Memórias Futuras
Olhar o futuro pelo espelho retrovisor da história. Qual história? Que futuro?
sábado, fevereiro 22, 2014
NEGROS
E outros buracos...
Estou siderado, afinal os Buracos Negros ( BN), esses
locais tenebrosos considerados a força mais destrutiva do Universo que com a
sua gravidade sugam tudo à sua volta incluindo a própria luz, razão pela qual
são negros, não são coisa rara no espaço sideral!
Os cientistas descobriram recentemente, há coisa de
uns 5 anos, que todas as galáxias têm um BN cujo tamanho varia com a dimensão
da própria galáxia e a nossa VIA LÁCTEA
não é excepção.
Felizmente, o nosso BN não é dos mais activos que é
como quem diz, não é dos mais comilões embora ultimamente esteja a aumentar de
apetite…mas apenas porque uns gases, mais distraídos, se aproximaram demasiado.
De qualquer maneira, não deixa de ser mais uma
preocupação pois nada garante que por força de um qualquer fenómeno
imprevisível ele não se torne num voraz BN e nós estamos apenas a 24.000 anos-luz
de distância o que parece muito mas nestas coisas do espaço não chega a ser
como de Santarém a Lisboa.
Pior que isto ou menos mau, não sei, a galáxia mais
próxima da nossa, a ANDRÔMEDA, está a aproximar-se à velocidade de 40.000 km/h
e o choque, “mais dia, menos dia”, será inevitável dando lugar a uma tremenda
explosão cujos efeitos, para nós, serão totalmente destrutíveis: primeiro a
atmosfera será sugada, de seguida, toda a água dos oceanos e num instante
ficaremos todos torradinhos!
Isto, na pior das hipóteses, porque, talvez com um
pouco de sorte, possamos vir a ser lançados no espaço sideral tal como um planeta
proscrito, desprezado e abandonado à sua sorte.
Mas não desesperemos, o choque será inevitável mas só
daqui a 3 biliões de anos…
Mas a propósito de BN não pude deixar de me lembrar,
por uma questão de associação de ideias, de um outro “Buraco Negro” que é o
nosso Médio Oriente ou a dívida soberana portuguesa.
Na verdade, tal como nas Galáxias tudo gira à volta do
BN, no Planeta Terra tudo gira agora à volta do Médio Oriente e da guerra entre
Judeus e Árabes.
Relativamente à nossa dívida tudo gira à volta dos
nossos credores e da sua disposição em continuarem a emprestar-nos dinheiro –
se possível a juros mais baixos – para podermos satisfazer algumas despesas e
fazer rolar a dívida que vem do passado.
É um fenómeno de turbulência que se mantém latente de
há sessenta anos a esta parte e que eclode, ciclicamente, em explosões de
violência. O outro, o da dívida, é um fenómeno mais recente mas que faz das nossas vidas outra
verdadeira turbulência.
Como em qualquer outro fenómeno da natureza física os
mesmos elementos, nas mesmas condições, obedecendo às mesmas leis, vão
conduzindo sempre aos mesmos resultados.
No caso da nossa dívida não sabemos bem a que
resultados irão conduzir...
No buraco do Médio Oriente, o medo que gera o ódio e
vice-versa tomaram conta da situação, apoderaram-se da mente dos protagonistas
e quando não se sabe o que mais fazer as pessoas matam-se umas às outras,
exterminam-se, na expectativa de que finda a contenda, os sobreviventes de uma
das partes dê por bem empregue o número dos seus mortos.
O futuro está cada vez mais inquinado pelo passado e
se é verdade que as pessoas se cansam das guerras e não as querem, também não é
menos verdade que arranjam sempre razões, e razões poderosas, para mergulharem
nelas e assim tem sido, naquela região, entre Árabes e Judeus enquanto não
passarmos à fase seguinte, declarada e assumida entre os fanáticos de Maomé e os
judeus e de seguida com o resto do mundo.
Não sei o que este miúdo de 5 anos vai ser na vida quando for grande mas, para já, é um prodígio de conhecimentos geográficos e de convicção.
O enterro ia devagar, a voz do comandante era pausada |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 12
O comandante sentou-se, cruzou as pernas, acendeu o cachimbo
(não o de espuma-do-mar, indecente para velório; era um cachimbo negro, de boqui lha curva), olhou em torno, alimentou a conversa:
- O rosto da falecida lembra-me, nem sei por quê, o de uma
dançarina árabe que conheci, lá se vão muitos anos, quando andava a bordo de um
cargueiro holandês. Por causa dela, meu piloto, um sueco, Johann, ia
desgraçando sua vida. . . Mas consegui salvá-lo. ..
Quem muito viveu é assim: qualquer fato, paisagem ou face
recorda-lhe algo do passado, uma história de amor, as margens de um rio, o
rosto de alguém.
Não enxergara o comandante no rosto encarqui lhado e macilento de Doninha, onde os outros viam
apenas a morte, a face trigueira e os longos cabelos azulados de Soraia, a
pecadora, a mórbida bailarina de lábios de fogo?
Aquela por quem Johann, o
piloto sueco e dramático, contraíra dívidas, vendera objectos do navio, qui sera matar-se. Num passo de dança, foi Soraia
enchendo a sala, enquanto o comandante procurava, afanosamente, recordar a
melodia exótica do alucinante bailado, para trauteá-la:
- A música não é meu forte mas guardei a melodia. ..
E como esquecê-la, senhores, se ela bulia com o sangue dos
homens, música langorosa como um vício? Viciara-se Johann, perdera a cabeça.
Música e dança, Soraia era como uma doença a penetrar no sangue, envenenando-o.
Os braços de serpente, as despidas pernas, o fulgor das pedras preciosas sobre
os seios, uma flor no ventre, quem não perderia a cabeça?
Todos eles dão razão a Johann, comovem-se com o desvelo do
comandante para com seu companheiro de tripulação, arrancando-o dos braços
voluptuosos e caros da dançarina.
Ah! esses braços, essas pernas, esses seios .
. . Cada um deles vê Soraia na sala. Ela dança e sua nudez de rosas e
esmeraldas esconde o cadáver raquítico de Doninha, espanta o medo e a morte.
No outro dia, pela manhã, no enterro, foi novamente o
comandante quem os afastou do círculo da morte, ao aparecer envergando uma
farda de cerimónia, magnífica. Ainda não o haviam visto assim, de uniforme
completo, as dragonas prateadas, as mãos calçadas de luvas brancas, segurando
um novo boné com âncora doirada. E a condecoração ao peito. Foi dizendo:
- No mar seria bem mais rápido: embrulhava-se num pano,
cobria-se com a bandeira, um marujo tocaria um dobre na cometa e o corpo mergulharia nas águas. Mais rápido e mais bonito, não
é verdade?
- O senhor assistiu a algum enterro assim, Comandante?
- Ora... Dezenas... Assisti e comandei... Dezenas.
Semicerrava os olhos, os vizinhos sentiam o desfile das recordações naquele
gesto simples.
- Estou me lembrando do pobre Giovanni. .. Um marinheiro que
esteve sob minhas ordens muitos anos. Eu mudava de navio, ele_ desengajava
também, era muito pegado comigo.
Só que era italiano e, como os senhores sabem,
os italianos são muito supersticiosos. Sempre me recomendava: “Comandante, se
eu morrer embarcado quero ser jogado em mar de minha terra.” Segundo ele, se
seu corpo fosse atirado em outras águas, sua alma não teria descanso. ..
O enterro ia devagar, a voz do comandante era pausada:
- Quando ele morreu, esse bravo Giovanni, deu-me uma
trabalheira dos diabos...
- Morreu de quê?
- De tanto beber. De que outra coisa poderia morrer
Giovanni? Bebia como um desesperado, desgostos de família. Pois bem: quando ele
morreu fui obrigado a fazer dois dias de navegação fora de rota. Fora de rota,
meus senhores, sabem lá o que é isso!
Só para jogar o corpo em águas
italianas... Eu tinha prometido, cumpri. Mudei o rumo, viajamos quarenta e oito
horas. ..
- E... e o defunto... - O quê?
- Aguentou tanto tempo sem. ..
- Metemos o corpo na câmara frigorífica do barco. Na hora da
cerimônia estava duro como um bacalhau salgado, mas estava perfeito. Só que
tive, porque cumpri com minha palavra, um mundo de complicações com os
armadores. Nem queiram saber.
Queriam saber e perguntavam. Lá ia Giovanni, sua bebedeira e
seus desgostos de família, a pele bronzeada, curtida pelo sal do mar, entre
eles e o caixão de Doninha, pelas ruas de Periperi.
Narrava o comandante a
discussão com os armadores avarentos, suas respostas firmes e bem-humoradas,
defendendo o direito de seus marujos serem atirados em mar de sua pátria, a
terem seus corpos devorados por peixes de nomes familiares.
Assim, ao
mergulharem pela última vez, seus olhos mortos poderiam enxergar, ao longe,
costas de seu país e para elas estenderiam seus parados braços.
Mas era
impossível tarefa convencer um bruto como Menendez, o armador de maus bofes, um
reles empregado da firma que, com intrigas e golpes, chegara à suprema direcção
da empresa, jogando quase na miséria o antigo chefe, um homem bom, esse sim, capaz de compreender os marinheiros
. .. Um bandido, o tal de Menendez, o comandante guardara-lhe rancor.
Como encafuar-se nos quartos escondidos nos leitos, sob
cobertores, subitamente agravados seus males, tremendo de medo, acuados pela
morte, se o comandante, naquela mesma tarde, estava na praça, a contar o
naufrágio que sofrerá nas costas do Peru, durante um maremoto?
Vagas como
montanhas, rasgando-se o mar em abismos, o céu negro como tão negra jamais a
noite conseguira ser.
Noite de Lua cheia, derramando-se o luar sobre a areia e as
águas, aquela do enterro de Doninha Barata. Noutra ocasião, eles nem veriam a
beleza do céu, estariam trancados, nos quartos e na implacável certeza da morte
próxima. Mas agora o comandante os convidava a tomar um trago em sua casa e a
espiar o céu no telescópio.
Do telescópio e de seu variado uso, com Dorothy ao luar no tombadilho.
Ah! o telescópio.. . Nele partiam para a aventura da Lua e
das estrelas, para fantásticas viagens, rompiam as fronteiras da monotonia e do
tédio. Como se por um passe de mágica deixasse Periperi de ser um pacato
subúrbio do Leste Brasileiro, habitado por velhos à espera da morte, e se
transformasse em estação interplanetária de onde descolavam audaciosos pilotos
para a conqui sta dos espaços
siderais.
sexta-feira, fevereiro 21, 2014
CONSELHOS DE UM VELHO APAIXONADO - Versos de Drumond de Andrade
Parece que estes versos não se encontram publicados na obra de Drumond mas mesmo assim há quem afirme que é ele o autor. Estes versos tocam-nos, sensibilizam-nos... foi assim comigo... o meu coração também parou de funcionar durante uns segundos... que importa o autor, por que não Drumond?
Bruxelas...
Quando, de manhã, entro na casa de banho, ao acender a
luz, automaticamente ligo o rádio porque o interruptor é o mesmo.
Contudo, pensando melhor, vou mandar desligá-lo para
que o meu estado de espírito não fique logo envernizado com as notícias
matinais.
Uns senhores de Bruxelas informaram o Governo português que os salários
dos nossos trabalhadores têm que continuar a descer nos próximos dez anos.
Ora eu vou fazer setenta e cinco, mais dez são oitenta
e cinco o que significa que tenho garantido até ao resto da minha vida o espectáculo
deprimente do definhamento do meu país de tal forma que, quando a morte chegar
irá ser, garantidamente, um verdadeiro alívio.
Mas não pensem que são só os senhores de Bruxelas a
envenenarem os nossos dias, não. O Sr. Presidente do Tribunal de Contas, aquele
senhor de óculos muito parecido com o Mister Bean, que supervisiona nas nossas
Contas Públicas sem que, até à data, se soubesse de qualquer resultado
concreto, prevê vinte anos para o “ajustamento” português o que é o dobro do
que disseram os senhores de Bruxelas.
Ora oitenta e cinco mais dez são noventa e cinco anos
o que significa que vou morrer num Portugal “desajustado”.
Também temos quem nos dê boas notícias e aí o campeão é
o Vice-Primeiro Ministro Paulo Portas, de todos, aquele em que menos acreditamos,
porque nos disse no Verão passado que se ia embora, decisão irrevogável, e qui nze dias depois voltou para ser promovido de Ministro
dos Negócios a Vice-Primeiro Ministro.
Restam-nos algumas notícias da Televisão. Hoje ouvi,
mais uma vez, o investimento em Évora, de 170 milhões de euros da Embraer S.A.,
empresa brasileira de aviões, com a admissão de vinte engenheiros, espero que
portugueses.
Se estes vinte se vierem a juntar aos vinte das notícias
anteriores estaremos já quase em cem.
Mas faz
bem a televisão em repetir estas boas informações. À uma, porque a memória dos
portugueses velhotes é fraca e já esqueceram a mesma notícia dada
anteriormente, às duas porque precisamos de ouvir coisas reconfortantes, que
nos encham de esperanças, que nos façam acreditar novamente num Abril cheio de
cravos, não espetados nos canos das espingardas mas atrás da orelha à marialva,
pois então.
O Negócio
das Vacas
(continuação)
Capitalismo Russo
Tens 2 vacas.
Contas e vês que afinal tens 5.
Contas novamente e vês que tens 42.
Contas de novo e vês que tens 12 vacas.
Paras de contar para abrir outra garrafa de vodka.
Capitalismo Suiço
Tens 500 vacas mas nenhuma é tua.
Cobras para guardar as vacas dos outros.
Capitalismo Espanhol
Tens 2 vacas que não valem a ponta de um corno.
Sentes-te muito orgulhoso por achares que tens as melhores vacas do mundo.
Capitalismo Brasileiro
Tens 2 vacas.
Ensinas uma a jogar futebol e depois exportas para a selecção portuguesa.
Capitalismo Hindu
Tens 2 vacas.
Ai de quem toque nelas!!!
Capitalismo Português
Tens 2 vacas.
Foram compradas através do Fundo Social Europeu.
O governo criou o IVVA - Imposto de Valor Vacuum Acrescentado.
Vendes uma vaca para pagar o imposto..
Um fiscal vem e multa-te porque embora tenhas pago correctamente o IVVA, o valor era pelo número de vacas presumidas e não pelas vacas reais.
O Ministério das Finanças, também por meio dos dados presumidos do teu consumo de leite, queijo, sapatos de couro, botões, presumiu que tu tens 200 vacas.
Para te livrares de sarilhos, dás a vaca que te resta e pedes o Rendimento Mínimo Nacional que dá menos problemas.
Divina
(continuação)
A concepção providencial apresenta
sempre a história como um processo linear governado por Deus: de uma fonte para
um destino pré-determinado de antemão pela Divina Providência, a partir de uma
situação negativa, causada pelo pecado original, para a salvação final que só
se alcança no “além”.
Para o providencialismo, nada do que
acontece é da exclusiva responsabilidade da vontade humana sobre a qual
prevalece a vontade de Deus, que desenha o destino dos homens, das nações e do
mundo inteiro.
A
doutrina da "predestinação", também desenvolvida por Agostinho e
séculos mais tarde defendida por Lutero e Calvino, é uma expressão radical do
providencialismo.
Naturalmente, estas ideias deitam por
terra o sentido da liberdade humana.
O Terreno Fértil da Renúncia
O cientista político nicaraguense Andrés
Pérez Baltodano, reflectiu ampla e criticamente sobre o Providencial, e suas
consequências políticas.
Atribui à concepção providencial religiosa a demissão
que caracteriza a cultura política na Nicarágua e em maior ou menor grau, na
maioria dos países latino-americanos Esta cultura ele a caracteriza como de
“pragmatismo resignado”. Algumas das suas ideias:
-
O "pragmatismo resignado" é um termo que eu uso para explicar a nossa
visão da história e do nosso papel na história. O "pragmatismo resignado"
é um pensamento, uma cultura que nos empurra para nos adaptarmos à realidade e
aceitá-la como ela é.
O
pensamento pragmático resignado não tem vontade de mudança. Com ele, não
podemos escandalizar-mo-nos com a realidade e partir para a sua transformação…Com
esse pensamento temo-nos habituados a níveis brutais de pobreza sofrida pelos
nossos concidadãos e à impunidade e corrupção de nossos governantes.
E de onde vem o pragmatismo resignado,
essa cultura, essa maneira de pensar sobre o poder e a história? Eu acho que o
pragmatismo resignado tem suas raízes principais na concepção providencial que
dominou a nossa cultura religiosa.
O Providencialismo é uma visão da história
que nos leva a acreditar que Deus é que dispõe sobre a vida de cada um de nós.
É uma maneira de ver a vida em
que Deus é o responsável pelo que acontece com meu tio,
comigo, com a sociedade da Nicarágua, do Iraque e do resto do mundo. Nesta
visão de história, marcada por um Deus providencial, é ele e não nós, que é o
regulador, administrador e auditor de tudo que acontece na história.
Alguns teólogos distinguem entre o que é
"providencial meticuloso" e " providencial em geral” e afirmam
que em algumas sociedades prevalece o meticuloso e em outras transformaram o
meticuloso em
geral.
Como é que sabe qual a vontade de Deus?
Providencialismo é hoje activamente divulgado pelo
catolicismo oficial, nos seus meios de comunicação nos sermões e na devoção à
“Divina Providência”. Um dos porta-vozes mais populares da igreja católica,
Madre Angélica, diz, por exemplo: Muitas pessoas fazem a pergunta:
- Como faço
para saber qual é a vontade de Deus para mim?
- A resposta é
simples: - Se isso acontecer, é a vontade de Deus.
Não é relevante
se Deus ordena ou se Deus o permite porque nada acontece connosco se Ele não o
tiver visto antes, tendo em conta o bem que nos virá a partir dele e esperando
a sua aprovação.
A submissão à vontade de Deus que vem de ideias como
estas também tem muito a ver com o poder institucional da Igreja. Muitos dos
"porta-vozes" das igrejas respondem que a vontade de Deus está
expressa nas palavras dos padres e pastores que interpretam a Bíblia e na
tradição...
Assim, obedecer à vontade de Deus não é mais que obedecer à vontade
do homem, e naturalmente das hierarqui as
que dizem representar.
Tudo é mais fácil mas não necessariamente mais fácil,
porque também é verdade “o medo da liberdade”. Superado esse medo, temos de
assumir a responsabilidade pelas nossas vidas e na história.
Crescemos e
amadurecemos como adultos.
Lembremos a oração do químico alemão Otto Hahn,
Nobel de Química em 1994, que dizia:
- Que Deus me dê força para não confiar
cegamente nem mesmo Nele.
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 11
De como a sensual bailarina Soraia e o rude marinheiro
Giovanni participaram do velório e do enterro da velha Doninha Barata
- Nem mesmo a morte - aliás, aguardada há meses - de Doninha
Barata, viúva de Astrogildo - Barata, aposentado das Águas e Esgotos, conseguiu
abrir um hiato no interesse despertado pela chegada e instalação do comandante.
Como se já não lhes sobrasse tanto tempo para o medo.
Exteriormente nada mudara, velório e enterro obedeceram ao
mesmo cerimonial, apareceram vagos parentes da cidade, veio o Padre Justo, de
Plataforma, encomendar o corpo, as mulheres despovoaram de flores seus jardins,
os velhos calçaram sapatos e puseram gravatas para o funeral.
No entanto,
houvera uma subtil e indelével diferença, como se a presença da morte não se
fizesse sentir tão brutalmente, como se ela houvesse demorado menos tempo entre
eles. Porque quando a morte, de longe em longe, passava por Periperi, não ia
logo embora, apenas concluía sua macabra tarefa.
Ficava por ali, mesmo depois
do enterro, sua sombra gélida estendida sobre os aposentados e retirados dos
negócios, sobre suas curvadas esposas, e os corações se apertavam como se a
garra da morte os comprimisse, a experimentá-los.
Perdia a brisa sua leve
carícia, eles sentiam nas costas dobradas pelo medo o hálito fúnebre espalhado
pela morte; por quem viria ela em sua próxima visita?
Não, não era a mesma coisa a presença da morte lá na cidade
da Baía, rápida e banal nas rodas de um automóvel, nos leitos dos hospitais,
nas páginas de desastres e crimes dos jornais.
Era leviana e secundária, por
vezes não merecia mais de duas linhas nas gazetas, desaparecendo em meio a
tanta vida a cercá-la, a tanto ruído e luta, não havia lugar para ela nos
corações apressados, dissolvia-se sua sombra nas luzes, e os risos não deixavam ouvir seu murmúrio.
Seu podre bafo, como iriam senti-lo as mulheres envoltas em perfume, em cálidas
vagas de desejo? Passava a morte despercebida, apenas executava sua tarefa e já
desaparecia, não havia tempo a perder com ela em meio a tanta ânsia e pressa de
viver.
“Fulano morreu”, anunciava-se, nos jornais, nos rádios, nas
conversas, “coitado!”, “pobre dele!”, “já foi tarde”, “era tão moço ainda. .
.”, e não se falava mais nisso, havia muito assunto a comentar, muito riso a
rir, muita ambição a satisfazer, muita vida a viver.
Em Periperi era diferente: não era vida feita de trabalho e
luta, de ambição e dificuldades de amor e ódio, de esperança e desespero, a que
ali viviam ou vegetavam. Ali o tempo se alongava nada o apressava, os
acontecimentos duravam acontecendo.
E o mais longo de todos era a morte, jamais
banal e rápida, sempre fulgurante e demorada, apagando, com sua chegada, todas
as aparências de vida do lugar. Não já começavam eles a morrer, os aposentados
e retirados dos negócios, quando ali desembarcavam, trazidos pelo desejo de
viver o maior tempo possível, de prolongar os anos, longe da agitação e dos
desejos?
Era uma população de velhos sem outro real interesse senão a própria
vida, e a morte de um deles matava um pouco a todos, ficavam cabisbaixos e
melancólicos.
As partidas de dama e de gamão rareavam, alguns deixavam
mesmo de sair de casa, agravavam-se as mazelas de outros, eram tristes os dias
e as raras conversas, melancólicas. Só aos poucos ia-se esbatendo a sombra da
morte, finalmente expulsa por aquele resto de vida, pelo único desejo de amor
que lhes sobrava: o de não morrer.
Renasciam o riso cansado, a pequena ambição
de ganhar uma partida no tabuleiro, a gula, voltavam a animar-se as conversas
na estação, na praça, agora na sala do comandante, à noite.
Frágeis eram os muros de interesses a ocultar-lhes a morte,
a defendê-los de sua pesada presença, a fechar-lhes os olhos para a sua sinistra
visão.
Estivera o comandante no velório. Vestido com seu paletó de
sarja azul com botões metálicos, o cachimbo e o boné. Mas, talvez porque mal
chegara da cidade, não entrara curvado e abatido como se aquele cadáver fosse
apenas um prólogo de sua própria morte. . . Fitou a face descarnada de Doninha,
a quem não chegara a conhecer, e comentou quase risonho:
- Vê-se que quando moça foi uma bela mulher. . .
Era um velório sonolento e silencioso. Cada um pensava em si
próprio, via-se estendido num caxão, entre velas de mau odor, flores aos pés,
para sempre terminado. Por vezes um ou outro estremecia, o medo estava cravado
em cada um deles, o medo da morte.
Não pensavam em Doninha, em sua mocidade, numa distante e duvidosa
beleza. A frase do comandante arrancou-os daquele torpor. Marreco, que
conhecera a finada na juventude, buscou na memória:
- Bonitona, sim.
quinta-feira, fevereiro 20, 2014
ENNIO MARCHETTO
Grandes canções na concepção de um artista fabuloso. É o dois em um: Humor e música.
Religiosa
Quando se vive "a vontade de
Deus", acreditando que tudo o que acontece no mundo é da responsabilidade
de "Deus", estamos vivendo de acordo com uma concepção histórica,
chamada "Providencial".
A crença de que Deus é o verdadeiro
protagonista e sujeito da história e que os seres humanos são apenas
ferramentas em suas mãos.
Para o Providencialismo, Deus é justo e
quando nos sucedem coisas más na vida são apenas "testes" de Deus
para ver se somos fiéis, para ver até quanto aguentamos sem o renegar.
Para o Providencialismo, o tempo humano,
a história não têm valor e as recompensas ou castigos só acontecerão fora do
tempo, na eternidade. Para o Providencial, "os caminhos de Deus são
imprescrutáveis" e o homem não pode entendê-los, nem questioná-los.
Muitos ditados populares e provérbios
expressam a cultura Providencialista religiosa, tradicional: "O que é teu
ninguém o pode tirar"; "Deus proverá", "Uma árvore que nasce
torta nunca se endireitará” ...
Outros matizam com sentido idêntico esse
fatalismo: "A quem madruga Deus ajuda”; ou o seu contrário: “Não é por
muito madrugar que amanhece mais cedo”.
Existem também ideias, nascidas das
filosofias orientais que fazem eco nas palavras de Jesus "A cada dia basta-lhe
o seu afã”."
Atribuída ao Dalai Lama há o seguinte
ditado: "Há apenas dois dias no ano em que não podes fazer nada. Um deles
se chama ontem e o outro amanhã. Então, hoje é o dia em que podes fazer alguma
coisa, o único em que podes viver".
Um dos aspectos mais importantes da
Teologia da Libertação foi o de começar a questionar o sentido providencial da
religião popular, tornando as pessoas responsáveis por cada um dos dias da sua
própria história, tornando-as "sujeito da sua libertação."
O Providencialista Santo Agostinho
Providencialismo é essencial no
Cristianismo tradicional. Está na raiz da cultura religiosa latino-americana,
que não viveu o impacto colectivamente libertador da Reforma Protestante e da Modernidade.
Considera-se que Agostinho, bispo de
Hipona, é o primeiro grande providencialista da igreja. Em sua vida, Agostinho
foi testemunha da queda do poderoso império romano nas mãos dos bárbaros e
considerou que tamanho cataclismo histórico, só poderia ter ocorrido pela
"vontade de Deus".
Seguindo essa interpretação providencial
de tal evento histórico, Átila, o líder dos Hunos, que sitiou Roma e
Constantinopla, foi chamado pelos cristãos daquela época "Flagelo de
Deus", um título que reflecte o ideário providencial: mais do que um
guerreiro capaz, Átila foi uma "prova" de Deus.
A história é um processo linear guiado
por Deus.
A concepção providencial enraizou-se
durante séculos. Nos primeiros anos da conqui sta
da América pelos espanhóis, muitos escritores católicos difundiram a ideia de
que a "descoberta" do continente como um território para evangelizar havia
sido uma acção providencial de Deus, uma decisão da vontade divina, para
compensar a igreja dos prejuízos causados à cristandade europeia pela Reforma
Protestante.
(continua)
O CAPITALISMO
Capitalismo Ideal
Tens duas vacas. Vendes uma vaca e compras um boi.
Eles multiplicam-se e a economia cresce.
Vendes a manada e ficas rico.
Reformas-te.
Capitalismo Americano
Tens duas vacas. Vendes uma e forças a outra a produzir o leite de quatro vacas.
Ficas surpreso quando elas morrem.
Capitalismo Japonês
Tens duas vacas. Fazes uma modificação genética para que tenham metade do tamanho de uma vaca normal e produzam vinte vezes mais leite.
Depois crias uns desenhos de vacas chamadas Vaquimon e vendes para o mundo inteiro.
Capitalismo Britânico
Tens duas vacas. Ambas são loucas
Capitalismo Holandês
Tens duas vacas. Elas vivem juntas, em união de facto. Não gostam de bois e pronto!
Capitalismo Alemão
Tens duas vacas. Produzem leite regularmente, segundo padrões de qualidade e horários previamente estabelecidos de forma precisa e lucrativa.
Um dia, inexplicavelmente, ficam doentes com uma bactéria qualquer e culpas os espanhóis.
(Amanhã há mais vacas...)
Quando entrei para a escola o meu pai disse-me:
- Menino, não pode ser só livros. Tens que fazer mais qualquer coisa. Dou-te à escolha:
- Ou vais para a catequese ou para o karaté.
Eu, que não gosto de violências, (coroas de espinhos espetadas na cabeça, sangue e outras coisas assim) escolhi o karaté (disciplina, filosofia e ética).
NINFOQUÊ?
- Boa tarde. Faça o favor de se sentar, minha senhora.
-Então de que se queixa a D. Maria da Luz?
- Ai doutor... tenho um problema mas.... não fico muito à
vontade e nem sei como começar...
- Não tem nada que se envergonhar, seja o que for. Os
médicos não julgam ninguém.
- Doutor, eu levanto-me e sinto logo umas coisas, uns
calores, uma vontade muito grande...sabe? Só me passa fazendo amor, mas como o
meu marido sai cedo de casa, eu vou à janela e chamo o primeiro que passar.
Fazemos amor, e fico quase bem... mas para ficar completamente calma tenho que
chamar outro.
À tarde é a mesma coisa: faço amor com três ou quatro e lá
me aguento até à noite. Ando com um bocado de vergonha e muito inqui eta por não saber o que é isto... O doutor sabe o
que eu tenho ?... É alguma coisa má???...
- Bom, pelos sintomas trata-se de um distúrbio do
comportamento sexual que se denomina "ninfomania".
- Ninfoquê?!
- Ninfomania, nin-fo-ma-nia.
- O doutor não se importa de escrever o nome aí num papel
pra eu mostrar lá no bairro, é que todos me chamam puta!!.
Ela adora ouvir histórias... |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 10
- Essa gente do mar, em cada porto uma mulher... - pronunciou Emílio Fagundes com certa inveja.
- Basta olhar para ele e logo se vê o homem de acção - disse
Rui Pessoa, aposentado da Mesa de Rendas Estadual.
Zequínha Curvelo, na mão o livro em cuja capa colorida o
bravo marinheiro envergava um paletó parecido com o do comandante, resumia
aquelas primeiras impressões:
- Um herói, meus amigos, vivendo entre nós.
Caía a tarde, sem pressa, lentamente, igual à vida em
Periperi
- Lá vem ele... - anunciou alguém.
Voltaram-se todos, nervosos. Num passo vagaroso e digno, de
homem acostumado a cruzar os tombadilhos na longa solidão do mar, adiantava-se
o comandante pela rua, vestido com seu paletó marítimo, o cachimbo na boca, e,
sobre os revoltos cabelos, um boné ornado com uma âncora, ainda não visto antes.
Fitava o infinito, ia certamente com suas recordações, seus marinheiros mortos,
suas mulheres abandonadas nos perdidos portos. Ao passar à altura do grupo,
levou a mão ao boné numa saudação, efusivamente respondida. E o silêncio se
fez, acompanhando-o em sua caminhada. Inqui eto,
Zequi nha Curvelo não resistiu:
- Vou puxar conversa. . .
- Vê se traz o homem aqui
para uma prosinha . ..
- Vou ver se consigo.
Partiu em passos rápidos, alcançou o comandante.
- Esse homem deve ser uma enciclopédia. . . - disse o
Marreco.
Voltaram o comandante e Zequi nha,
agora em direcção ao grupo. Zequi nha
apontava os vizinhos, estaria anunciando nomes e títulos.
- Vem para cá...
Levantavam-se das cadeiras e bancos, animados. Zequi nha começou a fazer as apresentações, o comandante
apertava as mãos:
- Um velho marinheiro, às ordens. . .
Ofereceram-lhe a imponente cadeira de braços do velho José
Paulo. Sentou-se entre seus vizinhos, puxou uma baforada do cachimbo (todos os
olhos fixos no cachimbo onde os seios e as coxas nuas da mulher eram uma
sugestão de volúpias raras), confidenciou com sua voz um pouco rouca:
- Vim morar aqui
porque nunca vi dois lugares tão parecidos no mundo como Periperi e Rasmat, uma
ilha do Pacífico onde vivi uns meses...
- Veraneando?
Sorriu o comandante:
- Como náufrago ... Nesse tempo eu ainda era segundo-piloto
e embarcara num navio grego. . .
- Seu Comandante, por favor, um momento, um momento. . .
Espere um minuto antes de começar... - era Augusto Ramos quem interrompia. -
Deixe primeiro eu chamar minha mulher. Ela adora ouvir histórias.
quarta-feira, fevereiro 19, 2014
| |