Memórias Futuras
Olhar o futuro pelo espelho retrovisor da história. Qual história? Que futuro?
sábado, janeiro 31, 2015
Lucky Blondo - sur ton visage une larme
Lucky Blondo - Sur ton visage une larme
Passaram muitos anos, 50 e muitos, mas ainda dá para recordar, ou não?...
Passaram muitos anos, 50 e muitos, mas ainda dá para recordar, ou não?...
Os filhos aguardavam a idade da partida e do adeus |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 162
Nos alforjes e nos corações conduziam breves
contra febres e mordidas de cobra, lembranças e conselhos, faces queridas,
lágrimas e soluços.
Pai e mãe, mulher e filhos permaneciam em
Sergipe na promessa e na espera, ilusórias razões de vida resgatadas lentamente
pelos velhos na qui etude da loucura
mansa. As ressentidas vitalinas, essas trancavam-se com as chagas de Cristo na
solidão histérica dos casarões, em uivos e blasfêmias.
Os filhos aguardavam a idade do adeus e da
partida.
Nos caminhos poucos casais, sobretudo
com crianças. Raramente família numerosa, machos e fêmeas, idosos e moços,
avós, filhos e netos. Acontecia porém: juntos haviam decidido empreender a
travessia, juntos pretendiam permanecer. Clã ancestral, vigorosas raízes, laços
profundos de sangue e substância.
Terminavam por se dispersar na pugna do
cacau: nas plantações, nas cozinhas das casas-grandes, nas tocaias, nas casas
de putas.
Violados os fundamentos, novos valores se
impunham.
Cruzavam-se hábitos, maneiras de
festejar e de chorar. Misturavam-se sergipanos, sertanejos, levantinos, línguas
e acentos, odores e temperos, orações, pragas e melodias. Nada persistia
imutável nas encruzilhadas onde se enfrentavam e se acasalavam pobrezas e
ambições provindas de lares tão diversos.
Por isso se dizia grapiúna para designar
o novo país e o povo que o habitava e construía.
Diligentes e obstinados, os sergipanos
povoaram o território do cacau. Trabalho não faltava, enriquecer acontecia:
matéria para trova e sonho, convite para calçar as alpargatas e partir.
Mantinham certa solidariedade entre si,
ajudavam-se sempre que possível.
Alguns, ao desembarcar em Ilhéus,
traziam endereço certo: a fazenda de um conterrâneo, Coronel cuja fama de
riqueza alimentava conversas e redondilhas nos dias pobres das cidades vazias de
homens.
Quando Natário fugira de Propriá,
trouxera recado de um parente, vago primo distante, para o coronel Boaventura
Andrade.
Em clima de risco, é mais seguro confiar
num conterrâneo.
3
O capitão Natário da Fonseca suspendeu o
passo da alimária
à aproximação da farândola para melhor
corresponder ao cumprimento do velho, repetido num eco de vozes cansadas:
bastardes.
O velho retirou o chapéu para pedir a
informação. Queria saber se trilhavam o rumo certo das fazendas estabelecidas
nas matas do rio das Cobras e se era verdade que naqueles lados estavam contratando
trabalhadores.
guardar...
Um
filho pergunta à mãe:
-
Mãe, posso ir ao hospital ver meu amigo? Ele está doente!
-
Claro, mas o que ele tem?
O
filho, com a cabeça baixa, diz:
-
Tumor no cérebro.
A
mãe, furiosa, diz:
-E
você quer ir lá para quê? Vê-lo morrer?
O
filho lhe volta as costas e vai...
Horas
depois ele volta vermelho de tanto chorar, dizendo:
-
Ai mãe, foi tão horrível, ele morreu na minha frente!
A
mãe, com raiva:
-
E agora?! Tá feliz?! Valeu a pena ter visto essa cena?!
Uma
última lágrima cai de seus olhos acompanhada de um sorriso e ele diz:
- Muito, pois
cheguei a tempo de vê-lo sorrir e dizer:
-
"EU TINHA CERTEZA QUE TU VINHAS"
Subsidiozinho
do paralítico
É injusto o que está a acontecer ao povo grego, e digo povo grego e não Grécia porque dentro desta cabem muitas realidades, algumas das quais, debaixo da mesma bandeira e com a mesma nacionalidade, fortemente responsáveis pelo que aconteceu ao país.
Já disse aqui que, dos
muitos milhares de milhões emprestados à Grécia, apenas 10% foram utilizados em Investimento Público ,
ou seja em benefício do povo.
O restante foi para pagar ao FMI e aos bancos europeus credores,
entre os quais alemães.
Estamos, portanto, numa situação em que os sacrifícios das pessoas
foram usados como moeda de troca para obter empréstimos que beneficiam outros
que não eles.
Na verdade só assim se explica que 6 anos depois das ajudas
financeiras e perdões de dívida, os resultados que estão à vista sejam estes,
sendo certo que nada disto poderia ter acontecido não fora a cumplicidade das
elites gregas, entre as quais a dos grandes armadores gregos que se recusaram a pagar
impostos sob a ameaça de desviar para outros portos do Mediterrâneo os seus
navios.
Comparados com estes o paralítico que passa a pé em frente da casa
do antigo ministro da Defesa porque subornou um médico para lhe conceder um
atestado que lhe permitiu obter mais um subsidiozinho, é gota de água no
oceano.
Mas sim, há muitos subsiodizinhos a mais na sociedade grega.
A cultura do pequeno envelope que passa por debaixo da mesa,
antiga herança dos tempos do domínio turco que se registou desde o Sec. XIV até
meados do XIX, equi valente em maior
escala à tradicional “cunha” bem portuguesa, constitui a pequena grande
corrupção.
Não é apenas o somatório de pequenos montantes que são desviados
dos circuitos normais e entram indevidamente nos bolsos daqueles que, pelas
funções, estão em condições de venderem favores, é o mal que se abate sobre os
cidadãos que percebem que, afinal, se pode viver e triunfar na vida, não pelo
trabalho, competência e mérito, mas pelo simples tráfego de favores. É desmoralizante para qualquer sociedade de um país democrata da
Europa civilizada.
Os gregos podem concentrar o seu ódio e revolta na troika e,
acredito muito justamente, mas esta pequena corrupção tão generalizada no seu
seio não pode deixar de constituir um ferrete, um problema de consciência social
para o qual todos são arrastados impotentes que são de lutar contra ela.
sexta-feira, janeiro 30, 2015
IMAGEM
Perda irreparável... Sem a mãe e sem a manada o bebé elefante não sobrevive. O leite, a protecção, os ensinamentos são muito difíceis de substituir mesmo em "infantários" especializados. Há uma organização queniana que se dedica ao resgate de elefantes órfãos pelo esforço feito por tratadores e voluntários para darem novamente vida às crias. Cerca de 35.000 elefantes são abatidos todos os anos por causa do marfim. A destruição dos ambientes naturais fará o resto...
Rádio Comercial | Mixórdia de Temáticas: Ovelhas electromagnéticas
Mixórdia de Temáticas - Ovelhas electromagnéticas
Demis Roussos - We Shall Dance - Legendado
DEMIS ROUSSOS - WE SHAL DANCE
Foi com "We Shall Dance" que o cantor iniciou a conquista do mundo a solo. De uma família grega em Alexandria, no Egipto, ele, com a mania das grandezas que combinava bem com o seu tamanho XL, falava com orgulho de ser descendente de Alexandre O Grande e dos faraós do antigo Egipto.
(Jorge Amado)
Episódio Nº 161
A
seu flanco, em vez de trombeta, o arcanjo anunciador conduzia uma lazarina,
exercitava a pontaria.
Comparsa na procissão das chagas,
mensageiro da demência,
apaniguado de Bom Jesus e da Virgem Mãe,
o imberbe pregoeiro tocara as extremidades do horror, bailara na festa dos moribundos,
recebera as cinzas da quaresma, queimara judas na aleluia.
Nos testamentos de Judas restava para o povo o
assombro dos prodígios e o pagamento das promessas - ah, terra de pobreza e iniqui dade! Nos limites do cacau não existiam romarias nem
milagres.
2
Sucediam-se as levas de sergipanos nos
derroteiros do rio das
Cobras, adentrando-se pelas matas; as
fazendas recentes reclamavam trabalhadores. De passagem, abasteciam-se no
comércio de Fadul, banhavam-se na
correnteza, recolhiam informações.
Do dinheiro
contado e recontado, alguns mais avexados subtraíam
moedas para o desalívio de mulher. Lugar bonito, aquele.
Na desvalida pátria sergipana ouviam-se
maravilhas, narrativas fantásticas sobre as terras do sul da Bahia e a lavoura
do cacau.
Terras férteis, muitas ainda devolutas -
era chegar e tomar
Posse - lavoura sem igual, mina de ouro.
Trabalho sobrando na foice, na enxada, no tanger dos burros, no corte do facão,
no clavinote.
Quem tivesse ambição, fosse disposto e
soubesse aproveitar a sorte, poderia enriquecer.
Recitavam-se casos nas feiras, exemplos
comprovados, a pura verdade. A história em versos do coronel Henrique Barreto,
o
Rei do Cacau, passava de boca em boca,
de ouvido em ouvido, na consonância das violas: “Morto de fome, saiu de Simão
Dias...”
Arribara mocinho, “seu capital, um toco
de facão”. De inicio, alugado, depois tropeiro, “tangendo burro noite e dia”.
Pusera bodega num arruado “pra vender
cachaça e munição”, juntara o necessário para comprar uma braça de terra, “nela
botara roça de cacau” e quando deu de si “virara um grande potentado”.
Rei do Cacau, o coronel Henrique Barreto,
nascido e criado na miséria em
Simão Dias : nas festas de fim de ano, enviava alguns trocados
para os parentes que por lá prosseguiam à míngua, apáticos sergipanos.
Ele, o Coronel, tornara-se grapiúna.
Nas estradas e atalhos cruzavam-se
bandos de homens jovens
ou na força da idade, casados e solteiros.
Tomavam o rumo
do sul da Bahia, abandonando os campos
feudais, as pequenas cidades mortas, apenas alcançavam a idade da razão ou
quando perdiam a última esperança de encontrar trabalho e pagamento.
Adeus, meu pai, minha mãe, me botem sua
bênção, vou enricar em
Itabuna. Adeus , mulher e filhos, vou na frente ganhar
dinheiro em Ilhéus para a viagem de vancês.
No Porto, um bêbado
estava a passar pelo rio Douro, quando viu um grupo de evangélicos a orar e a
cantar. Resolveu perguntar:
- O que se está a passar... aqui ?
- Estamos a fazer um baptismo nas Águas. Você também deseja encontrar o Senhor?
- Eu quero, sim....
Os evangélicos vestiram o bêbado com uma roupa branca e levaram-no
para a fila. Numa margem do rio estava um pastor que pegava nos fieis,
mergulhava a cabeça deles na água, depois tirava e perguntava:
- Irmão... viste Jesus?
- Ah, eu vi, sim...
E todos os evangélicos diziam:
- Aleluia! Aleluia!
Quando chegou a vez do
bêbado, o pastor meteu-lhe a cabeça na água, depois tirou e perguntou-lhe:
- Irmão... viste Jesus?
- Num bi! - Disse o bêbado.
O pastor colocou novamente a cabeça
do bêbado na água e deixou-a lá um certo tempo. Depois tirou-a e perguntou:
- E agora, irmão... viu Jesus?
O bêbado já bastante ofegante, lá
disse:
- Num bi, carago!
O pastor, já nervoso, colocou de novo
a cabeça do bêbado debaixo de água e deixou-a lá por uns cinco minutos. Depois
puxou o bêbado e perguntou-lhe:
- E agora, irmão... já conseguiste ver Jesus?
O bêbado, já mole e trôpego de
tanta água engolir, disse:
- Fod...-se , já disse que num bi caraaago! Bocês têm a certeza de
que ele caiu aqui ????... Num estará
no estádio da Luz a treinar o Benfica ? ....
Porque razão, depois de cinco anos de austeridade, a
Dívida Pública continua a aumentar nos países intervencionados e a deflação se estende
hoje, como um manto gelado, por toda a Europa?
O grande mérito da vitória do Sirysa na Grécia será a de
colocar esta pergunta crucial em cima da mesa dos líderes europeus.
A receita da austeridade foi constituída por privatizações,
despedimentos, baixa de salários e desmantelamento ou diminuição dos sistemas
de protecção social, como resultado de negociações impostas aos países “encostados
à parede” por falta de dinheiro para satisfazerem as mais elementares
necessidades do Estado.
Mas para onde foi o grosso do dinheiro, no caso da Grécia,
250 mil milhões entre resgates e perdão de dívida?
- Apenas 10% foi para Despesa Pública, O resto foi usado
para transferir dívida dos Bancos e do sector financeiro para o sector oficial,
incluindo o FMI. O dinheiro rodava por outros lados...
Ou seja, o povo que suportou os sacrifícios, 25% em
desemprego e 65% em desemprego jovem, passou à margem dos benefícios que
deveriam ter resultado da entrada de tanto dinheiro.
Este clima de queda generalizada dos preços em que a
Europa vive, incluindo a Alemanha que já entrou em deflação, pode tornar pouco útil
esta medida do BCE de Mário Draghi porque se não há expectativas de vendas com
lucros a economia pouco mexe porque os investidores, mesmo tendo dinheiro, não
têm estímulos para investir.
No EUA, outra economia de mercado como a europeia, mas com
políticas económicas diferentes tem outros resultados dado que não obedece a
políticas orçamentais restritivas que funcionam como espartilhos.
Mário Draghi põe o dedo na ferida quando diz que pode
mexer na Política Monetária mas nada pode fazer com a Política Orçamental que
compete aos governos.
Entretanto, há toda uma população europeia, porque a
austeridade não faz sentir os efeitos só na Grécia e em Portugal, que remoem
dentro de si as dificuldades porque passam e que estão na base da adesão aos
nacionalismos que podem fazer implodir o projecto europeu a atender aos sinais que se fazem sentir.
A Frau Merkel e todos os líderes europeus têm que tentar
responder à pergunta inicial numa perspectiva que vá ao encontro dos
verdadeiros interesses das economias que produzem riqueza e dão emprego às
pessoas.
Não podemos viver para cumprir uma meta orçamental sob
pena de não vivermos.
quinta-feira, janeiro 29, 2015
Csardas de Monti - em violino chinês de 2 cordas
Se com 4 de um violino normal já é difícil... é um prazer ouvir. Para mim até podiam ser 20 que o resultado seria o mesmo...
IMAGEM
Sequóia gigante denominada ´"O Presidente". Mais de 75 metros de altura, 8 de diâmetro e 3.200 anos de idade. Está situada na floresta Redwood na Califórnia. Nunca tinha sido fotografada devido ao seu tamanho. Foi-o agora com a colaboração de fotógrafos da N. G. e cientistas. Finalmente, foram seleccionadas 126 fotografias que juntas deram a fotografia abaixo.
Adamo - Mes mains sur tes hanches (1965)
O que são 50 anos se ela está fresquíssima na nossa memória?
Vou embora, Tição |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 160
Epifânia pulou fogueira com Zuleica, fizeram-se
comadres. O momento supremo foi o da largada do balão, surpresa para todos
exceto para Tição e Coroca. Chuviscava apenas: encheram-no de fumaça ao pé da
fogueira maior, no descampado onde se concentraram. Acenderam a mecha, o balão
subiu ao céu e nele se perdeu.
Antes de desaparecer, confundiu-se com
as estrelas raras e opacas: estrela de mentira era a mais bela.
Festejaram, ainda, a noite de São Pedro
para dar cabo do licor de jenipapo de Cotinha e aproveitar a presença de Pedro
Cigano com o fole.
Dias, depois, de manhãzinha, Castor
acabara de cuidar dos cascos de Rosedá, madrinha da tropa de Elísio - depois de
tê-los aparado com o puxavante, ele os brindara com quatro polidas ferraduras -
quando viu Epifânia à espera, pronta para partir: haviam passado a noite juntos
e ela nada anunciara.
A trouxa na cabeça, pequeno amarrado com
trapos e chinelas, seus pertences.
- Vou embora, Tição. - Ia aproveitar a
tropa de Elísio para não viajar sozinha. - Posso levar o abebê que tu fez pra
mim?
- Nos olhos e na voz a decisão, uma
ponta de tristeza e o rude orgulho.
Tição entregou-lhe o espelho de latão
que figurava Oxum no peji dos orixás. Não pediu que ela ficasse, apenas disse:
- Vou me lembrar de ocê a vida toda.
Epifânia estendeu a ponta dos dedos:
descalça, a trouxa em cima da carapinha, o abebê na mão, seguiu a tropa no
destino de Taquaras.
Alma Penada a acompanhou durante um bom
pedaço, mas ao entender que a negra ia de vez, arrepiou caminho e voltou a se
deitar no calor da forja.
Continuava feio e magro; revelara-se porém,
valente e bom de caça. Guardava a oficina e os passos de Tição.
O CAPITÃO NATÁRIO DA FONSECA ENCONTRA NA
ESTRADA UMA FAMÍLIA DE SERGIPANOS E A ENCAMINHA PARA TOCAIA GRANDE
1
Para ser um grupo de romeiros faltavam
apenas a cantoria e os cães, refletiu o capitão Natário da Fonseca ao avistar a
caravana.
Adolescência vadia, Natário não
enjeitara festa de santo milagreiro nas barrancas do rio São Francisco onde
nascera.
Fora guia de cego, chamego de
mulher-dama, zagal de beato. Cavalgando a besta do Apocalipse, o beato
Deoscóredes marchava impávido para o dia do juízo final conclamando penitentes
nas vésperas do fim do inundo.
Ele sente-se um revolucionário |
Alexis Tsipras
– O Revolucionário
Tenho lido e ouvido descrições do que é, neste momento, a situação dos gregos. Dramática, a roçar os limites da sobrevivência em centenas de milhar de casos com a agravante de que muitas dessas pessoas não têm na sua vida experiência de sem pobres.
Vêm da classe média, são instruídas, tinham um emprego,
normalmente nos Serviços e caíram, progressivamente, numa situação de total
desamparo, sobrevivendo da caridade social.
Não têm dinheiro para nada, andam a pé, comem uma refeição por dia
numa instituição de apoio social que ontem servia quarenta e tal almoços e hoje
quatrocentos e muitos de pior qualidade que os outros.
Na casa em que vivem, que é delas e onde se mantêm porque,
felizmente, uma lei não as deixa penhorar, já não têm luz eléctrica cortada há
muito por falta de pagamento. Substitui-a uma vela comprada com a ajuda de
alguns amigos dos tempos em que tinham emprego.
Nas suas vidas não há nada, já não são novos, falta-lhes
experiencia na pobreza, estímulos para lutar, em boa verdade não sabem, a verdadeira
vontade é deixarem-se morrer.
As pessoas à volta são como fantasmas, ou serão elas? - cinzentas,
indiferentes, irreais. A sociedade faliu, a família ignora-as porque também não
as pode ajudar, nas suas dificuldades cresce o egoísmo.
No passado, o seu povo contribuiu com a maior das dádivas para a
humanidade: o pensamento científico e a democracia e elas sabem-no e por isso
sentem orgulho, por isso mais lhes dói a situação em que se encontram.
Alexis Tsipras chega ao poder e sente a raiva escondida pelas
humilhações de todos aqueles, que sendo gregos como ele, roubaram e enganaram
os compatriotas colaborando com os estrangeiros em actos de pura espoliação. Os
gregos das elites, os que usam gravata, a mesma gravata que ele recusou pôr no acto da posse...
O país está como que a saque, os governantes que eles substituíram
até os sabonetes das casas de banho levaram...
Ele é engenheiro mas, mesmo analfabeto que fosse, sabe que uma impossibilidade elementar da vida em sociedade é de que não se pode dar o que não se tem,
distribuir uma riqueza que não existe, que não é produzida em quantidade
suficiente, mas olha à sua volta e não consegue resistir aos concidadãos maltratados,
de mão estendida para ele, uma réstia de esperança...
Sente-se credor da Europa, da Alemanha, do mundo, sente-se
revoltado... sente-se revolucionário.
A Europa criou no seu seio um grave problema. Ela própria é um problema.
quarta-feira, janeiro 28, 2015
The Animals - The House of the Rising Sun (Excellent video and audio qua...
The Animals - The House of the Rising Sun (A casa do sol nascente)
Como estarão hoje estes rapazes? Serão vivos? Chamarem -se de animais era "forte" mas reparem como estão todos impecavelmente vestidos de igual. Eram, em 1964, ainda muito novinhos e estão agora com mais de 70 anos que estes, quando passam, não é só para mim.
cair morto
A notícia de que a família Espírito Santo não tinha um único bem em seu nome elucidou-me sobre o tipo de sociedade em que vivemos, aonde chegámos.
Juristas meus amigos
garantiram-me que é perfeitamente legal um cidadão, ou cidadã, ou uma família não
ter qualquer bem em nome próprio. Nunca tinha colocado a questão da ausência de
bens no quadro da legalidade, mas no da necessidade.
Acreditava que pessoas
caídas na situação de sem-abrigo, refugiados, minorias étnicas não enquadradas
como algumas comunidades ciganas podiam não ter nada em seu nome, mas até já
ouvira falar no direito a todos os cidadãos possuírem uma conta bancária, um
registo de bens, nem que fosse para prever uma melhoria de situação no futuro.
Considerava um acto de reconhecimento da cidadania ter em seu nome o que pelo
esforço, ou por herança era seu. Chama-se a isso “património”, que tem a mesma
origem de pai e de pátria, aqui lo
que recebemos dos nossos antecessores e que faz parte dos bens que constituem a
entidade onde existimos.
Estes conceitos não valem
para os Espirito Santo, para estes agora desmascarados e para os da sua
extracção que continuam a não ter bens em seu nome, mas têm o nome em tantos
bens, em paredes inteiras, em tectos de edifícios, em frontarias, em
supermercados, em rótulos de bebidas.
Imagino
com facilidade um dos seus advogados e corifeus, um Proença de Carvalho, por
exemplo, a bramar contra a injustiça, contra o atentado às liberdades
fundamentais dos pobres a nada terem, à violência socializante e colectivista
que seria obrigar alguém a declarar bens que utiliza para habitar, para se
movimentar por terra, mar e ar, para viver, em suma.
A legalidade do não
registo de bens em nome próprio para se eximir ao pagamento de impostos e fugir
às responsabilidades perante a justiça é um exemplo da perversidade do sistema
judicial e da sua natureza classicista.
Esta norma legal destina-se a proteger ricos
e poderosos. Quem a fez e a mantém sabe a quem serve. Os Espirito Santo não são
gente, são empresas, são registos de conservatória, são sociedades anónimas,
são offshores com fato e gravata que recebem rendas e dividendos, que pagam
almoços e jantares.
Não são cidadãos. As cuecas de Ricardo Espirito Santo não
são dele, são de uma SA com sede no Panamá, ou no Luxemburgo. A lingerie da
madame Espírito Santo é propriedade de um fundo de investimento de Singapura,
presumo porque não sou o contabilista.
Mas a ausência de bens
registados pelos Espirito Santos em seu nome diz também sobre a sua
personalidade e o seu carácter. A opção de se eximirem a compartilhar com os
restantes portugueses os custos de aqui
habitar levanta interrogações delicadas: Serão portugueses? Terão alguma raiz
na História comum do povo que aqui
vive? Merecem algum respeito e protecção deste Estado que nós sustentamos e que
alguns até defenderam e defendem com a vida?
Ao declararem que nada possuem, os Espírito
Santo assumem que não têm, além de vergonha, onde cair mortos!
O ridículo a que os Espirito Santo se sujeitam com
a declaração de nada a declarar com que passam as fronteiras e alfândegas faz
deles uns tipos que não têm onde cair mortos, uns párias.
A declaração de “nada a declarar” em meu nome, nem
da minha esposa, filhinhos e restante família dos Espirito Santo, os Donos
Disto Tudo, também nos elucida a propósito do pindérico capitalismo nacional:
Os Donos Disto Tudo não têm onde cair mortos! O capitalismo em Portugal não tem
onde cair morto!
Resta ir perguntar pelas declarações de bens dos Amorins, o mais rico
dos donos disto, do senhor do Pingo Doce, do engenheiro Belmiro, dos senhores
Mellos da antiga Cuf, dos senhores Violas, dos Motas da Engil e do senhor José
Guilherme da Amadora para nos certificarmos se o capitalismo nacional se resume
a uma colecção de sem abrigo que não têm onde cair mortos!
É que, se assim
for, os capitalistas portugueses, não só fazem o que é costume: explorar os
pobres portugueses, como os envergonham.
Os ricos, antigamente, mandavam
construir jazigos que pareciam basílicas para terem onde cair depois de mortos
– basta dar uma volta pelos cemitérios das cidades e vilas. Os ricos de hoje
alugam um talhão ao ano em nome de uma sociedade anónima! Os Espirito Santo,
nem têm um jazigo de família!
Eu, perante a evidência da miséria, se fosse
ao senhor presidente da República, num intervalo da hibernação em Belém,
declarava o território nacional como uma zona de refúgio de sem-abrigo, uma
vala comum e acrescentava a legenda na bandeira Nacional: “Ditosa Pátria que
tais filhos tem sem nada!”
Carlos de Matos Gomes
( Coronel do Exército reformado e um escritor português)