de, a seguir, sermos nós a desaparecer.
Infelizmente, nessa altura, ainda não se falava do “apoio psicológico” mas, mesmo que o houvesse, quando a dor bate fundo o remédio é mesmo sofrer e deixar que o tempo vá concertando as feridas.
O Comandante de Batalhão, o Coronel Braga Paixão, homem inteligente, fez o que estava mais indicado numa situação daquelas.
Digamos que desmontou a Companhia trocando os Grupos de Combate ou Pelotões, na denominação clássica, com os das outras Companhias do Batalhão permitindo que os soldados, na sua quase totalidade, mudassem de local e pudessem conviver com outros colegas que não tendo sido tão directamente atingidos estavam mais capazes de os ajudarem.
Agora, tantos anos depois, podemos já pensar friamente no que aconteceu e apontar o dedo ao graduado que comandava a força e que, ou foi desobedecido nas instruções dadas ou não as deu correctamente, de forma, senão a evitar, pelo menos a diminuir as consequências daquele ataque em que o inimigo actuou completamente à vontade, senhor da situação e só não conseguiu o êxito total porque o meu jeep, por mera casualidade, apareceu sem ser esperado, vindo em sentido contrário.
A guerra subversiva é uma espécie de luta entre o gato e o rato e ali, enquanto nós éramos o rato, o inimigo fazia de gato e, sendo assim, sempre que os mecanismos defensivos dos segundos não eram superiores aos do primeiro, os ratos acabavam, irremediavelmente, na boca dos gatos e foi isso que aconteceu.
A missão de proteger diariamente um grupo de trabalhadores que reparavam a estrada, passando sempre pelos mesmos sítios e sensivelmente às mesmas horas, constituía um risco demasiado grande que não foi devidamente acautelado e devia tê-lo sido pois que, pelo menos ao nível dos oficiais, o treino e a preparação recebida foram suficientes para se saber como proceder em situações daquelas.
Infelizmente, na guerra, os erros pagam-se com a vida e foi o que aconteceu…os meus camaradas foram, ingenuamente, meter-se na boca do inimigo por não cumprirem os ensinamentos dos manuais da guerra subversiva.
Acredito que tivessem procedido correctamente no primeiro dia e em alguns dos outros que se seguiram, tempo suficiente para ganharem confiança e relaxarem na atenção e nas regras de como deviam progredir no terreno pensando que, se nada tinha acontecido até então, é porque já não iria acontecer e assim, já se podia ir desatento, a ver revistas e o Unimog, demasiado afastado das restantes viaturas que o precediam, ficou isolado “na zona de morte” da emboscada.
Penso mesmo, que ela já lá estava montada há mais dias aguardando pacientemente que o erro acontecesse…
Lembro-me, como se fosse hoje, do conselho de um dos Alferes, mais velho, que no fim da sua Comissão, quando o fomos substituir, nos disse à despedida:
-“Não se esqueçam que vocês nunca os vêm mas eles vêem-vos permanentemente e só esperam pelos vossos erros.”
Erros deste género foram cometidos na última viagem de regresso a Luanda por militares que tinham acabado a Comissão na Região de Nabuangongo e iam embarcar para Portugal.
A alegria de terem chegado ao fim e os festejos que precederam a partida retirou-lhes a concentração e a capacidade para observarem todas as normas de segurança que sempre se impunham mesmo na última viagem, especialmente nessa.
O tempo passou e o Quartel-General em Luanda decidiu que o exército devia, em colaboração com os donos das roças de café que continuavam abandonadas desde os ataques de Março de 1961, proceder à reocupação dessas explorações de forma a que a produção do café, principal riqueza de toda aquela zona norte de Angola, fosse novamente relançada.
Coube-me a mim e ao meu Pelotão, na zona que pertencia ao meu Batalhão, reocupar a fazenda Rainha Santa, abandonada desde o início da guerra que começou por ser de catanas mas que então, dois anos mais tarde, já contava com muitas armas automáticas algumas delas do próprio exército português caídas em seu poder nas acções de combate.
E lá fomos, com um cozinheiro, o panelão, mais uns tachos e panelas, um jeep, um Unimog e um atrelado, reconquistar território ao inimigo…
Devo confessar que, pela minha própria natureza, nunca me consegui imbuir de espírito guerreiro tendo-me mantido sempre como um empedernido civil, ainda que vestido de camuflado, com a única preocupação de sair dali vivo juntamente com o resto da rapaziada.
Esta circunstância ajudou-me, tornou as “coisas mais leves” e, por outro lado, ao fim de uns meses, aquela massa verde de vegetação omnipresente, quase asfixiante e que ao princípio me aterrorizava, já não me era estranha, a pouco e pouco fui-me apercebendo de que perigoso era estar fora dela, principalmente nas estradas e caminhos.
A mata, como lhe chamavam, afinal era protectora, escondia-nos, protegia-nos e se nos soubéssemos deslocar nela, sem ruídos, até podíamos surpreender em vez de sermos surpreendidos embora nunca tivesse sido essa a minha preocupação.
Assumi, para comigo, como objectivo, defender-me e aos meus soldados, deixando que a guerra, se a houvesse, passasse ao lado… do género, se eles estivessem para a esquerda iria para a direita, isto, claro, se dependesse só de mim e assim foi muitas vezes.
Aquela guerra nunca me convenceu e a confrontação com o inimigo, que também só acontecia se ele quisesse, reduzia-se a encontros com gentes indefesas que viviam refugiadas no mato procurando sobreviver, muitas vezes entre o medo que a tropa aparecesse e a necessidade de agradar aos guerrilheiros.
No entanto, de acordo com as instruções do Quartel-General, tudo quanto mexesse no mato era para matar ou então, se possível, apanhá-los à mão para os interrogar obrigar a confessar onde se encontravam os quartéis dos guerrilheiros.
Mas a circunstância da guerra ser quase toda ela feita por milicianos pôs em causa o cumprimento de certas directrizes dos senhores que comandavam a guerra de Luanda instalados em gabinetes com ar condicionado.
Um Alferes de outro Batalhão, disseram-me que era professor, não tive o prazer de o conhecer, encontrou na mata, fortuitamente, um grupo dessas pessoas.
Teve com elas um diálogo esclarecedor sobre o que as esperava se regressassem com ele de novo para o convívio com as autoridades portuguesas face às dificuldades porque também passavam vivendo fugidos no mato obrigados a apoiar os guerrilheiros que supostamente os deviam proteger.
Não os obrigou a acompanhá-lo e eles decidiram continuar a viver no mato e o Alferes regressou à base, só, com os seus soldados, sem direito a medalha mas satisfeito consigo por ter actuado de acordo com aquilo que lhe ditava a sua consciência.
A Guerra Colonial teve os seus horrores como todas as guerras mas tê-los ia tido muito mais senão fosse o comportamento dos oficiais subalternos milicianos que foram, no terreno, os grandes protagonistas daquela guerra.
Não tenho mesmo dúvidas de que, em matéria de horrores, e os testemunhos trazidos agora a público na série do Joaquim Furtado ajudaram a desfazê-las, as grandes atrocidades, injustas e completamente gratuitas, cometidas sob a psicose do medo, ódio e vingança, pertenceram aos portugueses que viviam em Angola e que muitas vezes censuravam os militares por serem demasiado brandos na sua actuação.
Recordo, a este propósito, muitos meses mais tarde, já na região do Alto-Zambeze, concretamente no Lumbala, distrito de Cazombo, um camionista português que convidei para almoçar quando me pediu para lhe vender pão.
Sentados à mesa ele reparou nos inúmeros jovens que residiam nas aldeias circunvizinhas e que de dia estavam por ali, dentro do aquartelamento, convivendo com os soldados, a alguns dos quais prestavam serviços na lavagem da roupa, como era hábito, e também porque frequentavam uma escola que pus a funcionar com a colaboração de um cabo que desempenhava muito bem as funções de professor.
Pois o camionista, branco, português, sem que nada o fizesse esperar, sentado à minha frente, virou-se na direcção para onde estavam os miúdos e simulando o disparar uma espingarda metralhadora disse-me com uma fria crueldade no olhar: “matava-os todos!”
Sem querer acreditar no que ouvia levantei-me e disse-lhe, calmamente, para sair dali e nunca mais me aparecer.
_Que tinha acontecido na cabeça daquele homem?
_Que distúrbios se tinham produzido?
_ A circunstância de pertencer a uma minoria de brancos acossada e em risco de perder privilégios podia ajudar a explicar alguma coisa?
Mas quais privilégios se o trabalho dele era dos mais duros, agarrado ao volante de um camião que, provavelmente, nem direcção assistida tinha e conduzindo em estradas em que se saía de um buraco para entrar noutro, consecutivamente durante quilómetros e quilómetros, horas e horas seguidas?
Qualquer coisa de verdadeiramente doentio se apossou e desenvolveu no espírito daquele homem encorajado e estimulado por um ambiente social de rutura entre brancos e negros em que as posições se estremaram e os instintos mais primários se impuseram tendo em vista a sobrevivência de uma forma irracional e desumana.
(cont.)
O tempo passou e o Quartel-General em Luanda decidiu que o exército devia, em colaboração com os donos das roças de café que continuavam abandonadas desde os ataques de Março de 1961, proceder à reocupação dessas explorações de forma a que a produção do café, principal riqueza de toda aquela zona norte de Angola, fosse novamente relançada.
Coube-me a mim e ao meu Pelotão, na zona que pertencia ao meu Batalhão, reocupar a fazenda Rainha Santa, abandonada desde o início da guerra que começou por ser de catanas mas que então, dois anos mais tarde, já contava com muitas armas automáticas algumas delas do próprio exército português caídas em seu poder nas acções de combate.
E lá fomos, com um cozinheiro, o panelão, mais uns tachos e panelas, um jeep, um Unimog e um atrelado, reconquistar território ao inimigo…
Devo confessar que, pela minha própria natureza, nunca me consegui imbuir de espírito guerreiro tendo-me mantido sempre como um empedernido civil, ainda que vestido de camuflado, com a única preocupação de sair dali vivo juntamente com o resto da rapaziada.
Esta circunstância ajudou-me, tornou as “coisas mais leves” e, por outro lado, ao fim de uns meses, aquela massa verde de vegetação omnipresente, quase asfixiante e que ao princípio me aterrorizava, já não me era estranha, a pouco e pouco fui-me apercebendo de que perigoso era estar fora dela, principalmente nas estradas e caminhos.
A mata, como lhe chamavam, afinal era protectora, escondia-nos, protegia-nos e se nos soubéssemos deslocar nela, sem ruídos, até podíamos surpreender em vez de sermos surpreendidos embora nunca tivesse sido essa a minha preocupação.
Assumi, para comigo, como objectivo, defender-me e aos meus soldados, deixando que a guerra, se a houvesse, passasse ao lado… do género, se eles estivessem para a esquerda iria para a direita, isto, claro, se dependesse só de mim e assim foi muitas vezes.
Aquela guerra nunca me convenceu e a confrontação com o inimigo, que também só acontecia se ele quisesse, reduzia-se a encontros com gentes indefesas que viviam refugiadas no mato procurando sobreviver, muitas vezes entre o medo que a tropa aparecesse e a necessidade de agradar aos guerrilheiros.
No entanto, de acordo com as instruções do Quartel-General, tudo quanto mexesse no mato era para matar ou então, se possível, apanhá-los à mão para os interrogar obrigar a confessar onde se encontravam os quartéis dos guerrilheiros.
Mas a circunstância da guerra ser quase toda ela feita por milicianos pôs em causa o cumprimento de certas directrizes dos senhores que comandavam a guerra de Luanda instalados em gabinetes com ar condicionado.
Um Alferes de outro Batalhão, disseram-me que era professor, não tive o prazer de o conhecer, encontrou na mata, fortuitamente, um grupo dessas pessoas.
Teve com elas um diálogo esclarecedor sobre o que as esperava se regressassem com ele de novo para o convívio com as autoridades portuguesas face às dificuldades porque também passavam vivendo fugidos no mato obrigados a apoiar os guerrilheiros que supostamente os deviam proteger.
Não os obrigou a acompanhá-lo e eles decidiram continuar a viver no mato e o Alferes regressou à base, só, com os seus soldados, sem direito a medalha mas satisfeito consigo por ter actuado de acordo com aquilo que lhe ditava a sua consciência.
A Guerra Colonial teve os seus horrores como todas as guerras mas tê-los ia tido muito mais senão fosse o comportamento dos oficiais subalternos milicianos que foram, no terreno, os grandes protagonistas daquela guerra.
Não tenho mesmo dúvidas de que, em matéria de horrores, e os testemunhos trazidos agora a público na série do Joaquim Furtado ajudaram a desfazê-las, as grandes atrocidades, injustas e completamente gratuitas, cometidas sob a psicose do medo, ódio e vingança, pertenceram aos portugueses que viviam em Angola e que muitas vezes censuravam os militares por serem demasiado brandos na sua actuação.
Recordo, a este propósito, muitos meses mais tarde, já na região do Alto-Zambeze, concretamente no Lumbala, distrito de Cazombo, um camionista português que convidei para almoçar quando me pediu para lhe vender pão.
Sentados à mesa ele reparou nos inúmeros jovens que residiam nas aldeias circunvizinhas e que de dia estavam por ali, dentro do aquartelamento, convivendo com os soldados, a alguns dos quais prestavam serviços na lavagem da roupa, como era hábito, e também porque frequentavam uma escola que pus a funcionar com a colaboração de um cabo que desempenhava muito bem as funções de professor.
Pois o camionista, branco, português, sem que nada o fizesse esperar, sentado à minha frente, virou-se na direcção para onde estavam os miúdos e simulando o disparar uma espingarda metralhadora disse-me com uma fria crueldade no olhar: “matava-os todos!”
Sem querer acreditar no que ouvia levantei-me e disse-lhe, calmamente, para sair dali e nunca mais me aparecer.
_Que tinha acontecido na cabeça daquele homem?
_Que distúrbios se tinham produzido?
_ A circunstância de pertencer a uma minoria de brancos acossada e em risco de perder privilégios podia ajudar a explicar alguma coisa?
Mas quais privilégios se o trabalho dele era dos mais duros, agarrado ao volante de um camião que, provavelmente, nem direcção assistida tinha e conduzindo em estradas em que se saía de um buraco para entrar noutro, consecutivamente durante quilómetros e quilómetros, horas e horas seguidas?
Qualquer coisa de verdadeiramente doentio se apossou e desenvolveu no espírito daquele homem encorajado e estimulado por um ambiente social de rutura entre brancos e negros em que as posições se estremaram e os instintos mais primários se impuseram tendo em vista a sobrevivência de uma forma irracional e desumana.
(cont.)