Memórias Futuras
Olhar o futuro pelo espelho retrovisor da história. Qual história? Que futuro?
sábado, maio 15, 2010
O Triunfo dos Pastéis de Nata na Expo Xangai
O pão de ló também sai bem, mas não se compara ao pastel de nata. Desde a abertura da Expo (dia 01 de maio) já vendemos mais de 25 000, disse hoje à agência Lusa o chefe do restaurante, Bruno Magro. Cada pastel custa 5 yuan (60 cêntimos).
Introduzido no continente chinês há cerca de uma década, o pastel de nata ("pu shi dan ta", expressão que significa, literalmente, "tarte de ovo de estilo português") é também uma das especialidades da "Júlia Food Co", a empresa de Xangai concessionária da cafetaria-restaurante do pavilhão português.
A Júlia Food Co tem mais de 30 lojas em Xangai, com cozinheiros de Macau, mas para a Expo 2010 contratou o "chefe" Bruno Magro, que trabalhava num dos raros restaurantes de cozinha portuguesa em Pequim.
É a maior exposição universal de sempre, com cerca de 240 países e organizações internacionais, e espera atrair 70 milhões de visitantes.
O movimento tem sido bom desde o primeiro dia, diz Bruno Magro. A cafetaria-restaurante serve também caldo verde, bifanas, moelas, frango e outros pratos típicos, alem de bicas, cerveja e vinho.
Os vinhos estão igualmente a sair bastante bem e algumas pessoas até compram para levar para casa, referiu ainda Bruno Magro.
A Expo 2010, dedicada ao tema "Better City, Better Life" (Melhores Cidades, Maior Qualidade de Vida), decorre de 01 de maio a 31 de Outubro numa área de 528 hectares (dez vezes a Expo 98, em Lisboa) ao longo das duas margens do rio que atravessa Xangai.
O pavilhão de Portugal, situado à entrada de Praça Europa, é um edifício de 2000 metros quadrados, revestido de cortiça, que evidencia os 500 anos de relações com a China e a atual aposta portuguesa nas energias renováveis.
Mais de cem mil pessoas visitaram o pavilhão durante a primeira semana do certame, correspondendo a cerca de 10% das visitas globais.
... E Vivam os Pastéis de Nata... (adoro-os!)
sexta-feira, maio 14, 2010
Chegámos à 13ª entrevista de Raquel a Jesus Cristo e destes diálogos ressalta o tom tranquilo, quase humilde, de Jesus Cristo. Ele percebe que as suas respostas não confirmam os ensinamentos recebidos ou herdados por Raquel sobre a sua vida e a da sua família, que constituem mesmo revelações surpreendentes e chocantes, e daí a subtileza que ele emprega nos esclarecimentos que lhe presta.
A igreja sabe que as convicções religiosas, ou outras quaisquer, precisam de se apoiar em histórias que desçam ao pormenor das coisas do dia-a-dia para as tornar mais convincentes e que a fantasia faz parte das melhores histórias.
A fé religiosa, a tal “necessidade de acreditar”, instrumento de sobrevivência da nossa espécie, facilita e permite a passagem destas histórias que enchem os nossos imaginários e se tornam parte integrante de nós mesmos. Percebemos isso, quando continuamos a ver em reportagens passadas pelo canal público da Televisão que nos entram em casa em doses maciças, milhares de pessoas em peregrinação a caminho de Fátima aproveitando a visita do Papa.
Para um Estado que se diz laico e republicano significa que ele não consegue nem lhe interessa subtrair-se à força que a igreja possui entre nós numa já ancestral aliança entre o Poder e a Igreja.
Vamos respeitar as pessoas que vão a Fátima em peregrinação. Fazem-no, a maior parte, por imperativos interiores, os restantes, familiares e amigos, como simples acompanhantes solidários no esforço físico das caminhadas.
Os homens da Igreja, desta ou de qualquer outra, não descobriram nem inventaram a fé, apenas se aproveitam dela, usam-na em seu favor como um instrumento para dominarem a consciência dos seus semelhantes e obterem poder e riqueza.
A mensagem de Jesus Cristo, já afirmada nestas entrevistas, é de Justiça e todos nós compreendemos que uma sociedade que fosse justa ou constituída por homens predominantemente justos, nem precisaria que eles fossem bons e solidários porque a bondade e a solidariedade servem, precisamente, para tentarem reparar as consequências das injustiças.
Pois bem, se Deus, pela boca de Jesus Cristo, afirma que os homens têm de ser justos, se essa é a sua mensagem, então aqueles que não conseguirem sê-lo por si próprios, acreditem em Deus e sejam justos em obediência a Ele.
É que a justiça é mais do que uma meta, um desígnio, uma mensagem e, embora deva ser tudo isto, provavelmente pode vir a ser uma condição de sobrevivência para a humanidade porque à medida que as consciências despertam para os valores e direitos do homem, de resto já consagrados internacionalmente, mais difícil e problemático será viver num mundo onde, por significativos que tenham sido já os avanços nesse sentido, ainda há injustiças gritantes.
O caminho da racionalidade parece-me, sem dúvida, ser o mais consistente, o que melhor corresponde à natureza da nossa espécie de “homo sapiens, sapiens”, sem recurso a crenças, de resto perigosas como se vê nos tempos que correm, mas também percebo que esse caminho é o mais difícil e o mais demorado de conseguir.
Entretanto, continuaremos a transcrever as entrevistas de Raquel com Jesus Cristo. Paradoxalmente, elas poderão dar uma ajuda nesse caminho…
STAND BY ME - SONG AROUD THE WORLD
(parabéns aos artistas de rua e ao realizador por esta original realização)
SALVATORE ADAMO - TOMBE LA NEIGE
(do vasto e lindo reportório deste "rapaz do meu tempo" esta é das mais bonitas)
SIMONE E GONZAGUIHA - MULHER E DAÍ
(Gonzaguinha é um ser especial... um poeta. Morreu, mas está vivo nas suas músicas)
VICTOR ESPADINHA - RECORDAR É VIVER
(Cada um pensará, ao ouvir esta bela canção, naquela que foi o amor da sua vida...)
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
EPISÓDIO Nº 120
- Zé Sampaio odiava aquela cabeçorra oxigenada, “cabeça de elefante, a maior da Bahia” a dentadura de cavalo, a voz de cavalo e os cuidados: - Sempre doentinho, seu Sampaio? Eu vivo dizendo: “Seu Sampaio, com todo aquele corpo, tem a saúde muito delicada. Qualquer coisinha e está tremendo na cama, cercado de remédios”. Digo e repito: “ Se seu Sampaio não tomar cuidado um dia desses bate a bota…”
Impressionado, Zé Sampaio, gostaria de corre-la a pontapés:
- Tenho uma saúde de ferro dona Dinorá…
- E por que fica assim na cama seu Sampaio, por que não vem ilustrar a gente com a sua prosa? Homem tão letrado, todo o mundo diz que o senhor só não se formou porque… bem, o senhor sabe, o povo fala tanta coisa… se a gente for dar atenção… eu não ligo, vão falando, entra por um ouvido sai pelo outro…
Zé Sampaio sabia onde ela desejava chegar: à sua dissoluta mocidade de filhinho de papai dissipador e malandro. O pai, desgostoso, cortou-lhe a mesada e, retirando-o dos estudos, o pôs na loja a trabalhar de caixeiro.
- Deixe o povo falar, dona Dinorá, não se importe…
- O senhor também acha que a gente não deve se importar com o que falam de nós? Não deve mesmo? – abria os olhos grandes, de boi, muito atenta, como se Zé Sampaio fosse um oráculo dos novos tempos.
- Eu, pelo menos… - e, enchendo-se de vez: - Quer saber de uma coisa, dona Dinorá? Eu quero é paz e descanso… e, para ter um bocadinho de paz, vivo dando razão a quem não a tem. E nem assim consigo… E nem assim consigo… Vêm me aporrinhar até aqui… Com sua licença.
Tomando do jornal ou da revista, virava as costas à visita. “Zé Sampaio é mais bruto do que uma cavalgadura” – dona Dinorá sentia-se envergonhada – “e logo com dona Dinorá, tão boazinha…”
Rispidez ao demais inútil pois dona Dinorá não se dava por expulsa, persistindo solerte:
- O senhor já sabe o que se passou com seu Vivaldo?
Ah!, mulher mais diabólica, desgraçada! Pois não é que lhe conseguia despertar o interesse? Zé Sampaio largava o jornal, vencido:
- Com Vivaldo? Não sei, o que foi?
- Pois eu lhe conto… Seu Vivaldo, homem direito, bonitão, hein! Parece um gringo, todo rosado…
Era sempre assim: após os elogios, vinha a intriga, a maledicência, a denúncia de um trago a mais, da escapula de um marido, um nome de mulher, quase sempre de mulher-dama.
Seu Vivaldo da funerária, segundo ela, num desrespeito às lápides e aos esquifes, reunia, nas tardes dos sábados, por detrás das cortinas roxas com efeitos cor de prata, um grupo de hereges em arrenegado póquer de apostas altas e vasto dispêndio de conhaque e genebra:
- Uma falta de respeito, o senhor não acha? Podia arranjar outro lugar para o vício… - ligeira pausa. – O senhor não pensa, seu Sampaio, que o jogo é o pior dos vícios?
A hospedeira observa o que ela faz, e pede para ver o seu bilhete. Diz então para a loira que ela pagou classe económica e que deve sentar-se no fundo.
A loira responde:
A hospedeira vai então à cabine e fala ao piloto e co-piloto que tem uma loira sentada na primeira classe, que deveria estar na classe económica, e não quer voltar para seu lugar.
O co-piloto dirige-se à loira e tenta explicar que ela pagou somente por classe económica, e que deve sair dali e sentar-se no seu lugar.
A loira responde:
- Sou loira, sou bonita, vou para Toronto e vou ficar bem aqui.
O co-piloto diz ao piloto que provavelmente deveriam ter a polícia à espera quando eles aterrassem para prender esta mulher. O piloto diz:
- Você disse que ela é loira?
Eu vou falar com ela, sou casado com uma loira e falo “loirês”. Dirige-se à loira e diz-lhe qualquer coisa ao ouvido.
Ela diz:
- Oh, peço desculpa.
Levanta-se e vai para o seu lugar na classe económica.
A hospedeira e o co- piloto ficaram boquiabertos, e perguntam-lhe o que é que ele disse para fazê-la mudar de ideias.
Ele responde:
- Disse-lhe simplesmente que A PRIMEIRA CLASSE NÃO ÍA PARA TORONTO....
JIMMY CLIFF - LOVE IS ALL
(adoro este ritmo... raízes... e não se esqueçam que o amor é tudo...ou quase)
MICHEL SARDOU - LA MALADIE D'AMOUR
(mais uma canção a despertar gratas recordações...)
DULCE PONTES - FESTA DA MOURARIA
(um povo, uma cultura, um coração que canta. O mundo inteiro pára para escutar...)
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
EPISÓDIO Nº 119
Eis dona Dinorá já além dos sessenta: voz estridente, enervante gargalhada, constante agitação. Em aparência a mais solidária e compreensiva velhota; em verdade um “frasco de veneno, cascavel enfeitada com penas de pássaros”, na frase quase poética de Mirandão, eterna vítima dessa categoria de comadres. Frase dita ao jornalista Giovanni Guimarães, ao ver a sessentona passar, muito viúva e sustentáculo da moral, por ocasião do almoço em casa de dona Flor, quando da visita de Sílvio Caldas. Completara, filósofo moralista:
- Quanto mais puta em jovem mais séria na velhice. Ficou donzela e bucho…
- Aquele estrepe? Quem é?
- Não é do nosso tempo, mas já teve nome e apelido. Quem fala muito nela é Anacreon, andou bebendo nessa moringa. Você já ouviu falar, na certa.
Atendia por Dinorá Sublime Cu.
Quase mudo, Giovanni, em espanto e assombro:
- Isso aí? O Sublime Cu tão recordado? Meu Deus!
Prova da vaidade das coisas terrenas, consideraram humildemente os dois, ante tal exibição de virtude e o triste físico do leva-e-traz: atarracada, tronco forte, pernas curtas, oveiro baixo, cabeçorra, champruda. Vestida de luto, como viúva verdadeira, medalhão ao pescoço com a fotografia do comendador, de quem falava como se houvesse sido sua esposa e ele o último homem da sua casta vida. Tipos como Anacreon, vergonha do género humano, era como se não existissem; ela os desconhecia, simplesmente.
Ladina, não ia directa aos assuntos, em acusações frontais; ao contrário, infernava os demais na maciota, parecendo tudo compreender e desculpar, elogiando uns e lastimando outros. Daí a sua fama de bondosa e simpática, os louvores semeados em seu caminho de mexericos. “Criatura boa vai ali…” Quando, por um azar, pegada em flagrante de intriga, dava-se por vítima: quisera fazer um benefício, em paga recebia a negra ingratidão.
Seu Zé Sampaio, homem pacato, cedo na cama com seus imaginários achaques, as gazetas do dia e revistas velhas (adorava ler revistas velhas e almanaques antigos), ao ouvir o vozeirão de dona Dinorá, punha as mãos sobre os ouvidos, em pânico, dizendo a dona Norma, com voz vencida mas não resignada, de quem já não tinha jeito a dar nas aporrinhações:
- Essa mulher é uma filha-da-puta, a maior filha-da-puta que tem por aqui…
- Assim também é má-vontade demais… Ela até que é boazinha…
Por aí se vê quão hábil dona Dinorá: conseguira superar aquela história do filho de Dionísia, quando seu prestígio caíra a zero, voltando a obter o favor de dona Norma. Não, porém o de seu Sampaio.
- Boa filha-da-puta… Veja se consegue, por favor, que ela não meta o nariz aqui no quarto. Diga que estou dormindo, estou descansando… Diga que eu morri…
Quem era dona Norma para impedir dona Dinorá de enfiar o nariz onde quisesse? Ia entrando, íntima da casa, de todas as casas de gente de consideração e dinheiro – para os pobres, bondosa, mas de uma bondade altiva e distante, muito protectora dos desprotegidos, mantendo-os, entretanto, no lugar (inferior) que lhes competia, sem lhes dar asa. Ia enfiando pelo corredor, pelo quarto:
- Dá licença seu Sampaio?
quinta-feira, maio 13, 2010
Ainda meio tonta, atravessou-o e viu uma miríade de pessoas. Todas vestindo cândidos camisolões e caminhando despreocupadas. Sem entender bem o que estava a acontecer, a executiva bem-sucedida abordou um dos passantes:
- Enfermeiro, eu preciso voltar com urgência para o meu escritório, porque tenho um meeting importantíssimo. Aliás, acho que fui trazida para cá por engano, porque o meu seguro de saúde é Platina, e isto aqui está a parecer-me mais a urgência dum Hospital público. Onde é que nós estamos?
- No céu.
- No céu?...
- É.
- O céu, CÉU...?! Aquele com querubins, anjinhos e coisas assim?
- Exacto! Aqui vivemos todos em estado de graça permanente.
Apesar das óbvias evidências, ausência de poluição, toda a gente a sorrir, ninguém a usar telemóvel, a executiva bem-sucedida levou tempo a admitir que havia mesmo batido a bota.
Tentou então o plano B: convencer o interlocutor, por meio das infalíveis técnicas avançadas de negociação, de que aquela situação era inaceitável. Porque, ponderou, dali a uma semana iria receber o bónus anual, além de estar fortemente cotada para assumir a posição de presidente do conselho de administração da empresa.
E foi aí que o interlocutor sugeriu:
- Talvez seja melhor a senhora conversar com Pedro, o coordenador.
- É?! E como é que eu marco uma audiência? Ele tem secretária?
- Não, não. Basta estalar os dedos e ele aparece.
- Assim? (...)
- Quem me chama?
A executiva bem-sucedida quase desabava da nuvem. À sua frente, imponente, segurando uma chave que mais parecia um martelo, estava o próprio Pedro.
Mas, a executiva tinha feito um curso intensivo de approach para situações inesperadas e reagiu logo:
- Bom dia. Muito prazer. Belas sandálias. Eu sou uma executiva bem-sucedida e...
- Executiva... Que palavra estranha. De que século veio?
- Do XXI. O distinto vai dizer-me que não conhece o termo 'executiva'?
- Já ouvi falar. Mas não é do meu tempo.
Foi então que a executiva bem-sucedida teve um insight. A máxima autoridade ali no paraíso aparentava ser um zero à esquerda em modernas técnicas de gestão empresarial. Logo, com seu brilhante currículo tecnocrático, a executiva poderia rapidamente assumir uma posição hierárquica, por assim dizer, celestial ali na organização.
- Sabe, meu caro Pedro. Se me permite, gostaria de lhe fazer uma proposta. Basta olhar para essa gente toda aí, só na palheta e andando a toa, para perceber que aqui no Paraíso há enormes oportunidades para dar um upgrade na produtividade sistémica.
- É mesmo?
- Pode acreditar, porque tenho PHD em reorganização. Por exemplo, não vejo ninguém usando identificação. Como é que a gente sabe quem é quem aqui, e quem faz o quê?
- Ah, não sabemos.
- Percebeu? Sem controlo, há dispersão. E dispersão gera desmotivação. Com o tempo isto aqui vai acabar em anarquia. Mas podemos resolver isso num instante implementando um simples programa de targets individuais e avaliação de performance.
- Que interessante...
- É claro que, antes de tudo, precisaríamos de uma hierarquização e um organograma funcional, nada que dinâmicas de grupo e avaliações de perfis psicológicos não consigam resolver.
- !!!...???...!!!...???...!!!
- Aí, contrataríamos uma consultoria especializada para nos ajudar a definir as estratégias operacionais e estabeleceríamos algumas metas factíveis de leverage, maximizando, dessa forma, o retorno do investimento do Grande Accionista... Ele existe, certo?
- Sobre todas as coisas.
- Óptimo. O passo seguinte seria partir para um downsizing progressivo, encontrar sinergias high-tech, redigir manuais de procedimento, definir o marketing mix e investir no desenvolvimento de produtos alternativos de alto valor agregado. O mercado telestérico, por exemplo, parece-me extremamente atractivo.
- Incrível!
- É óbvio que, para conseguir tudo isso, teremos de nomear um board de altíssimo nível. Com um pacote de remuneração atraente, é claro. Coisa assim de salário de seis dígitos e todos os fringe benefits e mordomias da praxe. Porque, agora falando de colega para colega, tenho a certeza de que vai concordar comigo, Pedro. O desafio que temos pela frente vai resultar num Turnaround radical.
- Impressionante!
- Isso significa que podemos partir para a implementação?
- Não. Significa que a senhora terá um futuro brilhante... se for trabalhar com o nosso concorrente. Porque acaba de descrever, exactamente, como funciona o Inferno...
Max Gehringer
(Revista Exame)
Se era assim tão repleta sua vida, como explicar a constante sensação de vazio, com se tudo aquilo, aquela actividade que a toma, domina e movimenta, fosse inútil e vã? Se em sua modéstia e parcimónia tinha o suficiente para viver com decência e Aida esconder, num hábito antigo, algumas sobras, se tranquila sua vida, e mesmo alegre, por que então vazia e vã?
Nas ruas em torno sobravam as mexeriqueiras velhas e jovens, pois para exercer tal ofício não se exige documento de idade. Dona Dinorá era a primeira dessas xeretas; em sua actividade tamanhos sucessos obteve a ponto de lhe ser atribuída fama de vidente.
Já foi nesta crónica dona Dinorá vista em acção, em lamúrias, em denúncias, em enredos, sem que, no entanto, dela própria se tratasse mais longamente, permanecendo até agora quase anónima, como se fosse tão só uma intrigante comum na roda das beatas. Talvez porque a insólita presença de dona Rozilda, por fim e felizmente em exílio em Recôncavo, não desse vez às concorrentes. Mas sempre é tempo de corrigir um erro, de reparar uma injustiça.
Para muitos, passava dona Dinorá, por viúva do comendador Pedro Ortega, rico comerciante espanhol desencarnado uns dez anos antes. Em verdade, nunca fora casada e donzela o fora pouco tempo; apenas púbere, arribara de casa para dar início a movida e de certa maneira brilhante existência, crónica picante. No entanto – benza-a Deus – ninguém mais moralista e ciosa dos bons costumes desde o feliz encontro com o galego quando, tendo passado dos quarenta e cinco, dona Dinorá olhava o futuro com apreensão: um medo pânico da pobreza e o hábito do conforto.
Sem ter sido jamais realmente bonita, certa graça fescenina, responsável por seu sucesso junto aos homens, diluía-se com os anos e as rugas. Dera então a incrível sorte do comendador, “bilhete premiado com o prémio grosso”, como dona Dinorá confidenciava às amigas na época. O espanhol oferecera-lhe respeitabilidade e garantias, sem falar na casinha das vizinhanças do Largo Dois de Julho onde a instalou.
Quem sabe devido ao medo de ver-se velha e pobre, à ameaça de prostituição de porta aberta, dona Dinorá, ao amparo do comerciante, converteu-se rápido no oposto do que havia sido: em respeitável matrona, guardiã da moral.
Tendência a acentuar-se após a morte de Pedro Ortega e cada vez mais. Quando ele partiu, entre discursos e coroas mortuárias, a antiga mundana passava dos cinquenta anos – cinquenta e três para ser exacto – e, nos oito de amancebamento, criara apego à virtude e à vida familiar.
O probo baluarte das classes conservadoras, grato à amante pela fidelidade e pela revelação de um mundo de ignorados prazeres (que besta fora!, perdera os melhores anos da sua vida ao balcão da pastelaria e no corpo chocho e ignorante da santa e agre sua esposa), deixou-lhe em testamento – além da casa própria, ninho dos pecaminosos amores – acções e obrigações do Estado, renda módica, bastante, porém, para assegurar-lhe velhice sem sustos, por inteiro ao serviço da difamação e da intriga.
Entrevista Nº 13
Tema: Maria Virgem?
Jesus – Parece-me que queres continuar a perguntar-me sobre minha mãe…
Raquel – Sim, claro, o senhor me desculpará mas eu decomentei-me muito bem para esta entrevista. Na Bíblia encontrei a prova definitiva de que Maria foi mãe sem deixar de ser virgem.
Jesus – Ah, sim?... e onde a encontraste?
Raquel – No livro do profeta Isaías. Escuta: “É aqui que a virgem conceberá e dará à luz um filho e lhe porá o nome de Manuel”. Isaías 7, 14.
Jesus – Mas eu não me chamo Manuel. Chamo-me Jesus.
Raquel – O problema não é o nome do menino mas sim a virgem que o pariu.
Jesus – Pois, não sei, mas… parece-me que esse alforge leva uma moeda falsa…
Raquel – Como uma moeda falsa…
Jesus – Por que não perguntas a esse teu amigo que chamaste no outro dia?
Raquel – Não, a esse não, a uma amiga… Aqui tenho o telefone… deixa ver… Vou chamar Ivone Gebara, freira e teóloga brasileira… alô?
Ivone – Sim?
Raquel – Sou Raquel Perez das Emissoras Latinas. Estou a incomodá-la para uma consulta teológica. O profeta Isaías falou de uma virgem dando à luz. Verdadeiro ou falso?
Ivone – Bem, na realidade, o profeta não escreveu “virgem” mas “jovem rapariga” que foi traduzido erradamente para “virgem”.
Raquel – Os tradutores da Bíblia mudaram a palavra?
Ivone – Sim. Com as traduções isso, por vezes, pode acontecer.
Raquel – Mas Mateus, no seu evangelho retoma essa profecia…
Ivone – E marcos, que é mais antigo que Mateus, nem a menciona… e Paulo, em todas as suas cartas, nunca fala de virgens dando à luz. Não acreditas que um prodígio destes fosse esquecido, pois não?
Raquel – Então, não entendo nada…
Ivone – É muito fácil de entender. Na antiguidade, a muitos homens famosos, os seus seguidores, de forma a aumentar-lhes o prestígio tornando-os ainda mais famosos e poderosos, diziam que eram filhos de mulheres fecundadas por deuses. Foi assim com Buda, Confúcio, Zoroastro, fundadores de outras religiões. Seus seguidores diziam que eles tinham nascido de mulheres virgens. Assim os divinizavam.
Raquel – O mesmo fizeram a Jesus Cristo?
Ivone – Sim, o mesmo.
Raquel – Pois… muito obrigado por esta informação, Ivone Gebara.
Jesus – Ouviste o que te disseram, Raquel?... Uma moeda falsa.
Raquel – Mas, então… e o senhor nasceu como… como…
Jesus – Como tu nasceste, como nascemos todos, de um homem e de uma mulher. E que mal há nisso?
Raquel – De mal, nada, mas…
Jesus – Vou te contar uma coisa que se passou uma vez em Cafarnaum. Eu estava a falar anunciando o Reino de Deus e uma mulher do povo levantou a voz: “Bendito o ventre que te trouxe e os peitos que te amamentaram”.
Raquel – Bonito piropo para sua mãe.
Jesus – Pois, mas eu encontrei um melhor. Disse-lhe: “Não bendito o ventre nem os peitos. Bendiz o espírito dessa mulher que ouviu a palavra de Deus e a conservou no seu coração”.
Raquel – Então…?
Jesus – Raquel, a palavra de Deus é uma semente que fecunda o espírito, não a carne. A palavra de deus fecundou o espírito de minha mãe e de quantas lutam pela justiça. Queres um milagre maior que este?
Raquel – O que eu quero é que a nossa audiência dê a sua opinião. Se Maria não foi virgem… como fica a nossa fé na virgem Maria?
De Nazareth para as Emissoras Latinas, Raquel Perez.
VIOLA WILLS - GONA GET ALONG
MINA GROSSI - VERDE LUNA
quarta-feira, maio 12, 2010
FICCIONADAS
COM JESUS CRISTO
Entrevista Nº 12
Tema – Anunciação a Maria
Sacerdote – O anjo do Senhor anunciou a Maria…
Fiéis – E concebeu por obra e graça do Espírito Santo…
Sacerdote – Eis aqui a escrava do Senhor.
Fiéis – Faça-se em mim segundo a tua vontade…
Raquel – Novamente, transmitindo da Basílica da Anunciação, na Nazareth. Acompanha-nos, como nas jornadas anteriores, Jesus Cristo na sua segunda vinda à Terra. Escutaste, senhor, o que rezavam e cantavam os fiéis?
Jesus – Sim, hoje madruguei e escutei várias vezes esta oração.
Raquel – São as palavras do anjo Gabriel quando visitou a tua mãe, aqui mesmo, neste lugar sagrado, há dois mil anos. Se o senhor me permite podemos ir ao essencial?
Jesus – Pois vamos ao essencial.
Raquel – Senhor Jesus Cristo, o senhor é filho de quem?
Jesus – De minha mãe… o mesmo que todo o mundo.
Raquel – Sim. Isso já nós sabemos. O problema é com o pai. Quero que me respondas sem nenhuma ambiguidade: o senhor é filho de Deus: sim ou não?
Jesus – Sim, claro que sou.
Raquel – Uff… Dá-me um grande alívio escutar essas palavras a mim e a muitos dos nossos ouvintes.
Jesus – Mas isso já tu sabias, Raquel. A vida é uma oferta de Deus. Todos somos filhos de Deus, tu também.
Raquel – A ver… a ver…Talvez não me tenha expressado bem. Perguntava se o senhor nasceu por obra e graça do Espírito Santo.
Jesus – Sim. O Espírito de Deus sopra sobre todas as águas.
Raquel – Vou ser mais explícita. Foi o Espírito Santo que fecundou Maria?
Jesus – Que dizes?… Deus não tem esperma. Deus não fecunda mulheres.
Raquel – Faço a pergunta de outra maneira: como é que Maria ficou grávida? Por um prodígio ginecológico ou por um fenómeno de partogénese?
Jesus – Não entendo essas palavras.
Raquel – Estou a dizer se é como essas flores que se auto-fecundam?
Jesus – Nazareth, na minha língua, significa flor mas nunca ouvi dizer que as nazarenas se fecundassem sozinhas.
Raquel – Não sabemos como, mas Deus realizou esse milagre portentoso no ventre de sua mãe Maria.
Jesus – Sim, o milagre da vida. Toda a mãe se assombra perante essa maravilha.
Raquel – Eu refiro-me ao milagre de ser mãe e virgem ao mesmo tempo.
Jesus – Não procures três corcundas no camelo, Raquel. Se Deus pode fazer as coisas facilmente por que iria complicá-las, não te parece?
Raquel – Que nos queres dizer com isso?
Jesus – Meu pai José conheceu minha mãe Maria e dessa união nasci eu.
Raquel – Estou ouvindo bem ou… o senhor dá-se conta que está dizendo uma heresia… talvez a maior de todas?
Jesus – Mas ninguém pode ser herege de si mesmo!... Não hei-de eu saber como nasci!
Raquel – Mas então, por favor, onde está a virgindade da virgem, onde está o anjo Gabriel, a Ave Maria cheia de graça o Senhor é contigo, bendita sejas tu…
Jesus – Sabes que mais? Convido-te a provares umas tâmaras.
Raquel – Como dizes?
Jesus – Vamos, vamos, aqui fora há um mercado…
Raquel – Deixemos os gracejos para outro momento…
Jesus – Os gracejos, sim, mas a fome não. Acompanha-me e continuamos conversando. Talvez fora do Templo compreendas melhor… Vem, segue-me!
Raquel – Espere, que tenho de me despedir dos ouvintes… De Nazareth para Emissoras Latinas, Raquel Perez.
COCHI PONZONI e RENATO POZZETO - E LA VITA, VITA!!! (1974)
(um vídeo cheio de boa disposição!)
OSWALDO MONTENEGRO - METADE DE MIM
(porque metade de mim é amor... e a outra metade também ... lindo!. Ouçam, ouçam, é poesia.)
PEDRO BARROSO - CANTAREI
(Pedro Barroso, poeta, trovador, autor genuino, voz portentosa, aqui do Ribatejo... de Portugal)
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
EPISÓDIO Nº 117
“Pobre Heitor, pobre Celeste, pobres crianças…” lastimou o doutor e padrinho. Mas, entre dona Flor, viúva e freudiana, e o casal já na cangalha de dona Rozilda há anos, não lhe coube vacilação; sacrificou o afilhado e a gentil esposa, em cuja casa almoçava e sempre bem em suas constantes idas ao Recôncavo.
Cada qual com sua cruz, decidiu ele; a dela, dona Flor a carregara sete anos a fio; aquele marido, pesado lenho. Não era justo agora, na esteira da viuvez, empurrar-lhe dona Rozilda, um calvário completo: cruz, coroa de espinhos, vinagre e fel.
Sem dona Rozilda, só de raro em raro as xeretas das vizinhanças traziam à baila o nome do maldito, em respeito às exigências de dona Norma e de dona Gisa, e também porque dona Flor retomara o curso normal da vida, após atravessar as infindas areias da ausência. Não a vida de antes e, sim, um calmo viver, pois sem a presença do esposo, sem suas implicações: os sustos, os desgostos, os aperreios, o desespero. Tudo isso acabara, dona Flor habituou-se a dormir a noite toda, de um sono só. Deitava-se relativamente cedo, após a prosa habitual com dona Norma no círculo das amigas, as cadeiras na calçada, comentando acontecimentos, programas radiofónicos e filmes. Ia ao cinema com dona Norma e seu Sampaio, com dona Amélia e seu Ruas, com dona Emina e doutor Ives, apreciador entusiasta de películas do faroeste. Aos Domingos almoçava no Rio Vermelho, em casa dos tios; tio Porto com a eterna mania das paisagens; tia Lita começando a envelhecer; mantendo, porém, seu jardim e seus gatos em esplendor.
Não quisera dona Flor aderir à animadíssima roda de bisca e três-setes em casa de dona Amélia; até dona Enaide vinha do Xame-Xame para a tarde no carteado. As fanáticas da bisca, as devotas dos três-sete fizeram o possível por conquistá-la, sem obter resultado, como se o falecido houvesse gasto toda a quota de jogo da família, não restando nada para ela. Pior inimigo da jogatina só mesmo o portenho da cerâmica, seu Bernabó; dona Nancy, doida por uma mãozinha de bisca, e o déspota irredutível: no máximo e por favor, os solitários jogos de paciência, nada feito.
Decorria assim tranquila a vida de dona Flor entre as aulas de culinária, as duas turmas cada vez mais numerosas, e as actividades sociais permitidas a seu prudente estado. Não eram pequenos compromissos como pode parecer à primeira vista; enchiam-lhe o tempo inteiro, não lhe sobrando ócios para pensamentos tristes.
Sem falar nas encomendas de recusa impossível para almoço de festa, fino jantar, banquete ou recepção: já de madrugada entregue à trabalheira na cozinha. Sendo muito exigente em relação à qualidade de seus pratos, ao cansaço somava a preocupação.
Vinha ajudá-la uma garota, menina moça dos seus dezasseis anos, filha de outra viúva, dona Maria do Carmo, herdeira de roças de cacau, morando no Areal de Cima desde logo depois do Carnaval e de imediato incorporada à roda de dona Norma. A mocinha, Marilda e morena, uma esperança nos molhos e temperos, tomara amizade de dona flor e não a largava, aprendendo pratos e bolos nas folgas de seu curso pedagógico. Dona Flor sorria ao vê-la em trânsito pela casa cantarolando, os cabelos em alvoroço, o rosto de adolescente tropical demasiado em quebranto e dengue, uma pintura de tão bela; se o velhaco fosse vivo, todo o cuidado seria pouco, ele não mantinha preconceitos de idade.
Como se constata e vê, não faltava o que fazer em sua vida de viúva, o tempo curto, por vezes nem dava para os compromissos.
terça-feira, maio 11, 2010
Entrevista Nº 11
Tema – Como era Maria
Jesus – Pois não sei de onde vêm os espinhos… mas, enfim, Raquel, pergunta-me o que quiseres…
Raquel – Digamos, que foi aqui neste lugar, onde tua mãe recebeu a visita do anjo e aceitou humildemente o seu destino?
Jesus – Por que dizes humildemente?
Raquel – Bem, sua mãe é um exemplo universal de humildade, de obediência à vontade de Deus…
Jesus – Pois não sei de que pessoa estás a falar porque minha mãe era bem arisca.
Raquel – Como arisca?
Jesus – Tinha mau génio. Já sabes como são as mulheres do campo da minha terra. Maria nunca se deixou dominar por ninguém. Nem por José, nem sequer por mim. Queres que te conte um episódio?
Raquel – Conta, conta para a nossa audiência…
Jesus – Quando senti o chamamento de Deus, começaram os problemas lá em casa. Meus irmãos que já eram crescidos não entendiam e minha mãe ainda menos.
Raquel – Não pode ser porque Maria conhecia a vontade de Deus sobre o senhor desde o começo.
Jesus – Escuta, Raquel. Uma vez, estava eu em Cafarnaum, dando início ao nosso movimento, formando o primeiro grupo. A casa estava cheia a abarrotar de gente e me avisaram:
- Jesus: estão lá fora à tua procura.
- Quem está à minha procura?
- A tua mãe e os teus irmãos.
- E o que querem eles?
- Que deixes essas tuas loucuras e regresses a Nazareth.
A minha mãe era a mais determinada.
Raquel – E o senhor que fez?
Jesus – Desafiei-os. Levantei a voz para que me ouvissem bem:
- Quem é minha mãe e quem são meus irmãos? Os que apoiam o plano de Deus não quero que os estorvem.
Raquel – E como reagiram?
Jesus – Ficaram furiosos. Mas depois, a pouco e pouco, com o tempo, foram entendendo. Mudaram. Meus irmãos e minha mãe acompanharam-me mais tarde para todo o lado.
Raquel – Sua mãe rezava muito?
Jesus – Muito, não. Mas quando o fazia fazia-o bem.
Raquel – Qual era a sua oração preferida? A Ave-Maria?
Jesus – Qual dizes… Não era uma oração antiga que eu lhe ouvia rezar muitas vezes: “Minha alma magnífica pertence ao Senhor, porque derrubou o trono dos poderosos e levantou os humildes. Chamou de bons aos pobres e aos ricos os mandou embora de mãos a vazias”. Se bem me recordo era assim que ela rezava.
Raquel – Mas isso é mais que uma oração, parece uma proclamação revolucionária…
Jesus – Como já te disse, a minha mãe era uma lutadora.
Raquel – Tudo o que nos conta está muito bem… mas a nossa audiência quer é saber do anjo.
Jesus – Qual anjo?
Raquel – Gabriel. O que anunciou a Maria a sua concepção virginal.
Sacristão – Atenção… senhores… têm que sair. Vamos encerrar a Basílica.
Jesus – Creio que já nos estão tirando daqui.
Raquel – Pois, vamos para uma pausa comercial… e sigam connosco. Para Emissoras Latinas, Raquel Perez, Nazareth.
PAT BOONE - LOVE LETTERS IN THE SAND
(falar desta voz e desta canção... só para dizer que, mais que lindas, são imortais)
(uma voz extraodinária. Obrigado pelas recordações...é difícil esquecer-te)
(com versos de António Gedeão - Prof. Rómulo de Carvalho - mais do que uma canção, a Pedra Filosofal é um hino à vida !
DONA FLOR
MARIDOS
EPISÓDIO Nº 116
Ali, na capital, vivia em desconforto, casa pequena sem quarto só para ela, dormindo em cama de vento, na sala onde dona Flor leccionava as aulas teóricas, sem armário próprio para os seus teréns, enquanto tão ampla casa do filho, com sobras de cómodos. Em Nazareth, ao demais e sobretudo, ela, dona Rozilda, era alguém. Não se impunha apenas como mãe de seu Heitor – funcionário de categoria da Estrada de Ferro, segundo secretário do social Farinhense, um dos melhores tabuleiros de gamão e dama da cidade (eclodindo nele a frustrada vocação de seu Gil, um zarro no desenho; copiava a fisionomia de qualquer vivente e reproduzia a lápis cromos de folhinha – era ela própria ornamento e evidência da melhor sociedade nazarena, onde exercia suas relações metropolitanas, a família Marinho Falcão, dr. Zitelmann Oliva e dona Lígia, o jornalista Nacife, dona Maga, o industrial Nilson Costa e sua chácara de Matatu, e antes de tudo seu compadre doutor Luís Henrique, o “cabecinha de ouro”, orgulho da terra.
Na capital, nem mesmo no mundo daquela pequena burguesia apenas remediada, circunscrito a umas poucas ruas entre o Largo Dois de Julho e santa Tereza, nem mesmo ali lhe davam atenção e importância; ao contrário, haviam-lhe tomado birra. As amigas mais íntimas de sua filha, dona norma, dona Gisa, dona Emina, dona Amélia Ruas, dona Jacy, não tiveram pejo em responsabilizá-la pelo estado desalentador da viúva, pondo a culpa em seus maus bofes, nas recriminações e nos insultos, na absurda quezília com o morto. Ou bem mudasse de atitude, largando o falatório e as maldições à memória do genro, ou fosse embora. Um ultimato.
Por isso mesmo, em reacção a tão inominável acinte, dona Rozilda prolongou a visita apesar do desconforto da casa e das restrições da vizinhança. (Dona Jacy até já arranjara ama para dona flor: uma encardida Sofia, sua afilhada.) Apressou-se a viajar, no entanto, após a missa de mês, ao ter notícias, através do compadre doutor de sua designação pelo reverendo Walfrido Moraes para o alto cargo de tesoureira da Companhia em Benefício das Novas Obras da Catedral de Nazareth, em cujo Conselho Director esplendiam a esposa do Juiz de Direito (presidenta), do Prefeito (Primeira Vice), do delegado (Segunda) e outras eminências sociais da terra.
Há muito almejava dona Rozilda pertencer ao rol das directoras, mesmo como última vogal da lista; de repente saía tesoureira, nada menos. O divino Espírito Santo iluminara o padre Walfrido, antes tão reticente às suas investidas.
Ao sacerdote custara vacilações e dúvidas tal despacho, mas o influente conterrâneo, a quem recorrera para obter o pagamento de substanciais verbas estaduais, condicionou sua decisiva ajuda à posse de dona Rozilda num cargo de inveja na pia congregação das beatas. Chantagem miserável, pensou o vigário, curvando-se a ela, no entanto, pois tinha urgência da bolada e, sem a intervenção do doutor Luís Henrique, como apressar a máquina burocrática?
Nas antevésperas, dona Gisela, com quem por vezes o doutor discutia sobre os destinos do mundo e as imperfeições do ser humano, informara-lhe:
- Se dona Rozilda não for embora, a pobre Flor não terá descanso nem para esquecer… E ela precisa esquecer, está complexada, é um curioso caso de morbidez, caro doutor, que só a psicanálise pode explicar. Aliás, Freud cita um exemplo…
Dona Norma, que com ela viera, interrompia em tempo:
- É uma caridade que o senhor faz, doutor… Bote essa peste longe daqui, mande para Nazareth, que ninguém aguenta mais…
segunda-feira, maio 10, 2010
(claro! Com o peso demorou 100 anos para subir o monte !!!)
- A História divide-se em 4: Antiga, Média, Momentânea e Futura, a mais estudada hoje*
(a Futura é particularmente estudada pela "Maya" certamente)
- O metro é a décima milionésima parte de um quarto do meridiano terrestre e para o cálculo dar certo arredondaram a Terra! *
(Ups! Até eu me vi atrapalhada para fazer o cálculo. Imaginação tem ele... vai ser matemático de certeza, Portugal precisa de matemáticos com imaginação)
- Quando o olho vê, não sabe o que está a ver, então ele amanda uma foto eléctrica para o cérebro que lhe explica o que está a ver.*
(nada mal pensado. Somos uma máquina fotográfica em potência e em funcionamento contínuo)
- O nosso sangue divide-se em glóbulos brancos, glóbulos vermelhos e até verdes! *
(acho que faltam os Azuis!!Ah, mas esses com o apito dourado andam em fuga)
- Nas olimpíadas a competição é tanta que só cinco atletas chegam entre os dez primeiros.*
(entende-se agora a prestação de Portugal nos jogos olimpicos!!!)
- O piloto que atravessa a barreira do som nem percebe, porque não ouve mais nada.*
(claríssimo!! Se passou a barreira o som quando chega já ele passou, por isso não o ouve. Será?)
- O teste do carbono 14 permite-nos saber se antigamente alguém morreu.*
(Assim de momento acho que hoje em dia basta verificar se o coração parou ou se respira... quer dizer... digo eu... mas pelo sim pelo não que se faça o teste do carbono 14, se os gajos do CSI descobrem uiui)
- O pai de D. Pedro II era D. Pedro I, e de D. Pedro I era D. Pedro 0*
(E antes foi o Pedro -1, já agora)
- Em 2020 a caixa de previdência já não tem dinheiro para pagar aos reformados, graças à quantidade de velhos que não querem morrer.*
(São uns chatos os velhos! Se o Socras topa o "jogo" deles...)
- O verme conhecido como solitária é um molusco que mora no interior, mas que está muito sozinho.*
("tadinho", espero que não tenha medo do escuro ou das trovoadas, não merece tanto sofrimento)
- Na segunda guerra mundial toda a Europa foi vítima da barbie!
(Queria dizer, decerto, barbárie! Ainda não existia os Morangos com Açucar... ai então é que seria lindo, não era a barbie que levava a melhor não!)
- O hipopótamo comanda o sistema digestivo e o hipotálamo é um bicho muito perigoso.*
(nem sei que diga... se a protecção dos animais descobre estamos todos tramados)
(não consigo encontrar melhor definição)
- Lenini e Stalone eram grandes figuras do comunismo na Rússia.*
(exactamente, principalmente o Stalone)
- Uma tonelada pesa pelo menos 100Kg de chumbo.*
(Diabos me levem...!!!)
- A fundação do Titanic serve para mostrar a agressividade dos ice-bergs.*
(claro, nem a experiência podia ter sido feita de maneira diferente; tinha de ser usado um dos animais mais agressivos que se conhece)
- Para fazer uma divisão basta multiplicar subtraindo.*
(atenção, não tentem fazer isto em casa, pode ser perigoso. pelo menos complicado é! Pelo sim pelo não peçam esclarecimentos ao futuro professor catedrático de análise matemática)
- A água tem uma cor inodora.*
(pois... eu também gosto muito dessa cor)
- O telescópio é um tubo que nos permite ver televisão de muito longe.*
(o tipo deve ser "espião" da vizinhança, sinceramente... já ninguém quer aderir ao MEO... anda tudo a "chular" os vizinhos. Será que com o telescópio conseguiu ver a grande penalidade fora da área?!)
- O sul foi posto debaixo do norte por ser mais cómodo.*
(obviamente que sim. Tinha algum jeito o contrário, e aposto que foi um alentejano que teve essa brilhante ideia)
- Os rios podem escolher desembocar no mar ou na montanha.*
(é isso! Ao nascerem podem escolher... viva a liberdade de escolha!)
- Os escravos dos romanos eram fabricados em África, mas não eram de boa qualidade.*
(Racista... só os fabricados na China é que são bons não?!)
- A baleia é um peixe mamífero encontrado em abundância nos nossos rios.*
(todos os dias me cruzo com baleias ao atravessar o rio, é tão giro)
- Newton foi um grande ginecologista e obstetra europeu que regulamentou a lei da gravidez e estudou os ciclos de Ogino-Knaus. *
(Não consigo ter palavras, nem quero pensar o que diria ele sobre a actual lei do aborto)
- Ao princípio os índios eram muito atrasados mas com o tempo foram-se sifilizando.*
(tal qual como quem escreveu, isto digo eu... cheia de esperança!!)
- A Terra é um dos planetas mais conhecidos e habitados do mundo.*
(questão para se perguntar... quantos planetas tem o mundo?)
- A Latitude é um circo que passa por o Equador, dos zero aos 90º.*
(os "circos" deste são mais pequenos que o habitual, mas está bem, é uma opinião a ser estudada!!)
- Caudal de um rio, é quando um rio vai andando e deixa um bocadinho para trás!*
(é claro. Caso contrário ficava vazio depois de passar. Deve ser uma forma de o encontrarem)
- Princípio de Arquimedes: qualquer corpo mergulhado na água, sai completamente molhado. *
(aí,,, não há dúvida nenhum, não?)
(O padre Mário ajuda a compreender, na linha das entrevistas de Raquel, a verdade histórica sobre esse homem notável chamado Jesus, o Nazareno, e da terrível tramóia que lhe foi montada)
ENTREVISTAS
ENTRVISTA Nº10
Raquel – Nossos microfones mudaram-se para a Nazareth, na Galileia, uma cidade que conta hoje com 65.000 habitantes e muito comércio. Encontramo-nos na monumental Basílica da Anunciação e de novo com o protagonista desta história, Jesus Cristo na sua segunda vinda à terra. Suas primeiras impressões, Mestre…
Jesus – Já te disse que não me chames Mestre, recordo-te que todos somos…
Raquel – Sim, já me disseste várias vezes… desculpa, é o costume. Bem, esta Basílica está construída sobre as ruínas da casa da sua sagrada família… ali em baixo podemos apreciar as antigas paredes… reconhece-las?
Jesus – Bem, com tantas velas e com tantos mármores… vou concentrar-me… sim, creio que era por aqui que jogávamos quando em crianças… Isto era um espaço de terreno por onde se saía para o vale… me recordo.
Raquel – A que jogavam?
Jesus – Com uma bola de trapos… a escondermo-nos dos soldados romanos, ao “moinho” que era jogo com umas bolinhas, muito divertido… ganhava sempre ao meu irmão Santiago…
Raquel – Seu irmão Santiago?
Jesus – Sim, Santiago. Josefo também jogava, Simoncito e Judas, não, ainda eram muito pequenos.
Raquel – O senhor quererá dizer seus primos?
Jesus – Como, meus primos? Meus irmãos. Eu tinha quatro irmãos varões e duas irmãs.
Raquel – O senhor refere-se a esses irmãos que os Evangelhos mencionam?... Porque a mim explicaram-me que a palavra grega “adelfos” significa tanto irmãos como primos…
Jesus – Não sei dessas palavras, apenas que eram meus irmãos.
Raquel – Talvez meios-irmãos, filhos de um anterior matrimónio de José…
Jesus – Como poderiam ser de um matrimónio anterior se o meu pai se casou muito cedo com minha mãe? Naquele tempo casávamo-nos muito cedo.
Raquel – Pois então, não entendo nada. Todo o mundo sabe que o senhor foi filho unigénito de Maria.
Jesus – Não. O primogénito. Eu era o mais velho, isso sim. Mas logo nasceu Santiago e logo de seguida Josefo, Ester, Simoncito, que era muito irrequieto, Judas e a benjamim…
Raquel – Eram todos filhos de José… e de Maria?
Jesus – Claro, de quem mais haviam de ser?
Raquel – O senhor deixa-nos noqueados com essas declarações…
Jesus – Como, noqueados?
Raquel – Bem, é uma expressão de um jogo que o senhor não conhece e seguramente não gostaria de conhecer, o boxe. Enfim, digamos, estupefactos.
Jesus – Minha mãe é que estaria estupefacta. Imagina criar seis crianças, comigo sete… e meu pai José, por mais que “vergasse as costas” não conseguia chegar a tantas bocas. E logo estava a avó Ana e o tio Miguelito…
Raquel – Deixe lá a avó e o tio e voltemos a seus irmãos, ou seja, a Santiago, Josefo e a todos os outros que o senhor mencionou, são seus irmãos carnais?
Jesus – Sim.
Raquel – Dá-se conta da gravidade do que disse?
Jesus – Não.
Raquel – É que, se esses irmãos foram irmãos e não primos, a virgem não foi virgem… e eu estou muito confundida.
Jesus – Mas porquê, Raquel? Que há de mal ter uma família? Deus criou a vida. Somos imagem e semelhança de Deus quando criamos vida, não quando permanecemos estéreis.
Raquel – Sim… quero dizer… temos que continuar a conversar com o senhor sobre estas coisas porque, francamente… ainda que, pensando bem... o que é que muda se Jesus teve irmãos? Muda a sua mensagem?
…de Nazareth, Raquel Perez.
BONEY M - DADDY COOL
(experimente dançar esta músca quando estiver sózinho em casa...)
PICOLO, GRANDE AMORE
Aquela sua camiseta fina
tanto estreita ao ponto que
eu imaginava tudo.
E aquele ar de menina
que não lhe disse nunca,
mas eu ficava louco.
E claras noites de verão,
o mar, as brincadeiras, as fadas,
e o medo e a vontade de ficar nus,
um beijo com lábios salgados,
o fogo, quatro risadas,
e fazer amor em baixo do farol.
Te amo de verdade, te amo o juro.
Te amo, te amo de verdade.
E ela, ela me olhava com suspeito
depois me sorria e me mantinha bem apertado.
E eu, eu nunca entendi nada
visto que agora não tiro da mente
que ela, ela era
um pequeno grande amor,
somente um pequeno grande amor,
nada mais do que isto, nada mais.
Sinto saudade de morrer
daquele seu pequeno grande amor,
agora que saberia o que dizer,
agora que saberia o que fazer,
agora que
quero um pequeno grande amor.
Aquele andar estranho,
até no meio de quiçá que,
o teria reconhecido.
Me dizia "és um desastre"
mas eu nisso aí
nunca acreditei.
E longas corridas ofegantes
em direção à estrelas caídas,
e mãos sempre mais desejosas
de coisas proibidas.
E as canções desafinadas gritadas ao céu lá em cima
"quem chega primeiro àquele muro..."
Não tenho certeza se te amo de verdade
não tenho, não tenho certeza.
E ela, de improviso não falava
mas se lia claramente no seu rosto que sofria.
E eu, eu não sei quanto chorei.
Somente agora me dou conta
que ela, ela era
um pequeno grande amor,
somente um pequeno grande amor,
nada mais do que isto, nada mais.
Sinto saudade de morrer
daquele seu pequeno grande amor,
agora que saberia o que dizer,
agora que saberia o que fazer,
agora que
quero um pequeno grande amor.
CLAIDIO BAGLIONI - PICOLO, GRANDE AMORE
CLARA NUNES - ILU AYÉ
DONA FLOR
EPISÓDIO Nº 115
Por isso, naquela manhã, as alunas (turma nova, numerosa e simpática), ao vê-la de blusa alva estampada com grinaldas escuras, um colar de pérolas falsas ao pescoço e leve traço de batom nos lábios romperam em entusiásticos aplausos à alegre professora. Ainda devia ela esperar outros seis meses para o verde e rosa, o amarelo e o azul, o vermelho e o havana; e para as novas e sensacionais cores da moda: azul-rei, azul-pervanche, hortênsia, verde-mar.
A alegre professora, sim. Como no verso de dona Maga Paternostro, a rica. Porque, em verdade, dona Flor aliviara o luto interior, despira os véus da morte, quando na véspera da missa do mês, enterrou dentro de si o carrego do falecido. Manteve, em respeito aos costumes e aos vizinhos, o rigor do preto, retomando, no entanto o seu riso manso, sua atenta cordialidade, seu interesse pelas circunstâncias diárias, seu capricho de dona de casa. Ainda com uma sombra de melancolia a fazê-la vez por outra pensativa e a dar à sua formosura doméstica uma nova qualidade, certo encanto nostálgico; curiosa, porém, da vida em derredor, imprimindo vigoroso alento à escola de culinária, de cujo renome descuidara naquele primeiro mês.
Cerrou a boca ao nome do finado, parecendo tê-lo esquecido por completo, como se, após a crise e a obsessão, viesse a concordar com dona Dinorá e suas comparsas, no facto de ter sido a morte do ordinário uma carta de alforria, encontrando-se, por fim, de acordo a viúva e as beatas. Em aparência, pelo menos.
Naquela ocasião da missa do mês, ao volver da vista à campa onde depusera as flores e o preceito do adivinho, o mokan de Ossain, abriu as janelas da sala de visitas permitindo finalmente à luz do sol iluminar a casa, varrendo sombras e espectros. Tomou da vassoura, do espanador, de trapos e escovas, e atirou-se ao trabalho.
Dona Rozilda propôs-se ajudá-la mas, em limpeza tão completa, também ela se foi de volta a Nazareth das Farinhas, quando filho e nora começavam a alimentar as clássicas esperanças de melhores dias. Afinal, quem mais necessitada de permanente companhia, do afecto e da assistência da mãe, senão dona Flor, recém-viúva e inconsolável? Dona Flor sozinha e indefesa, exposta aos múltiplos perigos de seu ingrato estado – era justo fosse dona Rozilda, mãe experiente e intrépida, residir com a filha desprotegida, ajudando-a no trato da casa e na solução dos inúmeros problemas. Quem sabe maravilhoso milagre sucedera, vendo-se enfim o casal e a cidade de Nazareth livres da mãe e sogra, tão mais sogra do que mãe? Celeste, nora e serva, fizera promessa de valia a Nossa Senhora da Aflição.
Suas preces não obtiveram eco; mais forte o santo de dona Flor, defendida, sem sequer o saber, nos axés e pejis dos candomblés, por força do rei de Ketu, Oxóssi, orixá de sua comadre Dionísia (Okê!). Assim, foi a viúva quem se livrou de dona Rozilda que, aliás, não se fora antes de pura má-criação, de rabujice, de pirraça aos vizinhos. Pois apeteceu aos vizinhos tiranizá-la, impor-lhe condições de convivência.