Memórias Futuras
Olhar o futuro pelo espelho retrovisor da história. Qual história? Que futuro?
sábado, agosto 25, 2012
IMAGEM
Fragata inoperacional há já muitos anos, 50 ou 60. Eram utilizadas para fazerem o movimento de carga e descarga dos navios fundeados no Tejo, Usavam uma vela, carregavam até 100 toneladas e eram uma das embarcações mais emblemáticas do rio Tejo. Um primo meu, ferrenho benfiquista, era proprietário de um barco destes que colaram na minha memória de criança a imagem de homens vergados com sacos às costas a subirem para as fragatas por pranchas inclinadas.
RAÚL SOLNADO
Raúl Solnado faz parte da "família" de todos os portugueses com excepção dos jovens que já só o apanharam de "raspão". Sinto que é minha obrigação recordá-lo mas eu faço-o por devoção, como artista e como homem.
As Raízes da Religião
Toda a gente tem a sua teoria de
estimação sobre a origem da religião, a razão pela qual todas as culturas
humanas têm uma. Uns, dizem que reconforta e consola, outros, que promove a
união dos grupos, satisfaz a nossa ânsia de percebermos porque existimos, etc…
Sabemos hoje que somos o produto de um
processo de evolução darwiniana, tal como todos os seres vivos. Os belíssimos
documentários que são trazidos até nós pelos programas dos canais da Odisseia e
da National Geografic sobre a origem do Homem, não nos deixam dúvidas sobre a
dificuldade desse processo. Várias “tentativas” que não sabiam que eram
“tentativas” e todas abortaram ao longo de alguns milhões de anos.
Finalmente, ficámos nós, só nós, todos
os outros desapareceram, não vingaram, como se costuma dizer. Conhece-se alguma
coisa desse processo - que continua e continuará - o suficiente para podemos
dizer que ele foi muito difícil. Uma vez, pelo menos, a quando da explosão do vulcão Toba, há 75.000, na Indonésia, estivemos à beira do "abismo" reduzidos ao número mínimo de elementos capaz de sobreviver.
Por isso, é legítimo perguntar que pressão ou
pressões foram exercidas pela selecção natural que tenham favorecido, na sua
origem, o impulso para a religião, tanto mais quanto é verdade que a religião é
esbanjadora e extravagante. Os rituais religiosos têm custos em tempo,
recursos, dor e privação.
A
religião pode por em perigo a vida do indivíduo mais devoto tal como a dos
outros. Milhares de pessoas foram torturadas por lealdade a uma religião,
perseguidas por fundamentalistas apenas, muitas vezes, por pertencerem a uma fé
alternativa que pouco tinha de diferente. Veja-se o caso dos sunitas e xiitas e entre católicos e protestantes.
Por outro lado, a religião devora
recursos, por vezes numa escala maciça. Uma Catedral medieval podia levar
séculos de trabalho humano a ser construída e, no entanto, nunca era usada como
residência ou com algum outro fim que fosse útil.
A música sacra e a pintura devota
monopolizaram em grande parte o talento da época medieval e do Renascimento.
Gente devota morreu pelos seus deuses e por eles matou. Outros autoflagelaram-se
até as costas verterem sangue, juraram uma vida de celibato ou de silêncio em
clausura, tudo ao serviço da religião.
Para quê tudo isto? Qual o benefício da
religião?
A nossa espécie por muito inteligente
que possa ser, é, no entanto, dotada de uma inteligência «perversa» porque
assimila conhecimentos sobre o mundo natural e de como sobreviver nele mas
depois, em simultâneo, atulham as suas mentes com crenças manifestamente
falsas.
Embora os pormenores variem de região
para região, não se conhece nenhuma cultura no mundo que não tenha a sua versão
da religião, com os seus rituais pródigos em esbanjar tempo, em consumir
riquezas e em gerar hostilidades.
Há pessoas instruídas que abandonaram a
religião, mas todas foram criadas numa cultura religiosa, que normalmente
deixaram para trás através de uma decisão consciente. Lembremos a velha piada
irlandesa que pergunta: «sim, és ateu, mas ateu protestante ou ateu católico?»
Do ponto de vista darwiniano não há
nenhuma dificuldade em explicar o comportamento sexual. Trata-se de fazer
filhos mesmo nas situações em que a contracepção ou a homossexualidade o
parecem contrariar.
Mas, e o comportamento religioso? Porque
jejuam os humanos, porque se ajoelham, autoflagelam, acenam freneticamente com
a cabeça em frente de um muro, porque fazem cruzadas?
(Richard Dawkins. Continuaremos)
GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 176
O engenheiro passara a
símbolo de devassidão, de descalabro moral. Talvez isso se devesse sobretudo ao
facto de ele ter fugido, acovardado, a tremer de medo no quarto do hotel,
embarcando às escondidas sem se despedir sequer dos amigos.
Houvesse ele reagido,
lutado e encontraria, certamente quem o apoiasse. A antipatia a cercá-lo não
atingira Malvina. É claro que cochichavam sobre o namoro, os beijos no cinema e
no portão, havia até quem apostasse sobre a sua virgindade.
Mas, talvez porque se
sabia ter a moça enfrentado de cabeça erguida o pai em fúria, a gritar-lhe
enquanto ele baixava o rebenque, sem dobrar o cangote, a cidade simpatizou com
ela.
Quando, umas duas semanas
depois, Melk a levou para a Baía para interná-la no Colégio das Mercês, várias
pessoas acompanharam-na ao porto, mesmo algumas colegas do Colégio das Freiras.
João Fulgêncio trouxera-lhe um saco de bombons, apertara-lhe a mão e lhe
dissera:
- Coragem!
Malvina sorrira,
quebrou-se seu olhar glacial e altivo, sua pose de estátua. Jamais estivera tão
bela. Josué não viera ao porto, mas confidenciara a Nacib, junto ao balcão do
bar:
- Eu a perdoei – Andava saltitante e
conversador, se bem de faces ainda mais cavadas, com olheiras negras, enormes.
Nhô-Galo, presente, olhava
a janela risonha de Glória:
- Você, professor anda escondendo leite.
Ninguém lhe vê no cabaré, eu conheço tudo o que é mulher em Ilhéus e sei com
quem cada uma está de xodó. Nenhuma com você… Onde vossa senhoria está arranjando
essas olheiras?
- No estudo e no trabalho…
- Estudando anatomia… Trabalho desse também
quero… – Seus olhos indiscretos iam de Josué para a janela de Glória.
Nacib também andava
desconfiado. Josué aparentava uma indiferença excessiva em relação à mulata e
deixara completamente de pilheriar com Gabriela. Ali havia coisa…
- Esse engenheiro prejudicou um bocado
Mundinho Falcão…
- Nada disso tem a menor importância. Mundinho
vai ganhar na certa. Sou capaz de apostar.
- Não é tão certo assim. Mas, mesmo que ganhe,
o governo não reconhece, vai ver…
A adesão do coronel Altino
à causa de Mundinho, seu rompimento com os Bastos, arrastara vários outros.
Durante uns dias as notícias sucederam-se: o coronel Octaviano, de Pirangi, o
coronel Pedro Ferreira, de Mutuns, o coronel Abdias de Sousa, de Água Preta.
Tinha-se a impressão de que se o prestígio dos Bastos não ruíra completamente,
pelo menos sofrera profundo abalo.
O aniversário do coronel
Ramiro, ocorrido semanas após o acidente com Rómulo, veio provar o exagero
dessas conclusões. Nunca fora festejado com tanto ruído. Foguetório pela manhã,
acordando a cidade, salvas e rojões em frente à sua casa e à Intendência. Missa
cantada pelo Bispo, a Confraria de São Jorge em peso, a Igreja cheia, sermão do
padre Cecílio celebrando, com sua voz ardente e efeminada, as virtudes do
coronel.
(Click na imagem: Não seria melhor estar cá em baixo, deitada na areia?... mas as mulheres são assim, gostam de se evidenciar. Que injusto que sou, ela apenas está a cumprir ordens do fotógrafo... só assim ele poderia captar os contrastes do azul do vestido no branco da nuvem e, principalmente, do branco desta naquele azul tremendo do céu.)
sexta-feira, agosto 24, 2012
O PADRE E A FREIRA
Um Padre (muito cavalheiro) ofereceu à freira uma boleia para o
convento, já que estava tarde e a chuva não demoraria a chegar...
No caminho o carro avariou.
Depois de caminharem uma hora debaixo de chuva, avistaram um motel, e o padre
sugeriu:
- Irmã, creio que será melhor
dormimos a
A irmã, toda molhada e cansada, concordou feliz da vida!!!!
Na recepção, foram informados
que tinham somente um quarto com uma cama de casal disponível.
O padre olhou para a freira e
disse :
- Sem problemas, a Irmã
pode dormir na cama, que eu durmo no chão. E assim fizeram.
No entanto, no meio da madrugada, a irmã acordou o padre dizendo:
- Padre! Está acordado?
- ( O padre bêbado de sono )
Hã?! Ah, irmã, o que foi?
- Ah... é que eu estou com frio. Pode-me chegar o
cobertor?
- Sim, irmã, concerteza!
O padre levantou-se, tirou o cobertor
do armário e cobriu a irmã com muita ternura.
Uma hora depois a irmã acorda o padre novamente dizendo:
- Padre! Ainda está acordado?
- ( O padre a babar na gola ) Ah? Ah,irmã, o que foi agora?
- É que eu ainda estou com frio. Pode-me chegar
outro cobertor?
- Claro irmã, claro que sim!
Mais uma vez o padre levantou-se cheio
de amor e boa vontade para atender o pedido da irmã.
Outra hora se passou e mais uma vez a irmã chamou pelo padre.
- Padre, ainda esta acordado?
- ( O padre engasgando com o
próprio ronco ) Ah? Sim irmã, o que foi agora?
- É que eu não consigo adormecer. Ainda estou
com muito frio.
Finalmente, entendendo as intenções da
irmã, o padre disse:
- Irmã, só estamos nós os dois a
- Certo!
- O que acontecer, ou deixar de acontecer a
- Certo!
- Então tenho uma sugestão: Que tal nós fazermos de marido e
mulher?
A freira pula de alegria na cama e
diz:
- Sim! Sim! Vamos fazer de
marido e mulher!
Nesse momento o padre muda o tom de
voz e grita:
- ENTÃO, PORRA! LEVANTA ESSE CU DA CAMA E VAI TU
BUSCAR A MERDA DO COBERTOR!
Obs - Quem pensou que iria haver um final erótico, faz favor, reza 10 Avé-Marias e 20 Pai-Nossos por maus pensamentos...
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ENTREVISTA FICCIONADA
COM JESUS Nº 63 SOBRE O TEMA:
“SANTÍSSIMA TRINDADE”
RAQUEL -
Continuamos no cume do Monte Tabor. Na entrevista anterior, o senhor, Jesus
Cristo, não parecia muito entusiasmado com o privilégio de ter duas naturezas,
uma humana e outra divina em sua única pessoa.
JESUS - Não
é isso, Raquel, é que não compreendi bem...
RAQUEL - Não fuja pela tangente dizendo que todos os
seres humanos somos criados a imagem e semelhança de Deus. Isso já nós sabemos.
Mas o senhor... o senhor chamou a si mesmo de Filho de Deus.
JESUS - Eu
sempre me chamei de filho do homem. Eu sou um homem, Raquel. Um homem verdadeiro.
RAQUEL - Mas
também um deus verdadeiro. O senhor… o senhor é deus.
JESUS - Pára, Raquel. Fico horrorizado com o que você
está dizendo. Só Deus é Deus.
RAQUEL - Creio que é hora de falar claramente. Eu estou
me referindo à Santíssima Trindade. É disso que quero falar, é disso que a
nossa audiência quer ouvir, sobre a Santíssima Trindade.
JESUS - Pois
falemos.
RAQUEL - Esse
dogma estabeleceu-se no Concílio de Nicéia. Deus: três pessoas e uma só
natureza. Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo. É ou não é assim?
JESUS - Falas de três deuses?
RAQUEL - Falo
de três naturezas em uma só pessoa. Ao invés, de três pessoas em uma só
natureza. É que estes temas são complicados, compreenda. Falo de três pessoas
divinas.
JESUS - E
quem são essas três pessoas?
RAQUEL - Bom, o senhor é uma delas.
JESUS - E
as outras duas?
RAQUEL - O
Pai e o Paráclito.
JESUS - Quem
é o Paráclito?
RAQUEL - O
Espírito Santo. Um pai, um filho e um Paráclito. Essa é a família divina.
JESUS - Uma
família só de homens?
RAQUEL - Deixe as brincadeiras para mais tarde. E volto
a lhe pedir que se concentre porque este tema é crucial. Este é o dogma dos
dogmas.
JESUS - Então, diz-me tu quem eu sou.
RAQUEL - O
senhor vem a ser a segunda pessoa da única natureza divina, ainda, como
recordará, o senhor conta com duas naturezas em uma mesma pessoa. Entende
agora?
JESUS - Não.
RAQUEL - Luz de luz, deus verdadeiro de deus
verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao pai.
JESUS - Mas,
Raquel, como eu vou ser uma pessoa com duas naturezas e uma natureza com três
pessoas?
RAQUEL - A solução de tudo isto é a união hipostática.
Três que não são três, mas um. E um que não é um, mas dois.
JESUS – Acredita,
Raquel, que eu estou me esforçando para te acompanhar, mas isso me parece uma
geringonça. Não estou entendendo nada.
RAQUEL - Bom, os mistérios divinos são assim.
JESUS - Ou
melhor, as trapalhadas humanas. Porque eu, desde menino, que meu pai e minha
mãe me ensinaram que Deus é Um. E que ninguém jamais viu seu rosto.
RAQUEL - Bibliotecas
inteiras explicando o dogma da Santíssima Trindade, triângulos com o olho
divino, sermões, pinturas, catedrais... e agora o senhor vem nos dizer…
MENINA - Hei!...
Vocês são daqui ?
JESUS - Vem aqui ,
garota, qual é o teu nome?
MENINA - Maria
JESUS - Que
nome bonito, como o da minha mãe. Vem, fica aqui
com a gente. O que queres?
MENINA - Um
sorvete!
JESUS - Um
sorvete não, vamos comprar “três” sorvetes. Olha pra ela, Raquel. Fala com ela.
As crianças são as que mais sabem sobre Deus. Deus não se revela aos sábios nem
aos teólogos.
RAQUEL -
E o resto?
JESUS - O
resto é o menos. Vamos, Maria. Muda de cara, Raquel. A natureza está aqui , ante nossos olhos. E nós somos as três pessoas.
Tu, eu e Maria.
RAQUEL - Pois… nós três nos despedimos do programa. Até
a próxima… Do Monte Tabor, Emissoras Latinas.
GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 175
Gabriela ia andando,
aquela canção ela a cantara em
menina. Parou a escutar a ver a roda a rodar. Antes da morte
do pai e da mãe, antes de ir para a casa dos tios.
Que beleza os pés
pequeninos no chão a dançar! Seus pés reclamavam, queriam dançar. Resistir não
podia, brinquedo de roda adorava brincar.
Arrancou os sapatos,
largou na calçada, correu prós meninos. De um lado Tuísca, do outro lado
Rosinha. Rodando na praça, a cantar e a dançar:
Palma, palma, palma
Pé, pé, pé.
Roda, roda, roda…
Caranguejo peixe é.
A cantar, a rodar, as
palmas bater, Gabriela menina.
Das Flores e dos Jarros
Atingira a luta política
também as eleições da confraria de São Jorge, em plena Catedral.
Muito desejara o Bispo conciliar as correntes, repetir o
tento lavrado por Ataúlfo Passos. Gostaria de ver reunidos em torno do santo
guerreiro os fiéis dos bastos e os entusiastas de Mundinho. Todo Bispo que era,
de barrete vermelho, não conseguiu.
A verdade era que Mundinho
não levava a sério aquela história da confraria. Pagava por mês e acabou-se.
Disse ao Bispo estar disposto a votar, se lá fosse votar, no nome que ele
indicasse. Mas o Doutor, de olho na presidência, fez pé firme. Começou a
cabalar. Dr. Maurício Caíres, devoto e devotado, era candidato à reeleição. E a
deveu sobretudo ao engenheiro.
Repercutira intensamente
na cidade o agitado fim do namoro. Apesar de o diálogo na praia, entre Melk e
Rómulo, não ter sido ouvido por ninguém, existiam dele pelo menos uma dez
versões, cada qual mais violenta, menos simpática ao engenheiro. Até de joelhos
o puseram junto ao banco da avenida, a suplicar piedade.
Transformaram-no num
monstro moral, de vícios inconfessáveis, aliciando mulheres, pavoroso perigo
para a família ilheense. O Jornal do sul dedicou-lhe um dos seus artigos mais
longos – toda a primeira página, continuando pela segunda – e mais grandiloquentes.
A moral, a Bíblia, a honra das famílias, a dignidade dos Bastos, sua vida
exemplar, a devassidão de todos os oposicionistas a começar pela do seu chefe,
Anabela e a necessidade de conservar ilhéus à margem da degradação de costumes
que ia pelo mundo, faziam desse artigo uma página antológica. Aliás, várias
páginas.
Para a Antologia da
imbecilidade… - dissera o Capitão.
Paixão política. Porque em
Ilhéus o saborearam, sobretudo as solteironas, quando o Dr. Maurício Caíres
repetiu grandes trechos do artigo como discurso de posse, reeleito que fora
para a presidência da Confraria: “… aventureiros vindos dos centros de corrupção,
a pretexto de discutíveis e inúteis trabalhos, querem perverter a alma
incorruptível do povo de ilhéus…”
(Click na imagem: Vamos beber à saúde?... mas de quem? - À nossa, á dos meus amigos e, porque não, à dela que foi da idéia?)
quinta-feira, agosto 23, 2012
IMAGEM
Esta imagem foi recolhida algures na costa do Atlântico norte onde vivem os papagaios do mar, um deles em 1º plano na fotografia. Ao contrário dos seus homónimos da América do Sul, estes papagaios voam muito mal. A vocação deles é mais para nadar de baixo de água onde apanham peixinhos pequeninos com o seu bico devidamente preparado. Na natureza é assim: cada um é para aquilo que evoluiu...
GENE KELLY
Se fosse vivo faria hoje 100 anos. Dançarino, actor, cantor e realizador, Gene Kelly deixou uma marca na história do cinema musical. esta cena do filme Serenata à Chuva, de 1952, tornou-se mesmo numa das longas metragens icónicas do cinema musical. Vi esta cena várias vezes ao longo da minha vida de forma deliciada... é um primor de técnica e de bom gosto de um dos melhores dançarinos do seu tempo. Em homenagem do seu centenário revemos, mais uma vez, o "Singin In The Rain"
Como é um alentejano?
- É, assim, a modos que atravessado.
Nem é bem branco, nem preto, nem castanho, nem amarelo, nem vermelho....
E também não é bem judeu, nem bem cigano.
Como é que hei-de explicar?
É uma mistura disto tudo com uma pinga de azeite e uma côdea de pão:
- Dos amarelos, herdámos a filosofia oriental, a paciência de chinês e aquela paz interior do tipo "não há nada que me chateie";
- Dos pretos, o gosto pela savana, por não fazer nada e pelos prazeres da vida;
- Dos judeus, o humor cáustico e refinado e as anedotas curtas e autobiográficas;
- Dos árabes, a pele curtida pelo sol do deserto e esse jeito especial de nos escarrancharmos nos camelos;
- Dos ciganos, a esperteza de enganar os outros convencendo-os de que são eles que nos estão a enganar a nós;
- Dos brancos, o olhar intelectual de carneiro mal morto;
- Dos vermelhos, essa grande maluqueira de sermos todos iguais.
O alentejano, como se vê, mais do que uma raça pura, é uma raça apurada.
Ou melhor, uma caldeirada feita com os melhores ingredientes de cada uma das raças.
Não é fácil fazer um alentejano.
Por isso, há tão poucos.
É certo que os judeus são o povo eleito de Deus.
Mas os alentejanos têm uma enorme vantagem sobre os judeus:
nunca foram eleitos por ninguém, o que é o melhor certificado da sua qualidade.
Conhecem, por acaso, alguém que preste que já tenha sido eleito para alguma coisa?
Até o próprio Milton Friedman reconhece isso quando afirma que:
«as qualidades necessárias para ser eleito são quase sempre o contrário das que se exigem para bem governar».
E já imaginaram o que seria o mundo governado por um alentejano?
Era um descanso!!!...
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 174
-
Pra ver quem?
-
Pra ver seu Nacib.
Dizer mais não precisava, derretia-se
todo. As solteironas olhavam, os homens olhavam, o padre Basílio vinha da
Igreja, a bênção lhe dava:
-
Deus te abençoe, minha rosa de Jericó.
Não sabia o que era, mas era bonito. Dia
gostoso, o de ir ao dentista. Na sala de espera se punha a pensar. Seu coronel
Manuel das Onças, apelido engraçado, velho teimoso, mandara um recado: se ela qui sesse, no nome dela botava uma roça plantada,
preto no branco, no cartório.
Uma roça… Não fosse seu Nacib tão bom, e
o velho tão velho, e ela aceitava. Não para ela, de que lhe servia? Roça para
quê? Para ela mesmo queria não… mas para dar para Clemente, ele tanto queria…
Onde andava Clemente? Ainda estaria na roça do pai da moça bonita, a do
engenheiro? Mal feito bater de chicote na pobre.
Que fizera de mais? Se tivesse uma roça
daria a Clemente. Que bom que seria… Mas seu Nacib não entenderia, não ia
deixá-lo sem cozinheira. Se não fosse por isso, podia aceitar. O velho era
feio, mas passava na roça um mundo de tempo e, nesse tempo, seu Nacib podia vir
consolar, com ela deitar…
Tanta bobagem para pensar. Pensar, umas
vezes era bom, outras não era. Pensar em defunto, em tristeza, gostava não. Mas
de repente pensava. Nos que tinham morrido na estrada, seu tio entre eles.
Coitado do tio. Lhe batia em
pequena. Se meteu em sua cama, ela ainda menina. A tia
arrancava os cabelos, xingava nomes, ele a empurrava, lhe dava tabefes.
Mas não era ruim, era pobre de mais, não
podia ser bom. Pensar coisa alegre, isso gostava. Pensar nas danças da roça, os
pés descalço batendo no chão. Na cidade iluminada onde estivera quando a tia
morrera, na casa tão rica de gente orgulhosa. Pensar em Bebinho. Isso era bom…
Certa gente também só conservava
tristezas. Que coisa mais tola… Dª Arminda tinha dias: amanhecia amuada, lá
vinham tristezas, amarguras, doenças. Não falava outra coisa. Amanhecia
contente, sua prosa era um pão. Um pão com manteiga, gostosa, só vendo. Falava
das coisas, contava dos partos, os meninos nascendo. Isso era bom.
O dente curado, que pena! Dente de ouro.
Seu Nacib era um santo, pagava ao dentista sem ela pedir. Um santo ele era, a
dar-lhe presentes, tantos, para quê?
Quando a visse no bar, reclamaria. Tinha
ciúmes… Que engraçado…
-
Que fazes aqui ? Vai andando para
casa…
Ia andando para casa. Vestida de fustão,
enfiada em sapatos, com meias e tudo. Em frente à Igreja, na praça, as crianças
brincavam brinquedos de roda. As filhas de seu Tonico, cabelos tão loiros,
pareciam de milho. Os meninos do promotor, o doentinho do braço, aqueles sadios
de João Fulgêncio, os afilhados do padre Basílio. E o negrinho Tuísca, no meio
da roda, a cantar e a dançar:
A rosa ficou doente,
O cravo foi visitar,
A rosa teve um desmaio,
O cravo pôs-se a chorar.
(Click 2 vezes na imagem. Parece que os conceitos de beleza física têm um pouco a ver com os seus contrastes. As pessoas do Sul da Europa, mais predominantemente morenas, preferem as louras e as do Norte, pelo contrário, mais branquinhas, as morenas. A ser verdade, e parece que sim, pode concluir-se que a natureza terá feito a sua "forcinha" para misturar tudo, optando pelos híbridos, Não gosta dos "puros", lá terá as suas razões... e ela quase nunca se engana. Assim, os homens e as mulheres sentem-se mais atraídos pelos seus contrários. Eu, que tenho olhos azuis-esverdeados, nunca trocaria esta morena por nenhuma loira...)
quarta-feira, agosto 22, 2012
Mário Viegas Manifesto Anti-Cavaco
Já passaram uns anitos bons, o "nosso" Cavaco lá continua, agora como Presidente da República e Mário Viegas, o melhor actor e declamador de sempre do nosso país, faleceu há muito (1996). Estamos em 1995, ano de eleições em que Mário Viegas é o 3ºcandidato pela Lista da UDP.
Recordêmo-lo neste Manifesto Anti Cavaco.
Portugal, Nação Valente e
Imortal (II Parte)
As empresas fecham, os
desempregados aumentam, os impostos crescem, penhoram casas, automóveis, o ar
que respiramos e a maltosa incapaz de enxergar a capacidade purificadora destas
medidas. Reformas ridículas, ordenados mínimos irrisórios, subsídios de
cacaracá?
Talvez. Mas passaremos sem
dificuldade o buraco da agulha enquanto os Loureiros todos abdicam, por amor ao
próximo, de uma Eternidade feliz. A transcendência deste acto dá-me vontade de
ajoelhar à sua frente. Dá-me vontade? Ajoelho à sua frente indigno de lhes desapertar
as correias dos sapatos.
Vale e Azevedo para os
Jerónimos, já!
Loureiro para o Panteão já!
Jorge Coelho para o Mosteiro
de Alcobaça, já!
Sócrates para a Torre de
Belém, já! A Torre de Belém não, que é tão feia. Para a Batalha.
Fora com o Soldado Desconhecido, o Gama, o
Herculano, as criaturas de pacotilha com que os livros de História nos enganaram.
Que o Dia de Camões passe a
chamar-se Dia de Armando
Vara.
Haja sentido das proporções,
haja espírito de medida, haja respeito.
Estátuas equestres para
todos, veneração nacional. Esta mania tacanha de perseguir o senhor Oliveira e
Costa: libertem-no. Esta pouca vergonha contra os poucos que estão presos, os
quase nenhuns que estão presos como provou o senhor Vale e Azevedo, como provou
o senhor Carlos Cruz, hedionda perseguição pessoal com fins inconfessáveis.
Admitam-no. E voltem a pôr o
senhor Dias Loureiro no Conselho de Estado, de onde o obrigaram, por maldade e
inveja, a sair.
Quero o senhor Mexia no
Terreiro do Paço, no lugar de D. José que, aliás, era um pateta.
Quero outro mártir qualquer, tanto faz, no
lugar do Marquês de Pombal, esse tirano. Acabem com a pouca vergonha dos
Sindicatos.
Acabem com as manifestações,
as greves, os protestos, por favor, deixem de pecar. Como pedia o doutor João
das Regras, olhai, olhai bem, mas vêde. E tereis mais fominha e, em
consequência, mais Paraíso. Agradeçam este solzinho. Agradeçam a Linha Branca.
Agradeçam a sopa e a
peçazita de fruta do jantar. Abaixo o
Bem-Estar.
Vocês falam em crise mas as
actrizes das telenovelas continuam a aumentar o peito: onde é que está a crise,
então?
Não gostam de olhar aquelas
generosas abundâncias que uns
Violadores de sepulturas,
com a alcunha de cirurgiões plásticos, vos oferecem ao olhinho guloso? Não
comem carne mas podem comer lábios da grossura de bifes do lombo e transformar
as caras das mulheres em tenebrosas máscaras de Carnaval.
Para isso já há dinheiro,
não é? E vocês a queixarem-se sem vergonha, e vocês cartazes, cortejos, berros.
Proíbam-se os lamentos injustos.
Não se vendem livros?
Mentira. O senhor Rodrigo dos Santos vende e, enquanto
vender, o nível da nossa cultura ultrapassa, sem dificuldade, a
Academia Francesa. Que queremos? Temos peitos, lábios, literatura e os
ministros e os ex-ministros a tomarem conta disto.
Sinceramente, sejamos justos,
a que mais se pode aspirar? O resto são coisas insignificantes: desemprego,
preços a dispararem, não haver com que pagar ao médico e à farmácia, ninharias.
Como é que ainda sobram criaturas com a desfaçatez de protestarem? Da mesma
forma que os processos importantes em tribunal a indignação há-de, fatalmente,
de prescrever.
E, magrinhos, magrinhos mas
com peitos de litro e beijando-nos uns aos outros com os bifes das bocas
seremos, como é nossa obrigação, felizes…
(Crónica satírica de António
Lobo Antunes, Abril de 2012)
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 173
Na Papelaria, à tarde,
morto de sono, Josué anunciara definitiva volta à poesia, agora sensual, a
cantar os prazeres da carne. E acrescentara:
- O amor eterno não existe. Mesmo a mais forte
paixão tem o seu tempo de vida. Chega seu dia, se acaba, nasce outro amor.
- Por isso mesmo o amor é eterno – concluiu
João Fulgêncio – Porque se renova. Terminam as paixões, o amor permanece.
Na sua janela, triunfante
e dengosa, Glória sorria para as solteironas, condescendente. Já não invejava
ninguém, a solidão acabara.
Canção de Gabriela
Assim, vestida de fustão,
enfiada em sapatos, com meias e tudo, até parecia filha de rico, de família
abastada. Dª Arminda aplaudia:
- Não tem em Ilhéus quem chegue a teus pés.
Nem casada, nem moça, nem rapariga. Não vejo nenhuma.
Gabriela rodopiava em
frente do espelho admirando-se. Era bom ser bonita: os homens enlouqueciam,
murmuravam-lhe frases com voz machucada. Gostava de ouvir, se era um moço a
dizer.
- Seu Josué queria que eu fosse morar com ele,
a senhora imagine! É um moço tão lindo…
- Não tem onde cair morto, professor de
menino. Nem pense nisso, você pode escolher.
- Penso não. Morar com ele quero não. Ainda se
fosse…
- Tá assim de coronel querendo, sem contar o
Juiz. Sem falar em seu Nacib ,
esse anda morrendo…
- Porque,
não sei não… - Sorriu – Tão bom, seu Nacib. Agora não pára de me dar presente.
Presente de mais… não é velho nem nada… Tanta coisa para quê? De bom que ele é…
- Não se espante quando ele lhe pedir em
casamento…
- Não tem precisão porque há-de pedir? Precisa
não.
Nacib descobrira-lhe um
dente furado, mandara-o tratar, botar dente de ouro. Escolhera ele mesmo o
dentista (lembrava-se de Osmundo e Sinhàzinha), um velho magrela na rua do
porto. Duas vezes por semana, após enviar os tabuleiros, preparado o jantar de
Nacib, ia ao dentista vestida de fustão.
Já estava no fim, o dente
curado, era uma pena. Atravessava a cidade, o corpo a gingar, olhava as
vitrinas, as ruas entupidas de gente, roçando ao passar.
Ouvia palavras, ditos
galantes, via seu Epaminondas, medindo fazenda, vendendo pano. De volta parava
no bar, cheio àquela hora do aperitivo. Nacib zangava-se:
- Que veio fazer?
- Passei só para ver…
(Click na imagem. Estamos na vindima, porque não uma uvinhas?)
ENTREVISTA FICCIONADA
COM JESUS Nº 62 SOBRE O TEMA:
“O SENHOR É DEUS”
RAQUEL - A unidade móvel de Emissoras Latinas mudou-se para o cimo do cume do Monte Tabor. Galileia, verde e esplêndida, a nossos pés. Acredita-se que foi aqui o lugar escolhido pelo senhor para se transfigurar diante de seus discípulos. Bom dia, Jesus Cristo.
JESUS - Bom dia, Raquel. Shalom!
RAQUEL - Apesar de ter mil perguntas pendentes, não posso evitar mais a que nossa audiência tanto espera. Quem é o senhor?
JESUS - Eu?... Eu sou Jesus.
RAQUEL - Alguns disseram que o senhor veio de outro planeta. Que é um extraterrestre.
JESUS - Extraterrestre?
RAQUEL - Não sou eu quem diz isso, mas escritores como J.J. Benítez que cavalga no cavalo de Tróia. Disse que na sua morte um disco voador veio recolhê-lo e o levar de volta à galáxia de onde veio.
JESUS - No meu tempo também escreviam contos, como o da Arca de Noé. Mas até as crianças sabiam que eram apenas isso, contos. Eu nasci nesta terra que estamos pisando. Não vim de nenhuma estrela.
RAQUEL - Nas entrevistas anteriores, o senhor deu-nos detalhes de seu nascimento, de seus pais. Mas, sejamos sinceros, ainda não nos esclareceu sua verdadeira identidade. Quem é o senhor, Jesus Cristo?
JESUS - Uma vez eu fiz essa pergunta a Tiago, a João e a Pedro... Quem o povo diz que eu sou? Uns que és o profeta Elias, outros que és o profeta Jeremias. E vocês? – Que dizem que eu sou? Tu és o Messias, o que vai libertar nosso povo.
RAQUEL - O senhor se considerava o Messias esperado?
JESUS - Eu sentia um fogo no meu coração... As palavras queimavam, se amontoavam na minha boca... Quando fui baptizar-me com João, no Jordão, não tinha ideia de até onde Deus me levaria.
RAQUEL - Mas nessa idade o senhor já conhecia sua vocação, sua missão divina? Ou não?
JESUS - Como ia conhecer, Raquel? A gente sabe do caminho quando vai caminhando.
RAQUEL - Mas perante Caifás, no Sinédrio, aí sim, tinha o filme claro, não é verdade?
JESUS - Que filme?
RAQUEL - Desculpe a expressão... quero dizer, que quando Caifás o interrogou, o senhor reconheceu que era o Messias. Ou não?
JESUS - Eu disse-lhe que sim, que o Reino de Deus tinha chegado.
RAQUEL - Mas Caifás não falou só do Messias. Perguntou-lhe se o senhor era o Filho de Deus. E o senhor também disse que sim.
JESUS - Claro, Raquel, todos somos filhos de Deus. Tu também és filha de Deus. Todos os teus ouvintes.
RAQUEL - Estou me referindo à sua natureza divina, e não creia que desta vez vai escapar. Tenho até a data. No Concílio de Calcedónia, ano 451, o senhor foi definido.
JESUS - Como assim fui definido?
RAQUEL - O senhor é uma pessoa em duas naturezas, uma divina e outra humana.
JESUS - E o que isso quer dizer?
RAQUEL - Vou dar-lhe um exemplo. O senhor, como homem, não conhecia a teoria da relatividade de Einstein. Mas como Deus sim, porque Deus sabe tudo.
JESUS - Que estranho, como se pode saber e não saber algo ao mesmo tempo?
RAQUEL - Outro exemplo. O senhor como homem não sabia que Judas ia traí-lo, mas como Deus já sabia.
JESUS - Se eu tivesse sabido o que Judas ia fazer, te asseguro que as coisas teriam sido muito diferentes. Teríamos regressado a Galileia imediatamente.
RAQUEL - Talvez eu não tenha me expressado bem porque sou jornalista e não teóloga. O que quero dizer é que...
JESUS - Deixa essa ladainha para outro momento, Raquel, e agora vê este vale... Respira o ar...
RAQUEL - Sim, respiro, mas… Os senhores, amigas e amigos ouvintes, estão satisfeitos? Eu ainda não. Por isso terei que continuar lhe perguntando sobre…
JESUS - Depois. Agora, deixa-te transfigurar por esta beleza e irás compreender melhor as coisas.
RAQUEL - Então… Do Monte Tabor e perante uma paisagem realmente maravilhosa, Raquel Pérez, Emissoras Latinas.
terça-feira, agosto 21, 2012
SCOTT McKENZIE - SAN FRANCISCO
Morreu no sábado com 73 anos, precisamente a minha idade, mais um... este vítima de uma doença do sistema nervoso que o vinha obrigando a internamentos desde 2010. San Francisco, seu grande sucesso musical, ficou-nos colado à pele e aos ouvidos e tornou-se no hino de uma geração misto de revolução hippie, música, drogas, liberdade sexual, expressão artística e política. Esta canção, inicialmente, devia servir para promover o festival de música pop de Monterey mas acabou por chegar aos primeiros lugares dos top e colou-se à cidade como símbolo de liberdade e, para ele, Scott Mckenzie, o seu cartão de visita.